Resumo: A justiça do trabalho é modelo de excelência por sua celeridade, protecionismo e eficiência, tendo em vista que esses são princípios básicos norteadores pelos quais esta se fundamenta. Apesar de sua autonomia e legislação própria, quando necessário o processo do trabalho se utiliza de fontes subsidiárias, sendo a mais comum delas o Código de Processo Civil. A partir daí surge a polêmica quanto a possibilidade de utilização da multa contida no art. 475-J do Código de Processo Civil, introduzida ao Código pela Lei 11.232/2005, o artigo prevê a multa de 10% do valor da condenação como sanção no caso de não adimplemento de obrigação de dar quantia certa na execução.O objetivo do presente trabalho é buscar, utilizando a pesquisa bibliográfica, jurisprudencial, descritiva, exploratória, teórica e dedutiva, a melhor resposta para as controvérsias trazidas pelo uso ou não do art. 475-J do CPC no Processo do Trabalho. Dessa forma, conclui-se que o uso subsidiário do CPC traz benefícios para o trabalhador, porém, a discussão permeia-se quanto a omissão culposa o proposital da CLT em relação a este assunto.
Palavras-chave: Processo do Trabalho. Execução Trabalhista. Art. 475-J Código de Processo Civil. Subsidiariedade.
Sumário: 1.Introdução 2.Princípios 2.1Princípio da norma mais favorável 2.2 Princípio da Proteção ao Trabalhador 2.3Princípio do Sincretismo Processual 3.Execução Trabalhista 4.Da multa prevista no art. 475-J do CPC 5. Da (in)aplicabilidade subsidiária do art. 475-J do CPC ao Processo Trabalho.
1.Introdução
Os princípios gerais de direito são diretrizes que fundamentam todo o sistema jurídico, sendo imprescindível sua aplicação quando houver dúvidas ou dilemas na aplicação de regras, normas ou outros preceitos.
Nesse contexto, o principio da subsidiariedade surge como uma possibilidade de solução ao problema da aplicação do art. 475-J do Código de Processo Civil ao processo do trabalho, pois possibilita uma orientação interpretativa do sistema processualístico em geral.
O processo do trabalho, apesar da criação da Consolidação das Leis Trabalhistas datar de 1943, tem notório destaque por sua celeridade e modernidade. Apesar de nunca ter se transformado em um Código propriamente dito, não deixa a desejar quanto sua atualização e contemporaneidade.
De outra banda o CPC sofreu hodiernamente uma série de reformas que trouxeram mudanças substanciais, e consequentemente, por conta de sua notoriedade, reflexos para todo o ordenamento jurídico pátrio.
A lei 11.232/2005 trouxe várias mudanças para o Código de Processo Civil, sendo a principal delas o sincretismo processual, modelo já existente e utilizado pelo Processo do Trabalho à época. Dessa forma, a execução se torna apenas mais etapa do processo, tornando o processo mais célere.
Outra mudança que a lei de 2005 trouxe ao CPC foi a aplicação da multa de 10% sobre o valor da condenação quando houver o inadimplemento da obrigação de dar quantia certa. Tal inovação é aplicada assim que for instaurada a execução de título judicial de natureza condenatória transitada em julgada – agora autoexecutável.
Os argumentos que permeiam aqueles que defendem a possível a aplicação subsidiaria do art. 475-J ao processo do trabalho entendem que a utilização desse artigo traria ao processo do trabalho os celeridade, efetividade da prestação jurisdicional e observaria o princípio da norma menos onerosa ao devedor.
Cumpre, portanto, fazer comparativo entre a legislação processual civil e a processual trabalhista em matéria de execução de sentença judicial, a fim de verificar os óbices de aplicação subsidiária da multa do art. 475-J do CPC.
