RESUMO: O presente artigo tem por escopo realizar uma breve análise sobre a admissão do efeito suspensivo automático dos embargos à execução no rito processual trabalhista; pondera sobre o enquadramento da aplicação subsidiária da Lei de Execuções Fiscais e supletiva, já sob abrigo do Novo Código de Processo Civil na execução trabalhista. Por fim, busca definir seu manejo na execução, em especial pelo seu conteúdo, processamento e pressupostos específicos, para então abordar e concluir, através de pesquisa bibliográfica e jurisprudencial as premissas e consequências do efeito suspensivo, considerando natureza alimentar de tais créditos.
PALAVRAS-CHAVE: execução no processo do trabalho; natureza alimentar dos créditos trabalhistas; embargos à execução; efeito suspensivo; valores incontroversos.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. A NATUREZA JURÍDICA DOS EMBARGOS À EXECUÇÃO; 3. O PROCEDIMENTO DOS EMBARGOS À EXECUÇÃO NO PROCESSO DO TRABALHO; 4. O EFEITO SUSPENSIVO NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO; 5. CONCLUSÃO.
1. INTRODUÇÃO
Sem que se pretenda, aqui, esgotar o tema, o efeito suspensivo admitido nos embargos à execução importa em impactos processuais relevantes, considerando que o crédito trabalhista conferido ao trabalhador têm por característica indistinta prover o seu sustento e da própria família, tendo em vista seu caráter alimentar, expressando seu fundamento constitucional na dignidade da pessoa humana. Porém, isso não significa dizer que após ultrapassada a fase cognitiva, quando ocorrer a citação do devedor para garantia da execução ou penhora de bens, conforme dispõe o artigo 884 da CLT, os aludidos valores serão liberados imediatamente e ilimitadamente ao trabalhador.
E é justamente a característica alimentar do crédito trabalhista que limita a faculdade do Juiz em permitir a prematura disposição dos valores ao exequente, antes de esgotados todos recursos cabíveis pelo executado, dado que uma possível reforma na Decisão judicial que tornou liquido e certo o título executivo certamente acarretaria na irrepetibilidade destes, dada a presumível situação de hipossuficiência do trabalhador que busca na justiça a quitação das verbas salariais inadimplidas pelo empregador.
Desse modo, deverão ser ponderados os requisitos previstos no novo código de processo civil, bem como na lei de execução fiscal, aplicados ao processo do trabalho para concessão de efeito de suspensivo aos embargos à execução de maneira que ofereça a prestação jurisdicional no prazo razoável e ao mesmo tempo não torne fracassada possível diligência visando restituir o montante liberado a maior ao exequente, na hipótese de reforma dos valores outrora homologados e confirmados em Sentença.
2. A NATUREZA JURÍDICA DOS EMBARGOS À EXECUÇÃO
Assim como entende Carlos Henrique Bezerra Leite[1], identificar a natureza jurídica dos embargos à execução na sua aplicação no processo do trabalho, transcende à discussão acadêmica.
Como majoritariamente aceito na doutrina e na jurisprude?ncia, os embargos do devedor ostentam natureza de ac?a?o cognitiva incidental, pelo que as deciso?es de me?rito neles proferidas fazem coisa julgada material[2].
Por outro lado, a corrente minoritária, adotada por Mauro Schiavi[3], justifica que se trata apenas de um instrumento de defesa facultado ao devedor, constituindo um incidente da fase executiva, com a mesma natureza da impugnação no processo civil, concluindo ainda:
“além disso, no processo do trabalho, os embargos à execução, em razão dos princípios da celeridade e da simplicidade, sempre foram opostos por petição nos próprios autos e nele processados. Sob outro enfoque, o parágrafo 1o, do artigo 884, da CLT, alude à matéria de defesa que pode ser invocada nos embargos, o que denota não ter os embargos natureza jurídica de ação autônoma e sim de impugnação”.
Em desfavor dessa corrente pesa o fato da ausência do princípio do contraditório na fase executiva, não havendo que se falar em defesa. Outro motivo, funda-se no objetivo da execuc?a?o que e? a pra?tica de atos coercitivos destinados a obrigar o executado a satisfazer o direito do credor reconhecido no julgado[4].
