ANTÔNIA MARIA DA SILVA
(Orientadora)[1]
RESUMO: O presente artigo aborda a temática da greve de servidor público, tendo como delimitação a isonomia entre servidores públicos e particulares no que se refere ao direito de greve e ao recebimento de salário, que na contemporaneidade foi objeto de mudança no entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema. O objetivo é analisar se o desconto do salário dos servidores grevistas, pelos dias paralisados, não configuraria motivo suficiente para impedir o direito de greve em si. O método de pesquisa utilizado para a realização do estudo foi o estudo bibliográfico, sendo pesquisado em doutrinas e na jurisprudência da Corte Constitucional. A hipótese da problemática inicialmente apresentado foi a de que os servidores públicos devem ter o ponto cortado em caso de greve, devido ao fato de que a greve prejudica o interesse da coletividade, e afasta o princípio da supremacia do interesse público. Dessa forma, o servidor público grevista só não terá o dia paralisado descontado, se for provado que o motivo da greve é por culpa do próprio poder público, tornando, com esse comportamento, a greve legítima.
PALAVRAS-CHAVE: Greve; Servidor Público; Recebimento de salário na greve; Paralização.
ABSTRACT: This article deals with the issue of the public servant strike, having as a delimitation the isonomy between civil servants and private individuals with regard to the right to strike and the receipt of salary, having been, at the present time, object of change in the understanding of the Supreme Court Federal (STF) on the subject. The objective is to analyze whether the salary discount of the striking servers, for the paralyzed days, would not constitute sufficient reason to prevent the right to strike itself. The research method used to carry out the study was the bibliographic study, being investigated in doctrines and in the jurisprudence of the Constitutional Court. The hypothesis of the problem initially presented was that public servants should have the cut point in case of strike, due to the fact that the strike damages the interest of the collectivity, and the principle of supremacy of the public interest must prevail. In this way, the striking public servant will not have the day paralyzed discounted, if it is proved that the reason for the strike is due to the public power itself, making, with this behavior, the legitimate strike.
KEYWORDS: Public Server Strike; receipt of salary; stalled.
SUMÁRIO: 1 Introdução. 2. Do direito de greve dos servidores públicos. 2.1. Dos serviços e servidores públicos. 2.2. Do princípio da continuidade do serviço público. 3. Da greve e do desconto de dias não trabalhados. 4.considerações finais. 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO
No presente trabalho aborda-se se podem os servidores públicos, de maneira legítima e dentro dos parâmetros legais, ao exercerem o direito de greve previsto na Constituição da República, não sofrerem, em decorrência dos dias de paralisação, descontos de seus salários, conforme acontece com empregados de empresas privadas.
O artigo foi dividido em 3 seções. A primeira – Introdução - traz a contextualização do direito de greve. A segunda trata do direito de greve dos servidores públicos. O terceiro da greve e dos descontos dos dias não trabalhados, além das considerações finais.
Tal sistemática permitirá a abordagem do tema de forma clara e objetiva do problema anteriormente proposto.
A palavra GREVE, tem origem francesa (GRÈVE), que significa cascalho. Em Paris havia o rio Sena: antes de haver a canalização, quando era época de cheias, eram depositados gravetos e cascalhos em uma praça, onde foi denominada de Place de Grève. Nesta praça os operários se reuniam, para procurar trabalho. Também os que trabalhavam se encontravam quando estavam descontentes com as condições de trabalho, para discutirem uma hipótese de paralisação, quando chegavam ao ponto de paralisarem, se reuniam nessa mesma praça para tal ato.
As paralisações trabalhistas começaram a ser regulamentadas no final do século XVIII. Em sua história a nível mundial, foi cronologicamente considerada um delito, principalmente no sistema corporativo. Depois passou a liberdade, no Estado Liberal e, posteriormente, a direito, nos regimes democráticos (MARTINS, 2016, p. 1233), tendo sido considerado um delito no direito romano, época na qual não era permitido a reunião dos obreiros, nem sua associação.
Na Inglaterra e na França, a greve era considerada um crime. Somente em 1825, na Inglaterra, e em 1864, na França, a legislação descriminalizou a simples paralisação. Na Itália, a greve foi considerada como um direito no ano de 1947.
No Brasil, a trajetória da greve tem como marco fundamental a afirmação da relação de emprego como vínculo sócio-jurídico importante no sistema econômico-social do Brasil. Esse marco é firmado pela extinção da escravatura em 1888, que tornou a relação empregatícia a modalidade central de vinculação do trabalho ao sistema socioeconômico.
