RESUMO: Este artigo apresenta concepções sobre registros de imóveis e as atividades desenvolvidas pelos oficiais cartorários contextualizando os princípios que regem esse sistema e os mecanismos legais existentes para segurança jurídica da propriedade, apresentando noções sobre a atividade registral e o modo prático para realização de suas atividades, sendo elas a publicidade, autenticidade e eficácia dos atos jurídicos constituintes dos direitos de propriedade, ou a este relativo. Demonstra o percurso do serviço prestado com conceitos, definições e a importância de se ter o registro imobiliário, atualmente ainda desconhecido por muitos indivíduos, os quais não têm ciência dos direitos reais garantidos ao adquirir e registrar o seu título sobre o bem. Mostra em breves palavras como ocorre o crime de grilagem que ainda é bastante existente no Brasil. Por ser um assunto amplo, não tem este trabalho a pretensão de esgotar o assunto, até mesmo pela certeza da impossibilidade de tal feito.
PALAVRAS-CHAVE: Registro Imobiliário, Propriedade, Posse, Princípios do sistema registrais, grilagem.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho pretende ressaltar sobre questões referentes a registros imobiliários urbanos e rurais. Registros esses que podem e devem se aproximar da sociedade e da realidade prática dos que deles fazem ou irão fazer uso seja como parte interessada ou como profissionais do direito a serviço da comunidade. Traz também a compreensão sobre matricula e averbação e sua importância para o mundo jurídico, tendo em vista que criam, instituem, declaram e transferem direitos reais sobre bens imóveis ou que situações jurídicas criadas pelo registro são mudadas, seja em relação à pessoa titular do direito real ou ao imóvel. A falta de compreensão sobre esse assunto pode fazer com que titulares de direitos muitas vezes venham a perdê-los ao deixar de efetuar o devido registro e ter apenas em mão o recibo de compra e venda do imóvel, caso este muito corriqueiro em pequenas cidades de interior.
Os registros públicos são regulamentados pelo Título V da Lei n° 6.015/73 e também abordado por alguns doutrinadores civilistas, entre eles Maria Helena Diniz, Afrânio de Carvalho, Carlos Barbosa Gonçalves e outros a qual se toma como base para o devido trabalho, além dos princípios que regem o Registro Imobiliário.
No tocante a esse Registro, o Código Civil não traz nenhum requisito para sua regulamentação, mas traz assuntos como propriedade e posse que estão correlacionados com o assunto em estudo.
Assim, pretende-se fixar a importância desse registro para um acompanhamento histórico, pois embora o princípio da publicidade seja bastante importante nesta atividade, os serviços cartorários ainda são extremamente fechados, burocráticos e desconhecidos pela comunidade, levando-se também em consideração as consequências ocasionadas com os falsos registros e quais os tipos de crimes que disso decorrem.
A elaboração do presente artigo foi baseada em doutrinas civilistas, nos serviços prestados em conformidade com a Constituição Federal, na Lei 6.015/73, na decorrência dos crimes de falsificação de registros imobiliários e também dispositivos legais que regulamentam o tema.
1 FINALIDADE DO REGISTRO IMOBILIÁRIO
Para entender a importância e utilidade do registro imobiliário pode-se voltar aos primórdios da humanidade, visto que a conquista e preservação dos bens, sempre foram preocupações e entre esses bens, a terra e o que dela se pode extrair foi e é motivo para grandes batalhas.
Fustel de Coulages[1] em sua obra A Cidade Antiga faz um relato sobre direito de propriedade, expondo que o surgimento da propriedade está ligado não ao homem, mas a família, não sendo a lei que garante o direito de propriedade e sim a religião, com cada terreno sob os olhos das divindades domésticas que zelavam por ele, manifestando o autor em sua obra:
Sabemos que há raças que jamais chegaram a estabelecer a propriedade privada; outras só o conseguiram depois de muito tempo e muitas dificuldades. Com efeito, não é um problema fácil, na origem das sociedades, saber se o indivíduo pode apropriar-se do solo e estabelecer um tal vínculo entre o seu ser e uma parte de terra, que lhe permita dizer: Esta terra é minha, esta terra é como uma parte de mim. (2009, p. 72)
Já para Francesco Carnelutti[2] o direito da propriedade nasce a partir do momento que o indivíduo toma para si a guarda do que o pertence protegendo conforme sua vontade, podendo tutelar conforme seus próprios interesses, definindo isso como direito subjetivo, porém escapa-lhe a propriedade se o titular desse direito não consegue defende-la. E assim descreve o autor:
[...] quando quem se apodera das coisas de outro é castigado, ou seja, quando se proíbe o furto, não é mais apenas o proprietário quem defende seu domínio, isto é, em primeiro lugar sua casa; à porta dela estão os policiais. Então, a propriedade, de instituto puramente econômico, passa a ser um instituto jurídico e até se converte em umdireito. (2001, p. 29)
Fazendo-se importante nesse ponto entender o que vem a ser posse e propriedade e os institutos legais para a sua defesa.
