RESUMO: O presente estudo teve como desiderato a análise dos princípios do processo executivo à luz do Novo Código de Processo Civil. Para tanto, analisou-se de forma criteriosa os princípios específicos do processo de execução bem como se buscou fazer um paralelo em relação às modificações trazidas pela nova codificação processual brasileira.
Palavras-chave: princípios; processo de execução; Novo Código de Processo Civil.
INTRODUÇÃO
Inicialmente, cumpre ressaltar que princípios são o raio norteador a iluminar as condutas dentro da ciência jurídica na busca pela solução de conflitos e pacificação social. Quanto aos princípios da execução, existem princípios específicos que só vigoram no processo executivo, compondo este quadro os seguintes princípios: nulla executio sine titulo, desfecho único, disponibilidade da execução, menor onerosidade, patrimonialidade, ultilidade, lealdade e boa-fé processual, atipicidade dos meios executivos e contraditório.
NULLA EXECUTIO SINE TITULO
Primeiramente, quanto ao princípio da nulla executio sine titulo, ensina Luiz Fux (2007), ministro de nosso Superior Tribunal de Justiça, que não há execução sem título que a embase, uma vez que na execução, além da permissão para a invasão do patrimônio do executado por meio de atos de constrição judicial, o executado é colocado numa situação processual desvantajosa em relação ao exequente (NEVES, 2015).
Ensina ainda o ilustre Araken de Assis (2010) que a execução das prestações pecuniárias baseia-se em título judicial, isto é, não há como executar um sujeito de direito sem pretexto concreto e sedimentado – traduzido no título executivo – capaz de assegurar a existência de um crédito cediço a ser recebido pela pessoa do exequente.
Assim, esse princípio processual vem a conferir maior segurança jurídica ao executado, caso contrário, uma mera alegação fria e vazia de que o sujeito fosse devedor poderia levar a uma situação em que ele se tornasse réu em um processo de execução, situação desagradável que poderia culminar com a constrição judicial de seus bens. Dessa forma, exige-se que o título assegure ao menos uma probabilidade de existência de crédito.
Ao lado deste princípio encontra-se o nulla titulus sine lege que elenca, em numerus clausus, os títulos executivos previstos na legislação, sem que o acordo de vontades das partes possibilite a criação de um novo título executivo.
Interessante questão surge quanto à executoriedade das decisões interlocutórias que concedem a antecipação de tutela. Se a lei é taxativa e não prevê a decisão interlocutória como título executivo, não poderia esta ser executada. Parte da doutrina entende que há uma exceção baseada no princípio da “execução sem título permitida” pelo fato de que esta tutela de urgência é concedida somente quando há iminente probabilidade de o direito alegado pelo autor existir. Outra parcela da doutrina afirma que o termo “sentença proferida no processo civil” deve ser interpretado extensivamente, de modo a abranger as decisões interlocutórias. Portanto, executável é a decisão interlocutória que concede a antecipação de tutela.
DESFECHO ÚNICO
Quanto a este princípio, cumpre destacar que pelo fato de o processo de execução ter um único escopo, qual seja, satisfazer o direito do exequente, ele acaba por ter desfecho único, podendo este ser normal: sentença declaratória ou com final anômalo: consubstanciado na extinção sem a resolução do mérito ou acolhimento integral dos embargos à execução com fundamento na inexistência do direito material do autor.
Sendo assim, o executado nunca terá uma decisão de mérito ao seu favor, vez que não há discussão meritória, e, sim, uma busca da satisfação do direito do autor, ou seja, é impossível a improcedência, possuindo, pois, o processo desfecho único.
O Superior Tribunal de Justiça pacificou entendimento no que tange o reconhecimento da prescrição no próprio processo executivo. Segundo o tribunal, neste caso específico, será gerada decisão que resolve o mérito, apesar disso, o princípio em comento continua a valer como regra.
DISPONIBILIDADE DA EXECUÇÃO
Quanto à disponibilidade da execução, leciona o art. 775, NCPC: é permitido ao exequente desistir de toda a execução ou de apenas alguma medida executiva a qualquer momento – ainda que pendentes de julgamento os embargos à execução – não sendo necessária a concordância do executado, presumindo a lei sua aceitação, vez que não há possibilidade de tutela em seu favor. Isto é,
diversamente do que sucede no processo de conhecimento, em que ao réu assiste idêntico direito a um juízo de mérito, visando à eliminação da incerteza a seu favor, a execução só almeja o benefício do credor. Por isso, dela pode desistir sem o consentimento do adversário.
(ASSIS, 2010).
A desistência, instituto de direito processual, não se confunde com a renúncia, instituto de direito material. Desde que comprovada a quitação das custas judicias, pode, posteriormente, o executor ingressar com demanda idêntica.
