RESUMO: análise acerca das formas de prestação de serviços públicos pelas entidades estatais brasileiras, seja de forma direta ou indireta, tanto sob a perspectiva constitucional (artigo 175 da Constituição Federal) quando sob o prisma da Lei 8987/95, além de apresentar as novidades sobre o assunto em face das modernas exigências dos cidadãos-destinatários dos respectivos serviços.
Palavras-chave: PODER PÚBLICO. SERVIÇOS PÚBLICOS. PRESTAÇÃO DIRETA E INDIRETA. COMPETÊNCIAS DOS ENTES POLÍTICOS. SERVIÇO PÚBLICO ADEQUADO. CONCESSÃO, PERMISSÃO OU AUTORIZAÇÃO. PARCERIAS PÚBLICO PRIVADAS.
ABSTRACT: analysis about the ways of providing public services by Brazilian state entities, either directly or indirectly, both in the constitutional perspective (Article 175 of the Federal Constitution) when in the light of Law 8987/95, in addition to presenting the news about subject in the face of the modern demands of citizens-recipients of their services.
Keywords: public power. Public services. Direct and indirect provision. Powers of entities politicians. Public service properly. Concession, permission or authorization. Public-private partnerships.
1) INTRODUÇÃO:
A Constituição Federal de 1988 atribuiu ao Poder Público a titularidade da prestação de serviços públicos à sociedade, definindo que tal mister poderia se concretizar de forma direta (através do próprio Estado) ou indireta (através do particular)[1].
Com o passar dos anos, a modernização das atividades tem sido a tônica reclamada pelos destinatários dos serviços, exigindo do Estado novas posturas em Relação aos mesmos.
Através do presente trabalho, serão trazidos conceitos e classificações atuais que visam tornar menos árduo o estudo da relação entre o Estado Brasileiro e os serviços por ele prestados aos seus cidadãos.
2) CONCEITO DE SERVIÇO PÚBLICO:
A conceituação de serviço público pode ser sintetizada, nas palavras do Professor Celso Antônio Bandeira de Mello, como “toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada a satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Publico- portanto consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais-, instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo”[2].
Para melhor destrichar o conceito, serviço público possui dois sentidos: de forma ampla, engloba os serviços jurisdicional, legislativo e administrativo; restritamente, apenas as atividades exercidas pela Administração ou por particulares a fim de satisfazer concreta e materialmente as necessidades da coletividade.
Sabe-se que o verdadeiro titular dos serviços públicos é o Estado, que pode prestá-los direta ou indiretamente. A prestação indireta ocorre através da descentralização dos serviços, ou seja, o serviço é transferido ao particular sob a forma de concessão, permissão ou autorização.
3) COMPETÊNCIA:
Na estrutura federativa brasileira, a Carta Magna deixou a cargo da União a prestação de serviços de interesse nacional (art. 21 da CF), em rol taxativo que abrange, dentre outros, os serviços postal, de telecomunições, de radiodifusão de sons e imagens, de transportes interestadual e internacional de passageiros.
Aos municípios, foi reservada a prestação de serviços de interesse local (art. 30 da CF). Contudo, ao contrário do que fizera com relação à União, o constituinte listou exemplificativamente alguns dos serviços que devem ser oferecidos pelos entes municipais, tais como transporte intramunicipal, serviço funerário e coleta de lixo.
Por fim, aos Estados foram destacados os serviços de interesse regional, detendo tais entes a chamada competência residual, a exemplo dos serviços de transporte intermunicipal e de gás canalizado.
4) CLASSIFICAÇÕES:
Os serviços públicos são usualmente classificados pela doutrina da seguinte forma:
a) originário x derivado:
- serviço originário: aquele que apenas determinado ente pode prestar, sendo indelegável. É o serviço público propriamente dito. É considerado essencial;
- serviço derivado: pode se delegado. É o serviço de utilidade pública. É considerado não essencial.
b) exclusivo x não exclusivo:
- serviços exclusivos: são aqueles de titularidade do Estado, mas que podem ser prestados tanto direta quanto indiretamente (mediante concessão, permissão ou autorização). Ex.: telecomunicação é de titularidade da União, mas pode ser prestado pelo particular.