Em torno desse período, surge o primeiro diploma legal que se refere à greve: o antigo Código Penal de 11 de outubro de 1890 (Decreto n. 1.162, de 12-12-1890), que tipificava a greve e seus atos como ilícitos criminais.
No panorama histórico brasileiro, o primeiro grande movimento grevista ocorreu no ano de 1891, em São Paulo, cuja reivindicação consistia em que houvesse uma jornada de trabalho de 8 horas, e que tivesse a proibição de trabalhos no período noturno para mulheres e menores.
Em 1938, o Decreto-lei 431 tipificou a greve como crime, quanto a incitamento dos funcionários públicos à paralisação coletiva dos serviços; induzimento de empregados à cessação ou suspensão do trabalho e à paralisação coletiva por parte dos funcionários.
Já o Código Penal de 1940, considerava crime, em seus artigos 200 e 201, a paralisação do trabalho, caso houvesse perturbação da ordem pública ou se fosse contrária aos interesses públicos.
Nesse período, mesmo havendo a proibição constitucional, o Decreto-lei 9.070/1946, admitiu a greve nas atividades acessórias, vedando-a nas atividades fundamentais.
Posteriormente, a Carta Magna de 1967 considerou em seu artigo 158, inciso XXI, que não era permitida a greve em serviços públicos, e no artigo 157, § 7º, também proibia a greve para as atividades essenciais. A Emenda Constitucional nº 1/1969, por sua vez, vedava, no artigo 162, a greve nos serviços públicos e atividades essenciais definidas em lei.
Em 1978, foi editado o Decreto-lei nº 1.632, que tratava da proibição da greve em serviços públicos e atividades essenciais. O decreto trazia enumerado quais seriam os serviços essenciais, como por exemplo (água e esgoto, hospitais, ambulatórios, transportes, energia elétrica, entre outros). Caso houvesse greve em algumas das atividades essenciais, incumbia-se ao Ministério do Trabalho declarar a ilegalidade da greve.
A Lei nº 6.620/1978 definiu os crimes contra a segurança nacional, estabelecendo a punição ao incitamento à paralisação de serviços públicos e à cessação coletiva do trabalho pelos funcionários públicos (MARTINS, 2016, p. 1236).
Somente a Constituição Republicana de 1988 principiou a disciplinar a greve como direito do servidor público. O artigo 37, incisos VI e VII, da Constituição, com a redação da Emenda Constitucional nº 19, assegurou ao servidor público o direito à livre associação sindical e o direito de greve (DI PIETRO, 2014, p. 634).
Assim, a atual Constituição traz em sua redação no artigo 37, VII que o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica. Acontece que essa lei nunca foi criada, trazendo prejuízo aos servidores concernente à pratica de seu direito Constitucional garantido.
2. DO DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS
2.1. DOS SERVIÇOS E SERVIDORES PÚBLICOS
O Serviço Público é direcionado por dois sentidos: um amplo e um estrito. Edmir Netto de Araújo traz as definições dos sentindo amplo e do estrito:
(...) A conceituação ampla de serviço público, a mais abrangente e genericamente possível, como “toda atividade exercida pelo Estado, através de seus Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) para a realização direta ou indireta de suas finalidades”, no que somos acompanhados por autores estrangeiros e por boa parte dos autores brasileiros.
No sentido estrito, serviço público é todo aquele que o Estado exerce direta ou indiretamente para a realização de suas finalidades, mas somente pela Administração, com exclusão das funções legislativa e jurisdicional, sob normas e controles estatais, para satisfação de necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniência do Estado.
A doutrina majoritária de Direito Administrativo tem uma preferência pelo sentido amplo. Contudo, ambos os conceitos estão certos, o que se muda é apenas a atividade a ser considerada como serviço público.
Celso Antônio Bandeira de Mello (2016, p. 699) assim define serviço público:
Serviço Público é, portanto, toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público, portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais, instituído em favor dos interesses definidos como públicos no sistema normativo.
Nesse sentido, serviço público é considerado uma atividade para satisfazer a coletividade e, pelo fato de ser de grande importância, o Estado tem o dever de assumi-las, mesmo não havendo exclusividade. Ademais, não se pode deixar à livre vontade das iniciativas privadas, por serem essenciais para a população, como por exemplo, água, saúde, educação, entre outros.
