Resumo: O presente artigo tem como finalidade analisar a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do recurso extraordinário (RE) nº 669.069/MG, segundo a qual “É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil”. Demosntrar-se-á, através da análise dos fundamentos jurídicos fixado nos votos dos Ministros, qual o alcance e sentido atribuído ao texto da parte final do art. 37, §5º da Constituição Federal (CF/88), sem olvidar da análise doutrinária do tema e da tese contrária à adotada pelo STF, ventilada pela Advocacia Geral da União (AGU).
Palavras Chaves: Ação de ressarcimento ao erário. Interpretação da parte final do art. 37, §5º da Constituição Federal. Recurso Extraordinário nº 669.069/MG. Prescritibilidade da ação de ressarcimento ao erário em face do agente causador de dano. Preponderância do Princípio da segurança jurídica face ao princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.
01. Introdução:
O presente estudo trata do recente julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), do recurso extraordinário (RE) nº 669.069/MG, o qual enfrentou o sentido e o alcance, da parte final, do art. 37, §5º da Constituição Federal, segundo o qual “A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento”.
O debate se originou a partir da análise de um caso concreto em que a União ajuizou uma ação de ressarcimento em desfavor de uma empresa de transporte rodoviário e do condutor do veículo dessa empresa, por entender que houve culpa exclusiva do motorista do ônibus na batida contra uma viatura da Companhia da Divisão Anfíbia da Marinha, de propriedade da União, ocorrida em outubro de 1997, numa rodovia de Minas Gerais/MG.
A discussão foi levada a Corte Excelsa pela Advocacia Geral da União (AGU) após tanto o juízo de primeiro, quanto o de segundo graus (TRF da 1º Região), terem extinguido a ação de ressarcimento por danos causados ao patrimônio público em razão da prescrição da referida ação.
Como se verá, a controvérsia alusiva à questão apoiou-se, fundamentalmente, em duas teses opostas a saber, a que apregoa serem todas as ações de ressarcimento imprescritíveis, sejam provenientes de ilícitos civis propriamente ditos ou por ato de improbidade administrativa, e aquela que defende a prescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário quando provenientes de atos ilícitos, em sentido estrito.
Observar-se-á, de outra banda, que o objeto do julgamento do RE nº 669.069 nada mais significou do que o enfrentamento de técnicas e métodos hermenêuticos, destacando-se a interpretação literal, restritiva e sistemática da parte final do art. 37, §5º da CF/88. Ademais, e igualmente relevante, a solução do caso em tela perpassa pela ponderação de valores impingidos nos princípios da segurança jurídica e da supremacia do interesse público em face do interesse do particular.
02. Desenvolvimento:
2.1. A (im)prescritibilidade da ação de reparação de danos à Fazenda Pública ocasionada por ilícitos segundo a visão da doutrina.
Antes do estabelecimento das posições doutrinárias acerca do tema da imprescritibilidade das ações de ressarcimento pelo Poder Público, mister se faz conceituar prescrição. Nesse diapasão, importa fixar os ensinamentos de Maria Helena Diniz sobre o tema, in verbis:
“A violação do direito subjetivo cria para o seu titular a pretensão, ou seja, o poder de fazer valer em juízo, por meio de uma ação (em sentido material), a prestação devida, o cumprimento da norma legal ou contratual infringida ou a reparação do mal causado dentro de um prazo legal. Se o titular deixar escoar tal lapso temporal, sua inércia dará origem a uma sanção adveniente, que é a prescrição. A prescrição é uma pena ao negligente. É a perda da ação, em sentido material, porque a violação do direito é condição de tal pretensão à tutela jurisdicional.”
Interpretando-se a contrário senso o significado de prescrição é possível, e de dedução lógica, estabelecer que as pretensões imprescritíveis possam ser entendidas como aquelas em que não é possível se fixar prazo para que o titular do direito violado possa fazer valer seu direito de ação em face do causador do ato ilícito (em sentido amplo).
Cabe deixar assentado, por outro lado, que prescrição difere do instituto da decadência, porquanto esta é, em uníssono entendimento doutrinário, a perda do próprio direito em si, por não utilizá-lo no prazo estabelecido para o seu exercício.
