Resumo: O presente artigo discute a possibilidade de os servidores oriundos de outro ente federativo que, sem solução de continuidade, ingressarem em cargo público federal, estadual, municipal ou distrital, poderem optar pela manutenção do regime previdenciário anterior.
Palavras-chave: Regime Previdenciário. Servidor. Direito. Opção.
Abstract: This article discusses the possibility of the servers coming from another federal entity, without interruption, they join in federal, state, municipal or district, public office may choose to maintain the previous pension scheme.
Keywords: Pension Scheme. Server. Right. Option.
I - INTRODUÇÃO
O presente artigo buscará enfrentar a polêmica aplicação do regime de previdência complementar aos servidores públicos egressos de outros entes da federação, que já ocupavam cargos públicos na origem, e que foram aprovados em novo concurso público.
As legislações Federais, Estaduais e Municipais tendem a não oportunizar a opção pelo regime de previdência complementar a esses servidores.
Sob esse prisma, será feito um levantamento das disposições constitucionais aplicáveis à espécie, buscando-se a melhor interpretação do regime constitucional previdenciário dos servidores públicos.
II- A APLICAÇÃO DA PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR AOS SERVIDORES PÚBLICOS EGRESSOS DE OUTROS ENTES FEDERATIVOS
Com a publicação da Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/1998, houve profunda alteração do art. 40 da Constituição Federal de 1988, que passou a prever, no § 14º, que a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, desde que instituíssem regime de previdência complementar para os seus respectivos servidores titulares de cargo efetivo, poderiam fixar, para o valor das aposentadorias e pensões a serem concedidas pelo regime de que trata aquele artigo, o limite máximo estabelecido para os benefícios do regime geral de previdência social de que trata o art. 201 da Carta Magna.
Como senão bastasse, o § 15º do mesmo artigo constitucional determinou que, observado o disposto no art. 202, “lei complementar disporá sobre as normas gerais para a instituição de regime de previdência complementar pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, para atender aos seus respectivos servidores titulares de cargo efetivo”
Ademais, o § 16º da CF estabeleceu que, “somente mediante sua prévia e expressa opção, o disposto nos § 14º e 15º poderá ser aplicado ao servidor que tiver ingressado no serviço público até a data da publicação do ato de instituição do correspondente regime de previdência complementar”.
Seguindo o comando constitucional, vários Estados da Federação, como o Estado de São Paulo (Lei nº 14.653, de 22/12/2011), instituíram o regime de previdência complementar a que se referiu o artigo 40, §§ 14º e 15º, da Constituição Federal, de caráter facultativo.
Em relação à União, tal regime complementar foi instituído através da Lei nº 12.618, de 30/04/2012, que, além de instituir o regime de previdência complementar para os servidores públicos federais titulares de cargo efetivo, fixou o limite máximo para a concessão de aposentadorias e pensões pelo regime de previdência de que trata o art. 40 da Constituição Federal.
A partir de 04 de fevereiro de 2013, após a autorização da Superintendência Nacional de Previdência Complementar (Previc), a Funpresp-Exe iniciou a administração do ExecPrev. Assim, todos os servidores públicos que ingressaram no Poder Executivo Federal a partir de 4/2/2013 passaram a ter duas opções: contribuir apenas para o RPPS - Regime Próprio de Previdência Social e ter sua aposentadoria limitada ao teto do RGPS ou vincular-se à previdência complementar, sendo tal opção irretratável.
Ressalte-se que foi assegurado aos servidores que, sem solução de continuidade com a Administração, ingressaram no serviço público Federal antes da vigência do novo regime, o direito de aderir à previdência complementar ou permanecer no sistema previdenciário anterior.
Entretanto existe uma questão tortuosa a ser enfrentada pelos operadores do direito, que está afetando vários servidores públicos egressos de outros entes da federação que, sem solução de continuidade, ingressaram em cargo público federal, estadual ou municipal. Eles têm direito à manutenção do regime previdenciário anterior?
No tocante à União, recentemente, o Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão publicou orientação normativa nº 17, de 23 de dezembro de 2013, publicada na edição extra do DOU 249, de 24/12/2013, no sentido de que os servidores estaduais, municipais e distritais que ingressaram em cargo público efetivo, do Poder Executivo Federal, a partir de 04/02/2013, estão submetidos ao regime de Previdência Complementar, independente de solução de continuidade entre os cargos. Nos termos da referida legislação, estão sujeitos ao regime de previdência complementar de que trata a Lei nº 12.618, de 2012, e consequentemente, terão suas contribuições previdenciárias submetidas ao limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social:
a) os servidores federais que ingressaram ou ingressarem em cargos públicos efetivos no Poder Executivo Federal a partir de 04 de fevereiro de 2013; e
b) os servidores egressos de órgãos ou entidades de qualquer dos entes da federação mencionados no parágrafo único do art. 1º desta Orientação Normativa que tenham ingressado ou ingressarem em cargo público efetivo do Poder Executivo Federal a partir de 04 de fevereiro de 2013.