Em análise à legislação, tem-se que o caput do art. 475-J determina que o devedor de quantia em dinheiro efetue o pagamento, de imediato, no prazo de 15 (quinze) dias sob pena de incidência da multa de 10% (dez por cento). Enquanto que, o art. 882 da CLT, faculta ao executado a garantia do juízo com depósito do valor ou nomeação de bens à penhora.
O procedimento adotado pelo CPC conflita com o procedimento da CLT quanto à exigência de citação do executado, uma vez que pelo rito celetista permanece a necessidade de citação para a execução trabalhista (art. 880), enquanto que a legislação processual civil prevê a mera intimação.
Por sua vez, o art. 884 da CLT assegura ao executado o prazo de 05 (cinco) dias para opor embargos à execução, ao passo que o rito processual civil faculta ao executado oferecer impugnação ao título judicial no prazo de (15) quinze dias.
Os embargos à execução são verdadeira ação conexa, enquanto a impugnação é incidente processual desprovido de efeito suspensivo, o que evidencia ainda mais o descompasso entre os procedimentos em questão.
Vale dizer, uma das reforma ao CPC foi justamente a substituição dos embargos à execução pela impugnação, uma vez que o recebimento dos embargos detinha o condão de suspender a execução, retardando a efetividade da tutela jurisdicional previamente reconhecida em sentença judicial.
Destaque-se outro ponto de distinção, a saber: no processo civil cabe ao credor iniciar a execução, mesmo que por mera petição, no prazo de seis meses sob pena de arquivamento provisório (§5º, do art. 475-J), enquanto que a CLT possibilita a execução trabalhista iniciada de ofício pelo juiz (art. 878).
Como se vê, a aplicação da multa do art. 475-J ao processo do trabalho é controvertida. No processo laboral há uma ação de conhecimento e uma ação de execução autônoma e, por outro lado, no processo civil, salvo alguma exceção, a execução é apenas uma etapa do mesmo processo, sendo denominado de processo sincrético.
Em termos práticos, a insistência em aplicar o art. 475-J na execução trabalhista pode gerar o retardo da satisfação do crédito, haja vista que a desarmonia entre jurisprudência e doutrina aumenta a interposição de recursos, inclusive, com sensação de insegurança jurídica e comprometimento da celeridade processual.
2.Princípios Trabalhistas
Para iniciar o mérito do presente trabalho faz-se importante delinear os princípios gerais do sistema que será estudado, pois estes são modelos na elaboração das normas e, também, na interpretação destas. O que importa na premissa de que a violação de um princípio é muito mais grave do que o desrespeito a uma regra ou norma jurídica.
Os princípios são elementos essenciais pelos quais surgem orientações e diretrizes para promover soluções interpretativas. O doutrinador Arnaldo Sussekind (2003, p. 142) compreende que os princípios “são enunciados genéricos, explicitados ou deduzidos, do ordenamento jurídico pertinente, destinados a iluminar tanto o legislador, ao elaborar as leis dos respectivos sistemas, como ao intérprete” (SÜSSEKIND apud CASSAR, 2012, p. 168).
Quando não for possível solucionar qualquer dúvida pela simples utilização do direito posto deverão ser utilizados os princípios gerais de direito como norteadores. Dessa forma, vários dispositivos normativos da legislação brasileira trazem os princípios como fonte subsidiária de interpretação, dentre elas:
art. 4º da Lei de Introdução às normas do Direito Brasileiro Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito;
art. 8º da CLT As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normais gerais de direito, principalmente do direito do trabalho (...);
art. 126 do CPC O juiz não se exime de sentenciar ou despachar alegando lacuna ou obscuridade da lei. No julgamento da lide caber-lhe-á aplicar as normas legais; não as havendo, recorrerá à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito.
Considerando a atual visão (neo)constitucional pós-positivista, os princípios são compreendidos como diretrizes gerais e abstratas, podendo ser implícitos ou explícitos. O princípio é flexível, pode ser ponderado e balanceado, enquanto a regra é rígida. Dessa forma, Luis Roberto Barroso observa que:
A Constituição passa a ser encarada como um sistema aberto de princípios e regras, permeável a valores jurídicos suprapositivos, no qual as idéias de justiça e de realização dos direitos fundamentais desempenham um papel central. (BARROSO apud LENZA, 2012, p. 147).