Fixados conceitos e distinções envolvendo prescrição e decadência, ainda que açodadamente, apenas para situar o leitor, vez que o objeto central do presente estudo não requer conhecimentos mais aprofundados sobre aqueles institutos, importa trazer ao presente estudo dois entendimentos doutrinários relevantes em torno da questão da (im)prescritibilidade da ação de reparação do Poder Público contra o agente causador de dano ao erário.
Para José dos Santos Carvalho Filho, o intérprete deve observar, na interpretação da última parte do art. 37, §5º da CF/88, três aspectos. O primeiro deles é relativo a abrangência subjetiva da imprescritibilidade, que para o doutrinador alcança tão somente os agentes do Poder Público, ou seja, daqueles que, mediante título jurídico formal conferido pelo Estado, sendo servidores ou não, estejam no exercício de função pública. Aduz, com isso, que se o causador do dano for um terceiro sem vínculo com o Estado, não se aplica a regra da imprescritibilidade em questão, mas sim a regra geral prevista no art. 206, §3º, inciso V do Código Civil (prazo trienal).
O segundo aspecto abordado por Carvalho Filho é concernente aos sujeitos da garantia constitucional. Para ele, embora a CF/88 diga expressamente, a imprescritibilidade alcança apenas as pessoas jurídicas de direito público, ou seja, as pessoas federativas, autarquias e fundações autárquicas, e, por essa razão, não atingem as empresas estatais (empresas públicas e sociedades de economia mista), vez que possuem natureza de direito privado, o que não é abarcado tecnicamente pela expressão “agentes públicos” prevista no texto do art. 37, §5º da CF/88.
O último aspecto defendido pelo ilustre doutrinador na análise da regra em questão diz respeito a sua aplicabilidade, que, para ele, somente deve recair em caso de danos (prejuízos) advindos das condutas ilícitas de natureza civil.
Outra posição relevante sobre o tema é defendida por Celso Antônio Bandeira de Melo. Referido autor, registre-se, recentemente passou a enfrentar o tema de forma diversa daquela que vinha defendendo em suas obras. Até a 26ª edição de seu livro, o doutrinador admitira que adotava a posição pela imprescritibilidade de todas as ações de ressarcimento, não fazendo qualquer distinção, revelando posição prestigiadora de uma hermenêutica literal e ampliativa. Esse posicionamento, para o mesmo, ocorria ainda que de forma desconfortável, pois, segundo afirma, não compreendia como os herdeiros de quem estivesse incurso na hipótese poderiam ser acionados pelo Estado mesmo decorridas algumas gerações, o que geraria a mais radical insegurança jurídica.
A partir da 27ª edição do seu Curso de Direito Administrativo é que o autor posiciona-se de forma diversa daquela intelecção, passando a compreender que a parte final do texto do art. 37, §5º da CF/88 deveria ser interpretado restritivamente, para tão somente abarcar as ações de responsabilidade propriamente ditas, não alcançando ressarcimentos ao erário oriundas de ilícitos civis e administrativos. Assim, a ressalva para as ações de ressarcimento, impingida no texto constitucional, significaria que as mesmas terão prazos autônomos em relação aos que a lei estabelecer para as responsabilidades administrativa e penal.
Segundo argumenta o eminente jurista, a fixação da compreensão segundo a qual toda e qualquer ação de ressarcimento ao erário seria imprescritível esbarraria na garantia fundamental do direito a ampla defesa do causador do dano, já que o mesmo não poderia guardar provas eternamente, transmitindo-as de gerações a gerações, ao mesmo tempo em que feriria o princípio da segurança jurídica. Veja-se a lição do doutrinador acerca da mudança do seu entendimento inicial do tema em debate:
“Já não aderimos a tal desabrida intelecção. Convencemo-nos de sua erronia ao ouvir a exposição feita no Congresso Mineiro de Direito Administrativo, em maio de 2009, pelo juvem e brilhante professor Emerson Gabardo, o qual aportou um argumento, ao nosso ver irrespondível, em desfavor da imprescritibilidade, a saber: o de que com ela restaria consagrada a minimização ou eliminação prática do direito de defesa daquele a quem se houvesse increpado dano ao erário, pois ninguém guarda documentação que lhe seria necessária além de um prazo razoável, de regra não demasiadamente longo. De fato, o Poder Público pode manter em seus arquivos, por período de tempo longíssimo, elementos presentes para brandir suas increpações contra terceiros, mas o mesmo não sucede com estes, que terminariam inermes perante arguições desfavoráveis que lhes fizessem”. (pág. 1099).