São legitimados a desistir do processo de execução todos os legitimados a ingressarem com a ação, salvo o Ministério Público, vez que tutela interesse alheio.
Condicionada está a admissibilidade da desistência a não realização de atos que não possam sofrer anulação sem o prejuízo do devedor ou de terceiro. Ao lado disso, já quanto à pendência de julgamento de embargos de execução, esta não impede a desistência por parte do legitimado.
Se no caso os embargos versem apenas sobre a matéria processual, perderão seu objeto e logo serão extintos sem a resolução de mérito, e, caso versem sobre direito material a extinção dos embargos está condicionada à concordância do embargante.
Já quanto às defesas incidentais, por terem natureza incidental, é impossível a extinção da execução e a continuidade destas defesas. Então, se a defesa tiver conteúdo meramente processual, será extinta por perda superveniente de interesse, mas, se versar sobre direito material, a extinção dependerá da anuência do executado, que, se permanecer com o interesse no julgamento da defesa, impedirá a extinção da execução.
MENOR ONEROSIDADE
Este princípio processual vem como garantia de que o executado não sofra mais gravames do que o necessário para a satisfação do direito do exequente. Sempre que for possível a satisfação do direito do exequente por outros meios que sejam menos dolorosos ao executado estes devem ser adotados. A menor onerosidade vem como uma barragem a onda daqueles sujeitos que creem ser a execução um instrumento de vingança.
O art. 805 do Novo Código de Processo Civil prevê que “quando por vários meios o exequente puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o executado.”, positivando, assim, o princípio da menor onerosidade no código processualista.
Ao lado disso, outras duas previsões são feitas no código processualista que remetem a ideia da menor onerosidade no cumprimento da dívida ao credor, a ver: arts. 891 e 899, NCPC.
Este princípio veda a aplicação de medidas executivas incapazes de gerar satisfação ao direito do exequente, como entendimento pacificado do STJ de que são inaplicáveis as astreintes quando o cumprimento específico da obrigação se mostra impossível.
Por fim, quanto ao princípio da menor onerosidade deve restar cristalino que este princípio não sacrifica o princípio da efetividade da tutela executiva, sendo que o juiz, pautado pela razoabilidade e proporcionalidade, deverá encontrar um meio a evitar situações de sacrifício descomunais tanto ao exequente como ao executado.
PATRIMONIALIDADE
O princípio da patrimonialidade traduz a proibição da execução pessoal, isto é, a execução nunca poderá recair sobre o corpo do devedor como se costumava fazer com a Lei das XII Tábuas, na qual dividir o corpo do devedor em números que correspondessem o número de credores que ele tivesse à espera da satisfação de seu crédito era a regra.
Segundo o mestre Pontes de Miranda (2001) o executar é ir extra, é seguir até onde se quer. Compreende-se que se fale de execução, de ação executiva, quando se tira algo de um patrimônio e se leva para diante, para outro.
Portanto, a partir dos ensinamentos, resta cristalino que com o princípio da patrimonialidade no processo executório a execução passou a ser real, recaindo esta sobre os bens do executado. Interessante questionamento surge quanto à prisão civil do devedor de alimentos, não seria esta um tipo de execução pessoal?
Respondem os doutrinadores que a prisão civil não passa de uma mera medida de execução indireta por meio de pressão psicológica a fazer com que o devedor satisfaça o direito do exequente. O princípio da patrimonialidade vem como um importante marco na caminhada pelo abandono da execução como forma de vingança privada.
UTILIDADE
O princípio da utilidade vem como uma razão de ser do processo de execução, isto quer dizer, o processo de execução deve ter uma utilidade que traga benefícios ao exequente, fulminando com a satisfação do seu direito. Destarte, o processo de execução não tem seu escopo como um ato que vá prejudicar o devedor, mas sim na satisfação do direito do credor. Baseado neste princípio, o magistrado não deve submeter o exequendo às astreintes quando a obrigação é materialmente impossível.
Sendo assim, quando se entender que não há meios de satisfazer o direito do credor, não haverá razão na admissão da execução e na aplicação de meios executivos. Prevê o art. 836 do Novo Código de Processo Civil que “não se levará a efeito a penhora quando evidente que o produto da execução dos bens encontrados será totalmente absorvido pelo pagamento das custas da execução.”.
LEALDADE E BOA-FÉ PROCESSUAL
Quanto aos princípios da lealdade e boa-fé processual, reforçam eles a ideia de que o sujeito processual deve sempre agir pautado pela conduta leal e de boa-fé no transcorrer do processo. Leciona Alexandre Freitas Câmara (2015) que na execução se exige de todos os sujeitos do processo, inclusive e especialmente do executado, que atuem de forma cooperativa e de boa-fé. Portanto, existem sanções previstas no art. 774, NCPC para caso o sujeito processual aja de maneira desleal ou imbuído de má-fé, praticando os chamados atos atentatórios à dignidade da justiça.
