MATEUS SCHAEFFER BRANDÃO
(Orientador: Prof. Me.)
RESUMO: Este artigo acadêmico tem como objetivo explorar as perspectivas de reparação de dano moral e patrimonial quando ocorrer extravios de bagagem no que tange as companhias aéreas. Dispondo assim, uma melhor investigação ao aprendizado da referida matéria, de forma a colaborar com a Ciência Jurídica Brasileira, sendo este um tema de extrema relevância, pois comprova a perspectiva que o usuário do transporte aéreo tem na busca dos seus direitos de reparação de um dano no tocante ao extravio de bagagem. Foram empregados neste trabalho, a metodologia a qual se faz um levantamento bibliográfico, dessa forma, foram utilizadas análises de casos e fontes documentais, aplicando assim o método de abordagem dedutiva. Serão estudados os pontos essências das leis que regularizam essa matéria, como uma forma de esclarecer algum conflito que possa ter entre as normas reguladoras, quais sejam: Constituição Federal, Convenção de Montreal, Convenção de Varsóvia, Código Brasileiro de Aeronáutica, Código de Defesa do Consumidor, Código Civil.
PALAVRAS-CHAVE: Dano moral; Responsabilidade civil; Extravio de bagagem; Transporte aéreo
ABSTRACT: This academic article aims to explore the prospects of repairing moral and property damages when there are baggage losses with regard to airlines.
Thus, a better investigation to the learning of the said subject, in order to collaborate with Brazilian Juridical Science, this being a subject of extreme relevance, since it proves the perspective that the user of the air transport has in the search of its rights of repair of a loss of luggage. The methodology used in this work was a bibliographical survey. In this way, case analyzes and documentary sources were used, thus applying the method of deductive approach. The essential points of the laws that regulate this matter will be studied as a way of clarifying any conflict that may have between the regulatory norms, namely: Federal Constitution, Montreal Convention, Warsaw Convention, Brazilian Aeronautics Code, Brazilian Defense Code Consumer, Civil Code.
KEYWORDS: Moral damage; Civil responsability; Lost luggage; Air Transport.
SUMÁRIO: 1. INTRODUÇÃO; 2. DAS CONVENÇÕES DE VARSÓVIA E MONTREAL; 3. RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR AÉREO; 4. AS CONVENÇÕES X CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR; 5. RESPONSABILIDADE CIVIL PELO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR; 6. DANO MORAL; 7. ANÁLISE JURISPRUDENCIAL ACERCA DO EXTRAVIO DE BAGAGEM; 8. CONSIDERAÇÕES FINAIS; 9. REFERÊNCIAS.
1. INTRODUÇÃO
Com o advento da globalização e o avanço da sociedade tornou-se cada vez mais relevante o deslocamento de pessoas e mercadorias de forma mais ágil em diversos lugares do mundo. O Transporte aéreo proporcionou uma maior aproximação entre grandes distâncias e em decorrência disso, a integração comercial entre Estados muito afastados, o que durante muito tempo era impossível.
Com o crescimento significativo da malha aérea, tornou-se imprescindível a imposição de uma normatização que seja capaz de ser observada e praticada pelas companhias aéreas.
Com propósito de padronizar as regras no contexto universal, foi realizada em 1929 a Convenção de Varsóvia, ratificada pelo Brasil em 1931 e depois de várias modificações rege nos dias atuais a Convenção de Montreal celebrada em 1999, e vigente no ordenamento jurídico brasileiro desde 2006.
O presente artigo visa um melhor entendimento acerca da possibilidade da reparação de danos morais e materiais no que se refere às companhias aéreas, bem como compreender a responsabilidade civil do transportador aéreo a luz do Código de Defesa do Consumidor.
A Convenção de Varsóvia surgiu em 1929, estabelecendo um diploma para a legislação aeronáutica, como forma de solucionar os problemas decorrentes da responsabilidade do transporte aéreo.
