RESUMO: A doutrina e a jurisprudência já enfrentaram por diversas vezes questões relacionadas ao estabelecimento empresarial. Discussões como o próprio conceito, natureza jurídica, elementos e os possíveis reflexos oriundos da alienação do estabelecimento comercial, foram alvo de muito debate, merecendo alguns esclarecimentos.
PALAVRAS-CHAVE: Estabelecimento empresarial. Natureza Jurídica. Elementos. Alienação. Consequências.
1 INTRODUÇÃO
O direito empresarial pátrio passou por grandes evoluções ao longo das últimas décadas, notadamente em razão do direito europeu. Por possuir fortes raízes francesas e italianas, muitos institutos foram importados desses berços, gerando a necessidade de adaptação ao ordenamento pátrio. Tudo isso em razão das próprias peculiaridades do direito brasileiro e do exercício local da atividade empresarial.
O estabelecimento empresarial é um excelente exemplo dessa influência europeia, pois é um instituto importante por estar intimamente ligado à economia nacional, movimentando todos os setores do Estado.
Com efeito, não se pode deixar de apontar as características básicas do estabelecimento empresarial, já que, desde a sua conceituação, houve bastante divergência doutrinária e jurisprudencial. Além disso, o estudo acerca da natureza jurídica, que possui várias correntes, é tema indispensável.
Outrossim, o presente trabalho abordará aspectos ligados à alienação do estabelecimento empresarial. Isso porque, o ordenamento jurídico pátrio visa evitar que haja fraude contra os credores do estabelecimento, já que o titular dessa entidade privada poderá se valer da alienação para se esquivar das responsabilidades inerentes ao desenvolvimento de atividade empresarial.
2 ESTABELECIMENTO EMPRESARIAL
2.1 Conceito
A noção de estabelecimento empresarial assemelha-se à noção de fonds de commerce do direito francês – a doutrina entende que surgiu pela primeira vez na França, na lei fiscal de 28 de fevereiro de 1872, de azienda commerciale do direito italiano, bem como de Geschäft ou Handelsgeschäft do direito alemão.
Estabelecimento empresarial é o conjunto de bens que o empresário reúne para exploração de sua atividade econômica, visando torná-la mais eficiente para a obtenção de lucros. Nesta toada, o art. 1.142 do Código Civil considera estabelecimento “todo complexo de bens organizado, para exercício da empresa, por empresário, ou por sociedade empresária”.
Com efeito, trata-se de elemento indissociável à empresa, não existindo a possibilidade de se dar início à exploração de qualquer atividade empresarial, sem a organização de um estabelecimento[1].
Vale ressaltar que caso determinado bem, embora integrante da massa patrimonial da sociedade empresária, não tenha utilidade no processo produtivo, será considerado fora do conceito de estabelecimento empresarial.
Impende apontar que parte da doutrina prefere a expressão “fundo de comércio”. Ao explicar os motivos que o levaram a adotar esta nomeclatura, Fran Martins disse que:
No Brasil, pois, tem sido usada para significar o fundo de comércio, a expressão estabelecimento comercial. Assim cuidam do assunto Carvalho de Mendonça, que dá como sinônimo de estabelecimento comercial a expressão negócio comercial, empregada no Regulamento n.º 738, de 25 de novembro de 1850, arts. 15 e 157, e pela Lei n.º 2.024, de 17 de dezembro de 1908, arts. 2º, n.º 7, 78 e 157; Júlio Pires Ferreira e Waldemar Ferreira. Empregamos, contudo, a designação fundo de comércio pela generalização que vem tendo em todo o mundo e porque o Dec. n.º 24.150, de 20 de abril de 1934, que regula as condições e processo de renovação dos contratos de locação de imóveis destinados a fins comerciais e industriais – um dos elementos mais destacados do fundo de comércio, ou seja, a propriedade comercial – a ela se integra em parte no valor do imóvel”. Tem, contudo a expressão por nós usada o mesmo significado de estabelecimento comercial, preferida pelos autores citados.
Um outro motivo pelo qual preferimos a designação fundo de comércio é o fato de estabelecimento comercial poder confundir-se, como via de regra ocorro na prática, com a casa comercial. Podendo ser a casa comercial não apenas o prédio em que o empresário se localiza como, igualmente, a empresa comercial, a confusão se faz de modo fácil, sendo muitas vezes difícil se cogitar quando é empregada num ou noutro sentido. Em razão de tudo isso, se faz mais apropriado o emprego da expressão fundo de comércio em vez de estabelecimento comercial[2].