Quanto a servidores públicos, Celso Antônio Bandeira de Mello (2016, p. 259) traz a seguinte definição:
(...) todos aqueles que mantêm vínculos de trabalho profissional com as entidades governamentais, integrados em cargos ou empregos da União, Estados, Municípios, Distrito Federal e Municípios, respectivas autarquias e fundações de Direito Público.
Dessa forma, são considerados servidores públicos aqueles que possuem um vínculo com o Estado em forma de relação de Trabalho, sendo de natureza profissional.
2.2. DO PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DO SERVIÇO PÚBLICO
O direito público possui como escopo principal o resguardo aos interesses
da sociedade como um todo, a regência das relações entre esta e o Estado
e dos liames jurídico-obrigacionais dos órgãos estatais e entidades entre si. Ampara o interesse público, somente atingindo ações individuais de maneira mediata ou automática.
É propriedade acentuada do direito público a distinção nas relações
jurídicas por ele amparadas, apresentando à luz a preponderância do interesse público sobre os interesses particulares. O alicerce desse desequilíbrio, deste modo, é a noção de que os anseios da coletividade devem sobressair-se aos interesses privados.
Portanto, quando a Administração Pública atua na conservação do interesse público, faz jus a determinados atributos que a colocam em estado jurídico de superioridade perante o particular, claramente, em compasso com a lei.
Entretanto, como explica Maria Silvia Zanella Di Pietro (p. 103, 2017), se por um lado a Constituição da República confere ao Estado prerrogativas alheias aos particulares (como o Poder de Polícia previsto no artigo 78 do Código Tributário Nacional), a fim de que este possua poderes bastantes para perseguir os interesses coletivos (Princípio da Supremacia do Interesse Público), por outro lado, e em nome desse mesmo objetivo de natureza pública, a Carta Magna limita a atuação da Administração Pública para que não abandone ou se desvie da sua finalidade constitucional (Indisponibilidade do Interesse Público). A junção dos poderes conferidos com as limitações impostas compõe o chamado Regime Jurídico Administrativo.
Como a atuação do Estado se externa pelas condutas dos Agentes Públicos, estes, consequentemente, possuem poderes e limitações impostas pela Constituição e a Lei. Uma das limitações é o que se denomina de Princípio da Continuidade do Serviço Público.
Os serviços públicos, dadas a sua natureza e relevância de atividades propriamente administrativas executadas sob regime jurídico de direito público, não devem ser interrompidos, uma vez que buscam atender aos anseios dos indivíduos em determinados setores sociais.
A respeito desse princípio, ensinam Marcelo Alexandrino e Vicente de Paulo (2017, p. 264):
Abrange, assim, a prestação de serviços públicos em sentido estrito – prestações que representem, em si mesmas, utilidades materiais fruíveis diretamente pela população em geral, efetuadas diretamente ou por meio de delegatários, o exercício do poder de polícia, as atividades de fomento e a intervenção. Ficam excluídas, por outro lado, a atuação do Estado como agente econômico em sentido estrito ("Estado empresário"), a atividade política de governo (formulação de políticas públicas), a atividade legislativa e a atividade jurisdicional.
Com isso, nota-se que o supracitado princípio está intimamente ligado ao princípio da eficiência, expressamente mencionado no art. 37, caput, da Constituição da República, de alteração introduzida pela Emenda Constitucional Nº. 19/1998, relativa à reforma do Estado.
A obrigatoriedade de que os serviços públicos prestados à coletividade sejam adequados está explícita no art. 175, parágrafo único, inciso IV, da Constituição Federal, tendo a Lei 8.987/1995, reguladora da prestação de serviços públicos sob regime de concessão e de permissão, conceituado serviço adequado como aquele que atende os requisitos nela delineados, dentre os quais se observa o da continuidade.
Desse modo, a aplicação do princípio da continuidade do serviço público impõe restrição a alguns direitos dos prestadores de serviços públicos e dos agentes dispostos a sua prestação. Uma característica peculiar do mencionado princípio é que sua observância é dever não só de toda a administração pública, como também dos particulares incumbidos da prestação de serviços públicos sob regime de delegação, como as permissionárias e concessionárias de serviços públicos.
Em razão da abrangência desse princípio, para alcançar os particulares prestadores de serviços públicos, surge a impossibilidade desse particular prestador de serviço público por delegação interromper sua prestação, ainda que o poder concedente descumpra os termos do contrato celebrado. Essa restrição é denominada inoponibilidade da "exceção do contrato não cumprido" (exceptio non adimpleticontractus).