Nesse sentido, forçoso concluir que o MPOG conferiu interpretação totalmente restritiva à expressão "serviço público" do art. 40, parágrafo 16º, da Constituição Federal.
Entretanto, tal entendimento não pode prosperar. De acordo com o art. 40, § 14º da CF, os Estados, os Municípios, o Distrito Federal e a União, desde que instituam regime de previdência complementar para seus servidores, poderão fixar para os benefícios concedidos pelo regime de que fala o artigo 40 (regime próprio de previdência) o teto do regime geral de previdência social (art. 201 da Constituição Federal); por sua vez, o § 15º do art. 40, estabelece que o regime de previdência complementar será instituído por lei do respectivo ente federativo (União, Estados, Distrito Federal e Municípios). Nesse sentido, quando o art. 40, § 16 da Carta Magna diz “serviço público”, o melhor entendimento é que tal expressão contém implicitamente os termos “federal”, “estadual”, “municipal” e “distrital”, e não somente aquele serviço público prestado ao mesmo ente federativo. Se esse entendimento for mantido, flagrante estará a violação ao princípio da isonomia, previsto expressamente na Carta Magna.
Pelo até aqui exposto, se o indivíduo já era servidor público anteriormente à instituição da previdência complementar e, posteriormente a tal instituição, assumiu cargo público federal, estadual, municipal ou distrital, sem quebra de vínculo com a Administração Pública, deve ter a opção de permanecer no regime previdenciário antigo. Cumpre destacar que a própria Constituição Federal prevê que, para se definir o regime previdenciário, o que vale é condição de titular de cargo público, sem estabelecer restrição quanto à natureza do vínculo contraído – federal, estadual, municipal ou distrital –, o que impede que lei assim o faça.
A questão, além de teórica, gerou diversas indagações envolvendo casos concretos, tendo a Advocacia-Geral da União (AGU) sido chamada para dirimir a questão. Foi elaborado o parecer nº 009/2013/JCBM/CGU/AGU, que restou aprovado pelo Advogado-Geral da União. Diante dos detalhes da questão envolvida, alguns trechos do referido parecer merecem destaque:
A questão é saber se o servidor carrega consigo, ou não; o direito de não sujeitar-se ao regime complementar do Ente Político no qual ingresse. No caso da União, a faculdade de aderir ou não ao regime complementar objeto da Lei n. 12.618/12. Não há previsão constitucional nem legal, de que o servidor transporta de um Ente Político para outro, o direito de não aderir ao regime de previdência complementar, pelo fato de não tê-lo feito na origem. Ou de fazer nova opção. A opção do § 16 do art. 40 da CF/88 diz respeito a determinado regime jurídico. Regime jurídico da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Cada Ente da Federação possui autonomia para instituir seu próprio regime jurídico (art. 39 da CF/88), e a opção por regime jurídico está atrelada a cada Ente Federado. Não há regime jurídico universal de opção. O servidor público efetivo tem relação estatutária com o Ente Federado que o admitiu. Daí, não ostenta direito oponível à União de não sujeitar-se às regras estabelecidas na Lei 12.618/12, precedente a seu ingresso. A opção do § 16 do art., 40 da CF/88 é opção por determinado regime jurídico: Regime jurídico próprio de previdência, sem observância do teto do RGPS ou, opção pelo regime complementar (quando o regime próprio do ente Federado arcar com benefício máximo do teto do RGPS). O STF tem entendimento firmado quanto a ausência de direito adquirido a determinado regime jurídico administrativo. Cite-se recentíssima decisão no At 857007 AgR/RS - Rio Grande do Sul, AR. REG no Agravo de instrumento. Relator Ministro Roberto Barroso, julgado em 10/09/2013, 1ª Turma, DJE de 08/10/2013.
[...]
A opção do § 16, art. 40 da CF/88 é uma faculdade que em deferência à legalidade (art. 37, caput da CF/88), somente pode ser exercitada nos limites da norma positivada. No caso da União, a Lei nº 12.618/2012. O direito de opção apenas surge no momento da instituição do regime complementar. E essa opção deve ser exercitada junto ao Ente Federado onde admitido o servidor e no prazo estipulado na Lei de regência. A Lei 12.618/12 é um marco regulatório. O direito de opção (§ 16 do art. 40 da CF/88) somente pode ser exercitado por quem era servidor público federal quando do início de vigência do Funpresp-Exe em 4/2/2013. Quem entrou depois, não detém a mesma prerrogativa do servidor que já estava nos quadros da União. Seria um super direito de expectativa para quem nem era servidor federal. Imagine-se a hipótese de servidores que ingressem nos quadros federais daqui a 5, 10, 15, 20 anos, após a Lei 12.618/12, querendo ostentar direito de receber além do teto do RGPS pelo regime de previdência da União. Refoge a qualquer lógica. A Lei 12.618/12 estabeleceu nos arts. 3º e 22 marcos temporais. Dizem com sua aplicabilidade: um a partir do início da sua vigência (4/2/2013) e o outro até a data anterior ao início da sua vigência (3/2/2013).