De maneira geral, entende-se, portanto, que estabelecimento empresarial (ou fundo de comércio) é o conjunto de bens corpóreos e incorpóreos da sociedade que são indispensáveis ao desenvolvimento regular da atividade empresarial.
2.2 Natureza jurídica
Muito se discutiu na doutrina – nacional e internacional – acerca da natureza jurídica do estabelecimento comercial. Várias correntes surgiram para explicar a questão. Atualmente, o tema encontra pacificado no sentido de que a natureza jurídica é de sociedade de fato.
Entre as teses, pode-se apontar 5 (cinco): a) ente dotado de personalidade jurídica; b) patrimônio afetado, separado; c) propriedade incorpórea; d) universalidade de direito; e e) universalidade de fato.
Pela primeira, afirma-se que o estabelecimento comercial constituiu um verdadeiro sujeito de direitos e obrigações, entretanto, até mesmo perfunctoriamente, é sabido que o estabelecimento não exerce qualquer direito em nome próprio, portanto, não possui personalidade jurídica[3].
A segunda tese se mostrou insustentável na medida em que tenta conceber o estabelecimento como um patrimônio afetado. Ora, não se pode afastar uma parte (do patrimônio do titular da atividade empresarial) do todo e isolá-la para todos os fins de direito.
Pela terceira, estabelecimento empresarial seria uma propriedade incorpórea, ou seja, uma abstração jurídica, confundindo-se até mesmo com a própria clientela. Porém, afasta-se este modo de pensar, pois a clientela é um dos elementos integrantes do estabelecimento[4] (GUSMÃO, 2009, p. 186).
Por sua vez, a quarta corrente explica que a natureza jurídica do estabelecimento empresarial é de uma universalidade de direito. No entanto, a exemplo da massa falida, do espólio, somente pode-se constituir uma universalidade de direito, por lei.
Por fim, a tese da universalidade de fato é a mais adotada pela doutrina pátria. Nesse sentido, o estabelecimento empresarial é a pluralidade de bens singulares que, pertinentes à mesma pessoa, tenham destinação unitária[5].
Fábio Ulhoa Coelho destaca três pontos essenciais para o esclarecimento do debate, quais sejam: 1) o estabelecimento empresarial não é sujeito de direito; 2) o estabelecimento empresarial é um bem; e 3) o estabelecimento empresarial integra o patrimônio da sociedade empresária.
Dessa feita, na classificação geral dos bens, estabelecida pelo Código Civil, o estabelecimento empresarial é uma universalidade de fato (art. 90), por encerrar um conjunto de bens pertinentes ao empresário (cuja propriedade titulariza ou dos quais é locador, comodatário, arrendatário etc.) e destinados à mesma finalidade, de servir à exploração de empresa (COELHO, 2013, p. 168).
2.3 Elementos
De acordo com a doutrina, os elementos integrantes do estabelecimento empresarial se dividem em dois peculiares grupos: aqueles incorpóreos e os denominados corpóreos (ou materiais e imateriais).
Sendo assim, compõem o primeiro grupo a propriedade comercial, o nome empresarial – firma ou denominação -, os acessórios do nome empresarial, tais como o título do estabelecimento e as expressões ou sinais de propaganda, a propriedade industrial (as de invenção, assim como patentes, as patentes dos modelos de utilidade e desenhos e modelos industriais e as garantias de uso das marcas de indústria, de comércio e de serviços), e a propriedade imaterial, caracterizada pelo aviamento (MARTINS, 2013, p. 350.)[6].
Por outro lado, integram os bens corpóreos do estabelecimento as mercadorias do estoque, os mobiliários, utensílios, veículos, maquinaria e todos os demais bens corpóreos que o empresário utiliza na exploração de sua atividade econômica.
