O presente artigo tem por objetivo realizar uma breve análise acerca dacondição de contribuinte individual no âmbito do Programa Mais Médicos, instituído pela Medida Provisória nº 621, de 8 de julho de 2013, posteriormente convertida na Lei nº 12.871, de 22 de outubro de 2013, e o valor da contribuição previdenciária devida, seja pelo médico participante ou pela União, ao Regime Geral de Previdência Social (RGPS).
O art. 20 da Lei nº 12.871, de 22 de outubro de 2013, estabeleceu de forma categórica que, ressalvadas as exceções de seu parágrafo único, o médico participante do “Programa Mais Médicos” é segurado obrigatório do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), na condição de contribuinte individual, na forma da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991. Tal disposição não se afasta, no mérito, daquela constante na Medida Provisória nº 621/2013, cuja conversão resultou na edição da citada Lei nº 12.871, de 2013.
Não obstante, e em que pese a expressa menção da submissão dos médicos participantes, contribuintes individuais, às disposições da Lei nº 8.212, de 1991, o fato é que a sua peculiar situação não se amolda, especificamente, a nenhuma das hipóteses estabelecidas pelo inciso V do art. 12 da Lei nº 8.212, de 1991, para caracterização do contribuinte individual, restando também prejudicada a definição exata da alíquota de contribuição a que estariam sujeitos.
Conforme se percebe da leitura das alíneas do inciso V do art. 12 da Lei nº 8.212, de 1991, a condição de contribuinte individual está ligada à exploração de atividade econômica, sob determinadas condições, ou à prestação de serviço, seja para uma ou mais empresas, ou mesmo de forma autônoma. Fora isso, a condição de contribuinte individual também é atribuída pelo o exercício de determinadas atividades como ministro de confissão religiosa e o membro de instituto de vida consagrada, de congregação ou de ordem religiosa (alínea “c”), dentre outras.
O valor da contribuição previdenciária, assim como o sujeito passivo, irá variar a depender de em que alínea do inciso V do art. 12 da Lei 8.212, de 1991, se enquadrar o contribuinte individual.
Por outro lado, como categoricamente defendido pela União, as relações existentes no âmbito do Programa Mais Médicos para o Brasil entre esta e o médico participante (inciso I do § 2º do art. 13 da Lei nº 12.871/2013) não constituem relação empregatícia de qualquer natureza (art. 17 da Lei nº 12.871/2013), ou relação de trabalho, ou sequer caracterizam contraprestação de serviços (art. 29 da Lei nº 12.871/2013).
Destarte, a priori, quando o art. 20 da Lei nº 12.871, de 2013, enquadra o médico participante como segurado obrigatório do Regime Geral de Previdência Social (RGPS), na condição de contribuinte individual, na forma da Lei nº 8.212, de 1991, parece-nos que estaria criando um novo tipo de contribuinte individual, não previamente previsto nas alíneas do inciso V do art. 12 da Lei nº 8.212, de 1991.
Partindo da premissa defendida pela União de que não há prestação de serviços no âmbito do Programa Mais Médicos, no que diz respeito ao médico participante, mas sim relação de ensino, voltada unicamente para o aspecto educacional, a União não poderia ser equiparada a empresa para fins do disposto na Lei nº 8.212, de 1991, e o recolhimento da cota previdenciária patronal, a princípio, não seria devido.
Com base nos parâmetros acima fixados, mormente a inexistência de prestação de serviço pelo médico participante do Programa Mais Médicos para o Brasil e a consequente inexistência do enquadramento do mesmo em qualquer das alíneas do inciso V do art. 12 da Lei nº 8.212/1991, temos que sua condição de contribuinte individual é derivada de determinação legal expressa (art. 20 da Lei nº 12.871, de 2013) e não de incidência nas espécies preestabelecidas de contribuinte individual na legislação de regência (Lei nº 8.212/91), sendo, na verdade, uma espécie nova de contribuinte individual, inexistente antes do advento da Medida Provisória nº 621, de 2013, que restou convertida na Lei nº 12.871, de 2013.
Seguindo essa linha interpretativa, não há que se equipar a União e seus órgãos à empresa para fins de pagamento de contribuição previdenciária patronal em relação aos médicos participantes do Programa Mais Médicos para o Brasil (art. 22, I, da Lei nº 8.212/1991) que não se enquadrem na exceção do parágrafo único do art. 20 da Lei nº 12.871, de 2013, para os quais indubitavelmente não é devida qualquer contribuição ao RGPS.
Em que pese a inexistência de prestação de serviço e a consequente ausência de encaixe da definição de médico participante do Programa Mais Médicos nas definições das alíneas do inciso V do art. 12 da Lei nº 8.212, de 1991, é inegável que o mesmo, por expressa determinação legal, tem a condição de contribuinte individual e deve se submeter aos ditames da Lei nº 8.212, de 1991.
Nesse contexto em que se apresenta a situação do médico participante do Programa Mais Médicos, nos parece acertado concluir que de fato não há cota previdenciária patronal, eis que como não há qualquer prestação de serviço, a União não pode ser equiparada a empresa para fins previdenciários.
De toda sorte, tendo em vista a expressa submissão do médico participante do Programa Mais Médicos aos ditames da Lei nº 8.212/1991 (art. 20 da Lei nº 12.871/2013), percebe-se que, aparentemente, a sua condição não guarda qualquer incompatibilidade com as disposições do art. 21 da Lei nº 8.212/1991, que estabelece que “A alíquota de contribuição dos segurados contribuinte individual e facultativo será de vinte por cento sobre o respectivo salário-de-contribuição”.
Destaca-se que não há disposição legal expressa que defina categoricamente que é devida a cota da contribuição previdenciária patronal no âmbito do Programa Mais Médicos para o Brasil, ante a inexistência de qualquer prestação de serviço, de modo que as disposições legais expressas levam a invariável conclusão de que a única cota devida é a do contribuinte individual, nos termos definidos pelo “caput” art. 21 da Lei nº 8.212/91.
Conforme estabelecido pelo Código Tributário Nacional (art. 108), na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará, sucessivamente, a analogia, os princípios gerais de direito tributário, os princípios gerais de direito público e a equidade; ressalvando-se que do emprego da analogia não poderá resultar a exigência de tributo não previsto em lei. Se não há determinação legal expressa no sentido da cobrança da contribuição previdenciária patronal, a priori, esta não pode resultar de intepretação analógica das disposições legais.
Pelo exposto, conclui-se que condição de contribuinte individual no âmbito do Programa Mais Médicos decorre de expressa imposição legal e, tendo em vista a inexistência de prestação de serviço, é indevida a cota patronal da contribuição previdenciária, sendo devida apenas a contribuição previdenciária do próprio contribuinte individual na base de 20% de sua bolsa.
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