Nos capítulos seguintes do presente trabalho serão analisados os princípios que são pertinentes ao tema aqui estudado, quais sejam: o princípio da norma mais favorável, o da proteção e o da subsidiariedade.
2.1 Princípio da Proteção ao Trabalhador
O princípio da proteção ao trabalhador tem o escopo de equilibrar a hipossuficiência que, em regra, é inerente ao trabalhador por se tratar da parte menos favorecida na relação de trabalho. Essa desigualdade, que pode ser de ordem econômica, social ou técnica, é, ainda, acentuada pelos altos níveis de desemprego, o que coage o trabalhador muitas vezes a se submeter a situações que tolhem seus direitos.
Não só a CLT como todo o sistema de legislação trabalhista foi formatado com a intenção de coibir esse tipo de abuso, compensando esse desequilíbrio com a realização de princípios e normas protetivas criados “exatamente para compensar a desigualdade real existente entre empregado e empregador, naturais litigantes do processo laboral” (LEITE apud VIEGAS; RABELO, 2011).
2.2 Princípio da Subsidiariedade
O ordenamento jurídico é complexo e imperfeito, além de possuir um processo legislativo pátrio é burocrático e moroso, por conta disso, em alguns momentos existirão lacunas e omissões a serem resolvidas pelos intérpretes da lei.
Não se trata aqui de uma visão positivista racional e codicista exegeta, em que o juiz é apenas la bouche de la loi. Mas de um prisma pós-positivista que aceita a imperfeição do seu sistema e cria mecanismo autosuficientes para supri-las.
Desta sorte, a própria Consolidação das Leis Trabalhistas em seu art. 769 dispõe a solução para as possibilidades de omissões legislativas, observando o seguinte: “nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo que for incompatível com as normas desse Título”.
Logo, serão necessárias para a aplicação subsidiária de norma diversa das previstas na CLT: 1) a omissão legislativa da CLT quanto o assunto em pauta, e 2) que esta norma estranha à CLT não seja incompatível com o seu sistema.
Como visto, para que haja aplicação subsidiaria de uma norma estranha à CLT não é suficiente a simples lacuna ou existência de norma mais benéfica. Os critérios utilizados para realizar essa heterointegração estão postos na lei e é nesse contexto que a aplicação ou não do art. 475-J do CPC deve ser analisada.
2.3 Princípio do Sincretismo Processual
Depois da realização do processo de conhecimento, e do efetivo reconhecimento pelo Estado-juiz na sentença transitada em julgado da necessidade de satisfação do direito de crédito, surge a forma pela qual a pretensão do credor se transformará em satisfação, que é por meio da execução. Portanto, “em execução o que se espera é que seja concretizada a prestação que o Estado-juiz reconheceu existir em favor daquele que demonstrou em juízo ser o titular do direito material” (BARBOSA, 2010, p. 79).
Quanto o título executivo é obtido no bojo do processo, a execução deverá ser iniciada automaticamente, isto porque no processo do trabalho há apenas uma etapa, não sendo a execução processada de forma autônoma.
Logo, não há que se falar em um processo apartado ou mesmo em nova citação, havendo apenas a intimação do devedor para adimplir sua obrigação. Fórmula copiada posteriormente pelo processo civil, por meio dasLeis n. 8.952/94 e 10.444/02, que alteraram o art. 461 do CPC.
O processo sincrético é forma garantidorada celeridade e efetividade na prestação jurisdicional, uma vez que o processo é um instrumento de satisfação da tutela jurisdicional específica, adequada e tempestiva, e não um fim em si mesmo.
