RESUMO: A Anulação, também conhecida como Invalidação, é uma espécie de extinção do Ato Administrativo, que pode decorrer de uma ilegalidade ou de uma ilegitimidade, caso em que há violação de princípios, atingindo os atos vinculados ou discricionários, quando ilegais. A competência para a Anulação dos atos administrativos é da Administração Pública e do Poder Judiciário, quando provocado. Em regra, a anulação gera efeitos “ex tunc”, ou seja, retroativos, pelo fato de não gerarem efeitos jurídicos válidos desde o momento da prática da ilegalidade. Contudo, se o ato administrativo for ilegal, mas, gerar efeitos favoráveis ao beneficiário, os chamados Atos Ampliativos, decorrerão efeitos “ex nunc”, para o futuro, em atenção ao princípio da Segurança Jurídica, da Boa-Fé e da Vedação ao Enriquecimento Ilícito do Estado. Em decorrência disto, o presente artigo visa a análise da hipótese de restrição à anulação dos Atos Ampliativos, ainda que ilegais, quando ultrapassados 5 (cinco) anos da sua prática e seus efeitos, operando-se a decadência do direito de anulá-lo, como determina o artigo 54 da Lei 9.784/99, o que não ocorre em caso de má-fé.
Palavras-Chaves: Anulação – Invalidação – Extinção do Ato Administrativo – Ato Ampliativo – Decadência – Efeitos.
ABSTRACT: The Annulment, also known as invalidation, is a kind of extinction of the Administrative Act, which may result from an illegality or illegitimacy, in which case there is violation of principles, reaching linked or discretionary acts when these are illegal. The jurisdiction to administrative acts' annulment it's a responsability of the Public Administration and the Judiciary, when provoked. As a rule, the cancellation generates effects "ex tunc", which means retroactive, by the fact it does not generate valid legal effect from the moment of the unlawful practice. However, if the administrative act is illegal, but generate favorable effects on the recipient, the so-called Acts Ampliative, it will take effect "ex nunc" for the future in regard to the principle of Legal Security, Good Faith and the Illicit Enrichment Seal of the State. As a result, this article aims to analyze the possibility of restricting the annulment of Ampliative Acts, although illegal, when exceeded five (5) years from it's practice and it's effects, operating the decay of the right to annul it, as required by Article 54 of Brazilian Law 9.784/99, wich does not occur in case of bad faith.
Keywords: Annulment - Invalidation - Extinction of Administrative Act - Ampliative Act - Decay – Effects.
SUMÁRIO: 1. Introdução 2. Atos Administrativos 2.1 Observância da Lei 2.2 Atos Vinculados 2.3 Atos Discricionários 3. Controle sobre a Atuação Administrativa 3.1 Controle Judicial 3.2 Controle Administrativo 3.3 Tutela 3.4 Autotutela 4. Anulação 4.1 Em face de Ilegalidade 4.2 Em face de Ilegitimidade 4.2 Efeitos “ex tunc” 5. Atos Ampliativos 5.1 Efeitos favoráveis ao beneficiário 5.2 Efeitos “ex nunc” 5.3 Princípios da Boa-Fé, Segurança Jurídica e Vedação ao Enriquecimento Ilícito do Estado 5.4 Restrição à anulação do Ato Ampliativo (Artigo 54 da Lei 9784/99) 5.5 Possibilidade de anulação do Ato Ampliativo caso comprovada a Má-Fé 6. Considerações Finais REFERÊNCIAS.
1. INTRODUÇÃO
O Direito Administrativo é um ramo do direito público que rege as relações jurídicas travadas entre a Administração Pública e os particulares ou a própria Administração. De modo que, corresponde ao exercício da função administrativa, função esta que corresponde aos atos que a própria administração pratica para exercer a sua potestade pública.
A função administrativa pode ser exercida pelo Poder Executivo de forma típica, ou pelo Poder Legislativo e Judiciário. Nesse sentido, tem-se que os atos correspondem a condutas humanas, e, os fatos são acontecimentos. Assim, ambos podem ser jurídicos, desde que gerem consequências ao mundo do direito.
O Ato Administrativo é aquele praticado em nome da Administração Pública através de uma conduta humana, sob a égide do direito público e suas particularidades, sujeitando-se a um sistema de controle.
A Atuação Administrativa deve decorrer sempre de observância legal. Desta forma, o ato administrativo pode ser praticado de forma vinculada ou discricionária. O Ato Vinculado, para ser praticado, deve obedecer a todos os requisitos estabelecidos pela lei, devendo abranger a todos os seus elementos de formação. O Ato Discricionário, por sua vez, pode obedecer a apenas alguns dos requisitos estabelecidos pela lei, de modo que dá à autoridade margem de escolha, por isso, discricionário, mas não hierárquico.
O gestor então, no Ato Discricionário, valora critérios de Conveniência e Oportunidade, que compõem o mérito do ato administrativo. Nesse diapasão, tem-se que a atuação administrativa está sujeita a um sistema de controle, que pode ser Judicial ou realizado pela própria Administração Pública.
O Controle Judicial se trata daquele que o Poder Judiciário realiza sobre os atos administrativos, podendo anulá-los em caso de ilegalidades e/ou ilegitimidade, ocasionada pela inobservância de princípios administrativos.
Entretanto, o Controle também pode ser Administrativo, ou seja, realizado pela própria Administração, que pode anular e revogar seus próprios atos. A Revogação dos Atos Administrativos ocorre por questões de mérito, ou seja, oportunidade e conveniência, que dão ao gestor possibilidade de escolha na prática do ato.
Nesse sentido, tem-se que os Atos Ampliativos, são aqueles atos que geram efeitos favoráveis aos beneficiários e dilatam a sua esfera jurídica, dando prerrogativas aos destinatários. Contudo, se deles decorrerem ilegalidades podem ser anulados, por exemplo, no caso de ingresso à cargo público sem a devida aprovação em concurso público, que é regra constitucional.
Os Atos Ampliativos possuem efeitos ex nunc, ou seja, para o futuro. De modo que só podem ser questionados em seus efeitos futuros, excluindo-os os efeitos pretéritos, por observância aos Princípios da Vedação ao Enriquecimento Ilícito do Estado, da Segurança Jurídica e da Boa Fé. Entretanto, estes atos podem ser anulados diante de ilegalidade e ilegitimidade.
O artigo 54 da Lei 9.784/99, que trata sobre o Processo Administrativo na Esfera Federal, determinada a vedação à anulação de Atos Ampliativos no prazo decadencial de 5 (cinco) anos, salvo comprovada má-fé, caso em que poderá ser anulado a qualquer tempo. Assim, tem-se que os Atos Ampliativos não podem ser anulados, ainda que ilegais, quando ultrapassarem 5 (cinco) anos de sua prática.
Nesse sentido, a presente monografia tem por objetivo uma análise doutrinária e jurisprudencial acerca dos Atos Ampliativos, aprofundando na possibilidade da anulação do ato e sua restrição, de modo à possibilitar um estudo sobre a matéria através de conceitos e julgados.
2. ATOS ADMINISTRATIVOS
Os Atos Administrativos são declarações jurídicas do Estado, que produzem efeitos no mundo jurídico, praticados por quem atue em seu nome para o exercício de suas atribuições e prerrogativas públicas. Nesse sentido, pode-se afirmar que o Estado possui poderes e sujeições para a concretização de suas funções e os direitos fundamentais. As sujeições são limitações ao poder-dever para evitar abusos de poder pelo Estado.
