RESUMO: o presente artigo aborda as regras e princípios estabelecidos pela Lei de Responsabilidade Fiscal aplicáveis aos Municípios, face aos comandos constitucionais, inclusive no que se refere a autonomia dos entes federativos.
Palavras-chave: Município; responsabilidade fiscal; controle interno e externo.
INTRODUÇÃO
A Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101 de 04 de maio de 2000) veio regulamentar o Capítulo II do Título VI da Constituição Federal (Das Finanças Públicas), tendo por objetivo estabelecer normas de finanças públicas voltadas para responsabilidade da gestão fiscal. A responsabilidade fiscal pode ser definida como o cuidado, o zelo na arrecadação das receitas e nas despesas públicas, obrigando-se o gestor a agir com transparência de forma planejada.
Nesse sentido, importante analisar quais os limites e efetiva incidência da aludida lei no âmbito municipal.
DESENVOLVIMENTO
A Lei de Responsabilidade Fiscal é aplicável a todos os entes da Federação (incluindo, portanto, os Municípios). Nesse sentido, trata-se de lei complementar de caráter nacional, e nos termos do art. 24 da Constituição Federal, abrange matéria de competência concorrente (matéria de direito financeiro) – ou seja, a lei nacional estabelece apenas as normas gerais. Dessa forma, as leis locais devem indicar, principalmente, os órgãos responsáveis pela fiscalização do cumprimento do programa governamental de trabalho e da liberação das quotas trimestrais, fixando-lhes as atribuições, limites de atuação e responsabilidades. Os demais encargos do controle interno são do Prefeito Municipal, nos termos do art. 76 da Lei 4.320/1964.
Como a autonomia municipal se exerce nos Poderes Legislativo e Executivo, é nesse âmbito que se centrará a sua relação com os deveres estabelecidos na Lei de Responsabilidade Fiscal.
A fiscalização financeira e orçamentária no âmbito municipal realiza-se mediante controle externo da Câmara de Vereadores, com o auxílio do Tribunal de Contas dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver; e controle interno do Executivo Municipal (art. 59 da Lei de Responsabilidade Fiscal), na forma da lei (art. 31 da CF). Além disso, a Lei de Responsabilidade Fiscal possibilita ao cidadão que denuncie qualquer irregularidade ou ilegalidade, responsabilizando corretamente quem efetuar denúncia infundada ou inverídica.
A lei estabelece que a Câmara Municipal, diretamente ou com o auxílio do Tribunal de Contas, bem como o sistema de controle interno de cada Poder e do Ministério Público, fiscalizarão o cumprimento de suas normas, com ênfase nos seguintes pontos (art. 59): a) atingimento das metas atingidas na lei de diretrizes orçamentárias; b) limites e condições para realização de operações de crédito e inscrição em restos a pagar; c) medidas adotadas para o retorno da despesa total com pessoal ao respectivo limite, nos termos dos arts. 22 e 23; d) providências tomadas, conforme o disposto no art. 31, para recondução dos montantes das dívidas consolidada e mobiliária aos respectivos limites; e) destinação de recursos obtidos com a alienação de ativos, tendo em vista aas restrições constitucionais e as Leis de Responsabilidade Fiscal; e, f) cumprimento do limite de gastos totais dos Legislativos Municipais, quando houver.
No mesmo sentido, a lei prevê que os Tribunais de Contas alertarão os Poderes ou o Ministério Público, Congresso Nacional, Senado Federal, Assembleias Legislativas Estaduais, Tribunais de Contas Estaduais, do Distrito Federal e dos Municípios, quando houver, os Tribunais referidos no art. 92 da CF, os Tribunais de Justiça e as demais Cortes Estaduais, nas hipóteses em que constarem a possibilidade de a realização da receita não comportar o cumprimento das metas de resultado primário ou nominal estabelecidas no Anexo de Metas Fiscais; de que o montante da despesa total com pessoal ultrapassou 90% dos respectivos limites; que os gastos com inativos e pensionistas se encontram acima do definido em lei; bem como fatos que comprometem os custos ou resultados dos programas ou indícios de irregularidades na gestão orçamentária. Compete também aos Tribunais de Conta verificar os cálculos dos limites da despesa total com pessoal de cada poder e órgão referidos no art. 20 da lei.
O art. 63 da lei faculta aos Municípios com população inferior a cinquenta mil habitantes optar por fazer a verificação do cumprimento dos limites estabelecidos nos art. 19 e 20 apenas no final do semestre, bem como divulgar semestralmente o Relatório de Gestão Fiscal e os demonstrativos indicados no art. 53. Ainda, é facultado àqueles Municípios elaborar o anexo de metas fiscais e o anexo de riscos fiscais da LDO e o anexo de que trata o inciso I do art. 5º a partir do quinto exercício seguinte à publicação da lei complementar.
