RESUMO: Este artigo tem por objetivo trazer um breve deslinde da questão da impossibilidade de indenização aos possuidores de boa-fé no caso de realizarem benfeitorias em bens públicos.
Palavras-chave: Bem público. Benfeitorias. Possuidor. Posse. Boa-fé. Má-fé. Indenização.
1. INTRODUÇÃO
O Código Civil brasileiro tratou de definir a posse em seu art. 485, ao enunciar que “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno, ou não, de algum dos poderes inerentes ao domínio, ou propriedade”.
Na doutrina o conceito de posse está longe de encontrar uma unanimidade. Para Roberto Senise Lisboa:
O vocábulo posse significa poder do exercício de fato sobre uma coisa. Quando essa situação é relevante para o Direito, considera-se um fato jurídico. E, como fato jurídico, pode consubstanciar-se a conduta daquele que age sobre a coisa como um ato lícito ou ilícito.
Assim, somente a posse que é um fato jurídico demonstra-se de importância para o Direito.
Como ato jurídico, o objeto da posse deve ser, em regra, economicamente apreciável.
Nestes termos concebida, a posse é uma situação jurídica e proporciona, destarte, direitos para aquele que se encontra nesse estado.
A posse, por natureza, é exclusiva, salvo quando houver composse, que é a situação jurídica subjetivamente múltipla sobre uma coisa, ou seja, a posse conjunta de duas ou mais pessoas sobre a mesma coisa. Ou, ainda, quando suceder a superposição de posses.
O possuidor de um bem pode promover a sua disposição física, impedindo, assim, o exercício do poder de outrem sobre o mesmo bem.
MARIA HELENA DINIZ, explica que para Ihering a posse é “a exteriorização da ouvisibilidade do domínio, ou seja, a relação exterior intencional existente normalmente entre a pessoa e a coisa, tendo em vista a função econômica desta”
Diz-se de boa-fé a posse cujo possuidor acredita ser legítima, ou seja, não lhe é percebida qualquer causa capaz de impedir a aquisição do bem ou o exercício do direito.
Ou seja, a posse deixará de ser de boa-fé e passará a ser reputada de má-fé conforme a intenção do possuidor mude para má. A respeito do assunto, aduz César Fiuza:
Tal é o caso do locatário que, a partir de certo momento, dedica-se a se assenhorear da coisa. Tal também será o caso do possuidor do lote que, tomando conhecimento de que se encontra em terreno do vizinho, mesmo assim, continue a possuí-lo. A partir do momento em que tomou conhecimento do vício, sua posse deixa de ser de boa-fé, tornando-se posse de má-fé.
Todavia, não se considera de boa-fé a posse de quem, por erro inescusável, desconheça o defeito que vicia sua posse. A pessoa que adquirir a posse de um débil mental não poderá alegar desconhecimento da incapacidade deste para classificar sua posse como de boa-fé.
A importância da distinção entre posse de boa-fé e de má-fé é enorme. Ao possuidor de Boa-fé, por exemplo, garantam-se os frutos percebidos, como veremos infra.
2. DESENVOLVIMENTO
Tema interessante a ser analisado é o caso do possuidor que de boa-fé realiza benfeitorias no imóvel de propriedade do Estado.
Em relação aos bens particulares o Código Civil definiu nos artigos 1.219 e seguintes que o possuidor de boa-fé tem direito a ser indenizado quando realizar benfeitorias necessárias e úteis e quanto às voluptuárias poderá levantá-las, mas não fará jus à indenização.
Já o possuidor de má-fé só será indenizado pelas benfeitorias necessárias e caso realize benfeitorias úteis e voluptuárias não poderá sequer levantá-las.
No que tange aos bens públicos não há regramento explícito sobre o assunto, mas o Superior Tribunal de Justiça tem entendido de que não é possível indenizar o particular que em posse de bem público realize benfeitorias, ainda que a posse seja considerada de boa-fé. Vejamos:
DIREITOS REAIS. RECURSO ESPECIAL. POSSE DE BEM PÚBLICO GERIDO PELA TERRACAP OCUPADO SEM PERMISSÃO. IMPOSSIBILIDADE. DIREITO À RETENÇÃO E INDENIZAÇÃO POR BENFEITORIAS. INVIABILIDADE.
1. Conforme dispõe a Lei 5.861/72, incumbe à TERRACAP, empresa pública que tem a União como co-proprietária, a gestão das terras públicas no Distrito Federal.
2. A jurisprudência firme desta Corte entende não ser possível a posse de bem público, constituindo a sua ocupação sem aquiescência formal do titular do domínio mera detenção de natureza precária.
3. Os artigos 516 do Código Civil de 1916 e 1.219 do Código Civil em vigor estabelecem a posse como requisito para que se possa fazer jus ao direito de retenção por benfeitoria.
4. Recurso especial provido.
No mesmo sentido, em julgado recente:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. ART. 535, II DO CPC. VIOLAÇÃO NÃO CONFIGURADA. BEM PÚBLICO. OCUPAÇÃO IRREGULAR. DIREITO DE INDENIZAÇÃO PELAS ACESSÕES.
INEXISTÊNCIA.
1. O fato de as conclusões do acórdão recorrido serem contrárias aos interesses da parte, não configura violação ao artigo 535, II do Código de Processo Civil.
2. Restando configurada a ocupação indevida de bem público, não há falar em posse, mas em mera detenção, de natureza precária, o que afasta o direito de retenção por benfeitorias e o almejado pleito indenizatório à luz da alegada boa-fé.
3. Agravo regimental não provido.
3. CONCLUSÃO
Considerando que os bens públicos não são passíveis de serem usucapidos não há possibilidade da posse irregular do bem público por qualquer particular gerar efeitos indenizatórios sejam as benfeitorias realizadas necessárias, úteis ou voluptuárias.
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg no REsp 1470182/RN, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/11/2014, DJe 10/11/2014
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 841.905/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/05/2011, DJe 24/05/2011)
DINIZ. Maria Helena. Código Civil Anotado. São Paulo: Saraiva. 1.995
FIUZA, Cézar. Direito civil: curso completo. 9ª Ed. Belo Horizonte: Delrey. 2006.
NOTAS:
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 841.905/DF, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 17/05/2011, DJe 24/05/2011
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. AgRg no REsp 1470182/RN, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/11/2014, DJe 10/11/2014
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