Em conclusão do seu pensamento reformador, Celso Antônio Bandeira de Mello apregoa que a Constituição, ao estabelecer os casos de imprescritibilidade, o fez de forma expressa, como nos casos do art. 5º, incs. LII e LXIV da CF/88, em matérias alusivas ao direito penal, que nunca há de se eternizar.
Uma vez firmada a compreensão pela prescritibilidade das ações de ressarcimento oriundas de responsabilidade civil, o aludido jurista passou a entender que os prazos prescricionais das ações de ressarcimento por dano ao erário poderão ser de cinco ou dez anos, a depender, respectivamente, da boa ou má-fé do agente causador do dano, sempre contados a partir do término do mandato do governante em cujo período foi praticado o ato danoso, tudo conforme dicção do art. 54 da Lei 9.784/99 e art. 205 do Código Civil.
2.2. Análise do julgamento do RE nº 669.069/MG:
Conforme introduzido no presente estudo, o objeto central do julgamento do recurso extraordinário nº 669.069/MG, pelo Supremo Tribunal Federal, cingiu em se perquirir acerca do sentido e alcance da parte final do texto expresso do art. 37, §5º da Constituição Federal de 1988. Segundo o aludido dispositivo “A lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos praticados por qualquer agente, servidor ou não, que causem prejuízos ao erário, ressalvadas as respectivas ações de ressarcimento”.
A celeuma hermenêutica fora debatida no âmbito de uma ação de responsabilidade civil em que a União Federal, intentando contra uma empresa de transportes rodoviário e o motorista do ônibus causador do dano contra um veículo pertencente à frota da Marinha do Brasil, pleiteou, mais de cinco anos após o evento danoso, o ressarcimento do dano causado ao erário no acidente ocorrido em Minas Gerais.
Em disputa, encontravam-se duas teses interpretativas da parte final do art. 37, §5º da CF/88, a saber: a defendida pelos autores da ação, Advocacia Geral da União, apoiada numa leitura literal e ampliativa do dispositivo, resultando na ideia de imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário, oriunda de danos causados por qualquer espécie de ilícito, seja civil, administrativo ou penal; bem como aquela advogada pela empresa privada de transporte rodoviário, representada pelo Ex-ministro do STF, Carlos Veloso, a qual se apoiava na prescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário, quando o dano originasse-se de ilícito civil, como ocorrera na espécie.
O debate chegou as portas da Corte Excelsa após o Juízo Federal sentenciante ter acatado a tese da prescritibilidade da ação ressarcitória e o Tribunal Regional Federal da primeira região ter corroborado a mesma.
A relatoria do recurso extraordinário ficou a cargo do Ministro Teori Zavascki, que adotou, ao final do julgamento, a seguinte tese sobre o caso: “a imprescritibilidade a que se refere o art. 37, § 5º, da CF diz respeito apenas a ações de ressarcimento de danos ao erário decorrentes de atos praticados por qualquer agente, servidor ou não, tipificados como ilícitos de improbidade administrativa ou como ilícitos penais”.
Referido entendimento conclusivo do relator fora construído a partir de uma hermenêutica jurídica restritiva do art. 37, §5º da CF/88. É que, segundo argumentou o ministro, a regra na Constituição é a prescritibilidade, razão pela qual deveriam ser excepcionais os casos alusivos a imprescritibilidade mencionada naquela norma.
Indo mais além no seu pensamento, o Min. Teori Zavascki preconizou em seu voto que o alcance do art. 37, §5º da CF/88 deve ser buscado com a do parágrafo anterior (§4º), que trata das ações de improbidade, passando a adotar o mesmo entendimento fixado pela Corte Cidadã (STJ), para quem o ressarcimento dos danos ao erário somente alcança os casos originados a partir das ações de improbidade administrativa. Estabeleceu, ademais, mencionando o pensamento do Ministro Cezar Puluzo no julgamento do MS nº 26210, que a imprescritibilidade alcançaria, igualmente, os danos ocasionados por ilícitos penais.
Aduz Zavascki, relativamente a parte final do art. 37, §5º da CF, destinada ao legislador ordinário, que o que se mostra mais consentâneo com o sistema de direito, inclusive o constitucional, que consagra a prescritibilidade como princípio, é atribuir um sentido estrito aos ilícitos de que trata o §5º do art. 37 da Constituição Federal.
