RESUMO: O Superior Tribunal de Justiça possuía entendimento consolidado no sentido de que haveria necessidade de ratificação do Recurso Especial interposto anteriormente ao julgamento dos embargos de declaração, ainda que não houvesse qualquer alteração do que fora anteriormente decidido. Com o novo Código de Processo Civil, novos parâmetros foram trazidos ao Direito Processual, e a prática foi inviabilizada por expressa disposição legal, alterando-se o antigo posicionamento.
Palavras-chave: Direito Procesual Civil; novo Código de Processo Civil; Recurso Especial.
ABSTRACT: The Superior Court of Justice had a consolidated understanding in the sense that there would be a need for ratification of the Special Appeal filed prior to the judgment of the embargoes of the declaration, although there was no change of what had previously been decided. With the new Code of Civil Procedure, new parameters were brought to procedural law, and the practice was invalidated by express legal provision, changing the old positioning.
Keywords: Civil Procedural Law; New Code of Civil Procedure; Special Appeal.
SUMÁRIO: INTRODUÇÃO. 1 EXIGÊNCIA, PELO STJ, DA RATIFICAÇÃO DO RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO ANTERIORMENTE AO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. 1.1 DESISTÊNCIA TÁCITA DO RECORRENTE. NÃO ESGOTAMENTO DAS VIAS ORDINÁRIAS E INTEMPESTIVIDADE PRÉVIA DO RECURSO ESPECIAL NÃO RATIFICADO. CONCLUSÃO. REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
A jurisprudência defensiva do Superior Tribunal de Justiça consiste na obstaculização do conhecimento de Recursos Especiais, sob a alegação de não preenchimento de determinados requisitos de admissibilidade assim instituídos pelo próprio STJ. Neste artigo, será detalhado um clássico (e, atualmente, superado) posicionamento da Corte no sentido da exigência de ratificação do Recurso Especial interposto anteriormente ao julgamento dos Embargos de Declaração, ainda que do julgamento dos aclaratórios não adviesse qualquer alteração do julgado. Demonstra-se, em seguida, que o entendimento perdeu força com o novo Código de Processo Civil, diploma que combate o formalismo excessivo e prima pelo julgamento de mérito. A novel legislação, pois, culminou na alteração do entendimento, consistindo a regra, atualmente, na desnecessidade da ratificação em referência. É valiosa, nesse contexto, a compreensão do antigo posicionamento do STJ, bem como da sua superação, para que se compreendam as novas balizas que norteiam o Direito Processual moderno.
1. A EXIGÊNCIA, PELO STJ, DA RATIFICAÇÃO DO RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO ANTERIORMENTE AO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
O artigo 1.022 do Código de Processo Civil dispõe ser cabível o recurso de embargos de declaração quando houver, na sentença ou no acórdão, obscuridade ou contradição, ou, ainda, quando for omitido ponto sobre o qual o juiz ou tribunal deveria ter se pronunciado. No que se refere à possibilidade de interposição do recurso integrativo contra despachos, elucidativa a lição de Araken de Assis (2007, p. 598), ao afirmar que
o fato de o despacho não provocar gravame às partes não o isenta dos defeitos do art. 535. Por exemplo: o juiz designa audiência de instrução e julgamento para certo dia, mas o provimento omite a hora da solenidade. Evidentemente, os embargos de declaração se prestam a corrigir a omissão. Feliz se revela, nesta contingência, o alvitre de que, conquanto declarando a lei o pronunciamento irrecorrível, “o faz com a ressalva implícita no concernente aos embargos de declaração”.
Nesse sentido, o entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, a garantir:
Os embargos declaratórios são cabíveis contra qualquer decisão judicial e, uma vez interpostos, interrompem o prazo recursal. A interpretação meramente literal do art. 535 do Código de Processo Civil atrita com a sistemática que deriva do próprio ordenamento processual, notadamente após ter sido erigido a nível constitucional o princípio da motivação das decisões judiciais. (EREsp 159.317/DF, Rel. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Corte Especial, DJ 26/04/1999).
Registre-se que o Recurso Especial, a seu turno, consoante estabelecido pelo artigo 105, III, da CF/88, é cabível contra decisão judicial proferida por Tribunal de Justiça Estadual ou Tribunal Regional Federal, quando a decisão recorrida contrariar tratado ou lei federal, ou negar-lhes vigência; julgar válido ato de governo local contestado em face de lei federal; ou der a lei federal interpretação divergente da que lhe haja atribuído outro tribunal
Consabe-se, o prazo recursal é comum às partes - vale dizer, corre de maneira simultânea para ambos os litigantes. Assim, durante o seu transcorrer, enquanto uma das partes pode vislumbrar a necessidade, no caso concreto, de interposição do recurso integrativo comentado, o outro litigante, diferentemente, pode optar pela interposição, de logo, do Recurso Especial, se cabível, considerando já claramente debatidas as questões pertinentes e, portanto, desnecessária a irresignação declaratória.