Entretanto, prevalecem as lições de Renato Saraiva, de “que os embargos a? execuc?a?o se constituem numa verdadeira ac?a?o de cognic?a?o incidental a? execuc?a?o, assumindo o executado o polo ativo da relac?a?o juri?dica (e o exequente o polo passivo), formulando pretensa?o consistente na anulac?a?o do processo de execuc?a?o ou no desfazimento da efica?cia do ti?tulo executivo”[5].
3. O PROCEDIMENTO DOS EMBARGOS À EXECUÇÃO NO PROCESSO DO TRABALHO
Nas palavras do renomado jurista brasileiro Renato Saraiva “o objetivo da execuc?a?o por quantia certa e? expropriar bens do devedor a fim de satisfazer o direito do credor, respondendo o executado com seu patrimo?nio, presente ou futuro, para o cumprimento das obrigac?o?es”[6].
Nessa esteira, a competência para julgamento dos embargos à execução é do juízo onde se processar a execução, estando descritas nos artigos 877 e 877-A da CLT, sendo que o primeiro dispositivo trata da execução dos títulos executivos judiciais e o segundo, dos extrajudiciais, nos termos abaixo transcritos:
“Art. 877 - É competente para a execução das decisões o Juiz ou Presidente do Tribunal que tiver conciliado ou julgado originariamente o dissídio.
Art. 877-A - É competente para a execução de título executivo extrajudicial o juiz que teria competência para o processo de conhecimento relativo à matéria.”
Avançando, caso o título executivo já tenha seu valor li?quido e determinado, expedir-se-á mandado de citac?a?o, penhora e avaliac?a?o, para que, nos termos do art. 880 da CLT, o executado seja citado para em 48 horas pagar a di?vida ou mesmo garantir a execuc?a?o:
"Art. 880 da CLT. Requerida a execuc?a?o, o juiz ou presidente do Tribunal, mandara? expedir mandado de citac?a?o ao executado, a fim de que cumpra a decisa?o ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as cominac?o?es estabelecidas, ou, em se tratando de pagamento em dinheiro, incluídas as contribuic?o?es sociais devidas a? Unia?o, para que pague em quarenta e oito horas, ou garanta a execuc?a?o, sob pena de penhora".
Vale destacar, que progressivamente a jurisprudência vem se inclinando no sentido que a citação do devedor não precisará ser necessariamente feita na pessoa do devedor, podendo, ao revés, ser efetivada através de intimação do advogado constituído nos autos, ainda que a interpretação literal do artigo 880 da CLT não nos leve a essa conclusão. Por exemplo, o Tribunal Regional do Trabalho da 1a Região e da 3a Região, nos seus mais recentes julgados já manifestaram que a ausência de citação pessoal não é causa de nulidade:
“EMENTA: INÍCIO FASE EXECUÇÃO. DESNECESSIDADE DE CITAÇÃO DO EXECUTADO POR MANDADO. LACUNA ONTOLÓGICA. HETEROINTEGRAÇÃO COM O PROCESSO CIVIL. INTIMAÇÃO REALIZADA EM AUDIÊNCIA NA PESSOA DO ADVOGADO. VALIDADE. O processo do trabalho padece de lacunas ontológicas e, no que toca especificamente ao cumprimento da sentença trabalhista, a heterointegração (diálogo das fontes) do subsistema processual do trabalho com o sistema processual civil é medida que se faz patente. Em que pese o art. 880 da CLT ainda fazer referência à citação do executado por meio de mandado para que cumpra a decisão ou o acordo, a heterointegração precisa ser realizada com o processo civil, que prevê, no art. 475-J, § 1º, do CPC, a hipótese de o executado ser intimado na pessoa do seu advogado.”
(TRT-1 - AP: 00001699320115010342 RJ, Relator: Eduardo Henrique Raymundo Von Adamovich, Data de Julgamento: 28/07/2015, Primeira Turma, Data de Publicação: 17/08/2015)
“EXECUÇÃO. CITAÇÃO NA PESSOA DO ADVOGADO. NULIDADE. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. No processo do trabalho, a teor do art. 794 da CLT, não se reconhece nulidade quando não há prejuízo para a parte. Assim, se a finalidade da citação foi atingida, apresentando o executado todas as medidas cabíveis na defesa de seus interesses, não há que declarar nulidade em face da citação para a execução ter sido realizada na pessoa de seu advogado.”