Os atos administrativos, desta forma, decorrem da Atuação Administrativa visando o atendimento da sua função administrativa, seja ela jurídica ou não, de modo a executar as leis. São compostos por elementos ou requisitos, que os integram, sendo eles: o sujeito/competência, ou seja, quem pratica o ato; a forma, que pode ser solene ou livre, determinando como o ato deve ser praticado; o objeto/conteúdo, que corresponde a declaração jurídica que emana do ato administrativo, de modo que deve ser legal, moral, possível e determinado; motivo, que tratam dos pressupostos de fato e de direito antecedentes que levam à prática do ato administrativo; e a finalidade, que corresponde ao alcance do ato, que deve sempre ser a consecução do interesse público, sendo portanto, sua condição de validade.
Além dos elementos, que os integram, os atos administrativos também são compostos por atributos, que os melhoram, de forma que são Imperativos, Autoexecutórios, Exigíveis e Típicos, de modo que podem ser impostos aos particulares sem anuência dos mesmos, justificando a Supremacia do Interesse Público sobre o Interesse Privado, e a consecução do interesse público, que é a finalidade do ato administrativo.
De acordo com entendimento de ELYESLEY NASCIMENTO, tem-se que:
“Isso posto, podemos definir o ato administrativo como a manifestação unilateral de vontade da Administração ou de quem lhe faça às vezes, sob a orientação do regime jurídico-administrativo e subordinada a lei, que tenha por fim a produção de efeitos jurídicos e seja sempre sujeita ao controle pelo Poder Judiciário”. (NASCIMENTO, 2013, p. 271).
Assim, tem-se que o ato administrativo é o ato praticado em nome da Administração Pública, de forma unilateral, em que se deve sempre estar adstrito à observância de lei e ao interesse público, exercendo o dever do Estado de zelar pelo bem estar coletivo, concretizando utilidades públicas.
Os poderes administrativos são fundamentais para o alcance do interesse público. O administrador não pode deixar de agir quando deve, por isso alguns doutrinadores o denominam de poder-dever. Assim, é um instrumento, de modo que a lei impõe uma atuação ao agente público, que se não a cumprir será omisso, irregular. Contudo, em certas situações o gestor deve se limitar em atender à legalidade do ato diante da prevalência da segurança jurídica dos atos praticados pela Administração Pública.
O doutrinador HELY LOPES MEIRELLES, não se distancia do conceito acima descrito, determinando que:
“ato administrativo é toda manifestação unilateral de vontade da Administração Pública que, agindo nessa qualidade, tenha por fim imediato adquirir; resguardar; transferir; modificar; extinguir e declarar direitos, ou impor obrigações aos atos administrados ou a si própria”. (MEIRELLES, 2008, p.152).
Estabelecendo também, que o ato administrativo decorre de manifestação unilateral de vontade da Administração, de modo a impor obrigações ou declarar direitos para o bem-estar coletivo. Nesse sentido, os atos administrativos estão sujeitos a um sistema de controle, que pode partir tanto da própria Administração Pública, do Poder Judiciário e até do Poder Legislativo em certas ocasiões.
2.1 Observância de lei
No que tange a observância de lei, os atos administrativos devem sempre estar em consonância com os princípios, principalmente com o Princípio da Legalidade, por implicar numa atuação conforme a lei e o direito, e, vez que, os princípios da administração pública integram o regime jurídico administrativo.
Os princípios estão consagrados na Constituição da República Federativa do Brasil, no caput do artigo 37, abaixo transcrito:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência [...]”. (CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, 1988).
Nesse sentido, tem-se por primordial a atuação da Administração Pública conforme os ditames legais, estabelecidos por leis gerais ou próprias, no que tange à determinados atos. Os atos administrativos devem estar sempre respaldados em lei, para que possam produzir efeitos jurídicos válidos. E assim, deverão estar sempre embasados em lei, caso contrário, serão extintos, por via da Anulação.
O princípio da legalidade é uma garantia geral que limita o poder do Estado, protegendo os direitos fundamentais contra o abuso de poder do Estado. A lei é um espaço normativo, no qual o agente deve agir ou não agir com finalidade prevista em lei e de acordo com o interesse público.
Portanto, para desempenhar suas funções, a Administração Pública possui poderes que lhe dão a prerrogativa de interferir na esfera privada, diante do Princípio da Supremacia do Interesse Público sobre o Interesse Privado, prerrogativas estas que são regradas, para que não haja imposição de ilegalidades, como abusos de poder e arbitrariedades estatais.
2.2 Atos Vinculados
Os atos vinculados são aqueles que obedecem a todos os requisitos estabelecidos em lei para que sejam praticados, não permitindo possibilidade de escolha ao gestor público, que fica adstrito aos seus elementos para que seja praticado.
Nesse diapasão, na atuação vinculada não há realização de juízo de valor pelo gestor público, de modo que, consequentemente não há possibilidade de análise de conveniência e oportunidade (mérito do ato administrativo). Preenchidos os requisitos legais o administrador é obrigado a praticar o ato.
Em caso de inobservância de algum elemento, o ato é anulável, por ilegalidade quando violar lei ou por ilegitimidade, quando violar os princípios do direito administrativo, que compõem o chamado Regime Jurídico de Direito Público, como leciona o professor JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO:
Desse modo, é o regime jurídico de direito público que rege basicamente os atos administrativos, cabendo ao direito privado fazê-lo supletivamente, ou seja, em caráter subsidiário e sem contrariar o regramento fundamental específico para os atos públicos. (CARVALHO FILHO, 2009, p. 96,97).
Ainda, aos ensinamentos de MARIA SYLVIA DE PIETRO, os atos são vinculados porque:
“a lei não deixou opções; ela estabelece que, diante de determinados requisitos, a Administração deve agir de tal ou qual forma. Por isso mesmo se diz que, diante de um poder vinculado, o particular tem um direito subjetivo de exigir da autoridade a edição de determinado ato, sob pena de, não o fazendo, sujeitar-se a correição judicial”. (ZANELLA DI PIETRO, 2014, p. 221)
Nesse sentido, é patente a obrigatoriedade de o gestor público atuar de determinada forma, não havendo margem de escolha, sob pena de sanção, uma vez que a lei determina que ele atue de tal forma, não permitindo que o faça de outro modo. Assim, pode-se concluir que a lei estabelece todos os requisitos para que o ato seja praticado sendo, portanto, vinculado aos seus elementos.
2.3 Atos Discricionários
Os atos discricionários, por sua vez, dão opção de escolha ao gestor público para a prática do ato, de modo que, ele se vincula a apenas alguns requisitos legais. Utiliza o mérito para a prática do ato administrativo, composto por critérios de conveniência e oportunidade.
Conforme os entendimentos de professora MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO:
“a lei deixa certa margem de liberdade de decisão diante do caso concreto, de tal modo que a autoridade poderá optar por uma soluções possíveis, todas válidas perante o direito. Nesses casos, o poder da Administração é discricionário, porque a adoção de uma ou outra solução é feita segundo critérios de oportunidade, conveniência, justiça, equidade, próprios da autoridade, porque não definidos pelo legislador”. (ZANELLA DI PIETRO, 2014, p. 221).