3.Execução Trabalhista Fundada em Título Judicial
A execução é forma de garantir o cumprimento do bem de vida conquistado no processo de conhecimento, executar significa “realizar, cumprir ou levar a feito” (MANUS, 2005, p. 15). Segundo o doutrinador José Augusto Rodrigues Pinto (1998, p. 25), a execução tem o seguinte conceito:
No sentido jurídico, a palavra assume significado mais apurado, embora guardando a ideia básica de que, nascida a obrigação, por ajuste entre particulares ou por imposição sentencial do órgão próprio do Estado, deve cumprir-se, atingindo-se no último caso, concretamente, o comando da sentença que a reconheceu ou, no primeiro caso, o fim para o qual se criou (PINTO apud MANUS, 2005, p. 15).
Depois do trânsito em julgado da sentença, ou seja, “só a partir do momento que a sentença começar a produzir efeitos” (BARBOSA, 2010, p. 146), em razão do sincretismo processual, o devedor será intimado pessoalmente e de ofício para adimplir sua obrigação.
Realizada a intimação inicia-se o prazo de 48 (quarenta e oito) horas para o devedor adimplir seu débito, passado esse prazo in albis, com fulcro no art. 880 da CLT, poderá ser realizada a penhora dos bens do devedor, ou a este deve garantir o juízo.
A penhora, embora muitas vezes não se trate da prestação jurisdicional específica como busca o direito processual, uma vez que “a incoercibilidade do ser humano ainda é um limitativo à execução específica”, torna-se de uma forma de ao mesmo tempo coagir e sancionar o devedor a realizar a obrigação. A coerção ocorre no sentindo de induzi-lo a satisfazer a pretensão sem maior onerosidade para o seu patrimônio, já a sanção é a punição pelo inadimplemento.
Quanto a sanção também há possibilidade do magistrado entender por multar o devedor por obstar e execução. Contudo, a possibilidade de multa trazida pela doutrina é pautada no art. 461 do Código de Processo Civil, e não no art. 475-J. Sendo, portanto, forma de coerção indireta, aplicada a depender exclusivamente da utilização ou não pelo magistrado do seu poder geral de efetivação.
Destarte, o magistrado poderá de ofício, independentemente de provocação das partes, conforme previsto no art. 461, §5º, do Código de Processo Civil, aplicar a multa na periodicidade e valor que entender devidos. Pode, ainda, cumular meios de coerção direta, com meios de coerção indireta (MELO 2011).
Essas “medidas de apoio”– dentre as quais a mais utilizada é a multa, contudo, vale ressaltar que não é a única modalidade – servem para dar efetividade ao processo levanto em conta suas peculiaridades a serem analisadas pelo magistrado, dessa forma, “a multa deve ser fixada em valor suficiente para pressionar psicologicamente o devedor a cumprir a decisão judicial” (CÂMARA apud BARBOSA, 2010, p. 147) derivam diretamente do direito francês, onde é conhecida por astreintes.
As astreintes, por serem aplicadas caso a caso, tem sua dosimetria proporcional à coerção que seja mais efetiva para promover o adimplemento do devedor. A forma de sanção utilizada pode ser revista a qualquer tempo pelo magistrado, que poderá modificar seu valor ou periodicidade com fulcro no art. 461, §6º do CPC.
4. Da multa prevista no art. 475-J do CPC
A Lei nº 11.232/2005 inseriu o art. 475-J e inaugurou nova sistemática de execução civil de sentença judicial. Em momento anterior à sua publicação, o princípio de efetividade da tutela jurisdicional instigou a denominada “crise da condenação”, isso porque a sentença condenatória passou a ser inócua, em virtude do processo de execução então vigente. Diz-se que o legislador de 2005 atribuiu caráter autoexecutável à condenação por quantia certa contra devedor solvente, pois a realização prática da execução passou a ser uma continuidade da relação de cognição (FUX, 2006, p. 109).