A posse segundo leciona Flávio Tartuce[3] “é um direito de natureza especial” (2014, p. 861), pois entende o autor ser a posse retirada da teoria tridimensional de Miguel Reale (norma, valor e fato), tendo em vista que a posse é o domínio fático que a pessoa exerce sobre o bem. Já para Maria Helena Diniz[4] a posse constitui um direito real propriamente dito, sendo um desdobramento natural da propriedade. Segundo o art. 1.196 CC/02: “Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade.”
Já a propriedade é um direito fundamental, protegido no art. 5°, XXII, da Constituição Federal de 1988 que tem por necessidade atender a uma função social, em favor de toda coletividade, sendo então um direito que alguém possui em relação a um bem. Os atributos da propriedade estão elencados no art. 1228 do CC/02, sendo eles: usar, gozar e dispor da coisa além do direito de reavê-la do poder de quem injustamente a detenha ou possua, mas sem perder de vista outros atributos, incluindo os constitucionais. E é por meio do registro de título que se tem a principal forma derivada de aquisição da propriedade, assunto que está disposto entre os arts. 1245 a 1247 do CC/02.
Devido ao instituto possessório (ações possessórias diretas) o possuidor tem a faculdade de propor demandas para manter-se ou ser restituído da posse. As medidas são autorizadas pelo art. 1.210, caput, CC/02: “O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação, restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo receio de ser molestado”. Para a alegação de domínio encontra-se elencado no art. 923, CC/02: “na pendência do processo possessório é defeso, assim ao autor como ao réu, intentar a ação de reconhecimento do domínio”. Pertinente expor, como leciona Taurtuce[5], que alegação de exceção de domínio não basta para a improcedência da ação possessória, confirmando o entendimento no art. 1.210 § 2° CC/02. [...] “o CC/02 consolidou a inviabilidade da alegação de domínio, ou de propriedade, em sede de ação possessória, ou seja, trouxe uma divisão entre os juízos possessório (em que se discute a posse) e petitório (em que se discute a propriedade)”. (p. 884).
Não menos importante é conhecer o momento que aparece o Registro de Imóveis no Brasil e sua importância. O território brasileiro se encontrava povoado precisando ter o conhecimento sobre cada gleba particular, com a finalidade de proteção contra eventual usurpação, vindo isto a ser atingido muitos anos depois de ter o País se tornado independente como instrui Afrânio de Carvalho[6]. O autor ainda relata que:
Quando o Brasil foi descoberto, o Rei de Portugal, como descobridor, adquiriu sobre o território o título originário da posse. Investido desse senhorio, o descobridor, por meio de doações, feitas em cartas de sesmaria, primeiro pelos donatários das capitanias, depois pelos governadores e capitães-generais, começou a destacar do domínio público os tratos de terras que viriam a constituir o domínio privado. (p.7)
Complementando ainda em seu livro que de 1822 até 1850 foi um período de abandono, no qual nenhuma lei foi criada sobre as terras, ocorrendo uma grande ocupação por meio da tomada de posse, sem qualquer título ou controle legislativo.
A Lei 601/1850 e seu Regulamento n° 1.318, de 1854 legitimaram a aquisição da posse registrando tudo no livro da Paróquia Católica, separando, contudo, das terras de domínio público, com o objetivo de transmitir ou onerar imóveis, fato este conhecido como Registro do Vigário.