Nesse sentido, tem-se que, embora discricionário, o gestor não está totalmente livre para exercer o ato, caso em que se configuraria uma arbitrariedade, o que não se confunde com discricionariedade, pelo fato de que os atos discricionários não podem ultrapassar os limites legais, caso em que se configuraria a atuação arbitrária, de modo a se contrapor à lei.
Assim, a atuação discricionária justifica-se pela impossibilidade de o gestor prever todas as situações que poderiam ocorrer, de modo que, atua com a finalidade de atender as necessidades sociais, com liberdade para escolher a melhor solução para o caso concreto e para a coletividade, dando-lhe margem de escolha para atuar conforme cada situação específica.
A margem de escolha deve se pautar em razoabilidade e proporcionalidade para a prática do ato. O gestor público deve praticar o ato visando sempre o interesse público, critérios mais convenientes e oportunos para que atinja sua finalidade da melhor forma em cada caso concreto.
Sob os atos discricionários não incide sistema de controle pelo Poder Judiciário, isto porque, o magistrado não pode adentrar no mérito da Administração Pública. Contudo, o Poder Judiciário pode analisar o ato administrativo se este for ilegal, decidindo apenas por ilegalidades, o que acarreta na Anulação do ato discricionário se tiver sido cometido com alguma contrariedade à lei ou a princípios.
Nesse sentido, pode-se afirmar que a atuação discricionária pressupõe um juízo subjetivo na escolha dos motivos e na valoração dos objetos, elegendo as medidas consideradas idôneas para a satisfação da finalidade pública em face do caso concreto.
A discricionariedade decorre de um fato, somado com a lei e com o interesse público, incidindo sobre a zona neutra do ato, possibilitando a liberdade de escolha do gestor.
3. CONTROLE SOBRE A ATUAÇÃO ADMINISTRATIVA
É de suma importância realizar a distinção entre Atos Vinculados e Atos Discricionários. Isto porque, apenas sob determinados atos podem incidir o sistema de controle pelo Poder Judiciário, enquanto que, a Administração Pública pode controlar seus próprios atos, seja por motivos de ilegalidade e/ou ilegitimidade e motivos de conveniência e oportunidade.
Em se tratando de mérito, o Poder Judiciário não pode a ele se contrapor pelo fato de o gestor ser dotado de possibilidade de escolha na prática do ato, ou seja, o Poder Judiciário só poderia anular um ato discricionário em caso de ser um ato ilegal, ou por não terem os seus requisitos obrigatórios cumpridos.
3.1 Controle Judicial
O controle judicial através da anulação do ato administrativo, apenas pode efetivar-se sobre atos ilegais ou ilegítimos (que violem princípios). De modo que, o controle judicial não pode incidir sobre o mérito do ato, podendo controlá-los apenas sobre seus vícios de ilegalidade e ilegitimidade.
Nesse sentido, MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO leciona que:
“Com relação aos atos discricionários, o controle judicial é possível, mas terá que respeitar a discricionariedade administrativa nos limites em que ela é assegurada à Administração Pública pela lei. Isso ocorre precisamente pelo fato de ser a discricionariedade um poder delimitado previamente pelo legislador; este, ao definir determinado ato, intencionalmente deixa um espaço para a livre decisão da Administração Pública, legitimando previamente a sua opção; qualquer delas será legal.” (ZANELLA DI PIETRO, 2014, p. 229).
Assim, é patente a impossibilidade de o Poder Judiciário anular os atos discricionários por questão de mérito, podendo apenas fazê-lo quando se trata de ato que contrarie a lei, através da anulação.
Já em relação aos atos vinculados, o Poder Judiciário não tem restrição para analisá-los, uma vez que seus requisitos decorrem diretamente da lei, de modo que se não houver observância dos seus requisitos serão de pronto ilegais, podendo ser anulados pela Administração pública a qualquer tempo, conforme entendimento sumulado pelo Supremo Tribunal Federal.
3.2 Controle Administrativo
O Controle Administrativo pode incidir tanto sobre os atos vinculados como sobre os atos discricionários, de modo que pode, entre outras modalidades de extinção do ato administrativo, Anulá-los ou Revogá-los, espécies de retirada.
A Anulação, como citado anteriormente, ocorre quando houver ilegalidade ou ilegitimidade (violação à princípios) na pratica do ato, produzindo efeitos ex tunc, ou seja, retroativos, tanto pela Administração Pública como pelo Poder Judiciário.
A Revogação por sua vez, incide sobre os atos discricionários, em que, em razão do mérito (conveniência e oportunidade) podem ser realizados apenas pela Administração Pública, que revoga os seus próprios atos com efeitos ex nunc, ou seja, para o futuro. Contudo, a lei não poderá prejudicar o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada.
A respeito da Revogação não há divergência doutrinária, de acordo com entendimento de MARIA SYLVIA (2014, p. 247) “revogação, em que a retirada se dá por razões de conveniência e oportunidade.”. Em relação à Anulação, também denominada de Invalidação, MARIA SYLVIA (2014, p.248) “o desfazimento do ato administrativo por razões de ilegalidade.”.
Assim, na esfera federal, determina o artigo 53 da Lei 9.784/99 (Lei do Processo Administrativo na Esfera Federal) que:
“A Administração Pública deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos”. (LEI FEDERAL 9.784 de 29 de janeiro de 1999)
Conforme entendimento sumulado do Supremo Tribunal Federal, tem-se que a Administração Pública pode anular seus próprios atos quando ilegais, e revogá-los quando inconvenientes ou inoportunos, exercendo o seu poder de Autotutela.
É o que se vê das Súmulas expostas:
“Súmula 346 do STF: A administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos.”
“Súmula 473 do STF: A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial”.
A Administração Pública, então, exerce controle sobre os seus próprios atos, de modo que a não observância dos requisitos legais pelo gestor podem acarretar na extinção do ato administrativo, tornando-os sem efeitos jurídicos válidos.
3.3 Tutela
A Tutela corresponde ao controle que a Administração Pública Direta realiza sobre a Administração Pública Indireta, sem hierarquia, de modo que, trata-se de princípio basilar da descentralização, essencial no que se trata da especialidade e legalidade da função a ser exercida pelas entidades das Administração Indireta, não podendo ser confundida com a Autotutela.
A Tutela tem como objetivo a supervisão da Administração Direta sobre a Administração Indireta, justificando a especialidade de cada entidade, que fora criada em prol do interesse público e do interesse social, que na esfera federal é denominada de Supervisão Ministerial.
3.4 Autotutela
A Autotutela corresponde ao controle que a Administração Pública faz sobre seus próprios atos, anulando-os quando ilegais e/ou ilegítimos e revogando-os quando inconvenientes e/ou inoportunos.
A Autotutela se materializa pelo entendimento consagrado do Supremo Tribunal Federal nas Súmulas 346 e 473, e também pela determinação legal do artigo 53 da Lei 9.784/99 (Lei do Processo Administrativo na Esfera Federal), transcritos acima, devendo respeitar os direitos adquiridos de modo a não causar prejuízo aos beneficiários de boa-fé.
Nesse sentido, pode-se afirmar que a Administração pública pode adotar medidas visando sanar a irregularidade do ato administrativo, sem provocação necessária, podendo atuar de ofício. Esse entendimento majoritário reforça o princípio da Autotutela da Administração Pública, sendo um poder-dever. Ou seja, não é uma mera faculdade. A Súmula refere-se a “poder”, mas diante de uma irregularidade, a administração deve agir, pois não pode se manter inerte, nem atuar com desinteresse.