No caso do processo civil, após o transito em julgado da sentença condenatória o devedor terá o prazo de 15 (quinze) dias para satisfazer a obrigação, o momento no início da contagem desse prazo inicialmente trouxe alguma celeuma. Contudo, a doutrina e o Superior Tribunal de Justiça já pacificaram o entendimento de que este prazo se inicia a partir da intimação do advogado. Logo, após o transito em julgado da sentença e da devida intimação do advogado do devedor e da baixa desta nos autos de origem, inicia-se a contagem dos 15 (quinze) dias trazidos pelo art. 475-J do CPC.
Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação
Transcorrido o prazo sem o pagamento do valor a que foi condenado, o devedor será penalizado com uma multa de 10% sobre o valor da condenação como forma de sancionar seu inadimplemento. Entendemos, assim como Fredie Didier, que a multa trazida pelo art. 475-J do CPC tem um caráter hibrido, pois contém em sua natureza tanto a coerção indireta como a direta. Para o autor, “a multa tem, assim, dupla finalidade: servir como contramotivo para o inadimplemento (coerção) e punir o inadimplemento (sanção)” (DIDIER apud MELO, 2011).
5. Da (in)aplicabilidade subsidiária do art. 475-J do CPC ao Processo Trabalho
A partir de toda a interpretação que foi estudada nos capítulos anteriores sobre o art. 475-J do CPC e sua aplicação subsidiaria ao processo laboral, alguns juristas acharam por bem realizar sua aplicação sob a argumentação de maior efetividade e celeridade à execução do processo.
Como salienta o informativo do Tribunal Regional do Trabalho da 8º região, o caso em concreto abaixo demonstra a aplicação do art. 475-J do CPC como forma de efetivação do cumprimento da obrigação, despiciendo às interpretações alhures comentadas não há como afirmar que o resultado foi necessariamente satisfatório por conta da aplicação do art. 475-J.
A Justiça do Trabalho é considerada uma das mais rápidas no Poder Judiciário Brasileiro. A cada dia, a busca pela eficiência é crescente. Os magistrados trabalhistas utilizam as atualizações legais como meios para favorecer o cidadão e dar efetividade às decisões. Na 5ª Vara do Trabalho de Belém, um bom exemplo pode ser dado. Um cidadão conseguiu, em apenas 19 dias, entrar com a ação e receber o pagamento resultante da sentença judicial. O juiz substituto Ney Stany Morais Maranhão instruiu e julgou o processo de forma líquida na mesma audiência, e aplicou o art. 475-J do CPC, que determina o pagamento da condenação em até 15 dias do trânsito em julgado da sentença, sob pena de multa de 10% e penhora dos bens. O resultado foi melhor que o esperado, a sentença foi proferida dia 29 de maio, e em 01 de junho o depósito já havia sido efetuado. Em ofício enviado à Corregedoria, a juíza titular da 5VT, Maria Zuila Lima Dutra, registrou o trabalho realizado também pelos servidores, pois só a combinação de bons juízes e servidores, sentença líquida e penalidade (em dinheiro) para quem não cumpre imediatamente decisão judicial resulta em eficiência e celeridade processual. (MARANHÃO, 2012).
Tendo em vista a polêmica sobre o tema, o Tribunal Superior do Trabalho, em março de 2012, publicou em seu informativo jurisprudência no sentido de que a aplicação subsidiária do art. 475-J do CPC é incompatível com o processo do trabalho. Observou o julgado que a aplicação da multa em questão não se trata de lacuna da CLT, pois esta legisla especificamente sobre o assunto e, por esse motivo, a aplicação de tal dispositivo contido no CPC desafiaria o devido processo legal.