Como assevera José dos Santos Carvalho Filho (p. 44, 2017), verifica-se que quanto a falar da continuidade do serviço público afeita ao Poder Público está-se a falar da indisponibilidade do interesse público. Em contraponto, quando se fala que o particular prestador de serviço público por delegação deve obrigar-se ao princípio da continuidade, está a falar-se da supremacia do interesse público.
Em suma, o princípio da continuidade do serviço público prevê:
(i) a necessidade de institutos como a suplência, a substituição e a delegação para preencher as funções públicas temporariamente vagas;
(ii) a impossibilidade, como anteriormente delineado, a quem contrata com a Administração, de invocar a exceptio non adimpleti contractusnos contratos que possuam como objeto a execução de serviço público;
(iii) a faculdade conferida à Administração de utilizar as instalações e equipamentos da empresa que com ela contrata, a fins de assegurar a continuidade do serviço;
(iv) a possibilidade de encampação na concessão de serviço público.
No que pese a obrigatoriedade do princípio da indisponibilidade do interesse público e, consequentemente, da continuidade do serviço público, o direito de greve está previsto no artigo 37, inciso VII, da CF, que dispõe:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e também, ao seguinte:
(...)
VII - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica;
O Supremo Tribunal Federal considerava o supracitado inciso VII como norma de eficácia limitada, ou seja, com a eficácia sobrestada até advento de lei infraconstitucional que regulamentasse a matéria. Durante esse período, os servidores públicos não podiam se valer do direito de greve, mesmo com este expressamente previsto na Carta Magna.
Além do mais, Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2017, p. 110) reitera a respeito do direito de greve aos servidores públicos e o princípio da continuidade do serviço público:
(...) essa vedação, que antes se entendia absoluta, está consideravelmente abrandada, pois a atual Constituição, no artigo 37, inciso VII, determina que o direito de greve será exercido “nos termos e nos limites definidos em lei específica”; o STF, na ausência de “lei específica”, decidiu pela aplicação da Lei no 7.783/89; também em outros países já se procura conciliar o direito de greve com a necessidade do serviço público. Na França, por exemplo, proíbe-se a greve rotativa que, afetando por escalas os diversos elementos de um serviço, perturba o seu funcionamento; além disso, impõe-se aos sindicatos a obrigatoriedade de uma declaração prévia à autoridade, no mínimo cinco dias antes da data prevista para o seu início.
Contudo, ao apreciar o Mandado de Injunção 708, o STF decidiu:
MANDADO DE INJUNÇÃO. GARANTIA FUNDAMENTAL (CF, ART. 5º, INCISO LXXI). DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS (CF, ART. 37, INCISO VII). EVOLUÇÃO DO TEMA NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). DEFINIÇÃO DOS PARÂMETROS DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL PARA APRECIAÇÃO NO ÂMBITO DA JUSTIÇA FEDERAL E DA JUSTIÇA ESTADUAL ATÉ A EDIÇÃO DA LEGISLAÇÃO ESPECÍFICA PERTINENTE, NOS TERMOS DO ART. 37, VII, DA CF. EM OBSERVÂNCIA AOS DITAMES DA SEGURANÇA JURÍDICA E À EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL NA INTERPRETAÇÃO DA OMISSÃO LEGISLATIVA SOBRE O DIREITO DE GREVE DOS SERVIDORES PÚBLICOS CIVIS, FIXAÇÃO DO PRAZO DE 60 (SESSENTA) DIAS PARA QUE O CONGRESSO NACIONAL LEGISLE SOBRE A MATÉRIA. MANDADO DE INJUNÇÃO DEFERIDO PARA DETERMINAR A APLICAÇÃO DAS LEIS Nos 7.701/1988 E 7.783/1989. 1. SINAIS DE EVOLUÇÃO DA GARANTIA FUNDAMENTAL DO MANDADO DE INJUNÇÃO NA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF).
(STF - MI: 708 DF, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 25/10/2007, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe-206 DIVULG 30-10-2008 PUBLIC 31-10-2008 EMENT VOL-02339-02 PP-00207 RTJ VOL-00207-02 PP-00471).
Com esta decisão, o setor público se submeteu, no que couber, à Lei nº 7.731/1989.