Em caso tal, por força do art. 1.026 do Código de Processo Civil, o prazo para a interposição de outros recursos, por qualquer das partes, fica interrompido pelos embargos de declaração.
A partir daí, algumas situações poderiam surgir: (a) o litigante que já havia interposto o recurso excepcional poderia complementar o seu recurso, utilizando-se da faculdade trazida pelo sub-princípio da complementariedade, a fim de impugnar a parte da decisão modificada pelo provimento dos declaratórios; (b) esse mesmo litigante poderia simplesmente se quedar inerte, seja porque a decisão não foi alterada pelos declaratórios, seja porque as eventuais mudanças não lhe prejudicaram ou não lhe eram recorríveis; (c) o outro litigante, que havia interposto os declaratórios, pode, agora, recorrer contra o acórdão a quo ou (d) esse segundo litigante pode, por outro lado, optar por não mais recorrer (FARIA, 2009, p. 251-252).
Com efeito, a jurisprudência defensiva do STJ referia-se à situação do litigante que interpôs, de logo, o Recurso Especial cabível e, a despeito do julgamento dos embargos declaratórios da parte adversa, quedou-se inerte, uma vez que ou a decisão anterior não foi modificada pelo novo pronunciamento judicial ou as alterações não lhe prejudicaram ou não lhe eram recorríveis.
De acordo com a Corte em comento, era estritamente necessário que, em situação tal, a parte confirme ou ratifique o recurso interposto. Era, pois, o teor da Súmula 418 do Superior Tribunal de Justiça: “é inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação.” Confira-se:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO ANTES DO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RATIFICAÇÃO NECESSÁRIA. RESP 776.265/SC.
APLICAÇÃO RETROATIVA DA ATUAL ORIENTAÇÃO DA CORTE ESPECIAL. TEMPESTIVIDADE. EXAME DE OFÍCIO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA. PRECLUSÃO INOCORRENTE.
1. A Corte Especial, no julgamento do REsp 776.265/SC, adotou o entendimento de que o recurso especial interposto antes do julgamento dos embargos de declaração opostos junto ao Tribunal de origem deve ser ratificado no momento oportuno, sob pena de ser considerado extemporâneo.
2. "A circunstância de a interposição do recurso especial haver ocorrido em momento anterior à publicação do julgamento acima citado não dá ensejo a qualquer alteração, porquanto é inerente o conteúdo declaratório do julgado já que o posicionamento ali apresentado apenas explicita a interpretação de uma norma há muito vigente, não o estabelecimento de uma nova regra, fenômeno que apenas advém da edição de uma lei" (EREsp nº 963.374/SC, sob minha relatoria, Primeira Seção, DJ de 01.09.2008).
3. A ausência de manifestação do recorrido acerca da intempestividade do recurso especial em suas contra-razões não conduz à ocorrência de preclusão, haja vista que o referido pressuposto recursal deve ser apreciado ex officio, quer seja no juízo de admissibilidade a quo, quer seja no ad quem. Precedente da
Corte Especial.
4. Agravo regimental não provido. (STJ. 1ª Seção. AgRg nos EREsp 877640/SP. Rel. Min. Mauro Campbell Marques. Publicado no DJ de 18/06/09).
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. OPOSIÇÃODE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PELO CORRÉU. AUSÊNCIA DE RATIFICAÇÃO DORECURSO ESPECIAL ANTERIORMENTE INTERPOSTO. SÚMULA 418/STJ. 1. "É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicaçãodo acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação."(Súmula 418 do STJ). 2. Agravo regimental desprovido. (STJ - AgRg no Ag: 1200307 PA 2009/0107698-3, Relator: Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, Data de Julgamento: 14/06/2011, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 21/06/2011)
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO. ANTERIOR. JULGAMENTO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RATIFICAÇÃO. NECESSIDADE. SÚMULA 418/STJ. REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. Ao contrário do afirmado pelo agravante, o tribunal local procedeu ao julgamento dos embargos de declaração, opostos por Altamiro Pereira Neto, no dia 13/5/2010 (fl. 195) e o respectivo acórdão foi publicado no DJe de 28/5/2010 (fl. 211).2. Tendo sido interposto o recurso especial em 10/5/2010, antes, portanto, do julgamento dos embargos de declaração, indispensável sua ratificação nos termos do enunciado da Súmula 418/STJ, independentemente de os embargos terem sido opostos pelo outrocorréu para tratar de matéria alheia à cuidada nas razões do especial do ora agravante.3. Nestes termos, mantenho a decisão agravada pelos seus próprios fundamentos.4. Agravo regimental a que se nega provimento. (STJ - AgRg no Ag: 1374085 PR 2010/0228149-5, Relator: Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Data de Julgamento: 06/12/2011, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 03/02/2012)
Como se vê, a necessidade de ratificação era patente ainda que não tivesse havido qualquer modificação da decisão quando do julgamento dos embargos declaratórios interpostos.