Conforme o entendimento de DIRLEY DA CUNHA JÚNIOR:
“Pelo princípio da Autotutela, a Administração Pública pode, diretamente sem intervenção do Poder Judiciário, rever os seus próprios atos, para corrigi-los, seja quando não mais convenientes e oportunos, seja quando ilegais. Desse modo, pode a Administração Pública revogar os seus atos administrativos por razões de conveniência e oportunidade ou invalidá-los (ou anulá-los como tradicionalmente se diz), quando eivados e ilegalidade.” (JUNIOR, 2010, p. 921)
Considerando que o Direito Administrativo não possui codificação específica, o controle, inclusive judicial, da atuação administrativa se realiza também em razão da observância das leis e dos princípios, que integram assim o chamado Regime Jurídico Administrativo, aplicados dessa forma na ausência de lei, visando viabilizar o controle e o atendimento do interesse público, que é indisponível, conforme o princípio implícito da Indisponibilidade do Interesse Público.
4. ANULAÇÃO
Ao analisar a Anulação, também chamada de Invalidação, pode-se afirmar que a Anulação do ato administrativo se trata de espécie de Retirada, modalidade provocada de extinção do ato administrativo, por motivo de ilegalidade (violação à lei) ou ilegitimidade (violação à princípios).
Da Anulação, não se originam direitos, é o entendimento de JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, ao lecionar que:
É precisão não esquecer que o ato nulo, por ter vício insanável, não pode redundar na criação de qualquer direito. O STF, de modo peremptório, já sumulou que a Administração pode anular seus próprios atos quando ilegais, porque deles não se originam direitos. Coerente com tal entendimento, o STJ, decidindo questão que envolvia o tema, consignou que o ato nulo nunca será sanado e nem terceiros podem reclamar direitos que o ato ilegítimo não poderia gerar. (CARVALHO FILHO, 2009, p. 156)
Contudo, em se tratando de atos ampliativos, que geram efeitos favoráveis aos beneficiários de boa-fé, a anulação possui um óbice, uma restrição, diante da modificação da esfera jurídica do beneficiário, não podendo atuar de forma a prejudicá-lo, visando estabilidade jurídica e social.
A Anulação é realizada nos casos em que uma ilegalidade se configura antes da concessão de um direito, e por isso deve ser anulada. Caso contrário, se a ilegalidade ocorresse após a concessão do direito tratar-se-ia de Cassação, espécie de extinção do ato administrativo distinta da Anulação.
A Anulação ou Invalidação trata-se de um ato que visa à restauração da ordem jurídica, baseando-se no princípio da Legalidade, Indisponibilidade do Interesse Público e Supremacia do Interesse Público sobre o Interesse Privado, de modo a desconstituir os efeitos produzidos por um ato ilegal ou ilegítimo.
De todo modo, esse poder-dever não se caracteriza como absoluto, uma vez que possui limites, como a prescrição e a decadência, por exemplo. Sendo, portanto, um poder-dever relativo, até porque, a desconstituição dos efeitos do ato administrativo deve considerar prejuízos que venham a ser causados à terceiros de boa-fé.
Conforme entendimento de HELY LOPES MEIRELLES acerca dos atos administrativos ilegais ou inválidos tem-se que não há meio termo quanto a legalidade ou ilegalidade do ato, é contrário a lei ou não:
“O ato administrativo é legal ou ilegal, válido ou inválido. Jamais poderá ser legal ou meio legal, válido ou meio válido, como ocorreria se se admitisse a nulidade relativa ou anulabilidade, como pretendem alguns autores que transplantam teorias do Direito privado para o Direito público sem meditar na inadequação aos princípios específicos da atividade estatal: o que pode haver é correção de mera irregularidade que não torna o ato nem nulo, nem anulável, mas simplesmente defeituoso ou ineficaz até sua retificação”. (MEIRELLES, 1992, p.177)
4.1 Em face de Ilegalidade e Ilegitimidade
Os atos administrativos gozam de uma presunção de legalidade, legitimidade e de veracidade. São estes os atributos que compõem o ato administrativo e que os diferenciam dos demais atos, em face da potestade pública da Administração.
Nesse sentido, a ausência desses preceitos de legalidade e legitimidade podem acarretar a extinção do ato administrativo de forma que não produzirão mais efeitos jurídicos válidos, não gerando qualquer consequência jurídica.
Assim, pode-se afirmar que a presunção de legalidade e legitimidade é relativa, admitindo prova em contrário, pelo fato de que, se ilegais ou ilegítimos merecem ser anulados e extintos do ordenamento jurídico.
Contudo, enquanto não houver uma declaração formal da Administração Pública ou do Poder Judiciário alegando que o ato é ilegal, ilegítimo ou inverídico, permanece ao particular o dever de obediência, em razão da Imperatividade imposta ao particular, através de ordens e cumprimento de obrigações, independentemente do consentimento do indivíduo, em decorrência da Supremacia do Interesse Público sobre o Interesse Particular.
4.2 Efeitos ex tunc
Os chamados efeitos “ex tunc”, são aqueles que retroagem, ou seja, ocorrem efeitos jurídicos válidos desde a prática do ato. Desse modo, caso decorra uma ilegalidade, o ato deverá ser revisto o ato desde a sua prática, pois implica na modificação de toda a esfera jurídica configurada anteriormente.
Nesse diapasão, os atos administrativos anulados operam efeitos ex tunc, ou seja, retroativos, de modo que podem ser discutidas situações pretéritas desde o cometimento do ato, pelo fato de que, os atos nulos não geram efeitos jurídicos válidos desde o momento da prática da ilegalidade ou ilegitimidade, havendo possibilidade de serem discutidos a qualquer tempo pela administração quando contrários à lei ou aos princípios administrativos.
Os efeitos ex tunc, por produzirem efeitos desde a prática do ato podem vir a causar consequências jurídicas aos administrados, beneficiando-os ou não. Assim, a anulação do ato não pode causar um enriquecimento ilícito ao Estado, assim sendo a Administração Pública deve assegurar a segurança jurídica das relações travadas entre si e os seus administrados que agem de boa-fé, devendo ser cautelosa ao buscar ressarcimento ou a responsabilização dos seus administrados.
Diante do exposto, é possível afirmar que nesses casos a Administração Pública mitiga o princípio da Legalidade em detrimento do Princípio da Segurança Jurídica, objetivando não desestabilizar a ordem social e a confiança dos seus administrados. Nesse sentido, a Administração Pública atua dando efetividade aos seus atos que mesmo quando ilegais, se houver decorrido o prazo decadencial ela ficará impedida de agir.
Isso posto, verifica-se a importância da boa-fé na prática do ato ampliativo, visto que se faz imperial que o beneficiário do ato não tenha intenção de agir de forma a contaminá-lo com qualquer mácula, já que se consumado com má-fé não há prazo decadencial para atuação do poder-dever de anular, não havendo restrição. É o que se verá adiante.
5 ATOS AMPLIATIVOS
5.1 Efeitos favoráveis ao beneficiário
A anulação dos atos administrativos pode gerar efeitos “ex nunc”, envolvendo os denominados Atos Ampliativos. Esses atos são aqueles que geram efeitos favoráveis aos destinatários, de modo que, em atenção à princípios administrativos, Boa-Fé, Vedação ao Enriquecimento Ilícito do Estado e Segurança Jurídica, quando passíveis de anulação terão efeitos exclusivamente ex nunc, ou seja, para o futuro.
