Resumo: A questão tratada neste sucinto artigo diz respeito à possibilidade ou não de a Administração Pública alterar o CNPJ constante do preâmbulo do Contrato Original em termo aditivo.
1. Introdução
A concisa análise diz respeito à situação corriqueira vivida em contratos administrativos relativa a pedido da empresa contratada para contemplação no ajuste de mudança de faturamentos da matriz para a filial, ou seja, refere-se à viabilidade ou não de modificação do CNPJ por meio de termos aditivos quando a contratação já está em pleno andamento.
2. Desenvolvimento
O Cadastro Nacional da Pessoa Jurídica compreende as informações cadastrais das entidades de interesse das administrações tributárias da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, conforme art. 2º da Instrução Normativa RFB nº 1.470, de 30 de maio de 2014, o qual dispõe sobre o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica.
Ao pesquisar a possibilidade de alteração de CNPJ na jurisprudência do Tribunal de Contas da União, é possível encontrar alguns apontamentos sobre a questão no Acórdão 1.573/2008-Plenário, Ministro Relator Aroldo Cedraz.
Uma das ocorrências detectadas nesse acórdão diz respeito à cláusula primeira do 8º Termo Aditivo, firmado em 1/7/2004 ao contrato nº 21.0103.2003, para que o faturamento dos serviços contratados junto a matriz da Microlínea Comércio e Serviços em Informática Ltda., CNPJ nº 68.428572/0001-00, ocorresse pela filial dessa empresa, 68.428.572/0002-90, situação que de fato já vinha ocorrendo em meses anteriores a essa alteração contratual.
Diante de tal ocorrência, os envolvidos foram chamados a apresentarem justificativas, pois aquele termo aditivo configuraria subcontratação total do objeto, subcontratação essa que não era prevista nem na minuta do contrato constante da licitação nem na avença original, fato esse que se constitui em motivo para rescisão unilateral do contrato pela administração, conforme reza o art. 78, inciso VI da Lei nº 8.666/1993.
A Secretaria de Controle Externo no Estado do Rio de janeiro – Secex/RJ[1] analisou as razões de justificativas apresentadas pelos responsáveis e assim concluiu:
197. As razões de justificativas apresentadas pelos responsáveis demonstram que efetivamente ocorreu uma falha nos procedimentos adotados pela Escritório Estadual de São Paulo, uma vez que somente em maio de 2004 foi constatado que desde de outubro de 2001 o faturamento vinha sendo feito pela filial e não pela matriz da empresa que assinara o contrato.
198. É preciso ponderar, contudo, que, uma vez que tomaram ciência do problema, os responsáveis do Escritório de São Paulo não se quedaram inertes, tendo solicitado e seguido as orientações da administração central da empresa. Ademais, solicitaram, à época, a alteração do sistema de pagamentos a fim de evitar ocorrências semelhantes (fls. 38/39, Anexo 12).
199. Assim, em que pese a celebração do termo aditivo permitindo a alteração do CNPJ para fins de faturamento possa caracterizar subcontratação total do contrato - que era não permitida no presente caso - entendemos que não houve a intenção de fazê-lo, nem tampouco de burlar o cumprimento da exigência constitucional de que as contratadas pelo poder público estejam em situação regular junto ao fisco e à previdência social. Consequentemente, não identificamos conduta culposa ou dolosa merecedora de apenação por parte do TCU.
200. Trata-se a nosso ver, de falha de procedimento e dos controles internos da empresa, para o que julgamos pertinente apenas a propositura de determinação destinada a evitar ocorrências semelhantes.
Conclusão
201. As alegações apresentadas pelos responsáveis lograram justificar o faturamento dos serviços contratados junto a matriz da Microlínea Comércio e Serviços em Informática Ltda., CNPJ nº 68.428572/0001-00, pela filial dessa empresa, CNPJ 68.428.572/0002-90.
202. Por todo o exposto, propomos sejam aceitas as razões de justificativa apresentadas pela Srª Neusa Leo Koberstein e pelo Sr. José Luiz Visconti.
203. Outrossim, propomos seja determinado à Dataprev que abstenha-se de efetuar pagamentos de notas fiscais emitidas por estabelecimento de CNPJ diferente daquele constante do contrato ou autorização de fornecimento, sob pena de caracterizar subcontratação total, ocorrência que, quando não prevista nem na minuta do contrato constante da licitação nem na avença original, constitui em motivo para rescisão unilateral do contrato pela administração, conforme reza o art. 78, inciso VI da Lei 8.666/93.