O posicionamento do STJ era largamente criticado pela doutrina. Ora, a necessidade de ratificação do Recurso Especial apenas aparenta razoabilidade em caso de modificação da decisão impugnada pelo recurso integrativo. Trata-se, pois, da aplicação do princípio da complementariedade. Explica Nelson Nery Júnior (2004, p. 182):
Pelo princípio da complementariedade, o recorrente poderá complementar a fundamentação de seu recurso já interposto, se houver alteração ou integração da decisão, em virtude do acolhimento de embargos de declaração. Não poderá interpor novo recurso, a menos que a decisão modificativa ou integrativa altere a natureza do pronunciamento judicial, o que se nos afigura difícil de ocorrer.
Nada obstante, a jurisprudência da Corte era, repita-se, no sentido de que a ratificação é imprescindível ainda que nenhuma alteração da decisão advenha do julgamento dos embargos de declaração.
A exigência de tão exacerbado formalismo feria princípios caros ao ordenamento jurídico e, além de desarrazoada, mostra-se incompatível com a proclamação da garantia constitucional do amplo acesso à justiça, insculpida no art. 5º, XXXV, da Lei Maior.
Fácil constatar, ainda, que colidia frontalmente com a garantia constitucional do devido processo legal, por ferir o respeito à legalidade, uma vez que não havia qualquer previsão normativa que determinasse a necessidade da ratificação então exigida pelo STJ. Ademais, pontue-se, novamente, que cabe unicamente à União legislar sobre direito processual, sendo defeso a qualquer outro Poder, inclusive o Judiciário, que intente esforços nesse sentido – o que afronta a separação de poderes estabelecida no art. 2º da Constituição Federal.
Não é outra a razão pela qual Flávio Cheim Jorge (2010, p. 184) garante:
Neste particular, sempre defendemos que a interposição de embargos de declaração pela parte contrária não prejudica o processamento e julgamento do recurso típico, não sendo possível cogitar de sua inutilidade posterior ou mesmo de necessidade de sua ratificação.
Outrossim, não se pode deixar de constatar que “quando o legislador desejou ser necessário, para o conhecimento de recurso já interposto, um segundo ato, qual seja, uma ratificação, expressamente assim asseverou” (CHEIM JORGE, 2012, P. 285). É o caso, pois, do agravo retido (art. 523, caput e § 1º do CPC) e dos recursos excepcionais retidos (art. 542, § 3º, CPC), que contam com o fenômeno denominado de efeito diferido – não havendo qualquer previsão legal, contudo, que estabeleça a mesma situação para o caso de Recurso Especial.
Conclui, pois, Flávio Cheim Jorge (2012, p. 286):
Exigir-se tal ratificação seria, assim, considerar que esse recurso excepcional, interposto antes do julgamento (e às vezes, até mesmo da interposição) de embargos de declaração da parte contrária, no tribunal a quo, seria uma espécie de recurso complexo, algo não intentado pelo legislador.
Consoante oportunamente delineado alhures, o entendimento anterior do STJ demonstrava que o objetivo principal da Corte através da exigência de requisitos de admissibilidade nunca previstos em legislação é, tão somente, a diminuição do número de processos postos a sua jurisdição. É a aplicação prática e genuína do que passou a ser denominado de jurisprudência defensiva.
Vale ressaltar que o Supremo Tribunal Federal, que adotava posicionamento na mesma linha do verbete sumular do STJ, já havia, recentemente, alterado seu entendimento. É dizer: em decisão proferida em 11/06/2013, a 1ª Turma da Suprema Corte expressamente afastou a necessidade de ratificação do Recurso Extraordinário quando do julgamento dos embargos declaratórios interpostos pela parte adversa.
Decidiu o STF, destarte, que a parte pode, a partir do primeiro dia do prazo recursal, interpor o recurso extraordinário, independentemente da parte contrária ter oposto embargos declaratórios; dessa maneira, seria desnecessária a ratificação do Recurso Extraordinário após o julgamento do recurso integrativo. Eis o teor do Informativo da Suprema Corte:
Tempestividade: RE interposto antes de ED
A 1ª Turma, por maioria, proveu agravo regimental interposto de decisão que não conheceu de recurso extraordinário por intempestividade. No caso, a decisão agravada afirmara que a jurisprudência desta Corte seria pacífica no sentido de ser extemporâneo o recurso extraordinário interposto antes do julgamento proferido nos embargos de declaração, mesmo que os embargos tivessem sido opostos pela parte contrária. Reputou-se que a parte poderia, no primeiro dia do prazo para a interposição do extraordinário, protocolizar este recurso, independentemente da interposição dos embargos declaratórios pela parte contrária. Afirmou-se ser desnecessária a ratificação do apelo extremo. Concluiu-se pela tempestividade do extraordinário. Vencido o Min. Dias Toffoli, relator, que mantinha a decisão agravada.
(RE 680371 AgR/SP, rel. orig. Min. Dias Toffoli, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio).