Assinada em 28 de maio de 1999, a Convenção de Montreal entrou em vigor no Brasil em 28 de setembro de 2006. De grande relevância para o ordenamento jurídico brasileiro, a Convenção de Montreal foi nomeada porque prepondera sobre a Convenção de Varsóvia e demais protocolos e convenções que regulam o transporte aéreo internacional. Sendo assim, o seu efeito principal é a centralização das regras relativas a esse tipo de transporte.
É coerente entender que a Convenção de Montreal é destacada aos tratados e convenções internacionais já existentes no Brasil. Desse modo, a Convenção de Montreal determina em seu artigo 55 que:
A presente Convenção prevalecerá sobre toda regra que se aplique ao transporte aéreo internacional:
1. entre os Estados Partes na presente Convenção devido a que esses Estados são comumente Partes:
a) da Convenção para a Unificação de Certa Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional, assinada em Varsóvia, em 12 de outubro de 1929 – (doravante denominada Convenção de Varsóvia);
b) do Protocolo que modifica a Convenção para a Unificação de Certas Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional assinada em Varsóvia, em 12 de outubro de 1929, feito na Haia, em 28 de setembro de 1955 – (doravante denominado Protocolo da Haia);
c) da Convenção complementar à Convenção de Varsóvia para a Unificação de Certa Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional realizado por quem não seja o Transportador Contratual, assinada em Guadalajara, em 18 de setembro de 1961 – (doravante denominada Convenção de Guadalajara);
d) do Protocolo que modifica a Convenção para a Unificação de Certas Regras Relativas ao Transporte Aéreo Internacional assinada em Varsóvia, em 12 de outubro de 1929 modificada pelo Protocolo feito na Haia, em 28 de setembro de 1955, assinado na cidade da Guatemala, em 8 de março de 1971 – (doravante denominado Protocolo da Cidade da Guatemala);
e) dos Protocolos Adicionais números 1 a 3 e o Protocolo de Montreal número 4, que modificam a Convenção de Varsóvia modificada pelo Protocolo da Haia ou a Convenção de Varsóvia modificada pelo Protocolo da Haia e o Protocolo da Cidade da Guatemala, assinados em Montreal, em 25 de setembro de 1975 – (doravante denominados Protocolos de Montreal); ou
2. dentro do território de qualquer Estado Parte na presente Convenção devido a que esse Estado é Parte em um ou mais dos instrumentos mencionados nas letras a) a e) anteriores.
O predomínio da Convenção de Montreal, no entanto, sucederá somente com relação a países que a tenham em vigor no seu território, e nos casos em que ocorra o transporte entre o Brasil e um país que não seja signatário da convenção de Montreal, será dessa forma regida por algum tratado que tanto o Brasil como esse país tenham ratificado.
A responsabilidade civil e uma obrigação jurídica proveniente do descumprimento de outro compromisso jurídico anterior. Assim sendo, para que haja responsabilidade civil é necessária à violação de um compromisso já existente no qual cause danos a parte.
“A responsabilidade civil é a que se apura para que se possa exigir a reparação civil, que é pena imposta ao agente ou responsável pelo ato ilícito” (SILVA, 2003, p.714).
Imprescindível é ficar consciente a norma geral da responsabilidade civil, a qual o agente do dano impõe a recompor o mal cometido, consequentemente, este é o ponto inicial.
Toda atividade que traz prejuízo traz em seu bojo, como fato social, o problema da responsabilidade. Destina-se ela a restaurar o equilíbrio moral e patrimonial provocado pelo autor do dano. Exatamente o interesse em restabelecer a harmonia e o equilíbrio violados pelos dano constitui a fonte geradora da responsabilidade civil..(GONÇALVES, 2012, p.20).
Nesse sentido Lisboa demostra:
O principal motivo que levou a construção da teoria da responsabilidade objetiva foi a necessidade de se responsabilizar o agente econômico que causa danos patrimoniais e extrapatrimoniais as pessoas pelo simples exercício de sua atividade profissional (teoria de risco), pois a demonstração da culpa do empregador e do transportador pelo dano sofrido pela vitima era praticamente impossível, impedindo-lhe de qualquer compensação (2006,p.21)
Assim sendo, verificando que na prestação desse serviço pelo transportador aéreo, ocorreu uma falha na execução, fazendo com que o bem dos passageiros não chegue ao seu destino, configura-se assim um serviço defeituoso, provocando dessa forma a responsabilidade objetiva do transportador aéreo, independentemente da existência de culpa.