Os Atos Ampliativos causam efeitos favoráveis aos destinatários, por isso, não retroagem, e não poderão ser anulados, ainda que ilegais, quando ultrapassados 5 (cinco) anos de sua prática, conforme o artigo 54 da consagrada Lei 9784/99, do Processo Administrativo na esfera federal, salvo se for comprovada a má-fé na prática do ato, caso em que poderá ser anulado a qualquer tempo pela Administração Pública ou pelo Poder Judiciário.
Em relação ao termo da vigência do ato há certa discordância doutrinária. Na concepção do professor JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, que entende que o termo da vigência do ato é a quo, tem-se que:
Em relação ao novo prazo, há entendimento no sentido de que o termo a quo de sua contagem ocorre a partir da data da publicação da lei nova – no plano federal, a Lei 9.784/99 – quando se trata de atos administrativos praticados em data anterior à sua vigência. Entendemos, porém, de forma diversa, e por mais de uma razão. A uma, porque a lei nada dispôs a respeito e, a duas, porque os prazos anteriores não podem ser simplesmente ignorados. Assim, deve aplicar-se, por analogia, o disposto no artigo 2.028, do Cód, Civil, que não prevê qualquer início de prazo a partir de sua vigência; refere-se apenas aos prazos a serem observados. [...] De qualquer modo, o tempo a quo será sempre o da vigência do ato sujeito à anulação. (CARVALHO FILHO, 2009, p. 157, p.158)
A anulação dos Atos Ampliativos só pode ocorrer antes do quinquênio determinado no artigo 54 da Lei 9784/99, que operará efeitos ex nunc, caso contrário, se ultrapassado o prazo de 5 (cinco) anos, a decai o direito da Administração Pública de anular o ato, conforme demonstrado no julgado abaixo:
MS 27561 DF EMENTA Agravo regimental em mandado de segurança. Tribunal de Contas da União. Anulação de ascensões funcionais concedidas aos servidores do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região.
Incidência da decadência prevista no art. 54 da Lei nº 9.784/99. Direito ao contraditório e à ampla defesa. Agravo regimental em mandado de segurança. Tribunal de Contas da União. Anulação de ascensões funcionais concedidas aos servidores do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. Incidência da decadência prevista no art. 54da Lei nº 9.784/99. Direito ao contraditório e à ampla defesa. Súmula Vinculante nº 3.
Agravo regimental não provido.
1. Decadência do direito do Tribunal de Contas da União de anular atos de ascensão funcional de servidores do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, realizados entre os anos de 1993 e 1995, após o decurso do prazo decadencial previsto no art. 54 da Lei nº 9.784/99, contado a partir de 1º de fevereiro de 1999, data de início da vigência da Lei nº 9.784/99. Precedentes. Necessidade de se garantir o contraditório e a ampla defesa para a validade das decisões do Tribunal de Contas da União. Súmula Vinculante nº 3
2. Agravo regimental não provido.
Decisão: A Turma negou provimento ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Dias Toffoli. 1ª Turma, 11.9.2012.
Diante do caso exposto, que trata da Anulação de ascensões funcionais concedidas aos servidores do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, verifica-se a incidência da decadência prevista no art. 54 da Lei nº 9.784/99, conferindo direito a Contraditório e Ampla Defesa aos destinatários.
Nesse diapasão houve desprovimento do Agravo Regimental interposto pelo Tribunal de Contas da União, por tratar-se de Ato Ampliativo, que gera efeitos favoráveis aos destinatários, mesmo decorrendo de ilegalidade, por decadência do direito da Administração Pública de anular o ato ilegal após o prazo decadencial estabelecido pela lei de Processo Administrativo na Esfera Federal.
No julgado exposto, há várias discussões acerca da ascensão funcional dos servidores do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, inclusive quanto à violação ao princípio do prévio concurso público para acesso aos cargos e empregos públicos, vez que houve ascensão sem previa previsão legal, fato este que não impediu o corrimento da decadência, pois se tornou direito adquirido, devendo continuar produzindo os seus efeitos para garantir o princípio da Segurança Jurídica e da Boa-Fé, além da essencial observância aos princípios do Contraditório e da Ampla Defesa, para aferimento de vício ocasionado pela má-fé, ou não.
Ainda, torna-se clara a necessidade de observância da segurança jurídica, visando não gerar instabilidades jurídicas nem sociais. Firmando a legalidade do ato praticado, vez que ultrapassados os 5 (cinco) anos estabelecidos no artigo 54 da lei 9.784/99 operou-se a decadência do direito da administração de anular o ato.
O julgado abaixo trata sobre a notificação de servidor público pela Administração para ressarcimento ao erário, acerca de férias, através de desconto na folha de pagamento após o prazo quinquenal estabelecido pelo artigo 54 da lei 9.784/99. O Recurso Especial número 1260763 RS em 2011, firma o entendimento acima comentado:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SERVIDORPÚBLICO. ANULAÇÃO DE ATO ADMINISTRATIVO. EFEITOS FAVORÁVEIS. FÉRIAS. ARTIGO 54 DA LEI N. 9.784/99. PRAZO DECADENCIAL. OCORRÊNCIA.
1. A Corte de origem julgou a lide em consonância com a jurisprudência do STJ, com base no disposto do artigo 54, § 1º, da Lei n. 9.784/99, segundo a qual o direito da administração anular os seus próprios, quando deles decorram efeitos favoráveis aos respectivos destinatários, decai em cinco anos, contados do pagamento decorrente do ato, salvo hipótese de má-fé.
2. No caso, o gozo das férias que se pretende o ressarcimento ocorreu no período de 08/04/1999 a 07/05/1999, de modo que o prazo decadencial de cinco anos decairia em maio de 2004 e somente em 11de junho de 2004 a Administração Pública notificou o servidor o desconto na folha de pagamento para fins de ressarcimento ao erário quando já impedido pela decadência.
3. Recurso especial provido.
Nesse sentido, o julgado confirma o entendimento da decadência do direito da Administração Pública de anular seus próprios atos quando deles decorrerem efeitos favoráveis aos destinatários, se ultrapassado o prazo de 5 (cinco) anos, quinquenal, estabelecido pela lei de nº 9.784/99 e pelo entendimento consolidado dos tribunais.
Isto porque, não se admite a instabilidade, nem social e nem jurídica. O ordenamento jurídico pátrio visa à segurança jurídica consagrado pela legalidade, pois o objetivo supremo da lei é a consecução da paz, da estabilidade na sociedade e do bem-estar coletivo.
5.2 Efeitos “ex nunc”
Os atos que produzem efeitos “ex nunc”, também chamados de proativos, os fazem só para o futuro, ou seja, só passam a produzir efeitos jurídicos válidos do momento da prática do ato para frente, assim, pode-se dizer que os seus efeitos só podem ser questionados para o futuro.
Os atos ampliativos, caso possam ser anulados, por não incidência da decadência, serão anulados com efeitos ex nunc, e não ex tunc que é a regra para anulação do ato administrativo.
Isto porque, dos atos ampliativos, por decorrerem efeitos jurídicos favoráveis para os destinatários devem ser resguardados os princípios da Segurança Jurídica, Vedação ao Enriquecimento Ilícito do Estado e da Boa-fé.