(TRT-3 - AP: 00810200806003009 0081000-52.2008.5.03.0060, Relator: Cesar Machado, Terceira Turma, Data de Publicação: 09/11/2015)
E ainda, para destacar o entendimento sustentado, cita-se a conclusão consubstanciada no Enunciado nº 12 da Jornada Nacional sobre Execução na Justiça do Trabalho (2010):
“CUMPRIMENTO DA SENTENÇA. INTIMAÇÃO DA PARTE PELO ADVOGADO. I - Tornada líquida a decisão, desnecessária a citação do executado, bastando a intimação para pagamento por meio de seu procurador. II - Não havendo procurador, far-se-á a intimação ao devedor prioritariamente por via postal, com retorno do comprovante de entrega ou aviso de recebimento, e depois de transcorrido o prazo sem o cumprimento da decisão, deverá ser expedida ordem de bloqueio de crédito pelo sistema Bacen Jud.”
Dispõe ainda, o artigo 883 da CLT, que “não pagando o executado, nem garantindo a execução, seguir-se-á penhora dos bens, tantos quantos bastem ao pagamento da importância da condenação, acrescida de custas e juros de mora, sendo estes, em qualquer caso, devidos a partir da data em que for ajuizada a reclamação inicial”.
Nessa toada, nos termos do artigo 884 da CLT, “garantida a execução ou penhorados os bens, terá o executado 5 (cinco) dias para apresentar embargos, cabendo igual prazo ao exeqüente para impugnação”. No processo do trabalho, o termo inicial para oferecimentos dos embargos à execução pelo executado é de 5 dias a contar: a) da data que foi garantida a execução, seja através de depósito judicial, ou então de oferecimento de outros bens em garantia; b) do dia da intimação da penhora.
Cumpre destacar que, no caso de indicação de bens em garantia pelo devedor, essa garantia não se dá com a simples nomeação de bens à penhora. A nomeação tem que ser aceita pelo exequente e convolada em penhora pelo Juízo. Aí, sim, começa o prazo para oposição de embargos à execução, após intimação do devedor da penhora[7].
Entre as matérias impugnáveis, o artigo 884, parágrafo 1o da CLT, prescreve que “será restrita às alegações de cumprimento da decisão ou do acordo, quitação ou prescrição da dívida”. Já não há mais dúvida na seara trabalhista que o aludido rol é meramente exemplificativo, aplicando-se subsidiariamente ou supletivamente as disposições do artigo 525, parágrafo 1o do CPC, por força do artigo 15 do CPC[8], podendo estender-se também às seguintes matérias, em caso de execução de título judicial:
“Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação.
§ 1o Na impugnação, o executado poderá alegar:
I - falta ou nulidade da citação se, na fase de conhecimento, o processo correu à revelia;
II - ilegitimidade de parte;
III - inexequibilidade do título ou inexigibilidade da obrigação;
IV - penhora incorreta ou avaliação errônea;
V - excesso de execução ou cumulação indevida de execuções;
VI - incompetência absoluta ou relativa do juízo da execução;
VII - qualquer causa modificativa ou extintiva da obrigação, como pagamento, novação, compensação, transação ou prescrição, desde que supervenientes à sentença.”
Por fim, consoante o artigo 885 da CLT, “não tendo sido arroladas testemunhas na defesa, o juiz ou presidente, conclusos os autos, proferirá sua decisão, dentro de 5 (cinco) dias, julgando subsistente ou insubsistente a penhora.”
4. O EFEITO SUSPENSIVO NOS EMBARGOS À EXECUÇÃO
O enfoque do trabalho aqui será na execução definitiva de título executivo judicial, haja vista que a execução provisória no âmbito do Direito do Trabalho somente é permitida até a penhora, a teor do artigo 899 da CLT, vedando-se a prática de atos de alienação de bens constritos, ou liberação de numerário no caso de depósito em dinheiro.
Quase a unanimidade da doutrina[9] perfila no sentido de que os embargos à execução no processo do trabalho não possuem efeito suspensivo automático, devendo, para tanto, a parte executada formular requerimento ao juízo da execução buscando este fim. Em contrapartida, o artigo 525, parágrafo 6o, do CPC confere ao juiz a faculdade de atribuir o efeito suspensivo aos Embargos à Execução, quando constatadas as condições dispostas em seu parágrafo sexto, in verbis:
“Art. 525. Transcorrido o prazo previsto no art. 523 sem o pagamento voluntário, inicia-se o prazo de 15 (quinze) dias para que o executado, independentemente de penhora ou nova intimação, apresente, nos próprios autos, sua impugnação.