Execução. Multa do art. 475-J. incompatibilidade com o processo do trabalho. Conhecimento do Recurso de Revista por violação do art. 5º, LIV, da CF (desrespeito ao principio do devido processo legal). Possibilidade. Tendo em conta que a multa prevista no art. 475-J do CPC é incompatível com o processo do trabalho, a SBDI-I, por unanimidade, conheceu dos embargos por divergência jurisprudencial e, no mérito, por maioria, negou-lhes provimento, mantendo a decisão da Turma que conheço do recurso de revista em face de execução, por ofensa frontal ao art. 5º LIV, da CF (princípio do devido processo legal). Na espécie, destacou o relator que o procedimento de execução por quantia certa decorrente de título executivo extrajudicial possui disciplina específica na legislação trabalhista, não havendo lacuna que justifique a incidencia do direito processual civil na forma do comando estabelecido no art. 796 da CLT. Assim, a aplicação da multa atentaria contra o devido processo legal. Vencidos, no mérito, os Ministros Lelio Bentes Corrêa, José Roberto Freire Pimenta e Augusto César Leite de Carvalho. TST-E-RR-201-52.2010.5.24.0000, SBDI-I, rel. Min. Horácio Raymundo de Senna Pires. 22.3.2012.
Há aqueles que consideram a aplicação do art. 475-J compatível com o processo do trabalho, argumentando que este dispositivo atende o postulado constitucional da razoável duração do processo, na medida em que força o executado a cumprir a obrigação com a imposição de acréscimo pecuniário sobre o valor executável, caso não cumpra ou cumpra parcialmente. Conclusão acolhida pela 1ª Jornada de Direito Material e Processual do Trabalho (enunciados 66 e 71).
Não havendo, portanto, obstáculos a aplicar os dispositivos da Lei nº 11.232/05 até onde exigem o cumprimento das obrigações contidas nas decisões que envolvem o mérito da lide, ou seja, o devedor deve ser intimado para cumprir nos termos do art. 475-J, já que o art. 880 da CLT não deve ser praticado na forma como determina, uma vez que a citação do devedor na forma como determina a CLT é incoerente com a dinâmica do processo de conhecimento, que sequer está encerrado em virtude na nova conceituação de sentença, podendo ser realizada por meio postal e é impessoal nos termos da art. 841 da CLT (GUSMÃO, 2008, p. 64).
Para esta corente a literalidade da CLT estaria em contradição com os valores e princípios constitucionais, a exemplo do princípio da razoável duração do processo, uma vez que os postulados constitucionais se sobrepõem às leis. Isso porque reconhece que o rito de execução do CPC é mais célere que o previsto na CLT por ter aderido ao modelo constitucional do processo.
Argumenta-se, ainda, que a aplicação subsidiária do referido artigo da legislação processual civil (art. 769 da CLT) encontra respaldo nos princípios constitucionais do art. 5º, incisos LIV, LV e LXXVIII da CF/88, pois a nova sistemática de real efetividade do direito processual hodierno viabilizada, de modo efetivo e célere, a satisfação do crédito trabalhista, promovendo a consecução de um dos fundamentos da República Federativa do Brasil, a dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III, da CF/88).
Como dito, o inc. LXXVIII foi introduzido ao art. 5º da CF/88 pela emenda constitucional nº 45/05, a chamada Reforma do Judiciário, pelo que é dotado de status constitucional, sendo inderrogável por lei infraconstitucional e, nesse sentido, independe de lei para sua completa implementação.
Por meio do princípio da economia processual a tutela jurisdicional deve ser prestada com vistas a produzir o máximio de resultados com o mínimo de sacrifícios, diz-se que ele se refere à redução de custos e tempo necessário para o desenvolvimento do processo com a consequente otimização da tutela jurisdicional (BUENO, 2011, p. 184).
Ocorre que o princípio não pode ser invocado em prejuízo de outros princípios, colocando em risco a segurança jurídica (art. 5º, caput e inc. XXXVI) que é imposta pelos princípios do devido processo legal e do contraditório também.
Como sabido os princípios constitucionais, a depender do caso concreto, são aplicados em verdadeira preponderância, ou seja, cabe aos interpretes e aplicadores do direito fazer o sopesamento dos princípios constitucionais com a necessária fundamentação, jamais sacrificar um em detrimento do outro.
