RESUMO: O governo federal no apagar das luzes do ano de 2014, publicou a MP 664 alterando requisitos para concessão de benefícios sociais. Tal medida contrariando discurso eleitoral usurpou função legislativa do Congresso Nacional, promovendo retrocesso social e com evidente vicio de inconstitucionalidade formal, não apresentando os requisitos urgência e relevância revela a forma como tais medidas vêm sendo utilizadas para burlar a separação de poderes.
PALAVRAS-CHAVE: pensão por morte, inconstitucionalidade formal, separação de poderes, medidas provisórias.
1 INTRODUÇÃO
O governo federal esta enfrentando um evidente descontrole nas contas públicas causada pelo excesso de gastos em ano eleitoral e anteriores. Exemplo construção de estádios de futebol, obras inacabadas do PAC-programa de aceleração de crescimento, gastos com programas sociais assistencialistas. Desta forma, após o termino da campanha eleitoral e na virada do ano o governo editou e publicou a MP 664/2014 alterando requisitos para concessão de benefícios da previdência social, dentre outros, incluindo carência para concessão de pensão por morte e transformando este benefício antes vitalício em temporário, salvo exceções. Contudo para utilização de tal espécie normativa, medidas provisórias, faz-se necessário requisitos como urgência e relevância, não presentes em um governo saindo de um mandato de quatro anos e reeleito para igual período.
2. PRINCIPIO DA PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL
Visa tal princípio impedir que o estado venha buscar a supressão de direitos constitucionalmente consagrados através de espécies normativas que venham a suprimir, restringir, diminuir tais direitos. Atua como um limite a atuação do legislador, vejamos a posição do ilustre doutrinador:
Neste sentido se fala também de cláusulas de proibição de evolução reacionária ou de retrocesso social (ex. consagradas legalmente as prestações de assistência social, o legislador não pode eliminá-las posteriormente sem alternativas ou compensações <<retornando sobre seus passos>>; reconhecido, através de lei, o subsídio de desemprego como dimensão do direito ao trabalho, não pode o legislador extinguir este direito, violando o núcleo essencial do direito social constitucionalmente protegido(Canotilho,2006,p.177)
Desta forma os direitos sociais previstos na constituição federal assumiriam verdadeiro status de cláusulas pétreas, não devendo ser restringidos, apenas ampliados.
3. PRINCIPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES
A democracia, conquista que podemos considerar recente na história da humanidade, pressupõe a vontade popular nas decisões políticas, o povo deve ser representado e ouvido nas decisões que afetam a coletividade como um todo .Manter um regime democrático pressupões portando a repartição, divisão de poderes. Este repartição não é construção recente, vejamos, em trecho extraído de brilhante artigo de Júlio Cezar Couceiro:
Essa teoria da separação de poderes em corrente tripartite, foi esboçado primeiramente por Aristóteles em sua obra “A Política”, em que admitia existir três órgãos separados a quem cabiam as decisões do Estado. Eram eles o poder Deliberativo, o Poder Executivo e o Poder Judiciário. Posteriormente, Locke em sua obra “Segundo Tratado sobre o Governo Civil”, concebendo o Poder Legislativo como sendo superior aos demais, que inclusive estariam subordinados a ele, quais sejam, o Executivo com a incumbência de aplicar as leis e o Federativo que, muito embora, tivesse legitimidade não poderia ser desvinculado do Executivo, cabendo a este cuidar das relações internacionais do governo.
4. INCOSNTITUCIONALIDADE FORMAL
De acordo com o Procurador Federal Lincoln Nolasco:
O art. 62 da Constituição Federal, “em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional”. Uma vez editada, a medida provisória permanecerá em vigor pelo prazo de 60 dias e será submetida, imediatamente, ao Poder Legislativo, para apreciação. Este prazo será contado da publicação da medida provisória, porém ficará suspenso durante os recessos do Congresso Nacional. Antes da promulgação da Emenda Constitucional nº 32/2001, não havia a suspensão do prazo e sim a convocação extraordinária do Congresso Nacional para deliberar sobre a medida provisória. Esta emenda também estabeleceu o prazo de duração da medida provisória, pois antes, algumas chegavam a durar até mais de seis anos sem serem convertidas em lei.
Portando, devido a evidente falta de urgência e relevância, requisitos previstos no artigo 62 da CR/88 tal medida em afronta evidente á Constituição Federal sequer deveria ter sua vigência cogitada. Contudo, o poder executivo se valendo de eventual dificuldade do poder judiciário apreciar os requisitos de tais espécies normativas durante seu efêmero período de vigência, abusa deste meio legal de alterar o ordenamento jurídico, devendo o poder legislativo buscar colocar freios no contínuo abuso de edição de medidas provisórias sem urgência ou relevância. Tal limite deverá ser interposto tanto na apreciação de tais medidas como na edição de emenda constitucional limitando tal poder normativo constitucional que vem sendo de forma abusiva utilizado pelo poder executivo.