§ 6o A apresentação de impugnação não impede a prática dos atos executivos, inclusive os de expropriação, podendo o juiz, a requerimento do executado e desde que garantido o juízo com penhora, caução ou depósito suficientes, atribuir-lhe efeito suspensivo, se seus fundamentos forem relevantes e se o prosseguimento da execução for manifestamente suscetível de causar ao executado grave dano de difícil ou incerta reparação”.(grifei)
Nessa esteira, reza o artigo 769 da Consolidação das Leis do Trabalho que “nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título”.
Já o novo Código de Processo Civil firma no artigo 15 que “na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente”.
Observa-se, assim, que o novo Código inova, não sendo ela somente subsidiária, na ausência de norma processual trabalhista, como também poderá ser aplicada supletivamente, ou seja, na complementação de dispositivo legal, o que significa dizer que, de forma subsidiária ou supletiva, a norma processual somente será aplicada no processo do trabalho, se com ele compatível.
No tocante às execuções fiscais, cujas disposições podem ser empregadas no direito processual do trabalho, com respaldo no artigo 889 da CLT, a 1ª seção do STJ ao analisar recurso submetido ao rito dos repetitivos, sob égide do CPC de 1973, recentemente assentou que a lei de execuções fiscais se aplica o regime excepcional de atribuição de efeito suspensivo aos embargos do devedor, previsto no CPC, que exige a prestação de garantia somada à presença de fundamentação jurídica relevante e do risco de dano irreparável.
“PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. APLICABILIDADE DO ART. 739-A, § 1º, DO CPC ÀS EXECUÇÕES FISCAIS. NECESSIDADE DE GARANTIA DA EXECUÇÃO E ANÁLISE DO JUIZ A RESPEITO DA RELEVÂNCIA DA ARGUMENTAÇÃO (FUMUS BONI JURIS) E DA OCORRÊNCIA DE GRAVE DANO DE DIFÍCIL OU INCERTA REPARAÇÃO (PERICULUM IN MORA) PARA A CONCESSÃO DE EFEITO SUSPENSIVO AOS EMBARGOS DO DEVEDOR OPOSTOS EM EXECUÇÃO FISCAL. 1. A previsão no ordenamento jurídico pátrio da regra geral de atribuição de efeito suspensivo aos embargos do devedor somente ocorreu com o advento da Lei n. 8.953, de 13, de dezembro de 1994, que promoveu a reforma do Processo de Execução do Código de Processo Civil de 1973 (Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973 - CPC/73), nele incluindo o § 1º do art. 739, e o inciso I do art. 791. 2. Antes dessa reforma, e inclusive na vigência do Decreto-lei n. 960, de 17 de dezembro de 1938, que disciplinava a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública em todo o território nacional, e do Código de Processo Civil de 1939 (Decreto-lei n. 1.608/39), nenhuma lei previa expressamente a atribuição, em regra, de efeitos suspensivos aos embargos do devedor, somente admitindo-os excepcionalmente. Em razão disso, o efeito suspensivo derivava de construção doutrinária que, posteriormente, quando suficientemente amadurecida, culminou no projeto que foi convertido na citada Lei n. 8.953/94, conforme o evidencia sua Exposição de Motivos - Mensagem n. 237, de 7 de maio de 1993, DOU de 12.04.1994, Seção II, p. 1696. 3. Sendo assim, resta evidente o equívoco da premissa de que a LEF e a Lei n. 8.212/91 adotaram a postura suspensiva dos embargos do devedor antes mesmo de essa postura ter sido adotada expressamente pelo próprio CPC/73, com o advento da Lei n. 8.953/94, fazendo tábula rasa da história legislativa. 4. Desta feita, à luz de uma interpretação histórica e dos princípios que nortearam as várias reformas nos feitos executivos da Fazenda Pública e no próprio Código de Processo Civil de 1973, mormente a eficácia material do feito executivo a primazia do crédito público sobre o privado e a especialidade das execuções fiscais, é ilógico concluir que a Lei n. 6.830 de 22 de setembro de 1980 - Lei de Execuções Fiscais - LEF e o art. 53, § 4º da Lei n. 8.212, de 24 de julho de 1991, foram em algum momento ou são incompatíveis com a ausência de efeito suspensivo aos embargos do devedor. Isto porque quanto ao regime dos embargos do devedor invocavam - com derrogações específicas sempre no sentido de dar maiores garantias ao crédito público - a aplicação subsidiária do disposto no CPC/73 que tinha redação dúbia a respeito, admitindo diversas interpretações doutrinárias. 