A noção de responsabilidade civil vem dos primórdios da sociedade, surgindo da vontade de vingança de um prejuízo sofrido pela decorrência da conduta de outro.
Segundo Lisboa (2004, p.428) a responsabilidade civil traz consigo dois papeis:
1. Garantir o direito do lesado (função-garantia) - decorrente da necessidade de segurança jurídica que a vítima possui para o ressarcimento dos danos por ela sofridos;
2. Servir como sanção civil (função-sanção) - decorrente da ofensa à norma jurídica imputável ao agente causador do dano, e importa em compensação em favor da vítima lesada.
A conexão inversa entre o Código Brasileiro de Aeronáutica e a Convenção de Montreal de um lado, e o Código de Defesa do Consumidor, do outro, são restringidas ao objeto da responsabilidade civil do transportador, por se tratar dos diplomas que contem dispositivos próprios. Quanto ao mais, em assuntos como, a cobrança de dívidas e das práticas abusivas (overbooking[1]), das publicidades dos bancos de dados, controle de clausulas abusivas, o Código de Defesa do Consumidor impera sozinho (BENJAMIM, 1998, v 2, p.508).
Essa oposição pode ser entendida da seguinte forma: ao tempo que Código de Defesa do Consumidor defende a efetiva reparação de todos os danos, sejam eles patrimoniais ou morais, individuais, coletivos e difusos, dispostos no artigo 6, inciso VI da referida lei, o Código Brasileiro de Aeronáutica e a Convenção de Montreal defendem que a responsabilidade da empresa transportadora integral na possibilidade de ocorrência de dolo ou culpa grave, e nos outras hipóteses serão de forma tarifada, assim sendo, será a norma que fixará possíveis valores de reparação.
Considerado um marco no ordenamento jurídico brasileiro, o Código de Defesa do Consumidor entrou em vigor no ano de 1991, sendo assim um importante passo para que o respeito à dignidade das relações pessoais fosse assegurado no Brasil.
Nota-se que alguns artigos do Código de Defesa do Consumidor dão uma saída completamente diferente daquela que contém as normas internacionais as quais são aplicáveis ao transporte aéreo internacional. Tem-se como exemplo o que preconiza o artigo 22 da Convenção de Varsóvia, que assegura que:
No transporte de bagagem, a responsabilidade do transportador em caso de destruição, perda, ou avaria se limita a 1.000 Direitos Especiais de Saque por passageiro, a menos que o passageiro haja feito ao transportador, ao entregar-lhe a bagagem registrada, uma declaração especial de valor da entrega desta no lugar de destino, e tenha pago uma quantia suplementar, se for cabível. Neste caso, o transportador estará obrigado a pagar uma soma que não excederá o valor declarado, a menos que prove que este valor é superior ao real da entrega no lugar de destino.
O mesmo estabelece um limite de indenização nos casos em que a responsabilidade culposa for do transportador, enquanto que o artigo 6, inciso VI[2], do Código de Defesa do Consumidor estabelece que a indenização deverá ser correspondida ao prejuízo ora sofrido.
Por conseguinte, no que tange o transporte aéreo internacional, os tribunais brasileiros começaram a aplicar o Código de Defesa do Consumidor, conforme se observa no acordão proferido em 02 de dezembro de 1999, pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial 235.678-SP:
Mudaram as condições técnicas de segurança de vôo e também se modificaram as normas que protegem o usuário dos serviços prestados pelo transportador [ ...] No conflito entre o disposto no novo diploma [Código de Defesa do Consumidor] e no tratado “a doutrina e a jurisprudência atual têm negado a existência superioridade hierárquica entre o tratado recebido no ordenamento jurídico interno e a legislação interna, principalmente em matéria tributaria e comercial.” (Claúdio Lima Marques, “Responsabilidade do Transportador Aéreo pelo Fato do Serviço e o CDC”, Dir. do Consumidor, 3/155-166.[...].