[...]
É compulsório a aplicação do limite máximo do RGPS para os ingressos nos quadros federais a partir de 4/2/2013. Não houve distinção de origem; se egresso de Estado, DF ou Município. Quem ingressou no serviço público federal a partir da vigência do FUNPRESP-Exe, em 4/2/2013, sujeita-se ao teto do RGPS para fins de benefício junto ao RPPS, independe de adesão do servidor ao Fundo. Se não aderir, terá seu benefício no Regime de Previdência da União limitado ao teto do RGPS.
Verifica-se, portanto, que o parecer da AGU é claro ao afirmar pela negativa da possibilidade de opção de regime previdenciário para os servidores públicos egressos de outros entes da federação (estados e municípios) que, sem quebra de continuidade, ingressaram no serviço público federal após a vigência do regime complementar.
Apesar da qualidade do trabalho técnico e da correção de todas as premissas jurídicas elencadas no parecer da AGU, entendemos que essa não é a melhor solução.
Ao contrário do afirmado pela AGU, é possível ao servidor egresso de outro ente federado nas condições aqui expostas realizar a opção do § 16 do artigo 40 da Constituição Federal, a qualquer tempo.
O Ministério Público do Estado de São Paulo, ao tratar da aplicação do § 16 do Artigo 40 da Constituição Federal, assim se manifestou:
DESPACHO DO PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA, de 21.06.2012
Protocolado n. 86.773/12 Interessado: Área de Preparação e Controle de Pagamento de Pessoal Objeto: consulta referente ao regime de previdência complementar instituído pela Lei Estadual n. 14.653, de 22 de dezembro de 2011 EMENTA : CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PREVIDENCIÁRIO. CONSULTA. REGIME PREVIDENCIÁRIO. PREVIDÊNCIA COMPLEMENTAR. 1. O regime de previdência complementar previsto no art. 40, §§ 14 a 16, CF/88, não se aplica àqueles que ingressaram no MPESP após a vigência da Lei Estadual n. 14.653/11 e que já eram servidores públicos da União, de outros Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, desde que não haja solução de continuidade, pois, o § 16 do art. 40 CF/88 não aninha a distinção promovida pelo legislador estadual em favor exclusivamente dos servidores públicos estaduais. [...].
Cabe destacar que o Ministério Público de São Paulo faz exatamente a mesma ressalva exposta no presente artigo. Vale dizer, o § 16 do artigo 40 da Constituição Federal não faz ressalva quanto ao ente federado de ingresso no funcionalismo público. Logo, não se pode admitir norma legal ou interpretação que reduza o âmbito de incidência do texto constitucional.
Assim, é possível ao servidor egresso de outro ente federado nas condições aqui expostas realizar a opção do § 16 do artigo 40 da Constituição Federal, a qualquer tempo.
Devemos esperar o posicionamento da jurisprudência sobre o tema, mas a tendência é que seja dada interpretação favorável aos servidores públicos egressos de outros entes federativos. Como demonstração disso, o Tribunal Regional Federal da 1ª região, com sede em Brasília/DF, atendendo ao pedido liminar formulado por associação de classe (ANAUNI – Associação Nacional dos Advogados da União), garantiu o direito de opção dos seus associados pelo regime da previdência complementar de forma retratável e revogável, até que o Poder Judiciário se manifeste de forma definitiva sobre o mérito do pedido.
III- CONCLUSÃO
Em que pese ainda não termos um posicionamento firme e definitivo da jurisprudência sobre o assunto, através do presente artigo demonstra-se os principais dispositivos constitucionais aptos a embasar o entendimento pela inconstitucionalidade da aplicação do regime de previdência complementar aos servidores públicos que já possuíam vínculo com outro ente da federação. Assim, se o indivíduo já era servidor público anteriormente à instituição da previdência complementar e, posteriormente a tal instituição, assumiu cargo público federal, estadual, municipal ou distrital, sem quebra de vínculo com a Administração Pública, deve ter a opção de permanecer no regime previdenciário antigo. Tal entendimento decorre da própria Constituição Federal que prevê que, para se definir o regime previdenciário, o que vale é condição de titular de cargo público, sem estabelecer restrição quanto à natureza do vínculo contraído – federal, estadual, municipal ou distrital –, o que impede que lei assim o faça.
Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil. Professor do Curso de Direito das Disciplinas de Direito Financeiro, Direito Tributário e Previdenciário na Fundação Educacional do Vale do Jequitinhonha.<br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ARANTES, Renato Hallen. A aplicação do regime de previdência complementar aos servidores públicos egressos de outros entes da federação Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 nov 2015, 05:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/45426/a-aplicacao-do-regime-de-previdencia-complementar-aos-servidores-publicos-egressos-de-outros-entes-da-federacao. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maurício Sousa da Silva
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Por: DESIREE EVANGELISTA DA SILVA
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