De modo que, se houver, por exemplo, pedido de ressarcimento ao erário em processo que anule admissão à cargo público sem o devido concurso, estabelecido como regra constitucional pelo artigo 37, II da Constituição da República Federativa do Brasil, não serão devidos os vencimentos recebidos anteriormente, pois da anulação só produzirá efeitos do momento da declaração de ilegalidade para o futuro, não havendo que se falar em ressarcimento sobre verbas pretéritas, mesmo sendo as ações de ressarcimento ao erário imprescritíveis, de acordo com o artigo 37 §5º da CRFB.
5.3 Princípios da Boa-Fé, Segurança Jurídica e Vedação ao Enriquecimento Ilícito do Estado
O princípio da Boa-Fé é basilar, e trata-se da necessidade da atuação conforme os ditames de que os indivíduos nas suas relações jurídicas devem agir com decoro e probidade, de modo que, se souber que a atuação é ilegal, estará atuando de má-fé, maculando o ato, pois a boa-fé deve estar presente na atuação administrativa e na atuação do administrado. Para que atue da melhor forma possível nas relações jurídicas, e não torne ilegítimo o ato vestindo-o de imoralidade.
O princípio da Segurança Jurídica, por sua vez, visa à estabilidade nas relações jurídicas e caracteriza-se pela interpretação da norma administrativa de forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se destina, sendo vedada a aplicação retroativa de nova interpretação, conforme estabelecido pelo inciso XIII, do artigo 2º da lei federal 9.784/99. Assim, com esse princípio a Administração Pública visa garantir a estabilidade das relações travadas com seus administrados, almejando que não haja instabilidades jurídicas e sociais perante as suas decisões.
De acordo com entendimento de MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO, o princípio da Segurança Jurídica:
Se justifica pelo fato de ser comum, na esfera administrativa, haver mudança de interpretação de determinadas normas legais, com a consequente mudança de orientação, em caráter normativo, afetando situações já reconhecidas e consolidadas na vigência de orientação anterior. Essa possibilidade de mudança de orientação é inevitável, porem gera insegurança jurídica, pois os interessados nunca sabem quando a sua situação será passível de contestação pela própria Administração Pública. Daí a regra que veda a aplicação retroativa. (ZANELLA DI PIETRO, 2014, p. 86)
Nesse sentido, tem-se a vedação a aplicação retroativa da lei, visando garantir a segurança jurídica dos atos praticados pela Administração Pública diante dos seus administrados.
O princípio da Vedação ao Enriquecimento Ilícito do Estado, trata-se da proibição imposta ao Estado de agir visando lucro diante de suas relações jurídicas, vez que, por sua característica de potestade pública deve estar sempre com suas vestes decorrentes da consecução do interesse público alcançada pela moralidade, probidade, legalidade, e boa-fé nas suas atuações, de modo a não utilizar a sua potestade para impor situações ilegais e constrangedoras aos seus administrados de forma ilegal.
5.4 Restrição à anulação do Ato Ampliativo (Artigo 54 da Lei 9.784/99)
Em face ao seu dever de anular, tem-se o artigo 54 da Lei 9.784/99, que restringe o direito da administração de anular os seus próprios atos quando deles decorram efeitos favoráveis aos destinatários quando decorridos 5 (cinco) anos da prática do ato. Determinando in verbis:
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé. (LEI FEDERAL 9.784/99 de 29 de janeiro de 1999)
Essa determinação legal mitiga o poder de anulação do ato administrativo, em prol do princípio da Segurança Jurídica, restringindo o dever de anular e velando pelas relações jurídicas. De modo que a expressão legal implica em generalidade, por ser abstrata, não sendo dirigido apenas à determinado indivíduo, mas à todos aqueles que estejam em situação abrangida pela determinação normativa.
Unânime é a posição adotada pelos doutrinadores Diógenes Gasparini, Diogo de Figueiredo Moreira Neto, Hely Lopes Meirelles apoiada por JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, que leciona em seu manual de direito administrativo que:
Entende-se que o interesse público que decorre do princípio da estabilidade das relações jurídicas é tão relevante quanto a necessidade de reestabelecimento da legalidade dos atos administrativos, de forma que deve o ato permanecer seja qual for o vício de que esteja inquinado. Em tais casos, opera-se a prescrição das ações pessoais em 5 anos. (CARVALHO FILHO, 2009, p.157)
Os Atos Ampliativos, como citado anteriormente, são aqueles que produzem efeitos jurídicos favoráveis aos destinatários, ou seja, modificam a sua esfera jurídica de forma positiva, de modo que, a roupagem do ato praticado com boa-fé impede a Administração Pública de anular o ato com efeitos que prejudiquem o beneficiário, possibilitando seus efeitos apenas do momento da anulação para o futuro, diferenciando a anulação neste caso, que em outras ocasiões produz efeitos ex tunc, ou seja, retroativos.
Isso decorre especificadamente em razão da administração nas suas atuações primar sempre pelo atendimento à estabilidade das relações jurídicas, tendo como fim o interesse público e o reestabelecimento da legalidade.
Os atos ampliativos, de acordo com o entendimento do professor CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO (2007, p.417) “aumentam a esfera jurídica de atuação do administrado.”.
O artigo 54 da Lei 9.784/99 determina que o direito da Administração de anular os atos administrativos, de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.
Essa é a restrição que justifica o estudo do presente artigo, de modo que a Administração Pública deixa de praticar um ato que deveria para não obstruir os seus princípios, visando dar força aos seus atos, pois, mesmo sendo imprescritíveis as ações de ressarcimento em seu favor, deve garantir a segurança jurídica e a estabilidade das relações que dela decorrem.
Nesse sentido, JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO tem como entendimento que a situação de ilegalidade deve ser sanada, de forma que:
Semelhante solução faria perdurar a situação de insegurança, prejudicando o administrado quando a má-fé se originasse da própria Administração. (CARVALHO FILHO, 2009, p.158).
A própria Administração se impõe um prazo, em que não poderá reaver seus atos quando deles derivarem efeitos jurídicos que beneficiem os seus administrados de boa-fé, de forma a não retroagir, e dar segurança jurídica às suas atuações. Agindo conforme a legalidade, priorizando a supremacia do interesse público sobre o interesse privado e a indisponibilidade do interesse público, proibindo uma atuação que prejudique o beneficiário e que ao mesmo tempo imponha o seu poder de atuar de forma a atingir o interesse social e coletivo, não gerando instabilidade social e nem jurídica.
Nesse sentido, caso seja comprovada a má-fé, as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal incidem, possibilitando a anulação do ato ampliativo a qualquer tempo. Assim, fica demonstrada a possibilidade de anulação do Ato Ampliativo quando houver ocorrido a decadência do direito da Administração Pública de anulá-lo, que ocorre quando a presença da má-fé retira do ato ampliativo a presunção de legalidade adquirida pelo beneficiário.
Isso porque, de uma ilegalidade não podem decorrer outras, como leciona o professor JOSÉ DOS SANTOS CARVALHO FILHO, que dispõe:
A ilegalidade não pode ser suporte de extensão para outras ilegalidades, nem encontra eco em qualquer aspecto de equidade. O que é preciso, isto sim, é sanar a ilegalidade, corrigindo-a através da anulação do ato e reestabelecendo a necessária situação de legalidade. (CARVALHO FILHO, 2009, p.156).