Existem cinco espécies de atos atentatórios à dignidade da justiça, são eles: fraude à execução, oposição maliciosa à execução, com o emprego de ardis e meios artificiosos, resistência injustificada às ordens judicias, dificultar ou embaraçar a realização da penhora e quando intimado não indicar ao juiz quais são e onde estão os bens sujeitos à penhora e os respectivos valores, nem exibe prova de sua propriedade e, se for o caso, certidão negativa de ônus.
ATIPICIDADE DOS MEIOS EXECUTIVOS
Previstos em rol meramente exemplificativo, os meios executivos são os instrumentos pelos quais o direito do exequente será satisfeito. Este princípio, consagrado pelo art. 536, §1º do NCPC, ao se valer da expressão “entre outras medidas” permite ao juiz, no exercício de sua função, adotar outros meios executivos que não estejam expressamente previstos na legislação.
São previstas na legislação medidas como multa, penhora, expropriação, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras, impedimento de atividade nociva, entre outros.
Por fim, cumpre destacar que o Superior Tribunal de Justiça reconhece expressamente a existência deste princípio, que em oportunidade entendeu admissível o bloqueio ou sequestro de verbas públicas como medida coercitiva para o fornecimento de medicamentos pelo Estado, na hipótese em que a demora no cumprimento da obrigação acarrete risco à saúde e à vida do demandante (NEVES, 2015).
CONTRADITÓRIO
Ensina Fredie Didier Jr. (2014) que
a função jurisdicional realiza-se processualmente, isso significa dizer que o método de exercício do poder jurisdicional pressupõe a participação efetiva e adequada dos sujeitos interessados ao longo do procedimento. Este direito à participação efetiva é o direito ao contraditório.
No processo de execução, em razão de o magistrado partir de uma presunção de existência de direito do credor, sustenta-se que não há a presença da discussão meritória, fazendo com que o processo de execução fosse apelidado de “processo do credor”. Inclusive, uma doutrina hoje já superada, sustentava ser dispensável o contraditório no processo de execução.
No entanto, apesar dessas sustentações, sabe-se que o processo de execução possui natureza jurisdicional, sendo que, por isso, ficará sob o crivo do princípio constitucional do contraditório. Além disso, inegável a existência de cognição acerca das questões incidentais no processo nas quais haverá nulidade se não observado o princípio constitucional supramencionado. Exemplos de questões incidentais que devem se desenrolar sob o crivo do contraditório são: o preço vil na arrematação, a avaliação do bem, a alienação antecipada de bens, a modificação ou reforço da penhora, decisão acerca da natureza do bem penhorado, entre outros.
CONCLUSÃO
Por fim, conforme ensinamentos do professor Humberto Theodoro Júnior (2016) a nova lei institui um verdadeiro sistema de princípios que se soma às regras instituídas e, mais do que isso, lhes determina uma certa leitura, qual seja, uma leitura constitucional do processo. A partir disso, se constatou, felizmente, que o novo código não deixou a desejar ao permanecer com um perfil no qual os princípios tem vez como elementos constitucionais de garantia processual às partes que assim acabam por ter uma litigância justa e segura do ponto de vista jurídico-social.
REFERÊNCIAS
ASSIS, Araken de. Cumprimento de Sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2010.
BRASIL. Código de Processo Civil, Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13105.htm> Acesso em: 19 mar. 2016.
CÂMARA, Alexandre Freitas. O Novo Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015.
DIDIER JR, Fredie; OLIVEIRA, Rafael Alexandria de; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil. Vol. 5. Salvador: Juspodivm, 2014.
MIRANDA, Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. Tomo IX. Rio de Janeiro: Forense, 2001.
NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Manual de Direito Processual Civil. Salvador: Juspodivm, 2016.
THEODORO JÚNIOR, Humberto; NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre Melo Franco; PEDRON, Flávio Quinaud. Novo CPC: fundamentos e sistematização. Rio de Janeiro: Forense, 2016.
Acadêmica do Curso de Direito da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Foi estagiária de Direito junto à Advocacia-Geral da União (AGU). Pesquisadora junto ao grupo de pesquisa CNPq Centro de Culturas Jurídicas Comparadas, Internacionalização do Direito e Sistemas de Justiça (CCULTIS), vinculado aos Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Pesquisadora junto ao grupo de pesquisa A Refundação da Jurisdição e a Multidimensionalidade da Sustentabilidade, vinculado aos Cursos de Graduação e Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Membro integrante do Núcleo de Direito Previdenciário (NEDIPREV), da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SALLA, Camila Fenalti. Novo Código de Processo Civil: os princípios da execução à luz do NCPC Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 25 abr 2016, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46497/novo-codigo-de-processo-civil-os-principios-da-execucao-a-luz-do-ncpc. Acesso em: 22 nov 2024.
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