2.4 Alienação do estabelecimento empresarial
Diversos países se preocuparam em disciplinar a alienação de estabelecimento empresarial, objetivando assegurar os créditos dos credores. Ao pesquisar sobre o assunto, Fabio Ulhoa Coelho traz alguns apontamentos:
Na Alemanha, o Handelsgesetzbuch, de 1897, contempla a regra que importa a responsabilidade do adquirente do estabelecimento empresarial pelas obrigações do alienante, quando mantido o nome empresarial (Koller-Roth-Morck, 1996:109/117). O direito francês, por sua vez, desde 1909, admite que os credores do alienante se oponham à venda do estabelecimento, inclusive para discutir o preço contratado, que deve ser suficiente para ele solver suas obrigações (Ripert-Roblot, 1947:503/504). Na Argentina, desde 1934, a lei determina que o preço do estabelecimento não pode ser inferior ao total do passivo do alienante, e o seu pagamento não pode ser realizado senão depois de transcorridos 10 dias da publicação do anúncio da venda. Essas duas limitações são estabelecidas, para que terceiros possam reclamar, naquele prazo, junto ao adquirente, a satisfação do crédito titularizado perante o alienante. Após atender às reclamações dos credores, o adquirente paga ao alienante o saldo do valor pactuado. Por fim, cabe lembrar o direito italiano, em que disposições do Codice Civile, de 1942, definem que o adquirente se sub- roga em todas as obrigações ativas e passivas do alienante, salvo as de caráter pessoal e as expressamente ressalvadas no contrato.
No que diz respeito à evolução da matéria na estrutura jurídica pátria, o referido autor destaca que:
No Brasil, até a entrada em vigor do Código Civil, considerava-se que o passivo não integrava o estabelecimento (Barreto Filho, 1969:228/229); em consequência, a regra era a de que o adquirente não se tornava sucessor do alienante. Isto é, os credores de um empresário não podiam, em princípio, pretender o recebimento de seus créditos de outro empresário, em razão de este haver adquirido o estabelecimento do primeiro. Admitia-se, então, somente três hipóteses de sucessão: a assunção de passivo expressa no contrato, as dívidas trabalhistas e fiscais. Com a entrada em vigor do Código Civil, altera-se por completo o tratamento da matéria: o adquirente do estabelecimento empresário responde por todas as obrigações relacionadas ao negócio explorado naquele local, desde que regularmente contabilizadas, e cessa a responsabilidade do alienante por estas obrigações no prazo de um ano (art. 1.146). Claro está que somente nos trespasses realizados após a vigência do Código Civil, opera-se a sucessão e liberação nestes termos; nos anteriores, vigora o princípio da não sub-rogação de passivo em decorrência do trespasse.
De acordo com o art. 1.143, CC, pode o estabelecimento ser objeto unitário de direitos e de negócios jurídicos, translativos ou constitutivos, que sejam compatíveis com a sua natureza. Esse dispositivo é de suma importância tanto para o direito civil (e empresarial) quanto para o direito tributário.
Destaque-se que não se pode confundir a alienação do estabelecimento – negócio denominado “trespasse” – com a cessão de quotas sociais de sociedade limitada ou alienação de controle de sociedade anônima. Nesta, não há transferência na titularidade do estabelecimento empresarial, ocorrendo uma mera alteração no quadro societário.
Trespasse ou trespasso é o negócio jurídico por meio do qual o empresário ou sociedade empresária (trespassante) aliena o estabelecimento comercial como um todo ao adquirente (trespassário), transferindo-lhe a titularidade de todo o complexo que integra o estabelecimento empresarial e recebendo o pagamento do adquirente (NERY Jr., 2005, p. 595).
O negócio jurídico de trespasse é contrato consensual, oneroso, sinalagmático, não solene e comutativo. A tradição do estabelecimento empresarial ocorre com a conferência do inventário dos bens que o integram, seguida da entrega das chaves. Não havendo reserva de bens no inventário ou, ainda, não tendo havido inventário, presume-se que a venda do estabelecimento se deu com “portas fechadas”, isto é, incluindo-se todos os bens integrantes do estabelecimento[7].
Com efeito, o contrato que tenha por objeto a alienação, o usufruto ou arrendamento do estabelecimento só produzirá efeitos quanto a terceiros depois de averbado à margem da inscrição do empresário, ou da sociedade empresária, no Registro Público de Empresas Mercantis, e de publicado na imprensa oficial, consoante o art. 1.144, CC. Atente-se que, em regra, o trespasse envolve a cessão da locação e, assim, depende da anuência expressa do locador.
