RESUMO: 1. A nova feição do Direito Civil – constitucionalização e repersonalização; 2. O moderno Direito de Família – na esteira desse novo Direito Civil; 2.1. Nova Principiologia do Direito de Família; 2.2. O princípio do melhor interesse da criança/adolescente; 3. O instituto do Parto Anônimo: conceituação; 3.1. Parto Anônimo: um instituto em consonância com os modernos princípios do Direito de Família; 3.2. Parto anônimo: uma opção frente ao desgastado debate acerca do aborto; 4. Ponto merecedor de destaque para o efetivo sucesso do parto anônimo: o necessário discernimento entre a diferença do direito ao estado de filiação frente ao direito de conhecer a origem genética; Conclusões; Referências.
Palavras-chave: Moderno Direito de Família – Afetividade – Aborto – Parto Anônimo.
1.INTRODUÇÃO A nova feição do Direito Civil – constitucionalização e repersonalização.
Diante da passagem do Estado Absolutista para o Estado Liberal burguês, desenvolvem-se, como mecanismos necessários ao resguardo do indivíduo contra os arbítrios típicos do anterior modelo estatal, os processos conhecidos como constitucionalismo e codificação.
A origem formal do constitucionalismo está ligada às Constituições escritas e rígidas dos Estados Unidos da América, em 1787, e da França, em 1791, a partir da Revolução Francesa. Teve como característica fundamental o caráter delimitador da ação do Estado (assinalando o chamado Estado mínimo), restituindo iniciativa regulatória prioritária aos particulares. Esse perfil de atuação mínima do Estado, determinado constitucionalmente, costuma ser definido, modernamente, como a instituição de direitos e garantias fundamentais de primeira geração. É, no dizer de Celso de Mello, o realce do princípio da liberdade clássica, negativa e formal[1].
Em paralelo, o processo de codificação, notadamente dentro do Direito Civil, sobrelevou o critério patrimonial e a propriedade privada, assegurando o mais amplo espaço de autonomia aos indivíduos.
Diante de um panorama histórico de privilégios e excessos estatais, o papel do constitucionalismo do pós Revoluções burguesas foi, pois, o de assegurar as liberdades, seguindo, o plano da codificação, o estabelecimento de marcos regulatórios estritamente mínimos ao disciplinamento da liberdade privada.
O direito civil continuou o seu desenvolvimento conservando, durante muito tempo, o seu status de “locus normativo privilegiado do indivíduo”, mantendo-se, como nenhum outro ramo do direito, a considerável distanciamento do Direito Constitucional[2].
Todavia, nas últimas décadas, tem, o Direito Civil, “perdido a sua função de Direito Comum, exercendo um papel supletivo diante de uma nova realidade constitucional. A ‘chamada constitucionalização do Direito Civil’ foi assumida, definitivamente, pela doutrina”[3]. Passou, a Constituição, a normatizar, diretamente e com eficácia plena, uma série de aspectos antes deixados ao legislador infraconstitucional.
No que pertine ao Direito Civil nacional, principalmente após a Constituição de 1988, a doutrina e a jurisprudência passaram a adotar, como artifício efetivo de hermenêutica, a supremacia constitucional, utilizando-a como elemento balizador e interpretativo para a aplicação das variadas normas ao caso concreto; ademais, tal prevalência constitucional quedou por determinar um processo de maior especialização de ramos dentro do Direito, notadamente dentro do Direito Civil, criando subsistemas mais flexíveis e atentos à nova realidade multidisciplinar (daí o surgimento do ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente; do CDC – Código de Defesa do Consumidor etc.). Destarte, se a Constituição apresenta um corpo normativo/principiológico acerca de matérias antes examinadas à luz exclusiva do Direito Civil, deve o operador do Direito, quando da criação/aplicação/interpretação da norma do referido corpo legal, ou de qualquer outra área de especialização, ficar atento aos princípios constitucionais/garantias fundamentais, assegurando sua supremacia.
Em consonância com a prevalência moderna de atenção aos marcos regulatórios constitucionais, perde, outrossim, destaque, dentro do Direito Civil, o valor propriedade/patrimônio, transmudando-se o centro de atenção para a pessoa, num verdadeiro processo de repersonalização. “É certo que as relações civis têm um forte cunho patrimonializante, bastando recordar que seus principais institutos são a propriedade e o contrato (modo de circulação da propriedade). Todavia, a prevalência do patrimônio, como valor individual a ser tutelado nos códigos, submergiu à pessoa humana, que passou a figurar como pólo de relação jurídica, como sujeito abstraído de sua dimensão real”[4]; é, pois, tendência que transparece a incompatibilidade entre a patrimonização absoluta das relações civis e o valor constitucional da dignidade da pessoa humana (previsto na Constituição de 1988 em seu artigo 1o, III).
