Os chamados benefícios previdenciários por incapacidade, destinados a assegurar a cobertura de eventos causadores de doenças, lesões ou invalidez, encontram-se previstos na Lei n.º 8.213, de 24 de julho de 1991, mais especificamente nos artigos 42 e 59, respectivamente, dependendo da caracterização da incapacidade ser temporária ou definitiva.
Da análise dos dispositivos legais acima mencionados se extrai que os requisitos necessários ao gozo dos benefícios são a qualidade de segurado, carência legal e incapacidade temporária (auxílio-doença) ou permanente (aposentadoria por invalidez).
Ou seja, a incapacidade laboral é condição sine qua non para a concessão dos benefícios por incapacidade. Em sendo assim, restando demonstrado que o segurado permanece no exercício de atividade laboral, há impedimento para a concessão do benefício.
Tal impedimento se lastreia na própria natureza dos benefícios em questão, que possuem caráter essencialmente substitutivo. Isto é, os benefícios previdenciários por incapacidade visam substituir a remuneração do segurado, que está impedido de trabalhar justamente por força de uma incapacidade.
Outra origem do impedimento está na própria Lei n.º 8.213/91, que estabelece em seu artigo 46 que “O aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno.”
Assim, não fosse pelo caráter substitutivo dos benefícios por incapacidade, o que, por si só, já seria suficiente para embasar a sua não concessão em casos em que há atividade laboral, o legislador entendeu por bem trazer tal vedação expressa em lei.
Sobre o tema, vale trazer recente julgado da 4ª Turma Recursal do Rio de Janeiro:
“PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. RECURSO DO INSS. DIREITO PROCESSUAL. DETERMINAÇÃO JUDICIAL DE APRESENTAÇÃO DE CÁLCULOS. POSSIBILIDADE. CELERIDADE. SIMPLICIDADE. ECONOMIA PROCESSUAL. RAZOÁVEL DURAÇÃO DO PROCESSO. INAPLICABILIDADE DO ART. 475-B DO CPC AO RITO DOS JUIZADOS. ENUNCIADO 52. RECURSO TAMBÉM EM RELAÇÃO A DIB. AUXÍLIO-DOENÇA SUBSTITUTIVO DO TRABALHO. VEDAÇÃO DE PERCEPÇÃO CUMULATIVA DE REMUNERAÇÃO E AUXÍLIO-DOENÇA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO PARA AFASTAR O PAGAMENTO NO PERÍODO NO QUAL HOUVE COMPROVAÇÃO DE RECOLHIMENTO PARA O RGPS. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. 4ª TURMA RECURSAL DO RIO DE JANEIRO. PROCESSO Nº: 0004158-33.2011.4.02.5170/01. 2ª JUÍZA FEDERAL RELATORA: DRA. DANIELLA ROCHA SANTOS FERREIRA DE SOUZA MOTTA. J. 01/07/2013.”
Também no Tribunal Regional Federal da 03ª Região é possível encontrar entendimento no sentido da tese aqui defendida:
PROCESSO CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. DESCONTO DO PERÍODO DE CONTRIBUIÇÕES POSTERIOR À CONSTATAÇÃO DA INCAPACIDADE. EMBARGOS PARCIALMENTE PROVIDOS. 1 - Embora tenha sido apreciada, no v. acórdão Embargado, a questão referente ao termo inicial do benefício, verifica-se a omissão quanto à existência de vínculos empregatícios no período posterior à data fixada como termo inicial da aposentadoria por invalidez. 2 - O fato de a parte autora continuar trabalhando não afasta a conclusão da perícia médica, pois o segurado precisa manter-se durante o longo período em que é obrigado a aguardar a implantação do benefício, situação em que se vê compelido a retornar ao trabalho, após a cessação do auxílio-doença, mesmo sem ter a sua saúde restabelecida, em verdadeiro estado de necessidade. Precedentes desta Corte de Justiça. 3 - Diante da incompatibilidade entre a percepção do benefício de aposentadoria por invalidez e o labor da segurada, descontar-se-ão os períodos em que ela verteu contribuições. 4 - Embargos de declaração conhecidos e parcialmente providos.
(APELREE 200603990361690, JUIZA NOEMI MARTINS, TRF3 - NONA TURMA, 10/12/2008).
Como já dito, o benefício por incapacidade é devido, de acordo com os termos da Lei n.º 8.213/1991, apenas aos segurados incapacitados.
Nos casos em que a parte laborou após o indeferimento administrativo, é descabida a percepção, nesse interregno, de benefício por incapacidade, dado que não se pode, ao mesmo tempo, estar incapaz e capaz.
Portanto, havendo continuidade do labor não há falar em benefício por incapacidade.
Não se nega que, em alguns casos, o segurado, mesmo sem condições laborais, acaba por efetuar recolhimentos sob a rubrica de contribuinte individual, com receio da perda de qualidade de segurado no curso de um eventual processo judicial.
É uma hipótese bem pontual em que se poderia abrir uma exceção à regra aqui defendida. Contudo, se há, comprovadamente, continuidade na atividade laborar e percepção de salário por parte do segurado, mostra-se absolutamente inviável o pagamento de benefício previdenciário neste interregno, sob pena de enriquecimento ilícito do segurado, que receberia em duplicidade naquele período.
Aqui cabe destacar que eventual irresignação poderia ser apresentada pelo empregador, mas apenas se comprovasse que houve pagamento da remuneração sem a contrapartida do trabalho, pois, se houve trabalho, o pagamento do salário é devido e, por consequência, exclui-se e obrigação de pagamento do benefício.
Assim, se a autarquia previdenciária consegue comprovar que, no período em que o segurado supostamente estaria incapacitado, houve atividade laboral, não há que se falar em concessão de benefício previdenciário, sob pena de descaracterização da natureza do benefício e violação expressa de norma legal.
Precisa estar logado para fazer comentários.