Resumo: O presente trabalho trata do instituto da decadência a favor da Administração Pública no âmbito do direito previdenciário, abordando, brevemente, a evolução histórica legislativa, as posições doutrinárias e o recente julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre o tema.
Palavras-chave: Decadência. Direito Previdenciário. Direito Intertemporal.
1. Introdução
O instituto da decadência está ligado aos efeitos do tempo nas relações jurídicas. Tanto o instituto da prescrição, quanto o instituto da decadência concretizam a necessidade de segurança jurídica e de paz social/pública. Tais institutos estão intimamente relacionados com a inércia do titular de um direito e o decurso de determinado lapso de tempo.
Decadência é a perda da possibilidade de exercer o direito em razão da inércia o seu titular. E só há decadência se houver prazo decadencial previsto em lei. Se não houver previsão legal, os direitos potestativos não decaem. Direito potestativo é o que confere ao titular a prerrogativa de fazer produzir efeitos pela sua simples declaração de vontade (traz na sua essência o poder).
2. Desenvolvimento
A redação original do art. 103 da Lei nº 8.213/91 dispunha que “sem prejuízo do direito” prescrevia em 5 (cinco) anos as prestações não pagas nem reclamadas na época própria. Assim, era possível a propositura de ação judicial para discutir direitos previdenciários a qualquer momento.
A demora na propositura da ação judicial acarretava apenas a prescrição das parcelas relativas aos últimos cinco anos anteriores ao ajuizamento da ação.
Com o advento da nova redação do art. 103, da Lei nº 8.213/91, através da MP nº 1.523-9/1997, posteriormente convertida na Lei nº 9.528/1997, o legislador previu um prazo decadencial de dez anos para que o segurado ou benefíciário revisasse o ato de concessão de benefício ou a decisão indeferitória no âmbito administrativo.
Essa foi a redação trazida pela MP nº 1.523-9/1997, posteriormente convertida na Lei nº 9.528/1997:
Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997)
Parágrafo único. Prescreve em cinco anos, a contar da data em que deveriam ter sido pagas, toda e qualquer ação para haver prestações vencidas ou quaisquer restituições ou diferenças devidas pela Previdência Social, salvo o direito dos menores, incapazes e ausentes, na forma do Código Civil. (Incluído pela Lei nº 9.528, de 1997)
Segundo Hermes Arrais Alencar,
“A alteração consistiu em fixar prazo decadencial, de dez anos, para a busca de direito previdenciário e estender a prescrição quinquenal à aprópria ação, e não mais tão só a “prestações vencidas há mais de cinco anos”.”
Posteriormente, a MP 1663-15, de 1998, convertida na Lei nº 9.711, de 1998, diminuiu o prazo decadencial para cinco anos. Assim ficou a redação do art. 103, caput, da Lei nº 8.213/91:
Art. 103. É de cinco anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. (Redação dada pela Lei nº 9.711, de 20.11.98)
Antes do implemento do prazo quinquenal, a MP 138, de 19/11/2003, convertida na Lei nº 10.839/2004, restabeleceu o prazo decenal previsto originalmente:
Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo. (Redação dada pela Lei nº 10.839, de 2004)
Os aplicadores do Direito discutem acerca da aplicação da decadência a favor da Administração Pública em relação aos benefícios previdenciários concedidos antes da inclusão do instituto no ordenamento jurídico brasileiro.
Marina Vasques Duarte entende que os novos prazos previstos a partir de 1997 não podem ser aplicados aos benefícios concedidos anteriormente,
“já que deve ser aplicada a lei vigente na data da concessão do benefício. Caso contrário, estar-se-ia concedendo efeitos retroativos ao citado dispositivo legal, em manifesta afronta ao disposto no art. 6 da Lei de Introdução ao Código Civil.”
De outra banda, Wilson de Souza Campos Batalha entende que a inexistência de prazo decadencial na data do nascimento do direito não significa que sua possibilidade de exercício seja perpétua. Quer dizer que a lei pode fixar prazo decadencial após o nascimento do direito, com efeito imediato sobre as situações em curso. Segundo ele,
“à semelhança dos fatos jurídicos complexos ou de formação continuada, a prescrição e a decadência subordinam-se à lei em vigor na data do termo prescricional ou preclusivo”.
No entanto, não deve haver aplicação retroativa, razão pela qual o termo inicial do prazo se dará a partir da data de vigência da lei.
3. Conclusão
A aplicação da decadência aos benefícios previdenciários concedidos antes de 1997 é matéria altamente discutida pelos operadores do Direito. A matéria é de extrema importância para a sociedade brasileira, porque o instituto da decadência está ligado à segurança jurídica e à pacificação social. Além disso, o tema gera um grande número de recursos, seja de parte dos segurados, seja de parte da Administração Pública, na figura do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS.
O Supremo Tribunal Federal sempre adotou, me matérias diversas, a posição de que é possível a lei fixar prazo decadencial após o nascimento do direito, com efeito imediato sobre as situações em curso. E, após muita celeuma jurídica, foi esse o entendimento final da Corte Suprema sobre essa matéria.
Em 16 de outubro de 2013, apreciando o Recurso Extraordinário 626489/SE, de relatoria do Min. Roberto Barroso, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se sobre o tema pontualmente. O Pretório Excelso, por unanimidade, entendeu que é legítima a instituição de prazo decadencial para a revisão de benefício previdenciário já concedido, fundamentando sua decisão no princípio da Segurança Jurídica. Nesse julgamento, a Corte Suprema fixou o termo inicial do prazo decadencial de dez anos, instituído pela Medida Provisória nª 1.523, de 28/06/1997, no dia 1º de agosto de 1997, por força do que aquela norma mesmo dispôs expressamente, incidindo sobre benefícios concedidos anteriormente.
Assim, o Supremo Tribunal Federal colocou uma pá de cal sobre a discussão - ao menos no âmbito judicial - ao julgar a matéria, eis que havia grande divergência na comunidade jurídica e no próprio Poder Judiciário acerca do tema.
Referências bibliográficas:
AMORIM FILHO, Agnelo. Critério científico para distinguir a prescrição da decadência e para identificar as ações imprescritíveis. Revista dos Tribunais, São Paulo: RT, vol. 300, out. 1961.
BALERA, Wagner. Princípios norteadores de direito previdenciário. Revista de Previdência Social, São Paulo, n. 82, p. 515-524. Set. 1987.
_______. A seguridade social na Constituição de 1988. São Paulo: RT, 1989.
BATALHA, Wilson de Souza Campos. Direito Intertemporal, Rio de Janeiro: Forense, 1980.
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