Poder-se-ia dizer, assim, que os institutos básicos do direito civil não apresentam a mesma configuração decorrente do liberalismo e individualismo burguês. Perde espaço o indivíduo-proprietário, para revelar-se enquanto pessoa humana (repersonalização). “Despontam a afetividade, como valor essencial da família; a função social, como conteúdo e não penas como limite, da propriedade; e o princípio da equivalência material e a tutela do contratante mais fraco, no contrato”[5].
É, pois, diante dessa perspectiva constitucional de valorização do indivíduo, desse processo de constitucionalização do Direito Civil, que devem ser relidos todos os institutos a ele pertencentes, tendo por premissa o fato de que a dignidade da pessoa humana é o núcleo essencial dos direitos fundamentais, o “valor que atrai a realização dos direitos fundamentais”[6].
2. O moderno Direito de Família – na esteira desse novo Direito Civil.
Diante desse processo de constitucionalização do Direito Civil, determinando sua releitura através dos princípios e garantias fundamentais albergados constitucionalmente, também o Direito de Família, como não poderia ser diferente, sofre profunda transformação em suas características. No atual contexto, adquire, a família, um novo sentido: relativiza-se sua função procracional; desapareceram suas funções política, econômica e religiosa, para as quais era necessária a origem biológica; e reaparece/renova-se dentro da experiência familiar o sentido de grupo unido por desejos e laços afetivos, em comunhão de vida. Nesse cenário, passa a família a ser instituto que exige tutela jurídica mínima, que respeite a liberdade de constituição, convivência e dissolução; a auto-responsabilidade; a igualdade irrestrita de direitos, embora com reconhecimento das diferenças naturais e culturais entre os gêneros; a igualdade entre irmãos biológicos e adotivos e o respeito a seus direitos fundamentais, como pessoas em formação; o forte sentimento de solidariedade recíproca, que não pode ser perturbada pelo prevalecimento de interesses patrimoniais[7]. É, pois, a consideração do afeto como principal fundamento/característica das relações familiares.
Cabe destacar, outrossim, que as relações familiares receberam atenção especial do legislador constituinte, que inseriu, dispersos por todo o texto da Carta Maior, uma série de dispositivos sobre o tema, sendo de razoável consenso, dentro da doutrina/jurisprudência, que, mesmo tendo assento em variadas partes do texto constitucional, ou mesmo residindo em textos de tratados internacionais, a natureza dos direitos que tutelam as relações familiares deve ser interpretada à luz da teoria dos direitos fundamentais[8].
Destarte, disposições como “a proteção do Estado à união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento” – art. 226, § 3º, da CF, “o planejamento familiar, fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, como livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas” – art. 226, § 7º, da CF, “a equiparação de filhos e a vedação de designações discriminatórias relativas à filiação” –art. 227 § 6º, da CF) entre tantas outras, devem ser encarados/aplicados dentro da ótica dos direitos fundamentais.
Diante da constatação de que necessária é a releitura do Direito Civil sob o prisma da Constituição Federal, os antigos princípios do Direito de Família (ainda embasados em aspectos de uma cultura machista, patrimonialista, calcada no estabelecimento de privilégios em virtude de pertença à determinada família, nas diferenças entre “tipos” de filho – filho consangüíneo, filho adotivo, filho decorrente de relação extraconjugal etc.) foram desfeitos, emergindo uma nova principiologia para as relações familiares.
2.1. Nova Principiologia do Direito de Família.
Não é pacífico, dentro da doutrina, quantos e quais deveriam ser os princípios necessários para um correto manuseio do Direito de Família. Paulo Lôbo, em termos mais gerais, considerou em número de três os mais importantes princípios constitucionais regentes das relações familiares (o da liberdade, o da igualdade, o da dignidade da pessoa humana)[9]; Flávio Tartuce, por sua vez, em artigo dedicado especificamente ao tema, desdobra em número de 9 os princípios (princípio de proteção da dignidade da pessoa humana, princípio da solidariedade familiar, princípio da igualdade entre os filhos, princípio da igualdade entre cônjuges e companheiros, princípio da igualdade na chefia familiar, princípio da não-intervenção ou da liberdade, princípio do melhor interesse da criança, princípio da afetividade, princípio da função social da família)[10]; ter-se-á em vista, neste tópico, de forma mais próxima, todavia, a obra do Rodrigo da Cunha Pereira[11], que desdobra em sete os princípios fundamentais norteadores do Direito de Família, a seguir, ainda que de forma resumida, explanados.