O novo posicionamento do STF, diametralmente oposto ao que era, à época, adotado pelo STJ, certamente encontra maior harmonia com os princípios constitucionais relativos ao processo e está alinhado à busca por efetividade processual e ao desapego ao formalismo excessivo.
No mesmo sentido, o Novo Código de Processo Civil, conforme já mencionado, caminha na direção da busca pelo processo efetivo e enaltece a flexibilização dos requisitos formais de admissibilidade em prol da análise de mérito. Por isso, preceitua, no artigo 1.024, § 5º:
Se os embargos de declaração forem rejeitados ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior, o recurso interposto pela outra parte, antes da publicação do julgamento dos embargos de declaração, será processado e julgado independentemente de ratificação.
Constata-se, pois, que o NCPC deixou de exigir a ratificação do Recurso Especial interposto anteriormente ao julgamento dos embargos declaratórios, se estes forem rejeitados ou não alterarem a decisão anterior.
Eis que, com o advento da novel legislação processual, o STJ findou por, ainda que tardiamente, superar seu entendimento defensivo, procedendo ao cancelamento da Súmula 418 e aprovando a Súmula 579, a dispor que “não é necessário ratificar o recurso especial interposto na pendência do julgamento dos embargos de declaração quando inalterado o julgamento anterior.” De qualquer forma, serão a seguir delineados os argumentos anteriormente utilizados pela Corte a fim de sustentar ou tentar justificar a adoção do entendimento classicamente esposado. Quer-se, com isso, demonstrar a clássica jurisprudência defensiva, até então adotada.
1.1 DESISTÊNCIA TÁCITA DO RECORRENTE. NÃO ESGOTAMENTO DAS VIAS ORDINÁRIAS E INTEMPESTIVIDADE PRÉVIA DO RECURSO ESPECIAL NÃO RATIFICADO
Poder-se-iam canalizar esforços no sentido de procurar razão na obrigatoriedade de ratificação por se considerar que haveria suposta desistência tácita por parte do litigante que queda silente.
Outrossim, havia jurisprudência expressiva que buscava justificar a necessidade de ratificação do Recurso Especial - interposto anteriormente ao julgamento dos embargos declaratórios - na alegação de não esgotamento das instâncias ordinárias.
Isso porque, como é cediço, o artigo 105, III, da CF/88 estatui que a causa objeto do apelo extremo ao STJ deve haver sido decidida em última ou única instância pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios, o que significa dizer que o esgotamento dessas instâncias é requisito de admissibilidade do Recurso Especial.
Sobre o tema, afirmam Fredie Didier Júnior e Leonardo José Carneiro da Cunha (2009, p. 266) que os recursos “não podem ser exercitados per saltum, deixando in albis alguma possibillidade de impugnação.” Ou, ainda, na lição de Vicente Greco Filho 2006, p. 371), “só cabe recurso especial se forem esgotados os recursos ordinários.”
Assim, se há, no caso concreto, possibilidade de interposição de embargos declaratórios, e o litigante interpõe, de logo, o Recurso Especial, a jurisprudência considera que não haveria, ainda, esgotamento das vias ordinárias, o qual só estaria alcançado com o julgamento do recurso integrativo. Dessa maneira, era necessário que o recorrente ratificasse o apelo em comento para oportunizar ao recurso que veja atendido o requisito de admissibilidade atinente ao esgotamento das vias ordinárias. Era o que se observava:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO PREPÓSTERA. AUSÊNCIA DE RETIFICAÇÃO OU CONFIRMAÇÃO. INTEMPESTIVIDADE. SÚMULA 418/STJ. 1. É expressa na Súmula 418 deste Tribunal Superior nossa sedimentada jurisprudência a respeito da intempestividade de recurso especial interposto antes do julgamento de embargos declaratórios sem que, ao depois, tenha sido o apelo extremo reiterado ou retificado. 2. A razão de ser dessa jurisprudência diz com a falta de esgotamento da via ordinária, de modo a não caracterizar o pressuposto processual constitucional do julgamento de única ou última instância. 3. Havendo jurisprudência sumulada a partir de julgamento pela Corte Especial, não é relevante a existência de precedentes de um determinado relator ou de Turma para suplantar-se tal orientação, senão unicamente pela via do art. 16, inciso II, do RISTJ. 4. Agravo regimental não provido. (STJ - AgRg no AREsp: 356611 GO 2013/0184478-5, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Julgamento: 19/09/2013, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 27/09/2013) [o grifo não consta do original]
Assim, é certo que, para a interposição dos recursos extremos, é imprescindível a preclusão consumativa no que se refere aos recursos cabíveis nas instâncias ordinárias. O Superior Tribunal de Justiça, destarte, considerava que a possibilidade de interposição dos embargos declaratórios denotava o não esgotamento da matéria recursal nas instâncias inferiores, o que anima a jurisprudência a defender a necessidade de ratificação do Recurso Especial.