- serviços não exclusivos: são aqueles que não são de titularidade do Estado, ou seja, podem ser prestados diretamente pelo particular. Ex.: saúde e educação.
c) quanto à forma de prestação:
- SERVIÇOS PRÓPRIOS: são os serviços públicos não exclusivos, quando prestados pelo Estado. Ex.: escolas ou hospitais públicos.
- SERVIÇOS IMPRÓPRIOS: são os serviços públicos não exclusivos, quando prestados pelo particular. Ex.: escolas e hospitais particulares.
d) quanto ao tipo de atividade estatal:
- SERVIÇO ADMINISTRATIVO: desempenhado pela administração para atender às sua necessidades internas ou para outros serviços que são prestados ao público (atividade-fim).
- SERVIÇO COMERCIAL: referente às atividades econômicas desempenhadas pelo Estado, produzindo lucro para quem o presta. Ex.: energia elétrica, transportes, telecomunicações.
- SERVIÇO SOCIAL: referente à ordem social (educação, cultura, saúde, assistência, etc.).
e) quanto a forma de fruição pelos cidadãos:
- SERVIÇO GERAL: prestado à coletividade (sujeito indeterminado), “uti universi”. Financiado pelas receitas dos impostos. Ex.: saúde, saneamento.
- SERVIÇO INDIVIDUAL: prestado ao indivíduo (sujeito determinado), “uti singuli”. Ex.:energia, água, telefone.
f) obrigatório x facultativo:
- SERVIÇO OBRIGATÓRIO: remunerados por tributos (taxas e impostos).
- SERVIÇO FACULTATIVO: remunerados por tarifas.
Consoante já salientado, as formas de prestação dos serviços públicos são a centralizada (serviço prestado pela Administração Direta), a descentralizada (serviço prestado por ente diverso daquele que possui a titularidade constitucional) e a desconcentrada (serviço é prestado por um órgão com competência específica para prestá-lo, integrante da estrutura da pessoa jurídica que detém a titularidade).
Sobre a descentralização, cumpre ressaltar a sua subdivisão em DESCENTRALIZAÇÃO POR SERVIÇOS (a lei transfere a titularidade para a Administração Indireta) e DESCENTRALIZAÇÃO POR COLABORAÇÃO (o serviço é prestado pelo particular, em colaboração com o Estado, mediante delegação deste, atribuindo-se a mera execução).
Já na desconcentração, tem-se que pode se dar por meio de DESCONCENTRAÇÃO CENTRALIZADA (órgão integrante de pessoa jurídica da Administração Direta) ou DESCONCENTRAÇÃO DESCENTRALIZADA (órgão integrante de pessoa jurídica da Administração Indireta).
5) DISTINÇÕES ENTRE CONCESSÃO E PERMISSÃO:
A prestação de forma indireta se dá pela delegação do serviço público ao particular (pessoa jurídica ou física), que o prestará em seu próprio nome e por sua conta e risco, remunerando-se diretamente por meio das tarifas cobradas dos usuários, e sempre sob a fiscalização do Poder Público.
A licitação, por exigência do precitado artigo 175 da Constituição Federal, é obrigatória. Excepcionalmente, a doutrina admite a inexigibilidade em caso de inviabilidade de competição.
É preciso pontuar que tanto na concessão quanto na permissão (ou, até mesmo, na autorização), a titularidade permanece com o Poder Público.
O diploma normativo que trata sobre o tema é a Lei Federal 8987/95, que estabelece as normas gerais sobre concessão e permissão. Tal diploma possui caráter nacional, uma vez ser aplicável a todas as esferas.
Segundo esta lei, concessão é a delegação de serviço público, mediante licitação na modalidade concorrência, à pessoa jurídica ou consórcio de empresas que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco e prazo determinado, enquanto permissão é delegação de serviço público, a título precário, mediante licitação, da prestação de serviços públicos, feita pelo poder concedente à pessoa física ou jurídica que demonstre capacidade para seu desempenho, por sua conta e risco. Há que se ter cuidado para não confundir com a permissão de uso de bem público (ato administrativo discricionário e revogável).