O primeiro dos princípios seria o da dignidade da pessoa humana. É ponto de partida para a análise de qualquer questão dentro das relações familiares o sentido de dignidade, de justiça humana. Pressupõe, este princípio, uma noção de sujeito não subordinado ao desejo de outrem, livre, respeitado em suas singularidades. Por isso, poder-se-ia dizer que a dignidade da pessoa humana é valor que atinge/influencia todos os demais princípios do Direito de família, correspondendo, efetivamente, e em virtude do processo de constitucionalização acima tratado, ao valor que atrai a realização dos direitos fundamentais. É através dele que todas as categorias de famílias e filhos puderam ser inseridas na ordem jurídica (ou que ainda estão em processo de inserção).
O princípio da monogamia. Toda atenção deve ser despendida neste ponto para não se criar a falsa impressão de que, com a observância desse princípio, estar-se-ia negando importância às famílias surgidas de relações extra-matrimoniais ou “extra-uniões-estáveis”; no dizer de Rodrigo Pereira, apesar do princípio funcionar como conexão moral, deve ser aqui interpretado como interdito proibitório para o estabelecimento de várias famílias paralelas.
O princípio da igualdade dos gêneros e o respeito às diferenças. “O princípio da igualdade, formal e material, relaciona-se à paridade de direitos entre os cônjuges ou companheiros e entre os filhos. Não há cogitar de igualdade entre pais e filhos, porque cuida de igualar os iguais. A conseqüência mais evidente é o desaparecimento de hierarquia entre os que o direito passou a considerar pares, tornando perempta a concepção patriarcal de chefia. A igualdade não apaga as diferenças entre os gêneros, que não pode ser ignorada pelo direito”[12]. É desse princípio que decorre a igualdade entre filhos (art. 227, § 6º, da Constituição Federal: “os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”), a igualdade entre cônjuges e companheiros e a igualdade na chefia familiar.
O princípio da autonomia e da menor intervenção estatal. É princípio de previsão expressa no Código Civil, art. 1513: “é defeso a qualquer pessoa de direito público ou direito privado interferir na comunhão de vida instituída pela família”. Destarte, a constituição ou extinção das relações familiares, o planejamento familiar, os valores religiosos/culturais/educacionais, a administração do patrimônio familiar são uma liberalidade dos integrantes da família. Necessária é, todavia, uma ponderação desse princípio com as questões do “melhor interesse da criança” e a “dignidade da pessoa humana”, em virtude de todo o processo de constitucionalização do Direito Civil/Direito de Família supracitado.
O princípio da afetividade. Apesar de ser o mais novo princípio jurídico do Direito de Família, passou a ocupar lugar de destaque entre os demais. É, junto com o princípio da dignidade da pessoa humana, base para a leitura/interpretação de todos os demais. Com a superação do patrimonialismo ínsito ao antigo Direito Civil e o estabelecimento de um processo de repersonalização, passa a afetividade a ocupar seu verdadeiro lugar, ou seja, lugar de essencialidade dentro da constituição/manutenção das relações familiares. É em virtude dela, também, que se pode pensar na constituição de diferentes tipos de família (a seguir trabalhado); é, outrossim, através da observância da afetividade, que será possível o crescimento dentro da doutrina e da jurisprudência da “mitigação do endeusamento ao biologismo nas relações de filiação, passando-se a enxergar a filiação socioafetiva como gênero, na qual passam a ser espécies a adoção, o filho de criação e as havidas por inseminação artificial heteróloga”[13].