Contudo, a ausência de lei específica sobre o tema traz problemas e divergências, cuja problemática deságua no equilíbrio entre os direitos dos servidores e da manutenção dos serviços públicos a população e a possibilidade de desconto dos dias paralisados, tendo José dos Santos Carvalho Filho (2012, p. 753) assim se pronunciado:
O ideal é que o Poder Público diligencie para que seja logo editada a lei regulamentadora da matéria porque toda a confusão sobre o assunto tem emanado da lamentável e inconstitucional inércia legislativa. Com a lei, evitar-se-iam os abusos cometidos de parte a parte, abusos estes que acabam respingando sobre quem nada tem a ver com a história – a população em geral – que, a despeito de sua necessidade, permanece sem a prestação de serviços públicos essenciais, como previdência social, assistência médica, educação, justiça, entre outros.
3. DA GREVE E DO DESCONTO DE DIAS NÃO TRABALHADOS
A greve não é um direito absoluto, deve-se respeitar os limites presentes na Constituição Federal e na lei.
A greve é considerada como uma espécie de suspensão do contrato de trabalho, e se existe uma suspensão do contrato de trabalho, não há pagamento dos dias paralisados.
Se houvesse o pagamento dos salários pelos dias paralisados, haveria um intuito dos grevistas de não voltarem a trabalhar, pois os mesmos estariam recebendo sem trabalhar, e o ônus da paralisando cairia somente à empresa.
Assim, caso a greve seja considerada abusiva, não há no que se falar em recebimento de salário pelos dias paralisados. Quando ocorre essa ilegalidade, é porque houve o descumprimento de algum dos requisitos formais que vem estabelecidos na Lei 7.783/89, como não cumprir ao aviso-prévio de greve, deflagrar a greve sem fazer assembleia sindical.
Nesse sentido, ensina Sérgio Pinto Martins (2016, p. 1256):
No tocante ao não pagamento dos dias parados, caso a greve seja considerada abusiva, os salários não devem ser pagos, pois a reivindicações não foram atendidas, nem houve trabalho no período. Não há suspensão do contrato de trabalho se a greve é exercida de maneira abusiva. Por conseguinte, inexiste direito ao pagamento de salário.
Em que pese o salário ser direito essencial do trabalhador, para poder sobreviver, depende da obrigação do obreiro trabalhar para recebê-lo (MARTINS, p. 895), sendo que na Carta Magna não consta previsão em relação ao pagamento do salário aos grevistas em caso de greve abusiva, nem na legislação infraconstitucional.
Por outro lado, se a paralização não for considerada abusiva, os salários deverão ser pagos, pois o empregador não cumpriu sua parte no contrato de trabalho, nem às regras da Lei nº 7.783/89.
É possível, além disso, haver acordo entre as partes, podendo ocorrer por convenção coletiva ou por determinação da Justiça do Trabalho, para o pagamento durante a greve, circunstância em que não ocorrerá suspensão do contrato de trabalho, mas sim interrupção da relação jurídica trabalhista.
O art. 7º da Lei 7.783/89 não traz regramento para o pagamento dos dias paralisados, deixando essa matéria no âmbito negocial entre as partes. Assim, se houver acordo entre as partes pelos dias parados, havendo sido atendidas ou não as reivindicações do movimento paredista, será perfeitamente lícito o pactuado. Se não houver acordo entre as partes, a Justiça do Trabalho decidirá sobre o não pagamento dos dias paralisados.
Quanto aos servidores públicos, em 27 de outubro de 2016, o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento do Recurso Extraordinário 693456 (por 6 votos a 4), decidindo que a administração pública deverá fazer o corte do ponto dos grevistas, deixando a possibilidade da compensação pelos dias paralisados, mediante acordo.
A única possibilidade de não haver o desconto pelos dias paralisados é se a greve tiver sido motivada por conduta ilícita do Poder Público.
Ao final do julgamento foi aprovada a seguinte tese de repercussão geral:
"A administração pública deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de acordo. O desconto será, contudo, incabível se ficar demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita do Poder Público".
Sendo assim, se não for comprovada a culpa do Poder Público, os grevistas terão o seu ponto cortado, devido ao fato da greve de servidor público prejudicar o interesse da coletividade, devendo prevalecer o princípio da supremacia do interesse público, sendo que o sentido a decisão em limitar o direito à greve é para preservar a continuidade do serviço público.