Dessarte, a eficácia da alienação do estabelecimento está condicionada ao pagamento de todos os credores do empresário. Se não lhe restarem bens suficientes para solver o seu passivo, deverá o alienante notificar os credores para obtenção de consentimento, expresso ou tácito, no prazo de 30 (trinta) dias a contar da notificação, nos termos do art. 1.145, CC.
Em caso de inobservância desse requisito, na linha da Lei Falimentar, poderá haver requerimento de falência do empresário, por prática de ato de falência (art. 94, III, “c”, Lei 11.101/05), que, em caso de procedência, implicará na ineficácia do ato de alienação, inclusive de ofício pelo juiz (art. 129, VI e parágrafo único), e consequentemente restituição dos bens alienados ao ativo da massa (art. 86, III).
O novel Diploma Civil trouxe inovações no tocante à alienação do estabelecimento empresarial. Com a nova redação, o legislador deixou claro que, contrariamente ao dispositivo anterior, o adquirente será responsável pelos débitos anteriores à transferência – pois aqui se presume que tinha ciência, ao adquirir o estabelecimento, de todos os débitos existentes –, desde que contabilizados, bem como estabeleceu a continuidade da responsabilidade do alienante pelo prazo de 1 (um) ano, conforme a nova disposição do art. 1.146:
O adquirente do estabelecimento responde pelo pagamento dos débitos anteriores à transferência, desde que regularmente contabilizados, continuando o devedor primitivo solidariamente obrigado pelo prazo de 1 (um) ano, a partir, quanto aos créditos vencidos, da publicação, e, quanto aos outros, da data do vencimento.
Ressalte-se que a regular contabilização da dívida para fins de responsabilização do adquirente do estabelecimento empresarial não se exige em relação a passivos de duas ordens: trabalhista e tributário. Também não se verifica relativamente a essas obrigações a liberação do alienante no prazo de um ano[8].
Em relação às dívidas trabalhistas, merece destaque o art. 448 da CLT, pelo qual “a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados”.
Com efeito, lembrando que a legislação trabalhista visa a proteção do trabalhador, observa-se mais um sistema de amparo. Pois, em havendo qualquer modificação na titularidade na sociedade, ao obreiro é assegurado o direito de cobrar o que lhe for devido tanto do alienante quanto do adquirente. Logo, não poderá ser oposto, quando da reclamação trabalhista, os termos do contrato de trespasse contra empregado, pois perante este não produzirá efeitos.
Dessa forma, sendo o alienante demandado, responderá por todos os débitos trabalhistas, resguardando-se do direito de regresso, caso constasse do contrato de alienação a cessão da dívida, contra o adquirente. Se este for reclamado, ocorrerá situação semelhante, pois, caso seja condenado, terá direito de regresso contra o alienante.
Sinteticamente, resumindo a discussão, o Tribunal Superior do Trabalho tem jurisprudência firma nessa mesma linha:
SUCESSÃO DE EMPREGADORES. ARTIGOS 10 E 448 DA CLT. RESPONSABILIDADE DA SUCEDIDA PELOS DÉBITOS TRABALHISTAS DOS EMPREGADOS QUE LHES PRESTARAM SERVIÇOS NOS CASOS EM QUE A SUCESSORA É PRÉVIA E MANIFESTAMENTE INADIMPLENTE.