6. Análise de Resultados
Rediga-se, ao jurisdicionado deve ser garantido um mínimo de previsibilidade na relação processual, o que corrobora com o direito constitucional de defesa. Nesse contexto, a diversidade de opinião entre juristas pode comprometer a segurança jurídica, mas também a celeridade processual da execução trabalhista em virtude da crescente interposição de recursos.
O Direito é dinâmico, haja vista que os fatos sociais estão em continua evolução, impulsionando o sistema jurídico a apresentar novas soluções. Todavia, partindo-se da premissa de que a redação da CLT, quanto ao procedimento de execução de sentença judicial de pagamento em dinheiro, careça de reforma, não estaria justificada a aplicação subsidiária do art. 475-J fora das situações excepcionadas no art. 769, da CLT.
Nesses termos, tem-se que apenas nas situações em que a CLT for omissa e quando não houver incompatibilidade é que o direito processual comum será fonte subsidiária, pois, caso contrário, comprometer-se-ia um dos princípios basilares do Estado Democrático de Direito, a segurança jurídica.
Em análise à legislação celetista, depreende-se que ela não é omissa, assim como regula o procedimento de execução por quantia certa, embora que de modo diverso do CPC. Diga-se, o que torna a aplicabilidade do art. 475-J incompatível com a atual sistemática do Processo do Trabalho.
É certo que o modelo constitucional do processo assegura a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação, o que reclama uma nova maneira de aplicar e interpretar o Direito Processual, mas levando em consideração o princípio da segurança jurídica, por óbvio.
Forçoso concluir, portanto, que ao invés de discutir a aplicabilidade subsidiária da multa de 10% (dez por cento) sobre o montante da condenação por meio da interposição de recursos, que acaba por redundar em lentidão, cabe ao Poder Legislativo dirimir a questão.
Tem-se que cabe ao legislador proceder a alterações que julgue necessária no texto da CLT, como o fez ao acrescentar o art. 475-J no CPC, considerando, inclusive, as peculiaridades do direito processual do trabalho, conformando este, nos pontos que considere necessário, com o modelo constitucional de processo.
Conclusão
A diretriz para a aplicação subsidiaria de elementos normativos estranhos a CLT estão previstos na mesma, com todos os requisitos e exigências necessárias para que um dispositivo seja aplicado em detrimento de outro.
Ao realizar a análise de tais dispositivos é possível constatar a impossibilidade de aplicação subsidiária do art. 475-J ao processo laboral, pois não estão presentes todos os requisitos necessários. O que impossibilita a subsunção fato-norma para o enquadramento da norma processualística civil ao procedimento laboral.
Apesar de sua utilização por alguns juristas resultarem em desfechos satisfatórios, não amparo legal para tal prática, além de não ser cristalino se o sucesso dos resultados se dá propriamente por conta da aplicação do artigo. Afinal, a execução trabalhista em si já suficientemente célere e efetiva.
Inegável o avanço que a reforma ao processo civil pela Lei nº 11.232/05 representou quanto à agilidade e à simplificação do CPC que, comparado a CLT, apresentava-se mais formalista e burocrático, tanto que e CLT foi e continua sendo inspiração das reformas do processo civil (PRATA, 2008, p. 801).
Inconcebível o jurisdicionado ficar a mercê do entendimento de cada magistrado em virtude da falta de uniformidade procedimental, maculando o princípio da segurança jurídica que é verdadeiro constitutivo do Estado Democrático de Direito (art. 5º, inc. XXXIII e art. 6º, caput, da CF/88). É certo que por este postulado o juiz não pode surpreender as partes com decisão estranha ao convencionado no ordenamento jurídico pátrio.
Diz-se que dotada de boa intenção a corrente que defende a aplicação da multa por considerar que corrobora com os princípios da celeridade processual e da real efetividade da tutela jurisdicional. Ocorre que esta corrente encontra óbice na redação legal do art. 769 da CLT.