Convém destacar também a figura da concessão precedida de obra pública, na qual o concessionário, antes de prestar o serviço, obriga-se a realizar determinada obra pública, de forma que o investimento na obra seja amortizado pela exploração do serviço após a sua conclusão.
Outra informação importante é que, para que o Poder Público delegue determinado serviço, deve haver lei que autorize (autorização legislativa). Exceções: serviços de saneamento e limpeza urbana, bem como os serviços públicos que a CF, as Constituições Estaduais e as Leis Orgânicas dos Municípios indiquem como passíveis de delegação.
Tanto a concessão quanto a permissão de serviço público têm como instrumento o contrato administrativo entre o concessionário/permissionário e o poder concedente.
6) SERVIÇO PÚBLICO ADEQUADO E SEUS REQUISITOS:
Serviço adequado é aquele que satisfaz as condições de REGULARIDADE, CONTINUIDADE, EFICIÊNCIA, SEGURANÇA, ATUALIDADE, GENERALIDADE, CORTESIA NA PRESTAÇÃO e MODICIDADE DAS TARIFAS.
Para melhor entendimento dos institutos acima, destrincha-se o conceito de cada um deles nas linhas abaixo:
- CONTINUIDADE significa que os serviços não devem sofrer interrupção. Exceções: emergência ou, após prévio aviso, por razões de ordem técnica ou de segurança nas instalações, e por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade. Importante observação é que nos serviços obrigatórios (remunerados mediante impostos ou taxas) não pode haver solução de continuidade; já nos serviços facultativos (remunerados mediante tarifas), em caso de inadimplência do usuário, a concessionária pode suspender a prestação do serviço.
Quando houver descumprimento do contrato pelo poder concedente, não poderá a concessionária/permissionária se valer da “exceptio non adimpleti contractus” contra o poder público, devendo pleitear eventual interrupção na prestação dos serviços apenas judicialmente (dependerá do trânsito em julgado da sentença). É importante atentar que o caso difere da interrupção de serviços prevista na Lei 8666/93, a qual ocorre quanto há inadimplência do poder público contratante por mais de 90 (noventa) dias, hipótese que pode ocorrer independentemente de provimento judicial.
- ATUALIDADE: nos dizeres da Lei 8987/95 (art. 6o, § 2o), corresponde a “modernidade das técnicas, do equipamento e das instalações e a sua conservação, bem como a melhoria e expansão do serviço”. É chamada de princípio do aperfeiçoamento, da adaptabilidade ou da mutabilidade, também sendo reconhecido como cláusula do progresso.
- GENERALIDADE: por força dos princípios da generalidade e da universalidade, os serviços públicos devem ser prestados, sem discriminação, a todos que satisfaçam as condições para sua obtenção, sendo imprescindível a observância de um padrão uniforme em relação aos administrados (princípio da igualdade ou neutralidade). Ou seja, maior número possível de usuários, sem discriminações.
Contudo, é possível a cobrança de tarifas diferenciadas em função de características técnias e custos específicos.
- MODICIDADE DE TARIFAS: significa que o prestador do serviço deve ser remunerado de maneira razoável, a fim de ser assegurado o equilíbrio econômico financeiro do contrato.
7) LICITAÇÃO PRÉVIA:
As concessões e permissões devem sempre ser precedidas de licitação. No caso de concessão, não se admite dispensa, porém, admite-se inexigibilidade em razão de inviabilidade de competição.
Para as concessões, a licitação será sempre na modalidade concorrência. Caso haja previsão no edital, poderá haver a inversão entre nas fases de habilitação e julgamento, assim como no pregão e no Regime Diferenciado de Contratações Públicas (previsto na Lei 12462/2011), nos quais primeiro julgam-se e classificam-se as propostas para depois abrir o envelope de habilitação do licitante melhor classificado.
Alerte-se que não há impedimento para que empresa estatal participe de licitação para concessão de serviço público.
8) PRAZOS DA CONCESSÃO OU PERMISSÃO:
A lei 8987/95 não estabeleceu prazos máximos nem mínimos para a duração do contrato de concessão ou permissão. Contudo, isso não significa que não devem ter prazos. Muito pelo contrário. Dever haver prazo determinado.
