A Operação LAVA JATO retomou ponto de preocupação da advocacia criminal: o alcance do sigilo das comunicações entre o cliente e seus defensores.
Segundo o noticiário: (a) o presidente de um dos Grupos de empresas que está custodiado na Polícia Federal em Curitiba alcançou um bilhete aos seus advogados por meio de um policial; (b) a mensagem foi copiada pelo policial, sendo entregue o original aos advogados do preso; (c) em interpretação do pedido, o Delegado responsável pela Operação declarou a clara possibilidade do conteúdo do bilhete significar condutas estranhas à relação advogado-cliente; (d) a chamada mais comum, diante do caso, é: 'Destruir e-mail sondas', pede o empresário desde a prisão.
De acordo com o artigo 41, § único da Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210/84), o preso tem direito a contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes (Inciso XV). Tal prerrogativa somente poderá ser mitigada por meio de ato motivado do diretor do estabelecimento prisional, uma vez que, não obstante se reconheça a possibilidade de restrição do direito fundamental ao sigilo de correspondência em prol da segurança pública, esta deverá ser exceção e, como tal, deve estar devidamente justificada com o fim de evitar abusos estatais.
Segundo o STF, a leitura da correspondência do preso poderá ser restringida apenas quando se observar as regras previstas na Lei de Execução Penal e, obviamente, em hipóteses excepcionais: segurança pública / disciplina penitenciária / preservação da ordem jurídica (1).
A complexidade aumenta quando se trata de correspondência entre o cliente preso e seu advogado. Neste caso temos que o sigilo das comunicações opera em grau máximo, o que é, aliás, da essência da atividade.
Segundo WUNDERLICH e Estellita, “o sigilo é ínsito à atividade profissional do advogado. É uma relação concreta onde os deveres de orientação e assistência contemplam, em si, o dever de sigilo. Não é possível admitir-se restrição ou limitação genérica do atuar do causídico-procurador, em qualquer fase, judicial ou extrajudicial, em procedimentos ou processos de qualquer natureza, sob pena de frustrarmos o caráter confidente da relação profissional e macularmos a essência do direito de defesa” (2).
Mais do que isso, sem adentrarmos na análise meticulosa do conteúdo do bilhete, duas premissas óbvias decorrem da leitura da mensagem (segundo publicação em vários sítios da internet):
Um. A anotação de próprio punho foi endereçada aos advogados;
Dois. O conteúdo deixa muito claro que se trata de teses defensivas: o título do bilhete é “PTS P/ HC”.
Assim, fica fácil concluir que o bilhete não poderia ter sido interceptado e nem mesmo tornado público. As interpretações sobre o conteúdo do bilhete não dizem respeito à Autoridade Policial e nem podem invocar o interesse público como cláusula de validade, pois a relação é sigilosa entre advogado e cliente. Se a moda pega, os advogados podem ter interceptadas suas conversas nos parlatórios dos presídios e delegacias, o que seria romper –definitivamente – com o Estado de Direito. Continuaremos resistindo!
NOTAS:
(1) STF, HC nº 70814/SP, 1ª Turma, Rel. Celso de Mello, j. 01/03/1994.
(2) WUNDERLICH, Alexandre; Estellita, Heloisa. Sigilo, deveres de informação e advocacia na Lei de Lavagem de Dinheiro. In: Janaina Paschoal; Renato de Mello Jorge Silveira. (Org.). Livro Homenagem a Miguel Reale Júnior. 1ed. Rio de Janeiro: GZ, 2014, p. 27.
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