5. Desse modo, tanto a Lei n. 6.830/80 - LEF quanto o art. 53, § 4º da Lei n. 8.212/91 não fizeram a opção por um ou outro regime, isto é, são compatíveis com a atribuição de efeito suspensivo ou não aos embargos do devedor. Por essa razão, não se incompatibilizam com o art. 739-A do CPC/73 (introduzido pela Lei 11.382/2006) que condiciona a atribuição de efeitos suspensivos aos embargos do devedor ao cumprimento de três requisitos: apresentação de garantia; verificação pelo juiz da relevância da fundamentação (fumus boni juris) e perigo de dano irreparável ou de difícil reparação (periculum in mora). 6. Em atenção ao princípio da especialidade da LEF, mantido com a reforma do CPC/73, a nova redação do art. 736, do CPC dada pela Lei n. 11.382/2006 - artigo que dispensa a garantia como condicionante dos embargos - não se aplica às execuções fiscais diante da presença de dispositivo específico, qual seja o art. 16, § 1º da Lei n. 6.830/80, que exige expressamente a garantia para a apresentação dos embargos à execução fiscal. 7. Muito embora por fundamentos variados - ora fazendo uso da interpretação sistemática da LEF e do CPC/73, ora trilhando o inovador caminho da teoria do "Diálogo das Fontes", ora utilizando-se de interpretação histórica dos dispositivos (o que se faz agora) - essa conclusão tem sido a alcançada pela jurisprudência predominante, conforme ressoam os seguintes precedentes de ambas as Turmas deste Superior Tribunal de Justiça. Pela Primeira Turma: AgRg no Ag 1381229 / PR, Primeira Turma, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, julgado em 15.12.2011; AgRg no REsp 1.225.406 / PR, Primeira Turma, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, julgado em 15.02.2011; AgRg no REsp 1.150.534 / MG, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 16.11.2010; AgRg no Ag 1.337.891 / SC, Primeira Turma, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 16.11.2010; AgRg no REsp 1.103.465 / RS, Primeira Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 07.05.2009. Pela Segunda Turma: AgRg nos EDcl no Ag n. 1.389.866/PR, Segunda Turma, Rei. Min. Humberto Martins,DJe de 21.9.2011; REsp, n. 1.195.977/RS, Segunda Turma, Rei. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 17/08/2010; AgRg no Ag n. 1.180.395/AL, Segunda Turma, Rei. Min. Castro Meira, DJe 26.2.2010; REsp, n, 1.127.353/SC, Segunda Turma, Rei. Min. Eliana Calmon, DJe 20.11.2009; REsp, 1.024.128/PR, Segunda Turma, Rei. Min. Herman Benjamin, DJe de 19.12.2008. 8. Superada a linha jurisprudencial em sentido contrário inaugurada pelo REsp. n. 1.178.883 - MG, Primeira Turma, Rel. Min. Teori Albino Zavascki, julgado em 20.10.2011 e seguida pelo AgRg no REsp 1.283.416 / AL, Primeira Turma, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 02.02.2012; e pelo REsp 1.291.923 / PR, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 01.12.2011. 9. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, e da Resolução STJ n. 8/2008.” (grifei)
(STJ - REsp: 1272827 PE 2011/0196231-6, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 22/05/2013, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 31/05/2013)
No mesmo sentido é o enunciado n. 54 da 1a jornada nacional de execução trabalhista, in verbis:
“54. EMBARGOS À EXECUÇÃO. EFEITOS SUSPENSIVOS. APLICAÇÃO DO ART. 475-M E 739-A, § 1o, DO CÓDIGO DO PROCESSO CIVIL (CPC). O oferecimento de embargos à execução não importa a suspensão automática da execução trabalhista, aplicando-se, subsidiariamente, o disposto nos arts. 475-M e 739-A, § 1o, do CPC.”
A parte final do enunciado deve ser lida com ressalvas, posto que a CLT não permite que se aplique na execução trabalhista o antigo art. 475 do CPC, conforme jurisprudência do TST.
Portanto, sem qualquer embargo, pode-se afirmar seguramente que os embargos à execução no âmbito trabalhista não possuem efeito suspensivo por sua simples apresentação ao processo, senão quando o devedor, cumulativamente adotar as seguintes medidas: a) garantia a execução; a) requerimento de efeito suspensivo; c) demonstração de fundamentos relevantes capazes de causar grave dano de difícil ou incerta reparação.