Já a lei 9074/95 prevê prazos máximos de concessão para alguns serviços, como estações aduaneiras e outros terminais alfandegados (prazo de 25 anos, podendo ser prorrogado por dez anos), ou geração de energia elétrica (prazo de até 30 anos, podendo ser prorrogado no máximo por igual período).
É possível a prorrogação, devendo as respectivas condições figurarem como cláusula essencial do ajuste.
9) TRANSFERÊNCIA DE ENCARGOS E INTERVENÇÃO:
Os contratos de concessão e permissão são “intuitu personae”, ou seja, personalíssimos. Porém, a Lei 8987/95 prevê hipóteses de transferência de encargos por meio de: a) contratação com terceiros; b) subconcessão; c) transferência de concessão; d) transferência de controle societário; e, e) assunção do controle pelos financiadores.
Portanto, é possível terceirizar ou contratar com terceiros atividades inerentes, acessórias ou complementares, bem como a implementação de projetos associados.
A subconcessão também é possível, consistindo na transferência parcial da execução do próprio serviço público concedido. Porém, reclama também licitação na modalidade concorrência para que a concessionária possa escolher a melhor opção (melhor licitante) para transferir parcialmente a execução.
A subconcessão não se confunde com a cessão ou transferência da concessão. Esta última também é possível, e implica na transferência integral do contrato de concessão à terceiros, ou seja, ocorrerá a substituição integral do concessionário, devendo haver autorização do poder concedente, hipótese esta bastante criticada pela doutrina, mas que ainda possui pronunciamento judicial sobre sua inconstitucionalidade.
Acerca da intervenção, mostra-se oportuno registrar que quando o concessionário estiver prestando serviço inadequado, poderá o poder concedente substitui-lo por um terceiro com o fim de assegurar a adequada prestação, em caráter emergencial.
A intervenção ocorrerá mediante decreto, devendo ser instaurado, em 30 (trinta) dias, procedimento administrativo, o qual deverá ter duração máxima de 180 (cento e oitenta) dias.
Cessada a intervenção, duas podem ser as consequências:
a) a extinção da concessão; ou,
b) a devolução do serviço às mãos da concessionária, após prestação de contas do interventor.
Importante observar que, no caso do serviço de energia elétrica, a intervenção ocorrerá através da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica), independente de decreto do chefe do executivo.
10) FORMAS DE EXTINÇÃO DA CONCESSÃO:
A concessão poderá ser extinta pelos seguintes meios: a) advento do termo contratual; b) encampação; c) caducidade; d) rescisão; e) anulação; e, f) falência ou extinção da empresa concessionária e falecimento ou incapacidade (em caso de empresário individual).
Extinto o contrato, os bens reversíveis retornarão ao poder concedente.
Também é consequência imediata da extinção a obrigação de o poder concedente assumir o serviço.
Para melhor compreensão de cada uma das modalidades de extinção da concessão, seguem as definições:
- ADVENTO DO TERMO CONTRATUAL (ou REVERSÃO): término do prazo determinado no contrato, sem a necessidade de avisos ou notificações prévios;
- ENCAMPAÇÃO: quando o poder concedente retoma os serviços do concessinário, não por motivo de inadimplência, mas por razões de interesse público, através de lei autorizativa, cabendo indenização em favor do concessionário (ressalve-se que não cabe indenização por lucros cessantes em nenhuma modalidade de concessão);
- CADUCIDADE: extinção unilateral da concessão, em razão do inadiplemento da concessionária. Deve haver a notificação prévia do concessionário para que tenha a oportunidade de sanar a irregularidade antes da adoção de qualquer medida mais drástica. Não sanada, aí sim instaura-se o procedimento administrativo, garantindo-se o contraditóri e a ampla defesa. Constatada a inadimplência, decreta-se a caducidade. Existe uma hipótese de caducidade obrigatória ou vinculada, qual seja, quando o concessinário transferir a concessão ou o controle societário sem notificar o poder concedente. Quando for decretada a caducidade e o poder público reassumir os serviços, não restará para ele qualquer obrigação quanto às pendências deixadas pelo concessinário, sejam elas trabalhistas, compromissos, etc., responsabilizando-se este por tudo;
- RESCISÃO: é a forma de extinção por iniciativa do concessionário, decorrente do descumprimento de obrigações pelo poder concedente e dependente de ação judicial. É importante destacar que o descumprimento por parte do poder público não autoriza a suspensão/paralisação dos serviços pelo concessionário, ao contrário da hipótese prevista na Lei 8666/93 (90 dias de inadimplência, etc.). Trata-se de aplicação do princípio da continuidade, só admitindo-se a paralisação após sentença judicial transitada em julgado e que reconheça a inadimplência. A lei 8987/95 prevê a arbitragem como mecanismo privado de solução de conflito oriundo do contrato de concessão;
- ANULAÇÃO: extinção do contrato por motivo de ilegalidade ou ilegitimidade. Pode ser declarada unilateralmente pelo poder concedente ou reconhecida judicialmente. Efeitos ex tunc, retroativos ao momento da ocorrência do vício; e,
- FALÊNCIA OU EXTINÇÃO DA CONCESSIONÁRIA: ocorrendo falência ou extinção (em caso de empresa) ou falecimento ou incapacidade (em caso de empresário individual). Trata-se de hipótese que ocorre de pleno direito, ou seja, não depende de ato decisório da administração ou provimento judicial.