O cenário atualmente é um pouco diferente. Uma decisão por maioria do Supremo Tribunal Federal no dia 25 de maio de 2017 trouxe entendimento mais restrito. A decisão do Plenário do Supremo Tribunal Federal [3]decidiu que serão regidas pelas convenções e não mais pelo Código de Defesa do Consumidor a relação entre as empresas de transporte aéreo internacionais e os consumidores no Brasil, mas isso somente nas hipóteses de indenizações que tenham com consequência os atrasos de voos e também nos casos de extravios ou danos a bagagem.
A tese aprovada diz que “por força do artigo 178 da Constituição Federal, normas e tratados internacionais limitadoras da responsabilidade das transportadoras aéreas de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, tem prevalência em relação ao Código de Defesa do Consumidor
O RE 636331, de relatoria do ministro Gilmar Mendes, foi ajuizado no Supremo pela Air France contra acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) que, levando em conta a existência de relação de consumo entre as partes, determinou que a reparação pelo extravio de bagagem deveria ocorrer nos termos do CDC, e não segundo a Convenção de Varsóvia.
Já o ARE 766618, relatado pelo ministro Luís Roberto Barroso, foi interposto pela empresa Air Canadá contra acórdão da justiça paulista, que aplicou o CDC e manteve a condenação da empresa ao pagamento de R$ 6 mil a título de indenização por danos morais a uma passageira, por atraso de 12 horas em voo internacional. A empresa pedia a reforma da decisão, alegando que o prazo de prescrição de ação de responsabilidade civil decorrente de atraso de voo internacional deveria seguir os parâmetros da Convenção de Montreal, sucessora da Convenção de Varsóvia, que é de dois anos, e não do CDC, cuja prescrição é quinquenal.
Deve-se salientar algumas peculiaridades: a Convenção de Montreal não versa sobre a responsabilidade por overbooking e cláusulas abusivas, a Convenção de Montreal só tem a natureza de proibir perdas e danos punitivos, ou seja, ela não versa sobre danos morais.
Como pode-se notar, a Convenção de Montreal por não versar sobre os danos morais, abre precedentes para essa responsabilidade, necessitando que se faça uso de outros diplomas para a proteção dos consumidores, ou seja, ao contrário da impressão que se tem dessa decisão do Supremo Tribunal Federal, a Convenção de Montreal poderá ter um liame com outras fontes de proteção ao consumidor.
É importante observar que anteriormente ao Código de Defesa do Consumidor, pertencia ao consumidor a comprovação explícita da culpa ou do dolo do fornecedor para que assim o mesmo obtivesse reparação do dano ora sofrido, pois ante a isso, o consumidor arcava por completo com os danos decorrentes dos produtos adquirido.
Assim sendo, o Código de defesa do Consumidor, Lei 8.079/1990, a trouxe consigo a teoria do risco do empreendimento, conforme explica Sergio Cavalieri:
Pela teoria do risco do empreendimento, toda aquele que se disponha a exercer alguma atividade no mercado de consumo tem o dever de responder pelos eventuais vícios ou defeitos dos bens e serviços fornecedores, independentemente de culpa. Este dever é imanente ao dever de obediência ás normas técnicas e de segurança, bem como aos critérios de lealdade, quer perante os bens e serviços ofertados, quer perante os destinatários dessas ofertas. A responsabilidade decorre do simples fato de dispor-se alguém a realizar atividade de produzir, estocar, distribuir, e comercializar produtos ou executar determinados serviços. O fornecedor passa a ser o garante dos produtos e serviços que oferece no mercado de consumo, respondendo pela qualidade e segurança dos mesmos. ( 2007, 7º ed, p. 459)
Objetivando assim, a responsabilidade civil nas relações de consumo, como disposto nos artigos 12 e 14 do referido Código:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, formulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização ou risco.