A jurisprudência, ademais, já começa a considerar o princípio da afetividade quando do regramento de situações nas relações familiares. Direito de visita ao menor por parte de ex-companheiros, determinação da existência de outras formas de família a ser tutelada pelo Direito, despatrimonialização das relações familiares, dando ênfase efetividade à necessária existência de afetividade para sua caracterização e a prevalência da filiação socioafetiva sobre o biologismo são algumas das posições recentemente adotadas pelos julgados.[14]
O princípio da pluralidade das formas de família. Em artigo bastante esclarecedor sobre o tema, Paulo Lôbo[15] aponta para o necessário reconhecimento e disciplinamento normativo de novas estruturas parentais/conjugais. Esclarece que são encontradas, na experiência brasileira, variadas formas de constituição de entidade familiar, a saber: 1– par andrógino, sob regime de casamento, com filhos biológicos; 2– par andrógino, sob regime de casamento, com filhos biológicos e filhos adotivos, ou somente com filhos adotivos, em que sobrelevam os laços de afetividade; 3– par andrógino, sem casamento, com filhos biológicos (união estável); 4– par andrógino, sem casamento, com filhos biológicos e adotivos ou apenas adotivos (união estável); 5– pai ou mãe e filhos biológicos (comunidade monoparental); 6– pai ou mãe e filhos biológicos e adotivos ou apenas adotivos (comunidade monoparental); 7– união de parentes e pessoas que convivem em interdependência afetiva, sem pai ou mãe que a chefie, como no caso de grupo de irmãos, após falecimento ou abandono dos pais; 8– pessoas sem laços de parentesco que passam a conviver em caráter permanente, com laços de afetividade e de ajuda mútua, sem finalidade sexual ou econômica; 9– uniões homossexuais, de caráter afetivo e sexual; 10– uniões concubinárias, quando houver impedimento para casar de um ou de ambos companheiros, com ou sem filhos; 11– comunidade afetiva formada com "filhos de criação", segundo generosa e solidária tradição brasileira, sem laços de filiação natural ou adotiva regular.
Ademais, assevera, Paulo Lôbo, que todos esses diferentes formatos de entidade familiar são albergados pela disciplina constitucional, superando a envelhecida visão de que as entidades familiares teriam previsão taxativa. É, pois, uma postura de inclusão, em consonância com os demais princípios do Direito de Família, especialmente o da dignidade da pessoa humana e o da igualdade.
O último princípio, por se tratar de matéria com íntima ligação ao instituto a ser posteriormente analisado no presente artigo (o parto anônimo), será tratado a seguir, em tópico específico e melhor pormenorizado.
2.2. O princípio do melhor interesse da criança/adolescente.
Entre os princípios que ganharam posição de destaque, recentemente, dentro do Direito de Família, está o princípio do melhor interesse da criança/adolescente. Em artigo clarificador sobre o tema, Tânia da Silva Pereira[16] estabelece como marco originário do princípio em exame seria o instituto inglês chamado parens patrie, do século XIII, representando uma prerrogativa do Rei em proteger aqueles que não poderiam fazê-lo em causa própria, vinculando-se à guarda de incapazes e a sua proteção. Assim, também no caso de proteção de menores seria o princípio aplicado, assegurando-se amparo aos seus interesses. Somente em 1836, todavia, tornou-se efetivo o princípio na Inglaterra.
Ademais, teria sido o princípio recepcionado, outrossim, pela jurisprudência norte-americana, em 1813, no caso Commowealth vs. Addicks, onde a Corte da Pensilvânia afirmou a prioridade dos interesses da criança em relação a seus pais, determinado a concessão da guarda à mãe, mesmo sendo esta considerada adúltera, vislumbrando, justamente, o melhor interesse do menor (best interest).
Foi com a Convenção Internacional dos Direitos da Criança, em 1989, todavia, que o princípio do melhor interesse da criança ganhou contornos mais precisos[17]. Em seu art. 3.1 fica estabelecido que: “todas as ações relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou privadas de bem-estar social, tribunais, autoridades administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar, primordialmente, o melhor interesse da criança”. Deve-se entender, outrossim, como criança, também a figura do adolescente (entre 12 e 18 anos), denominando corretamente o princípio como “melhor interesse da criança/adolescente”.
No Brasil, com a Constituição de 1988 e o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8069/90) adotou-se a chamada “Doutrina Jurídica da Proteção Integral” no que concerne à infância e juventude.
O art. 227 da Constituição Federal prescreve “prioridade absoluta” ao menor, determinando sua condição de “sujeito de direitos fundamentais”, estabelecendo, ademais, a necessária realização de todas as oportunidades e facilidades a fim de lhes propiciar um adequado desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. É norma dirigida não só ao Estado ou à sociedade como um todo, mas especialmente aos integrantes da família.