Por outro lado, deve ser levado em consideração que as condenações trabalhistas, predominantemente, detém características próprias e distintas dos demais créditos, em face da sua natureza alimentar, vinculada diretamente ao sustento do trabalhador e de sua família.
Não se desconhece o salário sob o prisma de direito fundamental do trabalhador, expressa pela Constituição em seus Arts. 7º, IV, VI e X, inclusive assegurando o direito de preferência sobre créditos de outra natureza.
A Lei Maior, em seu art. 100, § 1º, ao estatuir a preferência do débito de natureza alimentar sobre os demais, reconhece o caráter alimentar do salário:
“Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à conta dos créditos respectivos, proibida a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.
Páragrafo 1º Os débitos de natureza alimentícia compreendem aqueles decorrentes de salários, vencimentos, proventos, pensões e suas complementações, benefícios previdenciários e indenizações por morte ou por invalidez, fundadas em responsabilidade civil, em virtude de sentença judicial transitada em julgado, e serão pagos com preferência sobre todos os demais débitos, exceto sobre aqueles referidos no § 2º deste artigo”. (grifei).
Ademais, o art. 449 da Consolidação das Leis do Trabalho ratifica a preferência do crédito trabalhista:
“Art. 449 - Os direitos oriundos da existência do contrato de trabalho subsistirão em caso de falência, concordata ou dissolução da empresa.
§ 1º - Na falência constituirão créditos privilegiados a totalidade dos salários devidos ao empregado e a totalidade das indenizações a que tiver direito.
§ 2º - Havendo concordata na falência, será facultado aos contratantes tornar sem efeito a rescisão do contrato de trabalho e conseqüente indenização, desde que o empregador pague, no mínimo, a metade dos salários que seriam devidos ao empregado durante o interregno”.
Contudo, também deve ser lembrado que na justiça do trabalho, na imensa maioria das vezes, os postulantes têm no salário seu único ou principal meio de vida, se encontrando em situação de hipossuficiência, principalmente a partir do instante em que a prestação jurisdicional é a única possibilidade de ver satisfeita a contraprestação trabalhista quando não quitada voluntariamente, o que, por outro lado, poderia trazer consequências incontornáveis se eventualmente fosse liberado precariamente montante maior do que o apurado definitivamente. Nesse caso, provavelmente o exequente não iria dispor de patrimônio suficiente para recompor o desfalque provocado, levando-se à ineficácia na sua restituição.
Ocorre que, quando a sentença não é líquida, normalmente, é nos embargos à execução que o devedor tem a primeira oportunidade de se insurgir contra possível excesso de execução nos cálculos homologados, uma vez que é faculdade do Juiz abrir prazo para as partes impugnarem as contas apresentadas antes da sua homologação, como prescreve o artigo 879, parágrafo 2o da CLT:
“Art. 879 - Sendo ilíquida a sentença exeqüenda, ordenar-se-á, previamente, a sua liquidação, que poderá ser feita por cálculo, por arbitramento ou por artigos.
§ 2º - Elaborada a conta e tornada líquida, o Juiz poderá abrir às partes prazo sucessivo de 10 (dez) dias para impugnação fundamentada com a indicação dos itens e valores objeto da discordância, sob pena de preclusão.” (grifei)
Nesse caso, supõe-se acontecer as seguintes situações: 1) o reclamante apresenta os cálculos de liquidação em quantia superior ao valor devido, que é posteriormente homologado pelo Juízo, sem oitiva da parte contrária; 1) a própria contadoria da Justiça do Trabalho, ou então um perito nomeado liquida o feito, sem observância dos limites da coisa julgada, acarretando em excesso de execução, e o Juízo homologa-os, sem intimação das partes.
Dessa forma, fica evidenciado, portanto, que em algumas situações poderá ser proferida Sentença de homologação de cálculos tornando líquidos e exigíveis os valores a serem executados, sem o exercício do contraditório, e por consequência, arbitrando-se montante condenatório superior ou desarrazoado, ferindo-se os limites do título executivo já transitado em julgado. Nesse caso, o único instrumento processual que o devedor poderia dispor seria os embargos à execução, sem efeito suspensivo, via de regra.