Ao passar de tempo, mudanças políticas e sociais ocorreram e o Estado assumiu a responsabilidade pela segurança jurídica destes atos criando o Registro de Imóveis com a finalidade de assentamento de títulos públicos e privados com publicidade dos seus atos, surgindo a partir disso a presunção relativa da prova da propriedade. Neste sentido leciona Maria Helena Diniz[7]:
O registro imobiliário seria o poder legal de agente do ofício público, para efetuar todas as operações relativas à bens imóveis e a direitos a eles condizentes, promovendo atos de escrituração, assegurando aos requerentes a aquisição e exercício do direito de propriedade e a instituição de ônus reais de fruição, garantia ou de aquisição. Com isso, o assentamento dá proteção especial à propriedade imobiliária, por fornecer meios comprobatórios fidedignos da situação do imóvel, sob o ponto de vista da respectiva titularidade e dos ônus reais que o gravam, e por revestir-se de publicidade, que lhe é inerente, tornando os dados registrados conhecidos de terceiros (2007, p. 13)
O Registro de Imóveis reúne todos os dados da propriedade imobiliária, tendo como objetivo informações sobre os direitos reais do mesmo e a proteção em relação aos direitos e deveres do proprietário. Os registros públicos dão autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos (art. 1° da Lei 6.015/73) inter vivos ou mortis causa.
2. PRINCIPIOS QUE REGEM O REGISTRO IMOBILIÁRIO
Para alcançar os objetivos do Registro de Imóveis deve-se atender as perspectivas do Direito o qual segue princípios norteadores indispensáveis assegurando ao cidadão absoluta segurança dos atos registrados.
Alguns dos princípios que norteiam este registro são: legalidade; publicidade; força probante (fé pública); prioridade ou preferência; continuidade; especialidade e segurança jurídica.
É de suma importância a observância desses princípios como dos demais dispositivos legais que regem os registros imobiliários, os quais devem cumprir efetivamente seu papel, desempenhando de forma eficaz sua função.
Pelo princípio da legalidade compete ao oficial do cartório avaliar a legalidade, validade e eficácia do título apresentado para registro e segundo Carlos Roberto[8] apenas limitando o oficial à verificação de sua natureza, se registrável ou não.
Portanto, como os títulos levados a registros correspondem a negócios jurídicos, os quais por sua vez para serem válidos devem ser legais, conclui-se que a validade da inscrição no Registro de Imóveis, depende da validade do negócio jurídico o qual tem origem.
Por meio do princípio da publicidade leva-se a conhecimento todas as modificações ocorridas em um determinado imóvel, sejam elas relativas ao seu titular ou ao próprio imóvel. A Lei 6015/73 traz em seu art.17: “qualquer pessoa pode requerer certidão do registro sem informar ao oficial ou ao funcionário o motivo ou interesse do pedido”. Posto que, salvo algumas exceções, os registros devem estar permanentemente abertos ao integral conhecimento de todos, sendo o oficial obrigado a emitir certidão solicitada sobre determinado imóvel. Lecionando Carlos Barbosa[9]: “salvo exceções relativas a direitos alusivos à família e à filiação, torna público o que nele se contém, criando a presunção de seu conhecimento ou de sua cognoscibilidade.” (2010, p. 301)
O princípio da força probante também conhecido como princípio da fé pública presume-se pertencer o direito real à pessoa em cujo nome se encontra registrado o imóvel. Induz a presunção iuris tantum de propriedade produzindo todos os efeitos legais enquanto existir e a partir do momento que se descobre que o documento não produz a verdade pode ele ser retificado ou anulado como elencado no art. 1.247 CC/02 e o ônus probatório de sua falsidade incumbe ao prejudicado, conforme o art. 255 caput e § único da Lei 6.015
O princípio da prioridade ou preferência está elencado na Lei 6.015/73 em seus arts. 185, 187 e 190 até 192 e também no Código Civil em seus arts. 1.246, 1.422 e 1.493 do CC/02, definindo que tem prioridade erga omnes e preferência na efetivação do registro aquele que primeiro apresenta o título. Aduz Paulo Nader[10] [...] “na hipótese de serem levados ao registro dois ou mais títulos aquisitivos sobre o mesmo objeto, prevalece o apresentado e prenotado em primeiro lugar” [...] (2009, p. 129).
O princípio da continuidade está elencado no art. 195 da lei 9.015/73 e é por conta deste princípio que se o imóvel não estiver registrado em nome do alienante, não pode ser registrado em nome do adquirente. Existe, portanto, uma conexão efetiva com os diversos negócios jurídicos que lhe precederam.
Pelo princípio da especialidade o registro deve estar devidamente descrito e caracterizado em se tratando dos dados geográficos do imóvel, principalmente em se tratando da localização, metragem, confrontações, etc determinando, portanto, que todo registro recaia sobre um objeto devidamente individualizado.