O ECA, por sua vez, destaca a situação do menor como sujeito em “condição peculiar de pessoa em desenvolvimento”[18]. Neste prisma, passa a opinião do menor a ser considerada importante fator de orientação/convencimento para o magistrado na busca pelo melhor interesse da criança no caso concreto, devendo, no processo, ser, a criança, assistida, sempre que necessário, por profissionais capacitados para lidar com a situação (psicólogos, pedagogo etc). É o que consta precisamente do art. 28 do ECA, a saber: “art. 28. A colocação em família substituta far-se-á mediante guarda, tutela ou adoção, independentemente da situação jurídica da criança ou adolescente, nos termos desta Lei. § 1º Sempre que possível, a criança ou adolescente deverá ser previamente ouvido e a sua opinião devidamente considerada”. Na jurisprudência, outrossim, é clara a aplicação do princípio, como no exemplo a seguir colacionado:
MENOR - GUARDA - AUSÊNCIA DE ACORDO ENTRE OS PAIS – PREVALÊNCIA DO MENOR. Na solução do conflito entre os pais, quanto à guarda dos filhos menores, o Juiz deve dar primazia ao interesse dos menores. Não havendo possibilidade de acordo entre os pais, o interesse do menor deve ser auferido, pelo Juiz, sobretudo, através da análise dos sentimentos expressados pelas crianças e pela pesquisa social, desenvolvida por psicólogos e assistentes sociais, que, com as demais provas trazidas aos autos, permitem avaliar a qualidade das suas relações afetivas, o seu desenvolvimento físico e moral, bem como a sua inserção no grupo social (TJ-PR - Ac. unân. 3658 da 6.ª Câm. Cív. julg. em 23-6-99 - Ap. 77.373-7- Ponta Grossa - Rel. Des. Accácio Cambi; in Apase Paraná).
Destarte, o que se percebe é a tentativa do legislador de definir terreno adequado para que a criança para nascer em condições dignas de saúde e convivência familiar, possa se desenvolver cultural-emocial-academicamente de maneira apropriada, gozando de ambiente que lhe franqueie liberdade, oportunidade de ser ouvida e, sobretudo, afetividade.
3. O instituto do Parto Anônimo: conceituação.
Após a análise de todo o curso de reestruturação do Direito de Família, com seu processo de constitucionalização e reformulação de princípios, despontando a prevalência da dignidade da pessoa humana, da liberdade e, principalmente, da afetividade, é possível tratar do instituto conhecido como parto anônimo.
Aída Kemelmajer de Carlucci, ao trata do tema, assevera que o referido instituto é figura quase incompreensível para um leitor latino-americano, em virtude da inexistência de regulação nessa região. A referida autora conceitua o instituto como sendo a outorga a mulher que haja dado a luz a um filho do direito de manter em segredo sua identidade; ou seja, a lei asseguraria a mãe a sua decisão de manter sua identidade em anonimato, de modo que a pessoa que ela gerou não só estaria impedida de iniciar uma ação de filiação, como também de saber, algum dia, quem fora sua genitora. Destarte, automaticamente, o filho havido através da caracterização do parto anônimo estaria habilitado para adoção[19]. É, pois, situação que corta, por completo, os vínculos jurídico-familiares com o recém-nascido, isentando, a mãe, de qualquer responsabilidade civil ou criminal.
O instituto tem suas origens no mecanismo chamado “roda dos expostos”, quando era permitida a entrega de recém-nascidos em Conventos: as crianças eram colocadas, em segurança, numa espécie de porta giratória, tendo a partir daí o resguardo ao direito à vida e a uma possível convivência familiar por adoção (costuma-se considerar a prática como criação de São Vicente de Paulo, que, para evitar uma situação de aborto ou abandono, franqueava à mãe a entrega da criança na torre da Igreja, anonimamente, tocando, logo em seguida, a campanhinha do Convento).
Tem por finalidade maior, por conseguinte, o instituto, prevenir o infanticídio, o aborto (especialmente o aborto tardio e o aborto realizado em clínicas clandestinas extremamente precárias) e o abandono de recém-nascidos – deixados, na maior parte das vezes, em condições degradantes.
O parto anônimo já é adotado em países como a França, Luxemburgo, Itália, Bélgica, Holanda, Áustria e em alguns estados dos EUA. No Brasil, por sua vez, o debate começa a se acentuar com a tramitação, na Câmara dos Deputados, de um Projeto de Lei com o objetivo de regulamentar o referido instituto.
Com a regulamentação do parto anônimo, as mães interessadas poderiam deixar os bebês nos hospitais ou postos de saúde para a posterior adoção sem ter de registrar a criança em seu nome e sem precisar se identificar. O procedimento de adoção a ser posteriormente realizado seria menos burocrático por não envolver o pretérito registro de pai e mãe nos documentos (sem a necessidade de fazer a destituição do poder familiar).
Apesar de ainda ser bastante intenso o debate acerca da utilidade/necessidade de legalização do parto anônimo, e de, por conseqüência, ainda não existir consenso dentro da doutrina, crer-se ser possível afirmar que o instituto em exame coaduna-se com os modernos princípios do direito de família, constituindo medida de extrema serventia e proficuidade na busca por uma regulação das relações familiares de forma justa. É o que se passa, então, a tratar.