Por certo que a decisão do STF, diante de ausência de norma regulamentadora específica do direito de greve do servidor público, de solucionar a problemática sobre o desconto na remuneração dos servidores públicos em razão dos dias não trabalhados, quando a greve for considerada legal, buscou restringir tal direito quanto envolver serviços públicos.
Isso porque a manutenção da remuneração dos servidores grevistas cria um estado de impotência do Estado diante da negociação com os trabalhadores, tendo em vista que os servidores não têm pressa em cessar o movimento já que nada tem a perder, pois continuam a receber salários normalmente, sem contraprestação.
É certo que para que não caia a legitimidade da greve, os grevistas do setor público deverão organizar plantões, revezando-se para atender as situações de urgência sem acarretar danos muitos graves ou irreparáveis à coletividade, pois o direito de greve não pode ser superior ao direito da coletividade.
Outrossim, a aplicabilidade da lei de greve geral aos servidores públicos tem como consequência aplicação da regra da suspensão do contrato de trabalho, não havendo prestação nem contraprestação.
Além disso, não se coaduna com o interesse público a remuneração pelo Estado por um serviço que além de não prestado pelo servidor, causou prejuízo à sociedade.
4.CONSIDERAÇÕES FINAIS
As paralisações trabalhistas só começaram a ser regulamentadas no final do século XVIII.
A greve, em sua história a nível mundial, foi cronologicamente considerada um delito, depois passou a liberdade, e, posteriormente, a direito, nos regimes democráticos. No Brasil, a greve teve como marco fundamental a afirmação da relação de emprego como vínculo sócio jurídico importante no sistema econômico-social.
A Constituição Republicana de 1988 expressamente dispõe a greve como direito do servidor público, tendo, especificamente no artigo 37, incisos VI e VII, assegurado ao servidor público o direito à livre associação sindical e o direito de greve.
O direito de greve do servidor público não foi regulamentado, decorrendo da ausência de lei específica sobre o tema problemas e divergências, cuja problemática deságua no equilíbrio entre os direitos dos servidores e da manutenção dos serviços públicos à população e à possibilidade de desconto dos dias paralisados.
O Supremo Tribunal Federal, ao concluir o julgamento do Recurso Extraordinário 693456, decidiu que a Administração Pública deverá fazer o corte do ponto dos grevistas, deixando a possibilidade da compensação pelos dias paralisados, mediante acordo.
Em relação aos empregados do setor privado, quando a greve é considerada abusiva, não ocorre recebimento de salário pelos dias paralisados, geralmente porque tal possibilidade decorre do descumprimento de algum dos requisitos formais que vem estabelecidos na lei 7.783/89, como não cumprir ao aviso-prévio de greve, deflagrar a greve sem fazer assembleia sindical, sendo que, se a paralização não for considerada abusiva, os salários deverão ser pagos, pois o empregador não cumpriu sua parte no contrato de trabalho.
Na deflagração da greve pelos servidores públicos, a única possibilidade de não haver o desconto pelos dias paralisados é se a greve tiver sido motivada por conduta ilícita do Poder Público.
Caso não seja comprovada a culpa do Poder Público, os grevistas poderão ter o seu ponto cortado, devido ao fato de a greve de servidor público prejudicar o interesse da coletividade, devendo prevalecer o princípio da supremacia do interesse público.
5. REFERÊNCIAS
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BRASIL. Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966. Código Tributário Nacional. Disponível em < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172.htm>. Acesso em 12 out 2017.
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BRASIL. Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995. Disponível em . Acesso em 04 out 2017.
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MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 32ª edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2015.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 33ª edição. São Paulo: Malheiros Editores, 2016.
[1]Antônia Maria da Silva[1] Antônia maria da silva, Mestre em Direito Agrário pela UFG-2013, Especialista em Direito Tributário pela Unisul-2009, Especialista em Direito Notarial e Registral pela Candido Mendes-2017, Auditora Federal de Controle Externo do TCU desde 2004, Professora de Direito Tributário da Faculdade Serra do Carmo e professora da IFTO desde 2014.
bacharelanda da faculdade Serra do Carmo de Palmas-Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: UHLEMANN, Mariana Barbosa da Silva. A isonomia entre servidores públicos e empregados do setor privado no que se refere ao direito de greve e ao recebimento de salário Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 27 nov 2017, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51065/a-isonomia-entre-servidores-publicos-e-empregados-do-setor-privado-no-que-se-refere-ao-direito-de-greve-e-ao-recebimento-de-salario. Acesso em: 22 nov 2024.
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