Ao ser aplicado qualquer dos princípios que regem os registros imobiliários deve o oficial do Cartório ou profissional do direito sempre primar pelo princípio da segurança jurídica, pois devido a ele os atos presumem-se da veracidade necessária. Observa-se, portanto, que todos os princípios e a formalidade são instituídos em benefício do cidadão e apenas devem se sobrepor ao direito de propriedade Constitucional quando a segurança jurídica for ameaçada.
3. MATRÍCULA, REGISTRO E AVERBAÇÃO
A matrícula é o número de identificação constituindo o núcleo do registro, exigindo um controle rigoroso e exato das indicações que nela contêm. Mesmo ocorrendo sucessões de titularidades a matrícula permanece inalterada. Cada imóvel terá um número próprio de matrícula de forma que este imóvel não possa vir a ser matriculado mais de uma vez, e nem duas matrículas poderão ter por objeto o mesmo imóvel. Conforme dispõe o art. 225 da Lei 6.015/73: “A matrícula será efetuada por ocasião do primeiro registro a ser lançado na vigência da presente Lei, mediante os elementos constantes do título apresentado e do registro anterior no mesmo mencionado, preenchidos os requisitos do artigo 227.”
Caso ocorra o desmembramento, a parte desmembrada constituirá um novo imóvel que deverá ser matriculado e receber sua própria matrícula e o inverso pode vir a ocorre que é a chamada fusão, unificação de matrículas de dois ou mais imóveis pertencentes ao mesmo proprietário, gerando uma nova matrícula e dando encerramento as primitivas.
Cristiano Chaves e Rosenvald explana que o registro é subsequente à matrícula e é ato constitutivo de direitos reais sobre a coisa alheia ou ônus e limitações a eles equiparados. Os registros são derivados sendo todos vinculados a uma mesma matrícula inicial.[11]
Averbação é anotações que indicam as alterações ocorridas no imóvel seja essa mudança em situação física ou jurídica do seu proprietário, não modificando a essência do registro. A omissão dos títulos sobre eventuais averbações poderá dificultar a efetivação de futuros registros sobre o imóvel, por não existe coincidência sobre a documentação apresentada.
4. ATIVIDADES DO REGISTRO DE IMÓVEIS
É a partir da apresentação do título pela parte interessada perante o cartório de registro de imóveis que se inicia a ação do oficial de registro. Normalmente a apresentação é feita para que através do registro aconteça a publicidade.
O Registrador segue todos os atos cartorários em obediência aos princípios registrários, analise essa chamada pela doutrina de qualificação, tendo nesse caso a exteriorização do princípio da legalidade.
O primeiro passo no Cartório de Imóveis, quando da apresentação do título para registro, é a prenotação do mesmo, o qual garante a prioridade do título e a preferência dos direitos reais. Logo em seguida o título passa pela qualificação, o qual será verificado todos os pressupostos necessários (existência, validade e eficácia do negócio jurídico) ao registro sendo então decidido se ocorre ou não o registro.
A atividade é de extrema responsabilidade e por conta disso todos os atos do oficial do cartório estarão sujeitos a controle, podendo o oficial ser responsabilizado pelos seus atos. O fato do Registrador exercer uma função pública sofre ele a fiscalização por parte do Estado e pode ser alvo de suscitação de dúvida, fato este que é decorrente das funções a ele atribuídas e que está estabelecida na Lei 8.953/94.
Depois de feita a análise do título se o Oficial do Cartório de Registro de Imóveis determinar que o título não preenche os requisitos para registro emitirá um parecer por escrito com as razões que impossibilitaram o determinado registro, denominado esse parecer de exigência. Caso a parte venha a discordar desse parecer pode suscitar dúvida.
Depois de analisar e qualificar o título faz-se o registro, sendo importante conhecer em sucintas palavras sobre os livros obrigatóriosdo Registro de Imóveis que está elencado no art. 173 da Lei dos Registros Públicos,baseando-se, também, na obra de Carlos Barbosa[12]:
Livro 1 – Protocolo: é a anotação de todos os títulos apresentados diariamente.
Livro 2 – Registro Geral: destinado à matricula, registro, averbação além de outros atos. Ocorrendo nesse livro a prática de transferência do domínio dos imóveis.
Livro 3 – Registro Auxiliar: é destinado ao registro de atos que devem por lei serem registrados, embora não transfiram o domínio.
Livro 4 – Indicador Real: permite a busca dos registros pela localização do imóvel. É o repositório de todos os imóveis que figurem nos demais livros.
Livro 5 – Indicador Pessoal: onde se encontra o nome de todas as pessoas que figurem no registro como proprietário.