5. MP 664/2014 E SUPRESSÃO DE BENEFÍCIOS SOCIAIS
Dentre as principais alterações no RGPS trazidos a discussão pela MP 664 /2014 alterando a redação da Lei 8.213/91 temos a instituição de carência para concessão da pensão por morte, o fato que a mesma deixaria de ser vitalícia, obedecendo uma tabela estimada de sobrevida , vejamos:
Art. 77. ......................................................
§ 1º Reverterá em favor dos demais a parte daquele cujo direito à pensão cessar, mas sem o acréscimo da correspondente cota individual de dez por cento.
§ 2º ..................................................... ..
III - para o pensionista inválido pela cessação da invalidez e para o pensionista com deficiência mental, pelo levantamento da interdição; e
IV - pelo decurso do prazo de recebimento de pensão pelo cônjuge, companheiro ou companheira, nos termos do § 5º.
.............................................................
§ 5o O tempo de duração da pensão por morte devida ao cônjuge, companheiro ou companheira, inclusive na hipótese de que trata o § 2º do art. 76, será calculado de acordo com sua expectativa de sobrevida no momento do óbito do instituidor segurado, conforme tabela abaixo:
§ 6o Para efeito do disposto no § 5o, a expectativa de sobrevida será obtida a partir da Tábua Completa de Mortalidade - ambos os sexos - construída pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, vigente no momento do óbito do segurado instituidor.
Um ponto positivo da medida, de forma semelhante ao regime próprio da lei 8112/90, a não concessão do benefício por indignidade, a quem der causa por crime doloso á morte do instituidor.
“Art. 74. ..............
§ 1º Não terá direito à pensão por morte o condenado pela prática de crime doloso de que tenha resultado a morte do segurado.
§ 2º O cônjuge, companheiro ou companheira não terá direito ao benefício da pensão por morte se o casamento ou o início da união estável tiver ocorrido há menos de dois anos da data do óbito do instituidor do benefício, salvo nos casos em que: (Vigência)
I - o óbito do segurado seja decorrente de acidente posterior ao casamento ou ao início da união estável; ou
II - o cônjuge, o companheiro ou a companheira for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade remunerada que lhe garanta subsistência, mediante exame médico-pericial a cargo do INSS, por doença ou acidente ocorrido após o casamento ou início da união estável e anterior ao óbito.” (NR)
A MP 664/2014 encontra-se em tramitação no congresso nacional, contudo algumas alterações já foram inclusas pelo relator, dentre essa alterações a retirada da cota familiar por dependente, voltando neste ponto aos valores de concessão anteriores a medida, também ao prazo de concessão por faixa etária está sofrendo ajustes por parte dos parlamentares, lembrando que 1º de junho de 2015 é o ultimo dia de vigência da MP 664/2014.
6. CONLUSÃO
O poder executivo através de medida provisória afronta o benefício de proibição do retrocesso social, utilizando-se de espécie normativa excepcional para superar sua frágil governabilidade pelo enfraquecimento político frente ao Congresso Nacional. Busca regularizar a situação financeira não observando requisitos previstos no art. 62 CR/88 usurpando competência do poder legislativo ao editar MP sem urgência e relevância, com flagrante vício de origem, inconstitucionalidade formal da MP 644/2014. Não cumprindo os requisitos constitucionais para edição de MP, viola o poder executivo o principio da separação dos poderes, artigo 2º CR/88, buscando um indesejável caminho não democrático para tentar suprimir do poder legislativo seu papel institucional.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília: Senado Federal, 1988.
CANOTILHO, José Joaquim. Direito Constitucional e teoria da constituição. Coimbra: Almedina, 2006.
COUCEIRO, Julio Cezar. Princípio da Separação de Poderes em corrente tripartite. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XIV, n. 94, nov 2011. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?artigo_id=10678&n_link=revista_artigos_leitura>. Acesso em maio 2015.
NOLASCO, Lincoln. Limites materiais à edição de medidas provisórias. In: Âmbito Jurídico, Rio Grande, XV, n. 96, jan 2012. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11010>. Acesso em maio 2015.
Bacharelando do curso de Direito da Faculdade AGES.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, José Flávio Matos. Alterações nos requisitos de concessão pensão por morte e inconstitucionalidade formal da MP 664/2014 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 maio 2015, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/44199/alteracoes-nos-requisitos-de-concessao-pensao-por-morte-e-inconstitucionalidade-formal-da-mp-664-2014. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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