É aí então que surge a maior dificuldade, em vista que eventual liberação de numerário em favor da parte exequente, no caso execução com valores controversos, representaria ato de difícil reversão, na medida em que a beneficiária certamente não iria dispor da quantia na hipótese de necessitar restituí-la.
Entende-se, nesse caso, que o requisito da comprovação de grave dano de difícil ou incerta reparação estaria implícito quando se estivesse diante de processo envolvendo execução de créditos de natureza alimentar e o autor fosse beneficiário da gratuidade da justiça, bastando ao executado, comprovar fundamento relevante do seu direito, seja através de demonstração inequívoca do excesso de execução ou qualquer outra matéria arguível, uma vez que a garantia integral da execução é requisito indispensável para conhecimento da medida. Desse modo, seria autorizado ao julgador atribuir efeito suspensivo aos embargos à execução.
Salienta-se, todavia, que o efeito suspensivo não se estende sobre a totalidade do valor da execução, mas tão somente sobre o débito incontroverso. Desse modo, não haveria lógica alguma em reter montante que o próprio devedor não questionou ou que entende ser devido.
Assim, é direito líquido e certo do exequente a liberação dos valores incontroversos, admitidos pelo executado, consoante entendimento jurisprudencial, colacionado abaixo:
“MANDADO DE SEGURANÇA. EXECUÇÃO DEFINITIVA. ARTIGO 897 DA CLT. LIBERAÇÃO DE VALORES INCONTROVERSOS. AGRAVO DE PETIÇÃO INTERPOSTO PELO EXEQUENTE. LIBERAÇÃO DE VALORES INCONTROVERSOS. POSSIBILIDADE. Se o artigo 897 da CLT permite a execução imediata da parte remanescente até o final (leia-se incontroversa), nos próprios autos ou por carta de sentença, o só fato de o trabalhador ter interposto o agravo de petição e, assim, ter provocado a remessa ao segundo grau, não pode ser obstáculo ao cumprimento da lei. Trata-se de direito da parte buscar uma decisão favorável aos seus interesses, não podendo ser penalizada por isso com a retenção de valores sobre os quais não pairam mais dúvidas.”
(TRT-1 - MS: 00107906920155010000 RJ, Data de Julgamento: 26/11/2015, SEDI-2, Data de Publicação: 19/01/2016)
“MANDADO DE SEGURANÇA. CABIMENTO. EXECUÇÃO DEFINITIVA. NÃO-LIBERAÇÃO DOS VALORES INCONTROVERSOS. VIOLAÇÃO DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. Viola direito líquido e certo da parte exeqüente a decisão que, durante a execução processada em caráter definitivo, indefere a liberação da quantia incontroversa reconhecida pelo Executado em sede de Agravo de Petição (inteligência da norma insculpida no § 1º do art. 897 Consolidado).”
(TRT-5 - MS: 00011333420115050000 BA 0001133-34.2011.5.05.0000, Relator: DÉBORA MACHADO, SUBSEÇÃO II DA SEDI, Data de Publicação: DJ 14/03/2012.)
“AGRAVO DE PETIÇÃO. LIBERAÇÃO DE VALORES INCONTROVERSOS. Cabível a liberação de todo e qualquer valor incontroverso que seja disponibilizado, tendo em vista os limites da impugnação apresentada pela executada aliada à expressa sinalização dela, no sentido de que deve se insurgir, em sede de embargos à execução, apenas contra a forma de apuração das horas extras, o que permite que o juízo de origem libere quantias que não digam respeito à parcela controvertida.Agravo de petição interposto pela exequente a que se dá provimento parcial.”
(TRT-4 - AP: 01408009520085040023 RS 0140800-95.2008.5.04.0023, Relator: João Alfredo Borges Antunes De Miranda, Data de Julgamento: 01/09/2015, Seção Especializada Em Execução)
“CAPÍTULOS DA SENTENÇA TRANSITADOS EM JULGADO. EXECUÇÃO DEFINITIVA. LIBERAÇÃO DE VALORES INCONTROVERSOS. CABIMENTO. Os recursos de natureza extraordinária não impedem a execução de sentença (art. 497 do CPC), sendo certo que o recurso de revista é dotado de efeito apenas devolutivo, reputando-se provisória a execução que se processa em sua pendência (art. 896, § 1º, da CLT). Cabe reconhecer, todavia, que a execução apresenta caráter provisório apenas quanto aos capítulos da condenação oportunamente desafiados pela via processual própria (art. 475-I, § 1º, do CPC), facultando-se ao exequente prosseguir o procedimento satisfativo até o final perante a parte remanescente do título já transitada em julgado (inteligência do art. 897, § 1º, da CLT). O crédito trabalhista apresenta caráter marcadamente alimentar, sendo ainda presumível o estado de necessidade do obreiro, devido à situação de crise desencadeada pelo rompimento do pacto laboral, que é fonte primária de subsistência e dignidade do trabalhador, tornando inapropriada qualquer dilação satisfativa sem estrita justificação, mormente quando a providência não implica qualquer prejuízo ao devedor. Tratando-se de verbas definitivamente acertadas na fase cognitiva da demanda, compete deferir o imediato levantamento dos valores incontroversos em prol da parte vencedora (art. 899, § 1º, da CLT), independentemente, inclusive, do processamento definitivo da etapa de liquidação.”