No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo para que ocorra a anulação do ato ampliativo começa a correr desde a percepção do primeiro pagamento. É o que determina o parágrafo primeiro do artigo 54 da L. 9784/99, que fixa o começo da contagem para os atos contínuos, determinando-o de forma expressa, in verbis:
Artigo 54. [omissis]
§1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento. (LEI FEDERAL 9.784 de 29 de janeiro de 2009).
Nesse diapasão, caso ultrapassados 5 (cinco) anos da prática do ato ampliativo de boa-fé, ocorrerá a decadência do direito da administração de extingui-lo por anulação, visando não gerar instabilidade jurídica e nem social, assegurando o direito adquirido e reforçando os princípios da Boa-Fé, Segurança Jurídica e Vedação ao Enriquecimento Ilícito do Estado. Decaindo, portanto, o direito da administração de realizar a anulação.
Nesse sentido, tem-se o julgado 1293123 do RN de 2011, um Agravo Regimental no Recurso Especial, em que:
EMENTA
1. O STJ firmou o entendimento no sentido de que mesmo os atos administrativos praticados anteriormente ao advento da Lei Federal n. 9.784, de 1º/2/19999, estão sujeitos ao prazo decadencial quinquenal, contado da sua entrada em vigor.
2. Em casos análogos ao presente, a Primeira e a Segunda Turmas desta Corte têm decidido que a possibilidade de revisão da base de cálculos das horas extras incorporadas está fulminada pela decadência, de que trata o art. 54 da Lei n.9.784/99.
Precedentes:REsp 1270474/RN, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 5/11/2012; AgRg noAREsp 224.699/RN, Rel. Min. Herman Benjamin, DJe 5/11/2012; AgRg noREsp 1321448/RN, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJe 9/10/2012; AgRgno REsp 1270252/RN, DJe 5/9/2012.Agravo regimental improvido.
O julgado exposto, firma o entendimento de que o prazo quinquenal estabelecido no artigo 54, também são aplicados aos atos praticados antes do advento da lei 9.784/99, dando abrangência a norma, tratando sobre a incorporação de horas extras percebidas por servidor público ao seu vencimento. O direito de revisão decaiu pela transcorrência do prazo quinquenal estabelecido no mencionado artigo.
Assim, tem-se que o princípio da Autotutela legitima a administração à revisar seus próprios atos quando eivados de ilegalidade ou por conveniência ou oportunidade, pois o ato administrativo é uma declaração estatal utilizada para realizar suas prerrogativas públicas.
Contudo, esse poder-dever que tem a Administração Pública não é absoluto, e por isso, para consagrar a segurança jurídica, esse poder sofre restrições, como o limite presente no artigo 54 da lei 9.784/99, que certamente estabelece a decadência pretendendo a estabilidade dos seus atos e das relações jurídicas que realiza.
Nesse sentido, tem-se que, por perquirir a estabilidade social, o ordenamento jurídico pátrio impõe uma restrição à anulação do próprio ato da Administração Pública, de modo a não gerar a insegurança dos seus próprios atos perante os seus administrados, alcançando o interesse público, o interesse particular e a segurança jurídica ao mesmo tempo. Além de assegurar o princípio da legalidade, basilar de toda a estrutura do Regime Jurídico Administrativo.
Situação similar ocorreu numa Apelação Cível de número 102178 do Rio Grande do Norte em 2010, em que a 1ª (primeira) Câmara Cível conferiu à um servidor público que obteve ingresso em cargo público antes da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, tendo sido conferida a estabilidade excepcional ao servidor pelo artigo 19 do ADCT, conforme transcrito abaixo:
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO. INGRESSO NO SERVIÇO PÚBLICO ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. NÃO DEMOSNTRAÇÃO DA ESTABILIDADE EXCEPCIONAL CONFERIDA PELO ART. 19 DO ADCT. SENTENÇA MANTIDA. APELO CONHECIDO E DESPROVIDO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REMESSA NECESSÁRIA. SERVIDOR PÚBLICO. INGRESSO NO SERVIÇO PÚBLICO ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. ESTABILIDADE EXCEPCIONAL CONFERIDA PELO ART. 19 DO ADCT. CONHECIMENTO E DESPROVIMENTO DO RECURSO. A Constituição de 1988 estabeleceu que a investidura em cargo depende da aprovação em concurso público. Essa regra garante o respeito a vários princípios constitucionais de direito administrativo, entre eles, o da impessoalidade e o da isonomia. O constituinte, todavia, inseriu norma transitória criando a estabilidade excepcional para servidores não concursados da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que, ao tempo da promulgação da Carta Federal, contassem com, no mínimo, cinco anos ininterruptos de serviço público. O art. 19, do ADCT/88, assegura aos servidores, que atendem aos requisitos exigidos, estabilidade no serviço público. Portanto, o benefício concedido foi a estabilidade na função pública exercida e não o direito ao acesso a algum cargo público, o que depende de aprovação prévia em concurso público. Conhecimento e desprovimento da Remessa Necessária (AC , da 1ª Câmara Cível do TJRN, Rel. Des. Dilermano Mota, j. 12.01.2010 - Destaque acrescido). CONSTITUCIONAL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE À FORMAÇÃO DE CONVENCIMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. INGRESSO NO SERVIÇO PÚBLICO ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988. INTERRUPÇÃO DA CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO POR EXONERAÇÃO. INAPLICABILIDADE DA ESTABILIDADE EXCEPCIONAL CONFERIDA PELO ART. 19 DO ADCT. PROCESSO ADMINISTRATIVO QUE OPORTUNIZOU O CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA
(TJ-RN - AC: 102178 RN 2010.010217-8, Relator: Des. Expedito Ferreira, Data de Julgamento: 01/02/2011, 1ª Câmara Cível)
A jurisprudência em questão expõe a situação de que o artigo 19 do ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, determina que os servidores públicos civis da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, da Administração Direta, Autárquica e das Fundações Públicas em exercício na data da promulgação da Constituição Federal, há pelo menos cinco anos continuados e que não tenham sido admitidos na forma estipulada do artigo 37 da CRFB (Constituição da República Federativa do Brasil) são considerados estáveis no serviço público.
Nesse sentido, nota-se um ato ampliativo, em que, após cinco anos de exercício em cargo público, com a promulgação da Constituição Federal o Poder Judiciário reconheceu o direito à estabilidade no serviço público diante da decadência do prazo de cinco anos que possui a Administração Pública de anular seus atos ilegais. Assim, conclui-se que o ADCT, além da lei 9.784/99, conferiu prazo para anulação de atos quem ampliem a esfera jurídica do beneficiário, visando sanar eventuais injustiças e instabilidades diante das diversas situações jurídicas.
5.5 Possibilidade de anulação do Ato Ampliativo caso comprovada a Má-Fé
A má-fé é uma mácula que vicia todo o ato administrativo, como também os atos privados. Apesar do ato da administração pública ser unilateral, o fato de ser praticado pelo administrado, com a intenção de fazê-lo sabendo ser um ato ilegal, retira dele todos os direitos que lhe poderiam ser provenientes, pois fora praticado desde o início com esse vício, que não poderia ser ao menos Convalidado.