Nos termos em dispõe o artigo 10 da CLT, a alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados. O artigo 448 da CLT, por sua vez, assevera que a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados. Nessa esteira, consagrou-se o entendimento, na doutrina e na jurisprudência, de que a sociedade empresária sucessora trabalhista responde integralmente pelos débitos oriundos das relações de trabalho, ainda que referentes a período anterior à sucessão, e mesmo que o contrato de trabalho tenha cessado anteriormente a ela. Essa tese resguarda os empregados contra as incertezas das relações econômicas, preservando sempre seus direitos trabalhistas, uma vez que imputa à sucessora a responsabilidade por seus créditos trabalhistas independentemente da época em que seus direitos foram lesados, haja vista que a nova empregadora sempre deverá arcar, integralmente, com o pagamento dos débitos trabalhistas da sucedida. Isso não significa, no entanto, que a sucessão trabalhista, a exemplo do que ocorre na sucessão disciplinada pelo direito civil, implique, sempre e necessariamente, a liberação integral da empresa sucedida de sua responsabilidade pelo pagamento dos débitos trabalhistas dos empregados que lhes prestaram serviços. Com efeito, a responsabilidade da sociedade empresária sucessora foi construída pelo Direito do Trabalho com o escopo de proteger os empregados de uma eventual inadimplência de seus créditos trabalhistas. Ocorre que, muitas vezes, as partes negociantes têm transferido a propriedade da empresa para uma sociedade empresária de menor porte financeiro, ficando a sucedida com o capital resultante da alienação, mas sem a responsabilidade de arcar com os débitos trabalhistas do período de sua atuação enquanto a sucessora, que já não detinha patrimônio suficiente, fica sem ativos bastantes para solver aquelas dívidas trabalhistas. Como corolário, quem, no fim, fica prejudicado são os trabalhadores, que não conseguem ter seus créditos laborais quitados. Nesse contexto, fica claro que a regra geral acima delineada não pode ser aplicada nesses casos, porquanto criada para proteger os obreiros, e não para desampará-los. Em casos como este, em que a própria instância regional registrou expressamente no acórdão a existência de indícios de que a sucessão empresarial deu-se de forma a enfraquecer substancialmente as garantias patrimoniais de quitação dos débitos trabalhistas ao conjunto, sucessor e sucedido responderão conjuntamente pelo débito, pois não faz sentido que a sucessão empresarial acarrete prejuízos aos empregados enquanto as partes negociantes, seus sucessivos empregadores, lucram com o negócio jurídico. Esse entendimento, além de suprir a hipossuficiência dos empregados e preservar seus créditos com o empregador, observa o princípio da proteção, cerne do Direito do Trabalho. Esse é o escólio de Maurício Godinho Delgado, para quem "a jurisprudência tem ampliado as possibilidades de responsabilização subsidiária do antigo titular do empreendimento por além das situações de fraude comprovadas no contexto sucessório (art. 9º, CLT; art. 159, CCB/1916, e art. 186, CCB/ 2003, combinados com art. 8º, parágrafo único, CLT). Mesmo que não haja fraude, porém comprometimento das garantias empresariais deferidas aos contratos de trabalho, incidiria a responsabilidade subsidiária da empresa sucedida" (DELGADO, Maurício Godinho, Curso de Direito do Trabalho. 10ª edição. São Paulo: LTr, 2011, p.419 - grifou-se). Por fim, os artigos 10 e 448 da CLT não impedem a atribuição de responsabilidade solidária ou subsidiária à sociedade sucedida nas circunstâncias registradas na decisão regional, uma vez que ela apenas estabelece que a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afeta os contratos de trabalho dos respectivos empregados[9]. (Negrito nosso)
Por fim, em relação à cláusula de não-restabelecimento, contida no art. 1.147, entende-se que “não havendo autorização expressa, o alienante do estabelecimento não pode fazer concorrência ao adquirente, nos 5 (cinco) anos subsequentes à transferência”; outrossim, no parágrafo único, a regra é no sentido de que “no caso de arrendamento ou usufruto do estabelecimento, a proibição prevista neste artigo persistirá durante o prazo do contrato”.
Ou seja, o alienante não poderá, nos 5 (cinco) anos subsequentes à transferência, restabelecer-se em idêntico ramo de atividade empresarial ou na mesma praça, concorrendo com o adquirente, salvo se devidamente autorizado em contrato.
3 CONCLUSÃO
Portanto, pode-se perceber que, devido a sua importância, o tema relacionado ao estabelecimento empresarial deve ser mais aprofundado, já que é o núcleo de toda atividade econômica do país. Não se enxerga o regular exercício empresarial sem uma estrutura sólida e, para isso, o estabelecimento empresarial merece um cuidado à parte.
Dessa feita, após ultrapassadas as questões mais simples, relacionadas ao conceito do instituto, as demais matérias não podem ser esquecidas. Com efeito, a natureza jurídica do estabelecimento empresarial, a depender da corrente adotada, dará ensejo a diversas celeumas. Por isso, o entendimento majoritário e no sentido de se tratar de uma universalidade de fato.
De mais a mais, o ordenamento jurídico nacional trouxe diversos requisitos para que se possa alienar um estabelecimento empresarial. A razão de ser dessas regras é que se deve evitar o prejuízo a eventuais credores, bem como o uso abusivo da personalidade jurídica autônoma das pessoas jurídicas. Logo, verifica-se se tratar de um tema deveras importante.