O STJ era firme no entendimento esposado, e as palavras proferidas na decisão do Agravo em Recurso Especial nº 619.390, de Relatoria do Ministro Mauro Campbell Marques, são elucidativas do argumento adotado pela Corte, no que se refere ao suposto não esgotamento das instâncias ordinárias. Eis a ementa do julgado:
AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 619.390 - AL (2014/0303920-3) RELATOR : MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES AGRAVANTE : PAULO MAGALHÃES DE BRITO ADVOGADO : DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO AGRAVADO : FAZENDA NACIONAL PROCURADOR : PROCURADORIA-GERAL DA FAZENDA NACIONAL PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. INTERPOSIÇÃO DO RECURSO ESPECIAL NA PENDÊNCIA DO JULGAMENTOS DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE RATIFICAÇÃO DA PEÇA. SÚMULA 418/STJ. RECURSO ESPECIAL EXTEMPORÂNEO. AGRAVO CONHECIDO PARA NEGAR SEGUIMENTO AO RECURSO ESPECIAL. DECISÃO Trata-se de agravo contra decisão que inadmitiu recurso especial, em face de acórdão proferido pelo TRF 5 Região, assim ementado: TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. CDA. NULIDADE. COBRANÇA DE DÍVIDA ATIVA DA UNIÃO NÃO TRIBUTÁRIA. POSSIBILIDADE. MP 2.196-3/2001. CESSÃO DE CÉDULA DE CRÉDITO RURAL DO BANCO DO BRASIL PARA A UNIÃO FEDERAL. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. DESCABIMENTO. TAXA SELIC.1. Cabe à Fazenda Nacional a cobrança fiscal dos créditos de natureza não tributária (art. 39, § 5º, da Lei nº 4.320/64 e art. 2º, § 1º, da Lei nº 6.830/80), portanto não se fala em ilegalidade ou inconstitucionalidade da MP nº 2.196-3/2001 ou nulidade da CDA.2. Não havendo prova da condição de bem de família da propriedade rural do devedor penhorada, não prospera o pedido do embargante para desconstituir a constrição do bem considerado por ela impenhorável, com base na Lei nº 8.009/90.3. Não se conhece parte da apelação da exequente, pois a sentença foi justamente no sentido de manter a comissão de permanência até a cessão do crédito à União, a partir da qual incide a Taxa SELIC, de acordo com o art. 5º da citada medida provisória.4. A Fazenda Nacional não tem interesse em recorrer, se não sucumbiu nesta parte, devendo ser apreciado apenas o pedido para conservar os encargos pactuados, incluindo tal comissão.5. Não prospera a tese da credora, porque, embora contratada, não é possível cumular a comissão de permanência com a multa de 10% e os juros de mora de 1% ao ano (art. 5º, parágrafo único, do Decreto-Lei nº 167/67), em caso de inadimplência da obrigação.6. Afastada a comissão de permanência, cuja acumulação com outro encargo contratual é considerada ilegal.7. Apelações não providas Opostos embargos de declaração, foram rejeitados. No recurso especial, manifestado com fulcro na alínea c do permissivo constitucional, sustenta a agravante que o aresto vergastado contrariou o disposto no artigo 5º da MP 2.196-3/2001, pois é impossível a cumulação da taxa Selic com demais encargos como correção monetária, juros remuneratórios e multa contratual. Não houve apresentação de contrarrazões ao recurso especial. O recurso foi inadmitido por meio de decisão proferida pelo presidente do TRF 5ª Região, sob a fundamentação segundo a qual ausente o cotejo analítico. Fundamento esse impugnado por meio do presente agravo. É o relatório. Decido. A irresignação não prospera. No caso em análise, o agravante interpôs o recurso especial no dia 09/7/2013 (e-STJ fl. 360/368), na pendência da análise dos embargos de declaração interpostos pela Fazenda Nacional em 6/6/2013 (e-STJ fl. 369/370). Os embargos de declaração foram rejeitados (e-STJ fls. 373/376), e a sua decisao publicada em 01/8/2013 (e-STJ fl.377). Contudo, não houve, em momento algum, ratificação do recurso especial interposto prematuramente por Paulo Magalhães de Brito, a fim de viabilizar a via eleita, de modo que a extemporaneidade impede o seu conhecimento. Incide, portanto, o óbice da Súmula 418/STJ que dispõe, in verbis: é inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação. Isso porque a questão de anteriores embargos declaratórios terem, ou não, sido acolhidos, e de os efeitos infringentes terem, ou não, sido aplicados, não importa, em princípio, para a incidência do referido enunciado porque sua razão de ser diz com o necessário esgotamento de instância ordinária para a abertura da instância recursal extraordinária, de forma que ao notar-se a pendência do julgamento de determinado recurso ou incidente pelo Tribunal de origem, o recurso especial porventura interposto antes disso deve obrigatoriamente ser confirmado ou modificado pela parte interessada posteriormente à definitiva apreciação pela Corte a quo. Nessa esteira, a ratio essendi dessa jurisprudência dominante é exatamente a falta de esgotamento da instância ordinária e a necessidade de confirmação do recurso para dar cumprimento a esse requisito constitucional de admissibilidade recursal, assim porque a jurisprudência fala em necessidade de reiteração ou de ratificação exatamente por isso, é dizer, na hipótese de antecedentes embargos de declaração, o seu acolhimento deve provocar manifestação sobre a reiteração do recurso especial, com nova interposição, assim como a rejeição provocará a ratificação daquele mesmo apelo extremo interposto anteriormente. Nesse ponto, pouco importa se o julgamento de recurso interposto anteriormente ao apelo extremo implica ou não a modificação do julgado: o interessado no especial deve retificar ou ratificar sua pretensão recursal, conforme for o caso. Confira-se: PROCESSO CIVIL. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO ANTES DO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NECESSIDADE DE RATIFICAÇÃO. É extemporâneo o recurso especial interposto antes do julgamento dos embargos de declaração, salvo se houver ratificação posterior (STJ, Súmula nº 418). Agravo regimental desprovido. (AgRg no AREsp 303.137/RJ, Rel. Ministra MARGA TESSLER (JUÍZA FEDERAL CONVOCADA DO TRF 4ª REGIÃO), PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/11/2014, DJe 25/11/2014) AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. RECURSO INTERPOSTO ANTES DO JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RATIFICAÇÃO. NECESSIDADE. SÚMULA 418/STJ. ADMISSIBILIDADE PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. NÃO VINCULAÇÃO. 1. "É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação" (Enunciado 418 da Súmula do STJ). 2. Na hipótese dos autos, extemporâneo o recurso especial interposto quando ainda pendente de julgamento os embargos de declaração. 3. O juízo de admissibilidade previamente realizado pela Corte estadual não vincula o STJ. Precedente. 4. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no REsp 1208324/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 11/11/2014, DJe 21/11/2014) PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO ANTES DO ACÓRDÃO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE REITERAÇÃO. EXTEMPORANEIDADE. SÚMULA 418/STJ. 1. O recurso especial interposto antes da publicação da decisão proferida nos embargos declaratórios, ainda que tenham sido opostos pela parte contrária, deve ser oportunamente ratificado pela parte recorrente, sob pena de ser considerado extemporâneo, conforme o teor da Súmula 418/STJ. 2. Agravo regimental não provido. (AgRg no AREsp 424.264/RO, Relatora Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 3/12/2013, DJe 16/12/2013) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. APELAÇÃO INTERPOSTA NA PENDÊNCIA DE JULGAMENTO DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. NECESSIDADE DE RATIFICAÇÃO. SÚMULA 418/STJ. APLICAÇÃO. 1. A jurisprudência deste Superior Tribunal firmou-se no sentido de ser extemporânea a apelação interposta na pendência de julgamento dos embargos de declaração, ainda que apresentados pela parte contrária ou rejeitados, sem que ocorra a posterior e necessária ratificação, dentro do prazo legal. 2. Diante disso, aplica-se, por analogia, o enunciado da Súmula 418/STJ, que assim dispõe: "É inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação". 3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no AREsp 251.735/MG, Relator Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/11/2013, DJe 29/11/2013) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. EXTEMPORANEIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 418/STJ. 1. Nos termos da Súmula 418/STJ, "é inadmissível o recurso especial interposto antes da publicação do acórdão dos embargos de declaração, sem posterior ratificação". 2. Agravo regimental a que se nega provimento.(AgRg no REsp 1.370.270/RJ, Relator Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, DJe 10/4/2013) PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.RECURSO ESPECIAL INTERPOSTO ANTES DA PUBLICAÇÃO DO ACÓRDÃO QUE JULGOU OS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AUSÊNCIA DE POSTERIOR RATIFICAÇÃO. INTEMPESTIVIDADE. SÚMULA 418 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. É ônus do agravante providenciar a ratificação do Recurso Especial quando este é interposto antes da publicação do acórdão dos Embargos de Declaração, nos termos da Súmula 418 do STJ. 2. A teor do art. 4o., §§ 2o. e 3o. da Lei 11.419/06, a publicação eletrônica substituiu qualquer outro meio de publicação oficial, para quaisquer efeitos, à exceção dos casos que, por lei, exigem intimação ou vista pessoal, hipótese diversa do caso em análise, considerando-se como data da publicação o primeiro dia útil seguinte ao da disponibilização da informação no Diário da Justiça eletrônico. 3. Agravo Regimental desprovido.(AgRg no AREsp 153.194/PE, Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 2/10/2012, DJe 5/10/2012) Ante o exposto, com fundamento no art. 544, § 4º, II, b, do CPC, conheço do agravo para negar seguimento ao recurso especial. Publique-se. Intimem-se. Brasília (DF), 12 de dezembro de 2014. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES Relator (STJ - AREsp: 619390 AL 2014/0303920-3, Relator: Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Data de Publicação: DJ 16/12/2014) [o grifo não consta do original]
Ademais, em outro viés, convergente com o acima elencado, outra parte da jurisprudência defendia que o juízo negativo de admissibilidade do Recurso Especial não ratificado e interposto previamente aos julgamento dos embargos declaratórios teria por escopo suposta intempestividade prévia.