Os Ministros do Tribunal de Contas da União, reunidos em sessão do Plenário, acordaram (deliberação nº 1.573, do ano de 2008) em determinar à Empresa de Tecnologia e Informações da Previdência Social – Dataprev, com fundamento no art. 43, I, da Lei nº 8.443/1992, c/c o art. 250, II, do Regimento Interno desse Tribunal, que:
9.5.6. abstenha-se de efetuar pagamentos de notas fiscais emitidas por estabelecimento de CNPJ diferente daquele constante do contrato ou autorização de fornecimento, exceto quando se tratar de subcontratação autorizada pela Administração, nos termos da minuta do contrato constante da licitação e do art. 72 da Lei 8666/1993, uma vez que tal prática pode constituir motivo para rescisão unilateral do contrato pela administração, conforme reza o art. 78, inciso VI, do citado diploma legal;
Em outra oportunidade, a Corte de Contas da União realizou levantamento de auditoria na Petróleo Brasileiro S/A – Petrobrás (Acórdão nº 1.945/2007-Plenário, Min. Relator Aroldo Cedraz), onde ficou delimitado no Voto do Ministro Relator o seguinte entendimento:
15. O referido Aditivo, firmado em contrato celebrado entre a Petrobras e a empresa Metroval Controle de Fluidos Ltda. e UTC Engenharia, teve por objeto “a cessão, pela matriz UTC Engenharia S. A., São Paulo, CNPJ nº 44.023.661/001-08, dos direitos e obrigações do Contrato original, à filial UTC Engenharia S. A., Macaé/RJ, CNPJ nº 44.023.661/0081-92”.
16. As justificativas apresentadas assinalaram que “nenhum prejuízo é imposto à Petrobras, uma vez que a matriz cedente permanece solidariamente responsável pelo cumprimento das obrigações contratuais, de acordo com a Cláusula Segunda do Aditivo”, que ora se transcreve:
‘Cláusula Segunda - Solidariedade
2.1 - Em função da cessão que ora se opera, fica estabelecida a solidariedade da matriz UTC Engenharia S.A., São Paulo, CNPJ nº 44.023.661/0001-08, no que reporta ao integral cumprimento das obrigações ora assumidas, pela filia UTC Engenharia S.A., Macaé/RJ, CNPJ nº 44.023.661/0081-92, no Contrato 160.2.001.04-8”
17. Tal alegação não corresponde, contudo, à verdade dos fatos. Esqueceu-se o responsável de mencionar as questões tributárias inerentes à referida cessão, em face da alteração das alíquotas diferenciadas de ICMS aplicáveis aos diferentes estados da federação.
(...)
22. Claro está, portanto, que a alteração pleiteada importava em modificação da equação econômico-financeira inicialmente pactuada, em desfavor da Petrobras, com o que não concordava o setor jurídico.
23. Todavia, em novo parecer, formulado três meses depois, o mesmo setor jurídico concluiu de forma diversa, assinalando que:
“(...) com espeque nos princípios da razoabilidade e da boa-fé objetiva, sem agressão ao princípio da economicidade, ser possível o acatamento do pleito da contratada, alterando-se o seu domicílio para fins de fornecimento de materiais, sem que se exija da mesma o desconto referente ao Difal de ICMS que será assumido pela Companhia, o qual, aliás, será objeto de compensação futura.”
24. As novas conclusões a que chegou o setor jurídico da Petrobras em nenhum momento afastaram o juízo de mérito formulado pelo setor financeiro e tributário no sentido de que a alteração operaria em desfavor da Petrobras.
25. É inegável, portanto, em que pese o último parecer do setor jurídico, que a Petrobras assumiu ônus que não lhe seria devido.
26. Vale observar que não se analisa, nesta oportunidade, a decisão da Petrobras de alterar ou não o contrato original de forma a atender ao pleito da Metroval e alterar o endereço da Ultratec. O que está em análise é a falta de justificativa plausível para a retroatividade do Aditivo celebrado, mormente em face da existência de determinação deste Tribunal em sentido contrário.
Grifou-se.
Diante desses entendimentos do Tribunal de Contas da União, claro está que a alteração do CNPJ provoca fortes repercussões na esfera tributária e no campo da pessoalidade contratual.
De forma geral os contratos administrativos preveem em cláusula específica os motivos que ensejam a rescisão contratual. É frequente a disposição no sentido de que a subcontratação total ou parcial do objeto, associação da CONTRATADA com outrem, a cessão ou a transferência total ou parcial das obrigações contraídas, bem como a fusão, cisão ou incorporação da CONTRATADA que afetem a boa execução do Contrato, sem prévio conhecimento e autorização da CONTRATANTE enseja a extinção contratual.
Em relação ao instituto da subcontratação, o contrato deverá prever o limite da delegação das obrigações contratuais, na forma do art. 72 da Lei nº 8.666/1993. Em geral o edital e o contrato não fixam tal limite.
Nessa situação, ou seja, quando, apesar de o contrato prever a possibilidade de subcontratação desde que haja prévio conhecimento e autorização pela contratante, compreende-se que não há tal possibilidade e que o exercício da referida regra é incabível, em não havendo fixação do limite. Assim, a impossibilidade de subcontratação total do objeto fica implícita.
A jurisprudência é firme no sentido de que matriz e filial são pessoas distintas, porquanto respondem separadamente pelas obrigações tributárias, possuindo CNPJ diversos (TRF3ª, AI 466596, rel. desembargador federal Nery Junior, Terceira Turma, e-DJF3 de 26/10/2012). Abaixo seguem reproduzidos alguns precedentes nesse sentido:
Processo: AG 413718520144010000 / AG - AGRAVO DE INSTRUMENTO - 413718520144010000
Relator(a): DESEMBARGADORA FEDERAL MARIA DO CARMO CARDOSO
Sigla do órgão: TRF1 (Órgão julgador: OITAVA TURMA)
Fonte: e-DJF1 DATA:14/11/2014 PAGINA:1365 (Data da Decisão: 19/09/2014)
Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo de instrumento.