3.1. Parto Anônimo: um instituto em consonância com os modernos princípios do Direito de Família.
Pelo acima exposto, pode-se concluir que o instituto do parto anônimo encontro respaldo na Constituição Federal e no moderno Direito de Família.
É expresso, na CF, a observância do princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1o, III), o direito à vida (art. 5o, caput) e a proteção à criança (art. 227). Os contornos do instituto em exame demonstram, justamente, o esforço estatal de, através do tratamento adequado da situação da gestante (tanto em termos físicos quanto em termos psicológicos), possibilitar seu discernimento para uma maternidade madura e sadia. O objetivo do legislador, registre-se, não é estimular o abandono de crianças para adoção; do contrário: o que se pretender é evitar, justamente, o abandono de crianças em situações subumanas, retirando-lhes qualquer expectativa de vida.
Diante do novo panorama do Direito Civil/Direito de Família, com a necessária releitura de seus institutos através dos ditames constitucionais, inseri-se, o parto anônimo, como verdadeiro instrumento de realização da dignidade da pessoa humana (promovendo a manutenção do direito à vida e do sadio desenvolvimento da criança, que, do contrário, estaria em condições piores). É, pois, expressão da tendência de repersonalização do Direito de Família.
Ademais, o próprio ECA, em seu art. 7o, estabelece a necessária efetivação de políticas públicas que permitam o nascimento e desenvolvimento sadio, em condições dignas de existência.
Ademais, seguindo a interpretação trazida pelos novos princípios do Direito de Família, desponta, a afetividade, como elemento imprescindível para a configuração da entidade familiar. Não bastam apenas os vínculos biológicos; necessário é que a entidade familiar guarde entre seus integrantes o afeto como verdadeiro liame de ajuntamento. Destarte, no parto anônimo, potencializa-se a existência de uma futura relação familiar (por adoção), esta sim preenchida de afeição/afeto. Registre-se, entretanto, que não se quer com a presente afirmativa generalizar a negativa de possibilidade da parturiente, que, em tese se submeteria ao parto anônimo, de voltar atrás em sua decisão (observados os prazos legais a serem definidos) e desempenhar adequadamente sua função de mãe, estando presente a afetividade. É, pois, instituto que funciona como válvula de escape para os casos em que a mãe tem discernimento definido de que não pretende ficar com a criança. Daí ser tão importante o acompanhamento psicológico quando da realização do parto anônimo.
Por sua vez, como observado em item específico supra-trabalhado, coaduna-se, o parto anônimo, com o princípio do melhor interesse da criança. Prescreve, o referido princípio, a observância do regime de “Proteção Integral”, devendo a sociedade, o Estado e a família atentarem, por primeiro, para o interesse da criança. O parto anônimo, ao potencializar o direito do nascituro à vida com dignidade, nada mais faz que transparecer o melhor interesse do menor, evitando abandonos, partos clandestinos ou futuras rejeições.
Cabe frisar, em certa medida já exposto no presente artigo, que deve ser encarado, o parto anônimo, como medida supletiva, como válvula de escape, e não como direito à negação da maternidade de forma absoluta. Somente assim estar-se-á atentando para o princípio do melhor interesse da criança.
3.2. Parto anônimo: uma opção frente ao desgastado debate acerca do aborto.
É tema recorrente, dentro do Direito Penal e do Direito de Família, a possível descriminalização do aborto. E, ínsito a esta discussão, acompanhando-a de forma insuperável e muitas vezes tomando completamente seu espaço, o debate sobre qual deve ser considerado o marco inicial da vida (se a partir da concepção; se somente após o processo de “nidação”; se somente a partir do nascimento com vida etc.).
O que se percebe, todavia, é que tal debate encontra-se sobremaneira desgastado, sem consenso aparentes. Atualmente, a questão do marco inicial da vida foi posta em evidência em virtude do exame da Ação Direta de Inconstitucionalidade junto ao STF, questionando a validade da Lei de Biosegurança, ainda sem definição em virtude da suspensão do julgamento pelo pedido de vistas do Ministro Carlos Alberto Menezes Direito.
O parto anônimo, em termos de convencimento argumentativo no processo legislativo, seria medida mais rápida e de mais fácil acordo de vontades. Diversas frentes contrárias ao aborto, como a Igreja Católica, mostram-se mais abertas à instituição do instituto em exame. O próprio Catecismo da Igreja Católica (CEC nº 2270) prescreve que “a vida humana deve ser respeitada e protegida de maneira absoluta a partir do momento da concepção. Desde o primeiro momento de sua existência, o ser humano deve ver reconhecidos os seus direitos de pessoa, entre os quais o direito inviolável de todo ser inocente à vida.”