11) AUTORIZAÇÃO:
A autorização uma das formas de prestação indireta de serviços públicos. Porém, distintamente da concessão e da permissão, não é formalizada por contrato, e sim mediante ato administrativo unilateral, discricionário e precário.
É modalidade adequada para situações de emergência e situações transitórias ou especiais, bem como aos casos em que o serviço seja prestado a um grupo restrito de usuários, sendo o seu beneficiário exclusivo ou principal o próprio autorizado. Exemplos clássicos são os serviços de táxi, de radioamadores e de exploração de atividade portuária fora da área do porto.
Não exige-se licitação prévia, uma vez que o serviço, embora de interesse público, é prestado porque o próprio particular toma a iniciativa de obter a autorização, sendo este o maior interessado.
Possui prazo indeterminado de duração, com exceção da autorização enquanto ato administrativo vinculado, a exemplo dos serviços de telecomunicações, hipótese na qual deverá haver licitação.
A autorização de serviço público, objeto de nosso estudo, não se confunde com a autorização de atividades privadas, outorgadas no exercício de poder de polícia. Esta tem por objeto o exercício de atividade regida pelo direito privado, franqueada à livre iniciativa (como porte de arma de fogo ou uso privativo de bem público). A autorização de atividades privadas não é ato de delegação, mas mero ato de consentimento.
12) PARCERIAS PÚBLICO-PRIVADAS:
Trata-se de modalidade específica de concessão, instituída pela Lei 11079/04 (lei nacional, ou seja, aplica-se a todos os entes políticos).
A Parceria Público Privada (PPP) foi concebida com o intuito de possibilitar a realização de investimentos de grande vulto por parte do Poder Público, sobretudo em infraestrutura, através da parceria com a iniciativa privada. Trata-se de contrato administrativo de concessão firmado entre a Administração Pública e pessoa do setor privado com o objetivo de implantação ou gestão de serviços públicos, com eventual execução de obras ou fornecimento de bens, mediante financiamento do contratado, contraprestação pecuniária do Poder Público e compartilhamento dos riscos e ganhos entre os pactuantes.
Interessante pontuar que se não houver essa contraprestação pecuniária, não será concessão especial, como costuma denominar a doutrina, mas concessão comum. Nesta última o concessinário é remunerado pelas tarifas pagas pelo usuário.
A PPP pode ser Patrocinada ou Administrativa. Patrocinada é quando o concessionário é remunerado, conjuntamente, pela tarifa paga pelos usuários e pela contraprestação pecuniária do parceiro público ao privado. Quando mais de 70% da remuneração consistir em investimento do poder público, deverá haver autorização legislativa. A Administrativa, a seu turno, se dá quando a remuneração é feita totalmente pelo Poder Público, não havendo cobrança de tarifa dos usuários. A administração será usuária direta ou indireta, ainda que envolva execução de obra ou fornecimento e instalação de bens. Deve ser usada para serviços não cobrados dos usuários, tais como a administração de hospitais, escolas públicas e presídios.