Muito embora o registro não transfira direitos além do que o promitente possui, constitui uma presunção iuris tantum, a qual admite prova em contrário. Caso o teor do registro não manifeste a verdade pode ser exigido que se retifique.
A retificação é exigida quando não existe exatidão no registro, conforme leciona Carlos Barbosa[13]:
Ao admitir retificação, a lei se mostra de acordo com a realidade brasileira, de imensa extensão física e com grandes áreas de duvidosa confiabilidade dominial e possessória. Não é viável entre nós um sistema de presunção de validade absoluta do assentamento imobiliário, confiado a cartórios cujos elementos humanos e materiais nem sempre são de boa qualidade. (2010, p. 312)
Observa-se, porém, que grande parte da população desconhece a importância do sistema de Registro de Imóveis. Embora, o direito avance cada vez mais para que seja de conhecimento de cada indivíduo o seu direito inerente, ainda enfrenta-se muitas dificuldade as quais geram transtornos até mesmo para o Estado.
5. GRILAGEM
O histórico brasileiro é farto da falsificação de documentos de registro imobiliário (o grilo), cujo procedimento para farsa tem como ponto final os cartórios de registro de imóveis, o qual sem condições de recusar títulos aparentemente hígidos, e sem meios para apurar a superposição de glebas, os títulos acabam inseridos nos registros imobiliários. Os grileiros chegam a usar documentos antigos como as cartas de sesmarias (concessões de terras cultivadas dadas entre 1531 e 1822), criando um falso histórico da terra, sendo esses documentos de difícil confirmação cartorial.
Para o INCRA[14] a grilagem ocorre normalmente com a conivência de serventuários de Cartórios de Registro de Imóveis, os quais em muitos casos registram áreas sobrepostas umas às outras, que só existem no papel.
A ilegalidade da venda de terrenos que pertencem ao poder público ou até mesmo de propriedade particular com a falsificação na documentação constitui o crime de grilagem, valendo salientar que grileiro não é o mesmo que posseiro, visto que o primeiro não vive na terra, mas em um elevado nível de poder, enquanto o segundo é muitas vezes o pequeno agricultor que toma posse da terra para sobrevivência. A Lei 6.766/79 a partir do seu art. 50 dispõe que se o cidadão que for flagrado exercendo a prática dessa falsificação poderá ser punido com reclusão de 1 a 4 anos e multa de 5 a 50 vezes o salário mínimo vigente no País.
A denominação grilagem vem de um antigo macete usado pelos falsificadores que para dar aspecto de velho aos documentos criados por eles, deixavam os papéis em gavetas junto com grilos. Depois de algumas semanas os documentos apresentavam machas amareladas decorrentes dos dejetos dos insetos, além de estarem corroídos nas bordas e pequenos orifícios na superfície, dando a indicar uma suposta ação do tempo.
Um estudo feito em 1999 pelo governo federal para a Comissão Parlamentar de Inquérito da Grilagem apontava 100 milhões de hectares de terras griladas, com apurações feitas nos Estados do Amazonas, Pará, Acre, Amapá e Roraima, Rondônia e Mato Grosso. Porém o grande número de terras públicas está no Amazonas (45% não tem titulação ou destinação) e no Pará (70% das áreas são de assentamento, reservas indígenas, unidade de conservação e áreas militares) tornando-os alvos fáceis dos grileiros.
Muitas táticas são usadas para formação do crime relatado e entre elas existe o convencimento de compra de títulos de posse, documentos esses que não comprovam a propriedade, mas dá autorização de uso da terra. Com esses documentos em mãos o grileiro força os posseiros vizinhos e entregarem suas propriedades, muitas usando da violência para obter o que desejam.
Uma das obras de João Cabral de Melo Neto[15] traz em poucas palavras a ocorrência desses crimes no interior de Pernambuco, percebendo, portanto, que isso não ocorre apenas no Norte do País, mas que pode manifestar-se, embora em pequena quantidade, por todo o território brasileiro. Encontra-se a seguinte passagem: “- E o que havia ele feito irmãos das almas, e o que havia ele feito contra a tal pássara? – Ter um hectare de terra, irmão das almas, de pedra e areia lavada que cultivava.” (p.95). É o relato da morte de um possuidor de terras, que sem a menor chance de defesa é morto à bala em uma emboscada.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do que foi exposto fica clara a complexidade e a importância, para a segurança jurídica das relações de direito patrimonial e imobiliário, dos atos e serviços praticados no Registro de Imóveis. Os títulos que têm seus registros no Cartório de Imóveis guardam todo seu histórico dando publicidades a todos os atos neles inerentes, garantindo o direito real do proprietário e de um futuro adquirente.