Isto porque, a Convalidação corresponde, ao ato de aproveitar um ato administrativo viciado. Contudo, a Convalidação é discricionária, só podendo ocorrer em hipóteses em que não ofenda o interesse público, não viole direitos de terceiros de boa-fé e desde que o vício seja sanável. Uma vez ilegal o ato, de pronto ofende ao interesse público.
Nessas hipóteses verifica-se a diferença entre o aproveitamento de um ato viciado e a anulação de atos ampliativos. Nota-se que na Convalidação há o interesse da Administração Pública de que o ato seja “consertado”, ou seja, reaproveitado, uma vez que não atinja o interesse público, que deve estar livre de qualquer mácula de nulidades.
Nos atos ampliativos, visa-se a supremacia da Administração sobre os seus administrados. Ela mantém o seu ato, não o modificando nem fazendo com que retroaja, isso porque, essa atuação atribui maior respeito aos seus atos, que não podem gerar instabilidades, nem jurídicas e nem sociais. De modo que, a decadência do direito de anular assegura maior estabilidade e segurança ao ato administrativo praticado e satisfaz o administrado beneficiário, não acarretando prejuízo.
Tal situação não ocorre com os atos ampliativos decorrentes de má-fé, pois, desde o primeiro momento em que passou a produzir efeitos, estes já não eram válidos, pois decorrente de elemento que vicia a legalidade do próprio ato em questão.
Deste modo, caso configurada a má-fé, que não se presume e necessita de instrumento probatório, ou seja, deve ser comprovada, não decai o direito da administração de anular o ato administrativo, podendo fazer a invalidação a qualquer tempo, pois do ato viciado pela má-fé não se originam direitos e nem efeitos jurídicos válidos.
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando o poder dever da Administração Pública de anular seus próprios atos administrativos ilegais e/ou ilegítimos quando houver violação à lei e à princípios, tem-se que a administração e o Poder Judiciário podem anulá-los a qualquer tempo.
Entretanto, o artigo 54 da Lei 9.784/99, restringe o direito da administração de anular os seus próprios atos quando deles incidirem efeitos favoráveis aos destinatários quando decorridos 5 (cinco) anos da sua prática.
Nesse sentido, resta patente a supremacia dos princípios da Segurança Jurídica, Boa-fé e Vedação ao Enriquecimento Ilícito do Estado, de modo que, com essa determinação legal a Administração visa dar efetividade aos seus atos sem prejudicar os seus administrados. Com isso, visa garantir maior respeito aos seus atos, não retroagindo.
Nesse diapasão, essa determinação legal visa a não ocorrência de instabilidades, nem jurídicas e nem sociais. A decadência do direito de anular assegura maior estabilidade e segurança ao ato administrativo praticado, além de satisfazer os administrados beneficiários de boa-fé, não gerando prejuízos, tanto pretéritos quanto futuros.
Com essa atuação, a Administração assegura e reafirma a sua potestade pública, pelo fato de manter o ato praticado excluindo possíveis instabilidades e certa visão de incompetência da administração, que mantém o ato administrativo para não gerar situações de insatisfação dos administrados de boa-fé.
Pode-se afirmar que a Administração Pública, nesses casos, mitiga o princípio da legalidade, uma vez que torna o ato nulo ou anulável, legal, mesmo diante de flagrante ilegalidade, para, com este fim, manter imune a sua potestade pública e a estabilidade dos seus atos que gerem efeitos favoráveis aos seus administrados de boa-fé.
Diante desta atuação, é patente a incidência da Segurança Jurídica na atuação administrativa, que, adota ações suficientes para propiciar grau de certeza, respeito e segurança aos seus administrados, interpretando a norma administrativa da forma que melhor atenda ao fim público, impossibilitando aplicação retroativa de nova interpretação. Atuando ainda conforme a lei e o direito, objetivando o atendimento do interesse público e da estabilidade e segurança dos atos administrativos.
Sabe-se que o Direito Administrativo, é um ramo do direito desprovido de codificação própria, e por isso se opera através de um regime jurídico administrativo composto principalmente por princípios, que são norteadores à atuação administrativa, de modo que devem ser observados sob pena de ilegitimidade do ato.
Nesse sentido, diante da necessidade da Administração Pública em manter com veemência seus atos visando evitar instabilidades jurídicas, tem-se que, certos atos caso sejam questionados podem colocar em questão à sua potestade e a legalidade da atuação administrativa. Com isso, é possível afirmar, que em relação aos atos ampliativos a Administração Pública mitiga o princípio da legalidade em detrimento da segurança jurídica que seus atos devem proporcionar aos administrados, evitando assim insatisfações e descrença na atuação administrativa.
Em atendimento o artigo 54 da lei 9.785/99, o direito da Administração Pública de anular seus atos ilegais decai no prazo de 5 (cinco) anos, essa mitigação ao princípio da legalidade estimula o poder da administração em atuar da melhor forma diante do caso concreto, em que, em havendo situação de instabilidade jurídica, preza primeiramente pela melhor atuação jurídica e social perante os seus administrados.
Os Atos Ampliativos, por aumentarem a esfera jurídica do beneficiário conferem a ele o direito de ter protegida à sua situação jurídica em caso de decadência do prazo legal de 5 (cinco) anos, havendo manutenção do ato sem questionamento de valores pretéritos nem futuros. Também opera efeitos mesmo quando o prazo decadencial não tenha se operado, caso em que não produzirá nenhum efeito retroativo, operando efeitos unicamente “ex nunc”, ou seja, efeitos para o futuro, não havendo que se falar em ressarcimento ao Estado, em atendimento ao princípio da Vedação ao Enriquecimento Ilícito do Estado.
Assim, tem-se que o princípio da legalidade não é de todo absoluto, uma vez que pode ser mitigado em detrimento da segurança jurídica que a atuação administrativa deve proporcionar aos seus administrados, de modo a garantir uma atuação justa e que não prejudique os cidadãos por atos praticados em face da sua potestade pública, caso contrário, podem ocorrer arbitrariedades na atuação administrativa.
Primordial é a importância da estipulação do artigo 54 da lei 9.784/99, uma vez que garante aos administrados o direito de postular a manutenção da sua situação jurídica diante de ato praticado pela própria administração após a decadência do prazo para anulação, que, por sua vez, tem por melhor atuação a manutenção e reconhecimento da situação conferida, visando manter a estabilidade jurídica, administrativa e social dos seus atos, de forma a esquivar-se de dúvidas acerca da sua potestade pública.
Aplicando efeitos ex nunc quanto a proventos patrimoniais relativos à atos praticados à cidadãos de boa-fé pela própria Administração Pública quando não se opera a decadência ao direito de anular. Em caso de aplicação da decadência o ato é tido como legal. Conclui-se, portanto, que a Administração Pública atua em consonância com os princípios da Proporcionalidade e Razoabilidade, de modo a não instalar situação que a instabilize social e nem juridicamente.
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Advogada, especialista em Direito Administrativo pelo CEJAS em convênio com a Faculdade Cândido Mendes e Pós-Graduanda em Direito Público pela Faculdade Baiana de Direito.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUZA, Alessandra Rocha Jacobs de. Atos Administrativos: Restrição à Anulação quando decorrerem efeitos favoráveis aos beneficiários Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 jul 2016, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46988/atos-administrativos-restricao-a-anulacao-quando-decorrerem-efeitos-favoraveis-aos-beneficiarios. Acesso em: 22 nov 2024.
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