Consabe-se, a tempestividade é requisito geral de admissibilidade recursal. Significa dizer que todos os recursos devem ser interpostos dentro do lapso temporal legalmente previsto, sob pena de não serem conhecidos.
Para o Recurso Especial, consoante dita o art. 1.003, § 5º, do Código de Processo Civil, o prazo é de 15 (quinze) dias, o qual começava a ser contado, segundo estabelecia o art. 506, III, do diploma processual revogado, a partir da publicação do dispositivo do acórdão no órgão oficial. Em que pese a norma estatuída no CPC, era pacífica a jurisprudência do STJ no sentido de que o recurso interposto anteriormente à publicação no veículo oficial era tempestivo. Ora, é certo que, com a rapidez no acesso às informações por meio eletrônico, não mais se justificaria a necessidade de que a parte aguardasse a publicação oficial, mesmo já tendo ciência da decisão que deseja impugnar. Assim, bem entendeu a Corte ao suplantar seu antigo e ultrapassado entendimento:
PROCESSO CIVIL – RECURSO – TEMPESTIVIDADE – MUDANÇA DE ORIENTAÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. 1. A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de considerar intempestivo o recurso interposto antes da publicação da decisão no veículo oficial. 2. Entendimento que é revisto nesta oportunidade, diante da atual sistemática de publicidade das decisões, monocráticas ou colegiadas, divulgadas por meio eletrônico. 3. Alteração jurisprudencial que se amolda à modernização da sistemática da publicação via INTERNET. 4. Agravo regimental provido. (AgRg nos EREsp 492.461/MG, Rel. Min. Gilson Dipp, Rel. p/ Acórdão Min. Eliana Calmon, Corte Especial, DJ 23/10/2006)
Cabe à parte, pois, proceder à interposição do Recurso Especial dentro do prazo exposto. Contudo, no caso em comento, tal cuidado não era suficiente ao atendimento do requisito de admissibilidade recursal relativo à tempestividade. Isso porque, conforme aduzido, parcela da jurisprudência considerava que o REsp, ainda que interposto dentro do prazo legal, era prematuro se não ratificado após o julgamento dos declaratórios, padecendo de intempestividade prévia. Extemporâneo, teria sido interposto previamente ao esgotamento das instâncias ordinárias, requisito especial de admissibilidade dos recursos extremos, mencionado alhures. Nesse sentido:
Embargos de divergência em recurso especial. Recurso interposto antes do julgamento dos embargos de declaração. Necessidade de ratificação. Decisão de última instância.
1. O recurso especial foi interposto antes do julgamento dos embargos de declaração da parte contrária sem posterior ratificação.
2. O julgamento dos embargos de declaração, com ou sem efeito modificativo, integra o acórdão recorrido, formando com ele o que se denomina decisão de última instância, possível de impugnação mediante o uso do recurso especial, nos termos da Constituição Federal.
3. É extemporâneo o recurso especial tirado antes do julgamento dos embargos de declaração, anteriormente opostos, sem que ocorra a necessária ratificação – Corte Especial – REsp 776265-SC.
4. Embargos de divergência conhecidos e acolhidos.” (STJ, EDiv no REsp 796.854/DF, Corte Especial, rel. Min. Fernando Gonçalves, DJU 06.08.2007)
A conclusão é inexorável:
dessa forma, a despeito de diferentes justificativas, a jurisprudência dos Tribunais Superiores é uníssona no sentido de não admitir o apelo excepcional interposto sem a ratificação posterior ao julgamento dos embargos de declaração já opostos. (FARIA, 2009, p. 253-254)
Seja por considerar que há, por parte do litigante que não reitera o RE, desistência tácita, seja por entender que não há, no caso, esgotamento das vias ordinárias, ou, ainda, sob a justificativa de suposta intempestividade, é certo que se tratava de patente utilização, por parte do STJ, da jurisprudência defensiva, com o fito único de inadmitir Recursos Especiais legítimos e, assim, diminuir a quantidade de causas postas a julgamento perante a Corte.
E não era só. Explica-se:
Admitindo-se, apenas ad argumentandum tantum, como válida a necessidade de reiteração do recurso especial interposto antes do julgamento dos embargos de declaração, chega-se a uma outra questão, dela dependente, que escancara a posição defensiva da jurisprudência recursal dos Tribunais Superiores, notadamente o STJ. (FARIA, 2009, p. 261)
A situação mencionada diz respeito ao período a partir do qual a exigência do STJ, amparada tão somente em consolidação jurisprudencial, passaria a vigorar. Para tanto, deve-se atentar ao fato de que, com a promulgação da Constituição de 1988 e a criação da modalidade do Recurso Especial, não havia a necessidade da ratificação objeto de análise.