Art.14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
Note-se que a o alicerce da responsabilidade civil nas relações de consumo é a teoria de risco do negócio, partindo da premissa de que quem exerce uma atividade consumerista, qualquer que seja ela, deverá assumir os ricos dela resultante, pois, o risco é exclusivo do fornecedor, dado que ele escolheu arriscar-se, não podendo, dessa forma, repassar esse dever ao consumidor, tal preceito parte da lógica que, do mesmo modo que ele não repassa o seu provento ao consumidor, não pode de forma nenhuma passar o risco, pois uma das fortes características das atividades econômicas é o risco.
Diante disso, o consumidor, a parte sempre mais fraca da relação de consumo, ficou a nível de equivalência com as empresas com as quais o mesmo transaciona produtos ou serviços, tutelando assim sua posição de hipossuficiência.
A partir do check in até o recolhimento no local de destino, ou seja, na esteira, a bagagem fica na responsabilidade do transportador aéreo, uma vez que essa bagagem não é entregue ao passageiro, se faz necessário a compensação do dano ao consumidor, desse modo, as companhias aéreas devem provar o que foi perdido, e a maneira mais fácil é a listagem de bens apontados pelos passageiros.
A clausula de incolumidade própria do contrato de transporte assume o perfil de garantia de risco, de modo que a empresa transportadora deverá o dano decorrente do extravio de bagagem ( art. 734, do Código civil), sob o esquadro fático oferecido pela parte autora, haja vista que, por escolha operacional da empresa, não se e exigido de todas a declaração de bagagem”, ao passo que “ Cumpre a empresa aérea a obrigação de definir previamente o valor da bagagem ( artigo 734, paragrafo único, do Código Civil) para, com isso, limitar a indenização, devendo ser prestigiado o valor alegado pelo transportado como extraviado. ( TJDF - APC 2008.01.1.0802277-0, Rel. Desembargador J.J Costa Carvalho, 2º Turma Cível.)
Os Tribunais do Brasil dispõem de posições favoráveis para aqueles pedidos por danos morais, isso se dar especialmente pela situação de desagrado e desconforto aos consumidores que passam por essas condições, independentemente de culpa ou dolo do transportador aéreo.
Com relação a essa questão, é relevante frisar mesmo que a bagagem extraviada seja localizada e devolvida, ainda assim, é possível entrar com o processo. Reputa-se ao fato de somente a ocorrência de o passageiro ficar longe, nem que seja por um dia, de seus pertences, já o deixaria em uma situação de extrema aflição e aborrecimento. Isso se dá pelo entendimento do art. 14 do Código de Defesa do Consumidor, que determina a responsabilidade civil das empresas contratadas por danos morais e patrimoniais.
Artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor:
O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e risco.
Percebe-se então, que a possibilidade de cumulação do dano moral com o dano material, seja pelo atraso na entrega da bagagem ou no extravio é possível de acordo com o entendimento da legislação consumerista.
Nesse sentindo, prega a Súmula 37 do STJ que: “São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundas do mesmo fato”.
Sendo assim, o dano moral esta fixado nas relações em que ocorre o extravio de bagagem, pois, o transportador aéreo tem a responsabilidade de reparar o dano causado ao consumidor, essa responsabilidade civil do transportador aéreo ao passageiro com relação ao dano moral se dar na esfera de indenizador a dor, para que de alguma forma se possa neutralizar o mal sofrido pelo consumidor.
Assim sendo, o dano está diretamente ligado a indenização:
O substantivo indenização ainda que utilizado de maneira recorrente para tratar do quantum a ser pago aquele que sofreu o dano moral, não tem o mesmo sentido da indenização do dano material, ...ora, como se viu, no dano moral não há prejuízo econômico, possuindo a indenização outro significado. Seu objetivo é duplo: satisfativo- punitivo. Por um lado, a paga em pecúnia deverá proporcionar ao ofendido uma satisfação que seja capaz de amenizar a dor sentida. Em contrapartida, deverá também a indenização servir como castigo ao ofensor, causador do dano, incutindo-lhe um impacto tal, suficiente para dissuadi-lo de um novo atentado (NUNES, 1999, p.2)
Assim sendo, parte-se da premissa de que não há dano não indenizável. A injusta agressão ao direito do passageiro terá sempre que ser reparada pelo transportador. A Constituição Federal, prega a indenização por dano moral, e como garantia constitucional, devendo, de tal modo, ser obedecida, pois, a norma constitucional, sobrepõe a todas as normas
No entanto, há uma questão relevante, no que se refere ao pagamento das indenizações, e se é possível ou não estabelecer um limite a ser pago pelas empresas de transporte aéreo. As empresas aéreas, comumente, estabelecem em casos de extravio, um valor máximo de indenização, ao qual seria aplicado por quilo de bagagem, mas assim sendo, essas cláusulas não possuem força normativa para o Direito.