Dessa maneira, defende o relator, o ilícito civil, por não se revelar conduta revestida de grau de reprovabilidade mais pronunciado, nem se mostrar atentatório aos princípios constitucionais aplicáveis à Administração Pública, não seria possível se submeter a demanda à regra excepcional da imprescritibilidade. Por fim, conclui que deve ser aplicado ao ressarcimento das ações de reparação de dano contra à Fazenda Pública o prazo prescricional comum para as ações de indenizações por responsabilidade civil em que o Poder Público figure como autor.
Corroborando a posição do relator, no que diz respeito a imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário originárias das ações de improbidade, o ministro Luiz Fux aduz que é possível que uma ação de improbidade administrativa já prescrita (prazo de 5 anos da Lei de improbidade) não estenda seus reflexos (efeitos) sobre o ressarcimento ao erário, que é imprescritível porque, segundo ele, há uma superproteção constitucional do erário na CF/88.
Na mesma linha de defesa da limitação do alcance do lapso temporal das ações de ressarcimento ao erário, o ministro Marco Aurélio, no seu voto, propõe a seguinte indagação “Será que, considerada a Carta que se disse cidadã, que trouxe ares democráticos, tem-se esse poder insuplantável do Estado, de deixar que permaneça sobre a cabeça daquele obrigado a ressarcir uma verdadeira espada de Dâmocles?”.
Referido ministro, ainda em seu raciocínio jurídico, conclui seu voto mencionando que ninguém guarda documentos eternamente, referindo-se que o entendimento da imprescritibilidade da ação de ressarcimento por danos causados por ilícito civil inviabiliza o direito de defesa, ideia essa já defendida pela doutrina.
O ministro Luiz Roberto Barroso pontuou na sua manifestação sobre o tema que “a regra geral no Direito Brasileiro é a prescritibilidade, salvo as exceções inequívocas, que estão na Constituição, que são: o crime de racismo e as ações de grupos armados contra o Estado democrático e contra a Constituição”. O mesmo sustentou tese mais restrita do que aquela sugerida pelo relator (que afirmava ser a imprescritibilidade alcançada para a reparação de danos oriunda de ilícitos criminais e das ações de improbidade), tendo estabelecido que o caso descrito nos autos do RE 669.069/MG não permitiria concluir daquela forma, já que não fora dado as partes o contraditório da matéria. Acompanharam tal entendimento os ministros Luiz Fux e Rosa Weber. Com isso, não seria possível se fixar o entendimento de que as ações de ressarcimento ao erário, por danos causados em razão de atos de improbidade administrativa, seriam ou não imprescritíveis, estando essa questão, atualmente, pendente de enfrentamento pelo STF.
Trilhando igualmente o caminho da prescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário, o voto da ministra Carmen Lúcia faz menção a doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello que, alterando seu entendimento anterior, entendeu que a CF trabalhou com a ideia de imprescritibilidade limitada, somente sendo possível tal aplicação nos casos expressamente listados na CF. Argumenta em seu raciocínio que “não é do homem médio guardar, além de um prazo razoável, a documentação necessária para uma eventual defesa, aduzindo que hoje nem a lei assim estabelece” (inviabilização do direito de defesa).
Diversamente da compreensão adotada pelos mencionados ministros do STF, o Ministro Edson Fachin filia-se a compreensão concebida pela Advocacia Geral da União (AGU), tendo entendido que a imprescritibilidade referida no art. 37, §5º da Carta Maior refere-se a todo e qualquer ato ilícito, não só para atos de improbidade ou ilícitos criminais, pois, segundo ele, a Constituição Federal não exclui qualquer tipo de ato ilícito da imprescritibilidade, não sendo legítimo ao intérprete excluir o que a lei maior não excluiu.
Advoga Fachin que (i) não é possível se restringir a natureza do ilícito mencionado no texto do art. 37, §5º da CF, pois o próprio constituinte assim não o fez; (ii) o termo “agente” expresso naquele dispositivo deve ser entendido de forma ampla, como aquele que pratica ato ilícito e causa prejuízo ao erário, podendo recair sobre particulares; (iii) não é correto se fazer a leitura conjunta do art. 37,§5º e §4º da CF para conferir interpretação restritiva à impossibilidade da ação de ressarcimento; (iv) a interpretação restritiva, ao invés de favorecer o princípio da segurança jurídica, o desfavorece, além de que impede que o dispositivo cumpra a sua função de tutela da coisa pública.