Verifica-se que os atos cartorários devem sempre observa os princípios que os regem, os serviços devem ser executados de forma justa e leal sem que venham a beneficiar um em prejuízo de outrem, posto que em analise do INCRA muitas irregularidades começam a partir de serventuários dos cartórios. A mudança no mundo jurídico ocorre constantemente e em relação ao breve relato sobre crime de grilagem, percebe-se que deve haver uma unificação de informações dos diversos órgãos envolvidos no assunto, um procedimento que surgiu há anos, mas que nunca se pôs em prática. É preciso ampliar a fiscalização das terras públicas e maior efetividade na punição desse crime.
Dessa forma se conclui que as atividades cartorárias são de extrema importância na medida em que garantem publicidade, segurança e eficácia jurídica de direitos reais e direitos pessoais ao proprietário ou adquirente, garantindo sua existência no plano real.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Trad. Roberto Leal Ferreira. São Paulo: Ed. Martins Claret Ltda., 2009
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito das Coisas. 22. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007
DINIS, Maria Helena. Sistemas de Registros de Imóveis. 7aed. São Paulo: Saraiva, 2007
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GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Direito das coisas. 5a ed. São Paulo: Saraiva, 2010
NADER, Paulo. Curso de Direito Civil. Direito das Coisas vol. 4. 3a ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2009
NETO, João Cabral. Morte e Vida Severina. Rio de Janeiro: Objetiva, 2014
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Vol. Único. 4a ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Método, 2014
Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar a ocupação de terras públicas na região Amazônica.
CARVALHO, de Afrânio. Registro de Imóveis. Rio de Janeiro: Forense (https://arisp.files.wordpress.com/2008/03/afranio-de-carvalho-registro-de-imoveis-completo.pdf) – acessado em 07/06/2015
www.quinto.com.br/artigos_30.htm (artigo: Fraude em cartórios) - acessado em 09/06/2015
http://www.jurisway.org.br/v2/pergunta.asp?idmodelo=28181 (O que é e como funcionam o Registro de Imóveis?) – acessado em 07/06/2015
Lei 6.015/1973 (www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6015compilada.htm e www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6015original.htm) – acessado em 07/06/2015
Lei 6.766/1979 (www.planalto.gov.br/ccivil_03/lei/l6766.htm- acessado em 07/06/2015
[1] COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Trad. Roberto Leal Ferreira. São Paulo: Ed. Martins Claret Ltda., 2009
[2] CARNELUTTI, Francesco. Como nasce o Direito. Trad. Hiltomar Martins Oliveira. Belo Horizonte: Lider Cultural Jurídica Ltda, 2001
[3] TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Vol. Único. 4a ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Método, 2014
[4] DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito das Coisas. 22. Ed. São Paulo: Saraiva, 2007 (pg. 52)
[5] TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. Vol. Único. 4a ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Método, 2014
[6] CARVALHO, de Afrânio. Registro de Imóveis. Rio de Janeiro: Forense
[7] DINIZ, Maria Helena. Sistemas de Registros de Imóveis. 7a ed. São Paulo: Saraiva, 2007
[8] GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. Direito das coisas. 5a ed. São Paulo: Saraiva, 2010 (pg. 303)
[9] IDEM
[10] NADER, Paulo. Curso de Direito Civil. Direito das Coisas vol. 4. 3a ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Forense, 2009
[11]FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Curso de Direito Civil. Reais. 10a ed. rev. ampl. e atual. Salvador: Juspodivm, 2014
[12]GONÇALVES, Carlos Barbosa. Direito Civil Brasileiro. Direito das Coisas. 5a ed. São Paulo: Saraiva, 2010
[13]IDEM.
[14] Relatório da Comissão Parlamentar de Inquérito destinada a investigar a ocupação de terras públicas na região Amazônica.
[15] NETO, João Cabral. Morte e Vida Severina. Rio de Janeiro: Objetiva, 2014
Contadora e graduanda em direito na UniAGES - Paripiranga-BA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Hevelise na Santos da. Registros Imobiliários: um direito essencial da sociedade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 mar 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/49683/registros-imobiliarios-um-direito-essencial-da-sociedade. Acesso em: 22 nov 2024.
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