Destarte, fica claro que um consenso na instituição do parto anônimo seria mais fácil e menos desgastante, ao passo que, a partir daí, poder-se-ia, em certa medida, tratar de maneira um pouco mais justa às questões de saúde pública ligadas à gestação indesejada, efetivando-se uma medida que, sem dúvida, protegeria os interesses do menor contra eventuais abandonos.
4. Ponto merecedor de destaque para o efetivo sucesso do parto anônimo: o necessário discernimento entre a diferença do direito ao estado de filiação frente ao direito de conhecer a origem genética.
Paulo Lobô, em artigo específico sobre o tema[20], prescreve o necessário discernimento entre o direito ao estado de filiação e o direito à origem genética. Defende, o referido autor, que, em virtude da prevalência, nas relações familiares, da afetividade, deve ser afastado o biologismo absoluto. Destarte, em havendo choque entre o estabelecimento de vínculos familiares formais entre critérios de afetividade e biológicos, o primeiro deve prevalecer. Todavia, deve ser preservado o direito de conhecimento do patrimônio genético, garantido, então, como direito fundamental. Poder-se-ia pensar, através dessa conclusão, na hipótese de uma ação intentada contra suposto pai biológico apenas para conhecimento da origem genética, sem necessária cumulação com reconhecimento de paternidade, em virtude de anterior relação familiar já instituída e com experiência de afetividade.
O perigo, todavia, no que pertine ao parto anônimo, seria a permissão da aplicação desse entendimento, o que geraria inutilidade do instituto, já que seria, a questão do sigilo, comprometida.
Com efeito, deve-se entender que, se o direito ao estado de filiação não é absoluto, também o direito ao conhecimento da origem biológica não o é. É imprescindível, para o sucesso do instituto, que o sigilo seja efetivamente mantido; caso contrário, haveria um elemento ínsito de desestímulo no parto anônimo, em virtude do perigo inerente do nascido através de parto anônimo conhecer sua genitora, mesmo que sem nenhum intuito patrimonialista ou de estabelecimento de filiação, causando extremo desgaste psicológico para ambos.
Daí ser tão importante o trabalho psicológico prévio e, sobretudo, a possibilidade de registro, no Hospital, de características genéticas básicas, a fim de suprir esta necessidade de procura posterior.
Conclusões
1. Passou, o Direito Civil e, conseqüentemente, o Direito de Família, por profundas modificações em sua estrutura. Além do processo de constitucionalização e repersonalização de ambos, as relações familiares tiveram sua estrutura ampliada, para albergar novos tipos de família, acompanhadas de nova regulação por modernos princípios mais condizentes com a realidade/interpretação constitucional.
2. Nesse caminho, aspectos como afetividade e o princípio do melhor interesse da criança, enquanto manifestações diretas do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e da liberdade, ganharam força na regulação do ambiente familiar.
3. O parto anônimo, neste panorama, desponta como medida em consonância com os modernos princípios do direito de família. Ao prescrever a possibilidade de colocação do recém-nascido para adoção, com quebra de vínculos familiares e isenção de responsabilização civil e criminal, mantendo-se o sigilo (inclusive relativizando-se o direito ao conhecimento da origem genética), o referido instituto nada mais faz que realizar o princípio da dignidade da pessoa humana e do melhor interesse da criança, dando ênfase ao aspecto afetividade, ao potencializar um futura convivência familiar.
4. Ademais, representa, o parto anônimo, uma opção legislativa de mais fácil consenso frente ao desgastado debate do aborto, possibilitando uma conformação/acordo de vontades mais equilibrado entre os diversos setores da sociedade, dotando o Poder Público de novas armas que facilitariam as políticas públicas relativas à proteção a gestação não desejada, evitando os abortos clandestinos e os abandonos de menores recém-nascidos em condições degradantes.
Referências
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lhorInteresse.pdf> Acesso em: 30 mar. 2008.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998. p. 45.
SILVA, José Afonso da. A dignidade da pessoa humana como valor supremo da democracia. In: Anais da XV Conferência Nacional da OAB. Foz do Iguaçu: OAB, 1994. p. 549.
TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468> Acesso em: 01 abr. 2008.
[1] STF – Pleno – MS no 22.164/SP – Rel. Min. Celso de Mello, Diário da Justiça, Seção I, 17 nov. 1995. p. 39.206.
[2] LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.
[3] PEREIRA, Tânia da Silva. O Direito de Família e os desafios do novo Código Civil. Disponível em: <http://www.mp.sp.gov.br/portal/page/portal/documentacao_e_divulgacao/doc_publicacao_divulgacao/doc_gra_doutrina_civel/civel%2053.pdf>. Acesso em: 30 mar. 2008.