Nesse diapasão, interessa reproduzir interessante trecho do voto daquele ministro, por revelar-se, nele, o núcleo da sua argumentação, veja-se:
“Ao estabelecer que a imprescritibilidade da ação de ressarcimento ao erário se aplica apenas aos casos de improbidade, quando houver o decurso do prazo prescricional relativo aos atos de improbidade, automaticamente fica-se impossibilitado de se propor a ação de ressarcimento, ainda que essa seja considera imprescritível, pois o juízo a julgar a ação de ressarcimento não poderá inferir que os supostos atos ilícitos se enquadravam como atos de improbidade tendo em vista o decurso do prazo prescricional da possível ação de improbidade. O mesmo ocorrerá nos casos de ilícito penal quando a ação de ressarcimento for proposta após, por exemplo, o reconhecimento da prescrição da pretensão punitiva. Não poderia o juiz cível verificar a adequação típica de tal fato como um ilícito penal, o que, por consequência, inviabiliza o ressarcimento”.
Com isso, o ministro Edson Fachin, ao final de seu voto divergente propôs a fixação da seguinte tese: “A imprescritibilidade da pretensão ao ressarcimento ao erário prevista no art. 37, §5º da Constituição da República, alcança todo e qualquer ilícito, praticado por agente público, ou não, que cause prejuízo ao erário”.
Vistas as argumentações e posicionamentos dos ministros do STF, percebe-se que o deslinde da questão de fundo restringiu-se a aferir a preponderância entre duas técnicas hermenêuticas, uma restritiva e outra ampliativa (literal). Venceu a técnica da interpretação restrita, isto é, aquela segundo a qual a parte final do art. 37,§5º da CF/88, quanto a imprescritibilidade, não alcança os atos ilícitos civis. Nesse contexto, melhor razão teve o ministro Roberto Barroso, o qual acabou por fazer prevalecer a tese vencedora: “É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil”.
03. Conclusão:
Uma vez estabelecidos os posicionamentos e nuances doutrinárias e jurisprudenciais em torno da imprescritibilidade das ações de ressarcimento ao erário, em razão da interpretação do texto oriundo do art. 37, §5º da Constituição, foi possível perceber, através da análise do julgamento do RE 669.069/MG pelo STF, que a interpretação literal do texto constitucional não mostrou-se como a mais acertada para o presente caso, já que, quando invocada, fora vencida.
Restou patente, através de um juízo mais racional e sistêmico, que a melhor técnica adotada para o caso privilegiou uma análise racional e uma visão una da Constituição Federal, já que a impossibilidade de prescrição das ações reparatórias de danos não alcança toda e qualquer ação que tenha gerado danos ao patrimônio público, vez que exclui aquelas oriundas de ilícitos civis, conforme restou apregoado nos votos vencedores naquele julgamento.
Bem de ser e, por tudo quanto exposto, conclui-se que, atualmente, o STF passou a adotar nova leitura do art. 37,§5º da CF/88, vez que passou a seguir a doutrina de Celso Antônio Bandeira de Mello, compreendendo o dispositivo a partir da leitura, essa sim literal, da seguinte tese: “É prescritível a ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil”.
REFERÊNCIAS
FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo, 30. Ed. São Paulo: Atlas, 2016.
DINIZ, Maria Helena. Direito Civil Brasileiro, 22. Ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
BARROSO, Luís Roberto. Curso de Direito Constitucional Contemporâneo, 5. Ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
LENZA, PEDRO. Direito Constitucional Esquematizado. 19. Ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
RE 669.069/MG, Relatoria do Ministro Teori Zavascki, julgado em 03.02.2016, Dje 24.02.2016.
Técnico Judiciário do TRE/RN. Graduado em Direito pela Universidade Federal do RN e Especialista em Direito Público pela Universidade Anhaguera/MG.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Paulo Roberto Almeida e. A prescritibilidade da ação de reparação de danos à Fazenda Pública decorrente de ilícito civil e o STF. Análise do RE 669.069/MG Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 jun 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46850/a-prescritibilidade-da-acao-de-reparacao-de-danos-a-fazenda-publica-decorrente-de-ilicito-civil-e-o-stf-analise-do-re-669-069-mg. Acesso em: 22 nov 2024.
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