Mister se faz alertar para as restrições nas PPP's:
- de acordo com a lei, não pode haver PPP com valor inferior a 20 (vinte) milhões de reais;
- a duração mínima da parceria deve ser de 5 (cinco) anos, enquanto a duração máxima é de 35 (trinta e cinco) anos, incluindo eventual prorrogação;
- não pode haver PPP em casos unicamente de fornecimento de mão de obra, fornecimento e instalação de equipamentos ou execução de obra pública;
- não pode haver PPP para serviços exclusivos do Estado, portanto, indelegáveis (poderes de polícia, regulação e jurisdicional.
Acerca da contraprestação do Poder Público nas PPP's, a Administração poderá contribuir através de ordem bancária (dinheiro), cessão de créditos não tributários, outorga de direitos em face da própria administração, outorga de direitos sobre bens públicos dominicais, ou outros meios legais.
Há possibilidade de pagamento ao parceiro através de remuneração variável, vinculada ao desempenho, cumprimento de metas e padrões de qualidade e disponibilidade.
Acrescente-se que não pode haver remuneração antecipada, ou seja, só poderá ser repassada quando os serviços estiverem disponíveis, ainda que parcialmente (o pagamento é feito relativamente à parcela já fruível – por exemplo, em uma obra de metrô, quando cada trecho é concluído e cujo funcionamento é iniciado).
Nas Parcerias Público Privadas, podem ser ofertadas diversas garantias: a) garantia de execução do contrato, prestada pelo parceiro privado ao parceiro público, configurando-se uma garantia comum, através de caução, seguro-garantia ou fiança bancária, limitada a 10% do valor do contrato (quando envolver também bens entregues pela administração, tal valor será acrescido do valor dos bens); b) garantia de cumprimento das obrigações pecuniárias assumidas pelo parceiro público perante o parceiro privado, correspondendo a uma garantia do poder público em favor do parceiro privado, podendo se dar mediante vinculação de receitas (vedada a vinculação de receitas de impostos), fundos especiais (na União, o FGP – Fundo Garantidor de PPP), seguro-garantia (contratado com companhia que não seja controlada pelo Poder Público), garantia prestada por organismos internacionais ou financeiras não controladas pelo Poder Público, garantias prestadas por fundo garantidor ou empresa estatal criada para essa finalidade, dentre outras. Lembrando que o Estado não é obrigado a prestar das garantias recém elencadas; e, c) contragarantia prestada pelo parceiro público à entidade financiadora do projeto, sendo previstas ao financiador as garantias por parte do poder público correspondentes a transferência do controle de Sociedade de Propósito Específico (SPE) constituída pelo parceiro privado, emissão de empenho e indenizações por extinção antecipada do contrato.
Por fim, a União poderá conceder garantia ou realizar transferência voluntária aos Estados, Distrito Federal e Municípios com vistas à contratação de PPP, desde que a soma das despesas continuadas decorrentes das parcerias já contratadas por tais entes não ultrapasse, no ano anterior, o percentual de 5% da receita corrente líquida do exercíci, ou que a despesas anuais dos contratos vigentes nos 10 anos subsequentes não excedam 5% da mesma receita, projetada para os respectivos exercícios.
A União poderá criar o Fundo Garantidor de PPP (FGP) com a finalidade de prestar garantia de pagamento de obrigações pecuniárias assumidas pelos parceiros públicos. O limite global de participação da União, suas autarquias, fundações públicas e empresas estatais é de 6 (seis) bilhões de reais. O FGP tem natureza privada e patrimônio próprio, tendo por finalidade auxiliar não apenas nas PPP federais, mas também nas estaduais, distritais ou municipais. Frise-se que o FGP será criado, administrado, gerido e representado judicial e extrajudicialmente por instituição financeira controlada, direta ou indiretamente, pela União. Atualmente, cabe ao Banco do Brasil tal papel. Dentre as garantias que podem ser oferecidas pelo FGP, estão a fiança, o penhor, a hipoteca, a alienação fiduciária, entre outras.
A Sociedade de Propósito Específico (SPE) será constituída para implantar e gerir o objeto da parcerIa, e será controlada pela empresa vencedora da licitação. Vale lembrar que quem assina o contrato da PPP não é a empresa vencedora, mas a própria SPE. Logo, deverá esta ser constituída antes da assinatura do contrato.