A Corte só passou a adotar o entendimento atual e, portanto, a exigir esse requisito de admissibilidade sem previsão constitucional ou legal a partir de abril de 2007, quando do julgamento do REsp 776.265/SC. Por esse motivo, o STJ, inicialmente, entendeu que, em caso de Recurso Especial interposto anteriormente a esse marco, não poderia ser exigida a ratificação, devendo haver juízo positivo de admissibilidade ainda que a parte não tivesse reiterado o Recurso Especial interposto anteriormente ao julgamento dos embargos declaratórios.
Desse modo, até mesmo em respeito à segurança jurídica, enendeu o STJ que o “requisito de admissibilidade” da ratificação deveria ser aplicado somente aos recursos interpostos posteriormente ao julgamento de 18.04.2007, na medida em que seria impossível exigir, do recorrente, que respeitasse regra que nem mesmo os mais brilhantes Ministros do STJ respeitavam (se é que existia!) há quase duas décadas. Tratava-se, assim, de uma solução conciliadora, racional e respeitadora do direito adquirido processual. (FARIA 2009, p. 262)
Em que pese o exposto, o entendimento do Tribunal não perdurou. Em julgamento realizado em 21/05/2008, o STJ, através de sua Corte Especial, por maioria, no EDiv no REsp 933.438/SP, alterou o posicionamento, para entender que a nova exigência jurisprudencial, a estabelecer a necessidade de ratificação do Recurso Especial, teria efeitos retroativos. Vale dizer, mesmo nos casos em que o recurso extremo já havia sido interposto quando do novo entendimento da Corte, haveria juízo de admissibilidade negativo se ausente a reiteração da espécie recursal. Eis trecho do voto do Ministro Relator do processo, Mauro Campbell Marques:
[...] O acórdão que implica em não admissão ou não conhecimento do recurso tem conteúdo preponderantemente declaratório (grau de eficácia 5, nos dizeres do mestre), sem descurar de sua eficácia desconstitutiva da própria relação jurídica processual (o que lhe rende o grau de eficácia 3). Sendo assim, se a eficácia preponderante do decisum é declaratória (ou declarativa, como preferia Pontes de Miranda), é inerente ao mesmo a sua retroatividade. Esta linha que entendo ser a correta, foi a que a 2.ª T. trilhou ao julgar o AgRg no Ag 950.182/SP, de relatoria da Min. Eliana Calmon (citado no relatório como acórdão paradigma), ao entender que o posicionamento adotado pela Corte Especial no REsp 776.265/SC ‘apenas explicita a interpretação de uma norma há muito vigente, não o estabelecimento de uma nova regra, fenômeno que apenas advém da edição de uma lei.’ De fato, o acórdão prolatado apenas explicita o conteúdo da nova redação do art. 538 do CPC, após a alteração realizada pela Lei 8.950 de 13.12.1994.
Apesar da tentativa do Tribunal de justificar o entendimento, o que se conclui, com a devida vênia, é que o posicionamento do STJ, no caso analisado, era clara aplicação do se convencionou denominar de jurisprudência defensiva. O formalismo exacerbado, sem amparo legal, consubstanciado na necessidade de reiteração do Recurso Especial ainda que do julgamento dos embargos declaratórios não advenha qualquer alteração da decisão, sendo a exigência, ademais, retroativa aos Recursos Especiais interpostos preteritamente à pacificação do posicionamento, demonstra que o objetivo único do Tribunal da Cidadania era obstar o conhecimento de Recursos Especiais legítimos aos olhos da lei, para, impossibilitando-lhes a análise de mérito, reduzir o número de processos que chegam a essa instância superior.
CONCLUSÃO
De tudo se conclui que o antigo posicionamento, ao privilegiar em demasia o formalismo, demonstrava que o objetivo do STJ era, tão somente, inadmitir Recursos Especiais e, dessa maneira, diminuir o grande número de processos que lá tramitavam pela via recursal. Tal, contudo, esbarra na mais moderna hermenêutica processual. Com o advento do novo CPC, a prática foi legalmente suplantada, o que culminou no cancelamento da Súmula 418 do STJ e na edição da sua Súmula 479, de maneira que, atualmente, é desnecessária a ratificação do recurso interposto anteriormente ao julgamento dos Embargos de Declaração, se deste não advier alteração do quanto anteriormente decidido.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Sergipe, pós-graduada em Direito Civil e Processual Civil pelo Instituto Elpídio Donizetti/FEAD.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GOES, Carolina Mattos. A (des)necessidade da ratificação do Recurso Especial interposto anteriormente ao julgamento dos embargos de declaração Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 01 jun 2017, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/50194/a-des-necessidade-da-ratificacao-do-recurso-especial-interposto-anteriormente-ao-julgamento-dos-embargos-de-declaracao. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Fernanda Amaral Occhiucci Gonçalves
Por: MARCOS ANTÔNIO DA SILVA OLIVEIRA
Por: mariana oliveira do espirito santo tavares
Por: PRISCILA GOULART GARRASTAZU XAVIER
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