Ementa: PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. ATIVOS FINANCEIROS. MATRIZ E FILIAL. IMPOSSIBILIDADE. PERSONALIDADE JURÍDICA E RESPONSABILIDADES DISTINTAS. 1. Matriz e filial são estabelecimentos autônomos, com inscrições próprias no CNPJ, a denotar sua autonomia jurídico-administrativa. Incabível, assim, responsabilizar a matriz pelos débitos tributários das filiais e vice-versa. 2. Para efeitos tributários, os débitos da matriz não se confundem com os débitos da filial. 3. Agravo de instrumento a que se nega provimento.
Processo: AC 00055816320074036100 / AC - APELAÇÃO CÍVEL – 1387335
Relator(a): DESEMBARGADOR FEDERAL ANDRÉ NEKATSCHALOW
Sigla do órgão: TRF3 (Órgão julgador: QUINTA TURMA)
Fonte: e-DJF3 Judicial 1 DATA:27/06/2014 ..FONTE_REPUBLICACAO: (Data da Decisão: 16/06/2014)
Decisão: Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento aos agravos legais, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Ementa: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. CPC, ART. 557, § 1º. APLICABILIDADE. PEDIDO DE REFORMA DE DECISÃO. 1. A utilização do agravo previsto no art. 557, § 1º, do CPC, deve enfrentar a fundamentação da decisão agravada, ou seja, deve demonstrar que não é caso de recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior. Por isso que é inviável, quando o agravante deixa de atacar especificamente os fundamentos da decisão agravada. Precedentes do STJ. 2. Conforme entendimento jurisprudencial, as filiais têm personalidade jurídica própria para fins tributários e dispõe de CNPJ específico em relação ao qual são arrecadadas as contribuições à Previdência Social. Por isso, devem integrar a relação processual, não podendo a demanda prosseguir apenas com a participação da matriz. 3. Em relação à alegação da União, os honorários advocatícios já se encontram de acordo com a jurisprudência, devendo ser mantidos em R$ 2.000,00 (dois mil reais), à vista do disposto no art. 20, § 4º, do Código de Processo Civil. 4. Agravos legais não providos.
Como se vê, o posicionamento do Judiciário é pela inviabilidade de confusão entre as personalidades jurídicas das respectivas responsabilidades da empresa matriz e das filiais. Para efeitos tributários, enfim, os débitos da matriz não se confundem com os débitos da filial. Compreende-se que o mesmo entendimento pode ser aplicado em âmbito administrativo na seara dos contratos celebrados pelo Poder Público.
A fim de endossar o entendimento aqui defendido, apontam-se as orientações do Tribunal de Contas da União, que sinalizam a distinção entre filial e matriz, o que pode ser estendido à questão tratada neste artigo, que versa sobre a alteração de CNPJ por termo aditivo em contratos administrativo já em andamento. Vejamos:
Forma de apresentação dos documentos
O ato convocatório deve ter disciplinado a forma de apresentação dos documentos. Usualmente exige-se que os documentos estejam:
• em nome do licitante e, preferencialmente, com número do CNPJ e endereço respectivo, observado o seguinte:
• se o licitante for a matriz da empresa, todos os documentos devem estar em nome da matriz;
• se o licitante for filial, todos os documentos devem estar em nome da filial;
3. Conclusão
Considerando os pontos ventilados em acórdãos do Tribunal de Contas da União que trataram de algumas ocorrências referentes à mudança de faturamentos da matriz para a filial, bem como precedentes jurisprudenciais que tratam da distinção entre matriz e filial, a compreensão aqui exposta é pela impossibilidade de alteração do CNPJ. A mudança, como dito, tem forte repercussão na seara tributária.
4. Referências Bibliográficas
JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 12 ed. São Paulo: Dialética, 2008.
Licitações e contratos : orientações básicas /Tribunal de Contas da União. – 3. ed, rev. atual. e ampl. Brasília : TCU, Secretaria de Controle Interno, 2006.
www.tcu.gov.br Acesso em 12/11/2014.
[1] As Secretarias de Controle Externo são unidades técnico-executivas subordinadas à Secretaria-Geral de Controle Externo e têm por finalidade assessorar os Relatores em matéria inerente ao controle de gestão e oferecer subsídios técnicos para o julgamento das contas e apreciação dos demais processos relativos às unidades jurisdicionadas ao Tribunal. Fonte da informação:
http://www.tcu.gov.br/Institucional/Organograma/Secretaria/Segecex/ Regionais/secexmg.html. Acesso em 30/7/2010.
Procuradora Federal em Brasília - DF
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MOREIRA, Teresa Resende. Da alteração do CNPJ de empresa em contratos administrativos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 dez 2014, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/42517/da-alteracao-do-cnpj-de-empresa-em-contratos-administrativos. Acesso em: 22 nov 2024.
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