A SPE serve para evitar confusão entre as demais atividades da empresa vencedora e o objeto da PPP. Poderá assumir a forma de COMPANHIA ABERTA (ou seja, valores mobiliários podem ser negociados no mercado).
Impende asseverar que é vedado à Administração Pública ser titular da maioria do capital votante, exceto quando instituição financeira controlada pelo Poder Público adquirir a maioria do capital votante em caso de inadimplemento de contratos de financiamento (ex.: BNDES financiou investimentos da empresa que ganhou a PPP, mas tal empresa está passando por dificuldades, daí o BNDES assume o controle da SPE para promover a sua reestruturação e assegurar a continuidade da prestação dos serviços).
A PPP deverá ser precedida por licitação na modalidade concorrência, tendo como peculiaridades: 1) para a abertura a licitação, deverá haver previsão do objeto da PPP no Plano Plurianual, licença ambiental e demonstração de atendimento à Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101/2000); e, 2) critérios de julgamento de menor valor da tarifa, melhor proposta (técnica + menor valor da tarifa), menor valor da contraprestação do parceiro público e melhor proposta (técnica + valor da contraprestação).
Vale o alerta para o fato de que o edital poderá prever a inversão da fases de habilitação e julgamento, ou seja, julga-se primeiro para depois exigir a habilitação do vencedor.
Por fim, há algumas disposições legais aplicáveis à União, tendo exigido o legislador a criação de um órgão gestor de PPP, integrado por representantes do Ministério do Planejamento, Ministério da Fazenda e da Casa Civil, denominado de COMITÊ GESTOR DE PPP (CGP). A Secretaria do Tesouro Nacional tem competência para editar normas gerais relativas à consolidação das contas públicas aplicáveis aos contratos de PPP. A União somente poderá contratar PPP quando a soma das despesas de caráter continuado derivadas do conjunto das parcerias já contratadas não tiver excedido, no ano anterior, a 1% da receita corrente líquida do exercício, e as despesas anuais dos contratos vigentes, nos 10 anos subsequentes, não excedam a 1% da receita corrente líquida projetada para os respectivos exercícios. É medida para assegurar o equilíbrio das contas públicas.
13) CONSIDERAÇÕES FINAIS:
Não restam dúvidas quanto à abertura do ordenamento jurídico pátrio para a otimização das formas de prestação dos serviços tão necessários aos cidadãos, de modo que a atuação estatal tem caminhado para uma posição de regulação e fiscalização, ao passo em que o particular assume papel cada vez mais protagonista em tal cenário.
Contudo, é imprescindível que o Estado continue assumindo a direção da oferta de serviços, uma vez que, por não objetivar o lucro, haja vista o interesse público primário em atender aos anseios da coletividade, certamente o custo da atividade será desonerado.
REFERÊNCIAS
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito Administrativo Descomplicado. 23A Edição. Editora Método. São Paulo, 2015.
CARVALHO, Matheus. Manual de Direito Administrativo. 2A Edição. Editora Jus Podivm. Salvador, 2015.
DE MELLO, Celso Antonio Bandeira; Curso de Direito Administrativo. Malheiros Editores. 14o Ed. 2001. São Paulo.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 20o Ed. São Paulo
FILHO, José dos Santos Carvalho; Manual de Direito Administrativo. Editora Lumen Júris. 24ª Ed. Rio de Janeiro.
MOREIRA NETO, Diogo Figueiredo. Curso de Direito Administrativo. 15A Edição. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
[1] CF. “Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. (...)”.
[2] DE MELLO, Celso Antonio Bandeira; Curso de Direito Administrativo. Malheiros Editores. 14o Ed. 2001. São Paulo p. 600
Advogado, bacharel em direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), pós-graduado em Residência Judicial pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e Escola da Magistratura do Rio Grande do Norte (ESMARN).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DANTAS, Lucas Costa. O Estado brasileiro e a prestação de serviços públicos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 09 mar 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46157/o-estado-brasileiro-e-a-prestacao-de-servicos-publicos. Acesso em: 25 nov 2024.
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