Da leitura do artigo supracitado infere-se que as normas de processo civil podem ser aplicadas subsidiariamente em duas hipóteses, quais sejam: a) omissão da CLT sobre a matéria; b) a norma do CPC não apresenta incompatibilidade com o processo trabalhista.
Ora, a CLT não é omissa quanto a processo de execução e, não apenas isso, a legislação trabalhista regula o procedimento da execução por quantia certa (arts. 876/892), o que torna a aplicabilidade o art. 475-J do CPC totalmente incompatível com sistema processual do trabalho.
Vale dizer, nessa oportunidade, o caso de maior insegurança não é apenas quanto à falta de uniformidade procedimental (em que o juiz aplica ou não o art. 475-J), mas a aplicação parcial de ambos, ou seja, o magistrado adota a norma de processual trabalhista em concomitância com a norma processual civil.
Na situação acima indicada, pode ocorrer do juiz trabalhista fazer constar no mandado de citação (art. 880 da CLT – e não a mera intimação), por exemplo, o prazo para pagar o valor em pecúnia com a imposição da multa de 10% (dez por cento) sobre o montante (475-J do CPC) em caso de não cumprimento ou cumprimento parcial, fazendo constar, inclusive, ao final, o prazo de cinco dias, após a garantia patrimonial da execução, para o devedor opor embargos à execução (art. 884 da CLT) e, não, o prazo de quinze dias para impugnar o título executivo judicial (art. 475-J, §1º, do CPC).
Repita-se, o devedor será citado para pagar a dívida e, caso não pague, poderá garantir a execução mediante depósito da mesma, atualizada e acrescida de despesas processuais, ou nomeando bem à penhora (art. 882).
Desse modo, não vislumbra-se maior vantagem em aplicar a multa em questão, uma vez que a CLT faculta ao devedor, no prazo de quarenta e oito horas, pagar o valor em pecúnia ou garantir a execução e, caso não faça um ou outro, seguir-se-á penhora dos seus bens, acrescida de custas e juros de mora.
Todavia, que o valor da condenação pode ser alterado por meio de embargos à execução, pelo que apenas após o trânsito em julgado dos embargos o valor da condenação é considerado definitivo, em observância ao devido processo legal.
Nos termos do art. 884 da CLT, garantida a execução ou nomeados bens à penhora a devedor terá o prazo de (05) cinco dias para apresentar embargos, cabendo igual prazo ao exequente para impugnação.
Assim, é aconselhável que o juiz trabalhista, sempre que possível, profira sentença líquida, pois o art. 884 é aplicado sem prejuízo da art. 879, §2º (que versa sobre a possibilidade do juiz abrir prazo para as parte impugnarem, no caso de sentença ilíquida, quando elaborada a conta e tornada líquida), além do que o juiz não pode condenar o devedor em quantia atribuída de maneira unilateral pelo credor e, ainda mais, com imposição da multa do art. 475-J (PRATA, 2008, p. 802).
Conquanto, conclui-se, de modo lógico, que a aplicabilidade da norma específica exclui a incidência da multa do art. 475-J, tendo em vista o princípio da segurança jurídica que apenas permite a aplicabilidade de legislação subsidiária nas situações limites do art. 769 da CLT.
Referências
BARBOSA, Andrea Carla. A Nova Execução Trabalhista de Sentença. São Paulo: Ltr, 2010.
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CASSAR, Vólia Bomfim. Direito do Trabalho. 6. ed. Niterói: Impetus, 2012.
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Advogada e Pós-Graduada em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho e Direito Constitucional.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MELO, Liana Holanda de. A possível aplicação subsidiária do art. 475-J do Código de Processo Civil ao Processo do Trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 mar 2015, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/43564/a-possivel-aplicacao-subsidiaria-do-art-475-j-do-codigo-de-processo-civil-ao-processo-do-trabalho. Acesso em: 22 nov 2024.
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