(TRT-3 - AP: 00499201500503005 0000499-38.2015.5.03.0005, Relator: Convocada Sabrina de Faria F.Leao, Setima Turma, Data de Publicação: 06/11/2015)
5. CONCLUSÃO
No presente trabalho, conclui-se com base na sistemática adotada pela legislação trabalhista, bem como no regramento da lei de execução fiscal e novo código de processo civil aplicados subsidiaria e supletivamente ao processo do trabalho, que os embargos à execução no processo do trabalho não tem efeito suspensivo diante da simples apresentação pelo devedor.
Caso o executado pretenda ver atribuído tal efeito, deverá comprovar o atendimento dos seguintes pressupostos: a) garantia da execução; a) requerimento de efeito suspensivo; c) demonstração de fundamentos relevantes capazes de causar grave dano de difícil ou incerta reparação.
Nada obstante, a comprovação do periculum in mora se considera implícita nos casos em que o litígio envolver verbas de natureza alimentar, sempre a parte autora for hipossuficiente, beneficiária da gratuidade da justiça.
Contudo, mesmo nessa hipótese, é direito líquido e certo do exequente do levantamento dos valores incontroversos admitidos ou não contestados pelo devedor.
NOTAS:
[1] Leite, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito processual do trabalho – 14. ed. de acordo com o novo CPC – Lei n. 13.105 de 16-3-2015. - São Paulo : Saraiva, 2016, p. 1569.
[2] “EMENTA: Embargos a? execuc?a?o. Natureza juri?dica. Os embargos a? execuc?a?o possuem natureza juri?dica de ac?a?o de conhecimento incidental ao processo de execuc?a?o, na?o podendo ser rediscutida mate?ria ja? decidida em embargos anteriores, entre as mesmas partes, com mesmo pedido e ide?ntico fundamento, face a? existe?ncia de coisa julgada.” (Processo n. 01609-2000-007-01-00-3 AP – TRT da 3a Região, agravante: Hospital Central IASERJ, agravado: Roberto Ribeiro Pereira, publicado no dia 28/04/2009.
[3] Schiavi, Mauro. Manual de direito processual do trabalho – 10. ed. de acordo com o Novo CPC – São Paulo : LTR, 2016, p. 1249-1250.
[4] Saraiva, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho / Renato Saraiva, Aryanna Manfredini – 13. ed. rev. e atual.- Salvador: Ed. JusPodivm, 2016. p. 568.
[5] Saraiva, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho / Renato Saraiva, Aryanna Manfredini – 13. ed. rev. e atual.- Salvador: Ed. JusPodivm, 2016. p. 568.
[6] Saraiva, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho / Renato Saraiva, Aryanna Manfredini – 13. ed. rev. e atual.- Salvador: Ed. JusPodivm, 2016. p. 554.
[7] Nesse sentido jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 3a Região: Processo no 01015-2010-105-03-00-9 AP, Agravante: ITAU? UNIBANCO S.A, Agravado: GRECIELE DE SOUZA SANTANA (1) TRISHOP PROMOC?A?O E SERVIC?OS LTDA, data da publicação: 23/06/2012.
[8] Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.
[9] Nesse sentido Renato Saraiva, Mauro Schiavi, Carlos Henrique Bezerra Leite.
Bacharelado em Ciências Jurídicas e Sociais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: ISER, Marcelo André. O efeito suspensivo atribuído aos embargos à execução no Processo do Trabalho Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 abr 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/49995/o-efeito-suspensivo-atribuido-aos-embargos-a-execucao-no-processo-do-trabalho. Acesso em: 27 dez 2024.
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