Estabelece a lei, ainda, no art. 64, que a União prestará assistência técnica e cooperação financeira aos Municípios para a modernização das respectivas Administrações tributária, financeira, patrimonial e previdenciária, com vistas ao cumprimento das suas normas.
Especificamente sobre deveres do Chefe do Executivo, os principais delitos que podem vir a ser cometidos estão estabelecidos nos art. 359-A a 359-H do Código Penal. Por esse motivo, o gestor que está iniciando o mandato deve fazer uma triagem em relação aos Restos a Pagar, fazer uma distinção entre aqueles que derivam de despesa processada e despesas não processadas, verificar a possibilidade de baixa dos Restos a Pagar, verificar a confiabilidade daqueles que estão como processados, se realmente aquele bem ingressou, se aquele serviço foi prestado, para finalmente, ter a convicção daquilo que se vai pagar. Outra providência importante é fazer uma análise das despesas contraídas nos oito últimos meses da gestão passada e toda aquela despesa que tenha sido contraída sem saldo financeiro em caixa, a fim de encaminhar denúncia aos órgãos competentes, posto que ela não deveria ter sido realizada. O gestor passado é quem vai ser responsabilizado por essas despesas, o que respeita ao princípio da “intranscendência subjetiva das sanções”.
Já quanto aos Vereadores, a sua responsabilidade político-administrativa está prevista no Decreto-Lei nº 201/67.
No que se refere à transparência da gestão fiscal, um dos pilares em que se apoia a lei, pressupõe-se que seja adotada uma linguagem simples, acessível e compreensível ao cidadão quando da divulgação de informações, a fim de permitir o controle social. A própria lei estabelece alguns instrumentos de transparência (ou seja, a lista não é exaustiva), determinando que deverá ser dada ampla divulgação, inclusive através de meios eletrônicos de acesso ao público, aos planos, orçamentos e Leis de Diretrizes Orçamentárias, prestações de contas e respectivo parecer prévio, bem como relatório resumido da execução orçamentária e relatório de gestão fiscal.
Ainda no âmbito da transparência, a lei prevê o incentivo à participação popular e realização de audiências públicas durante o processo de elaboração e de discussão dos orçamentos, bem como que sejam deixadas disponíveis as contas apresentadas pelo chefe do Poder Executivo que incluirão, além das suas próprias, as do presidente da Mesa Diretora da Câmara Municipal, durante todo o exercício, no respectivo Poder Legislativo e no órgão técnico responsável pela sua elaboração, para que possam ser consultadas e apreciadas por qualquer cidadão ou instituição da sociedade. Como se não bastasse, devem ser realizadas, até o final dos meses de maio, setembro e fevereiro, audiências públicas na Câmara Municipal, nas quais o Poder Executivo demonstrará e avaliará o cumprimento das metas fiscais de cada quadrimestre.
Cabe ressaltar, por fim, que inegavelmente as receitas públicas sofrem influência direta da situação da economia, não só local e regional, como também nacional. Tendo em vista que os Municípios não têm o comando da política econômica e eventuais mudanças na sua condução, o art. 66 da lei traz o remédio para situações de baixo crescimento econômico ou mesmo crescimento negativo do PIB nacional, regional ou estadual por período igual ou superior a quatro meses. Nesses casos os prazos estabelecidos para retorno ao limite de comprometimento da despesa total com o pessoal e dívida serão duplicadas.
CONCLUSÃO
Do explanado, conclui-se que a Lei Complementar nº 101 representou um marco na Administração Pública, impondo um novo padrão de conduta fiscal, regido pelo planejamento, transparência e controle dos gastos públicos. Esse padrão de comportamento é imprescindível para a atual conjuntura política, principalmente no que se refere à atual autonomia do Município frente aos demais entes federativos, nos termos da CF/88, bem como a fim de serem observados os princípios e regras que regem a atuação da Administração Pública.
REFERÊNCIAS
BARROS, Wellington Pacheco. O Município e seus agentes. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002.
FIGUEIRÊDO, Carlos Maurício Cabral e NÓBREGA, Marcos Antônio Rios da. Gestão Fiscal Responsável – Os Municípios e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão; Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio e Gestão; Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, 2001.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro, 16ª Edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2008.
Bacharel em Direito na Universidade Federal de Santa Maria. Analista Judiciária da Justiça Federal do Rio Grande do Sul/TRF4.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PSZEBISZESKI, Rafaela Fernanda Fontoura. A Lei de Responsabilidade Fiscal frente aos Municípios Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 jul 2016, 04:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/47122/a-lei-de-responsabilidade-fiscal-frente-aos-municipios. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Heitor José Fidelis Almeida de Souza
Por: STJ - Superior Tribunal de Justiça BRASIL
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Por: Conteúdo Jurídico
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