[4] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.
[5] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.
[6] SILVA, José Afonso da. A dignidade da pessoa humana como valor supremo da democracia. In: Anais da XV Conferência Nacional da OAB. Foz do Iguaçu: OAB, 1994. p. 549.
[7] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.
[8] Cf. SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1998. p. 45.
[9] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.
[10] Cf. TARTUCE, Flávio. Novos princípios do Direito de Família brasileiro. Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1069, 5 jun. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8468>. Acesso em: 01 abr. 2008.
[11] Cf. PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Uma Principiologia para o Direito de Família. Disponível em <http://www.ibdfam.org.br/anais_download.php?a=40>. Acesso em: 30 mar. 2008.
[12] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Constitucionalização do Direito Civil. Jus Navigandi, Teresina, ano 3, n. 33, jul. 1999. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=507>. Acesso em: 30 mar. 2008.
[13] Cf. ALBUQUERQUE, Fabíola Santos. Adoção à Brasileira e a Verdade do Registro Civil. Disponível em <http://www.ibdfam.org.br/anais_download.php?a=14>. Acesso em: 30 mar. 2008.
[14] A título de exemplo da observância do princípio da afetividade dentro da regulação das relações familiares, registre-se a seguinte jurisprudência do STJ: REsp 124621/SP. Relator Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA. DIREITO CIVIL. PÁTRIO PODER. DESTITUIÇÃO. PAIS BIOLÓGICOS CONDENADOS CRIMINALMENTE. CARÊNCIA DE RECURSOS. IRRELEVÂNCIA. HIPÓTESES ESPECÍFICAS. ART. 395 DO CÓDIGO CIVIL C/C ART. 22 DO ESTATUTO. INTERESSES DO MENOR. PREVALÊNCIA. ORIENTAÇÃO DA TURMA. PRECEDENTES. ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA/STJ. RECURSO DESACOLHIDO. (...) II - Nos termos do artigo 23 do referido Estatuto, “a falta ou a carência de recursos materiais não constitui motivo suficiente para a perda ou a suspensão do pátrio poder”. E a destituição, como efeito da condenação criminal, nos termos do art. 92-II, Código Penal, só é automática quando se tratar de crime doloso, sujeito à pena de reclusão, cometido contra filho. III - Por outro lado, na linha de precedente desta Corte, “a legislação que dispõe sobre a proteção à criança e ao adolescente proclama enfaticamente a especial atenção que se deve dar aos seus direitos e interesses e à hermenêutica valorativa e teleológica na sua exegese”. IV - Assim, “apesar de a condenação criminal, por si só, não constituir fundamento para a destituição do pátrio poder, nem a falta de recursos materiais constituir motivo suficiente para essa conseqüência grave, o certo é que o conjunto dessas circunstâncias, somadas ao vínculo de afetividade formado com a família substituta, impossibilita que se modifique o status familae, no superior interesse da criança”. (grifos nossos)
[15] Cf. LÔBO, Paulo Luiz Netto. Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerus clausus. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 53, jan. 2002. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2552>. Acesso em: 01 abr. 2008.
[16] PEREIRA, Tânia da Silva. O princípio do melhor interesse da criança: da teoria à prática. Disponível em: <http://www.gontijo-familia.adv.br/novo/artigos_pdf/Tania_da_Silva_Pereira/MelhorInteresse.pdf> Acesso em: 30 mar. 2008.
[17] Apesar de, em outros instrumentos internacionais, já ter havido a iniciativa de proteção especial à infância, a saber: a Declaração de Genebra de 1924, a Declaração Universal de Direitos Humanos das Nações Unidas de 1948 e a Declaração Universal dos Direitos da Criança de 1959.
[18] Arts. 4º e 6º do ECA: Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;
b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.
(...)
Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.
[20] LÔBO, Paulo Luiz Netto. Direito ao estado de filiação e direito à origem genética: uma distinção necessária. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 194, 16 jan. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4752>. Acesso em: 02 abr. 2008.
Advogado da União, atual Coordenador Regional do Juizado Especial Federal da Procuradoria Regional da União da 1ª Região, Substituto, aprovado também nos concursos de Procurador da Fazenda Nacional, Procurador do Município de Maceió, Oficial de Justiça.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CARVALHO, Daniel Leão. Parto anônimo e sua consonância com o moderno Direito de Família Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 jul 2016, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47018/parto-anonimo-e-sua-consonancia-com-o-moderno-direito-de-familia. Acesso em: 22 nov 2024.
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