REFERÊNCIAS
BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de recuperação de empresas e falência: lei 11.101/2005 comentada artigo por artigo. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: 2011.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: direito de empresa. 1. vol. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2013.
COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de direito comercial: direito de empresa. 21. ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
GUSMÃO, Mônica. Lições de direito empresarial. 8. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009.
MARTINS, Fran. Curso de direito comercial/ atual. Carlos Henrique Abrão. 36. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
NERY JUNIOR, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código civil comentado e legislação extravagante. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.
REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
[1] COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial, volume I: direito de empresa. ed. 17. São Paulo: Saraiva, 2013.
[2] No meio jurídico, adota-se ora a expressão “fundo de comércio” (derivada do francês, fonds de commerce, e cuja tradução mais ajustada seria, na verdade, “fundos de comércio”), ora “aviamento” (do italiano avviamento), para designar o sobrevalor nascido da atividade organizacional do empresário. Prefiro falar em “fundo de empresa”, tendo em vista que o mesmo fato econômico e suas repercussões jurídicas se verificam na organização de estabelecimento de qualquer atividade empresarial. Registro que não é correto tomar por sinômimos “estabelecimento empresarial” e “fundo de empresa”. Este é um atributo daquele; não são, portanto, a mesma coisa. Precise-se: o estabelecimento empresarial é o conjunto de bens que o empresário reúne para explorar uma atividade econômica, e o fundo de empresa é o valor agregado ao referido conjunto, em razão da mesma atividade (ULHOA, 2013, p. 166).
[3] Tese nascida na Alemanha, cujos precursores são Endemann e Wilhelm. Buscou-se um estudo que justificasse o estabelecimento comercial como uma pessoa jurídica, entretanto, esse pensamento não se mostra sequer compatível com o ordenamento pátrio. Conforme visto no conceito de estabelecimento, o sujeito de direitos é a sociedade empresária, sendo a ela imputadas as obrigações e assegurados os direitos, e não ao estabelecimento.
[4] Fábio Ulhoa Coelho discorda desse posicionamento, para ele, é um equívoco a consideração da clientela como elemento do estabelecimento empresarial. Explica que: clientela é o conjunto de pessoas que habitualmente consomem os produtos ou serviços fornecidos por um empresário. Dessa forma, embora até seja possível falar-se em um direito à clientela, cuja tutela se faz por meio da repressão à concorrência desleal, não se deve confundi-la com os bens do patrimônio da sociedade empresária (COELHO, 2013, p. 169).
[5] Monica Gusmão, 2009, p. 186.
[6] Discordando das lições de Fran Martins, considerando incorreta a afirmação de que o aviamento constitui elemento incorpóreo do estabelecimento empresarial, Fabio Ulhoa defende ser incorreta essa afirmação. Para ele, o aviamento é um atributo da empresa, e não um bem de propriedade do empresário. Dessa forma, quando se negocia o estabelecimento empresarial, a definição do preço a ser pago pelo adquirente se baseia fundamentalmente no aviamento, isto é, nas perspectivas de lucratividade que a empresa explorada no local pode gerar. Com efeito, isto não significa que se trate de elemento integrante do complexo de bens a ser transacionado. Significa unicamente que a articulação desses bens, na exploração de uma atividade econômica, agregou-lhes um valor que o mercado reconhece. Nessa linha, tem-se por aviamento como sendo sinônimo de fundo de empresa, ou seja, designam ambas expressões o sobrevalor, agregado aos bens do estabelecimento empresarial em razão da sua racional organização pelo empresário (COELHO, 2013, p. 169).
[7] Nery Jr., apud Maria Antonieta Lynch de Moraes – o trespasse: a alienação do estabelecimento empresarial e a cláusula de não restabelecimento, RT 792/116, pp. 119/120.
[8] COELHO, 2013, p. 188.
[9] RR - 934-66.2010.5.11.0004, Min. Rel. José Roberto Freire Pimenta, 2ª Turma, TST, julgamento: 31.10.2012.
Advogado com experiência em Direito Público. Graduado em Direito pela Universidade Tiradentes - UNIT
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RODRIGUES, Ticiano Marcel de Andrade. Aspectos controvertidos acerca do estabelecimento comercial e a sua alienação Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 jul 2016, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47095/aspectos-controvertidos-acerca-do-estabelecimento-comercial-e-a-sua-alienacao. Acesso em: 22 nov 2024.
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