Com o objetivo de compreender em casos reais, faz-se uma breve analise acerca da atuação dos magistrados ao que se refere o extravio de bagagem.
APELAÇÃO CÍVEL. CONSUMIDOR E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. TRANSPORTE AÉREO. EXTRAVIO DE BAGAGEM. - PROCEDÊNCIA NA ORIGEM. (1) DANO MATERIAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. BENS EXTRAVIADOS. IMPUGNAÇÃO ESPECÍFICA. AUSÊNCIA. DEVER DE INDENIZAR. ACERTO. - "Nos litígios que envolvem perda de bagagem e/ou objetos de seu interior, a responsabilidade civil é objetiva, elidida apenas se demonstrada alguma excludente de responsabilidade contida no artigo 14, § 3º, do Código de Defesa do Consumidor. Não verificadas essas excludentes, principalmente com a exigência ao passageiro de declaração de bagagens e seus valores [...] a medida que se impõe é a condenação da empresa aérea ao pagamento de danos materiais oriundos do extravio dos objetos alegados na inicial." (TJ-SC - AC: 03001772120168240054 Rio do Sul 0300177-21.2016.8.24.0054, Relator: Henry Petry Junior, Data de Julgamento: 03/10/2017, Quinta Câmara de Direito Civil)
Nota-se no julgado acima exposto que o pedido da parte autora foi julgado procedente, a parte ré foi condenada a pagar uma indenização no valor de R$ 8.289,00 (oito mil, duzentos e oitenta e nove reais), corrigido monetariamente pelo INPC, que começou a ser contado na data do extravio da bagagem, a parte ré também foi condenada a pagar uma indenização por danos morais no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais).
DIREITO DO CONSUMIDOR. TRANSPORTE AÉREO. EXTRAVIO BAGAGEM. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DANO MORAL. Ação proposta por consumidora em face de companhias aéreas a buscar a reparação de dano moral e material, porque bagagens extraviadas por mais de trinta dias, foram entregues danificadas e com pertences faltantes. Sentença que condenou as rés a repararem dano material e moral, este com indenização de R$ 8.000,00. Apelo da segunda ré a buscar a reversão do julgado e a sustentar que a primeira foi culpada pelo extravio. Em caráter eventual, requer redução do quantum indenizatório do dano moral, para valor inferior a R$ 2.000,00. 1. A ré não foi capaz de demonstrar que não deu causa ao extravio da bagagem. Assim, há de se entender pelo defeito na prestação do serviço. 2. A verba indenizatória do dano moral somente será modificada se não atendidos pela sentença os princípios da proporcionalidade e razoabilidade na fixação do valor da condenação (Enunciado 116 do TJRJ). 3. Dano moral fixado em R$ 8.000,00 observa, no caso concreto, a natureza e extensão do dano, a condição econômica das partes e o caráter punitivo pedagógico que a condenação deve encerrar. 4. Dado que o dano moral resultou de inadimplemento de obrigação contratual, os juros moratórios devem incidir da citação, ato processual que, na espécie, constitui em mora o devedor (inteligência do art. 240 do CPC e do art. 406 do Código Civil). 5. Recurso ao qual se nega provimento. Sentença a cujo dispositivo se imprime reparo de ofício. (TJ-RJ - APL: 01729335420128190001 RIO DE JANEIRO CAPITAL 9 VARA CIVEL, Relator: FERNANDO FOCH DE LEMOS ARIGONY DA SILVA, Data de Julgamento: 21/06/2017, TERCEIRA CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 23/06/2017)
Extrai-se do julgado acima que a condenação do réu foi mantida na decisão em tela, visto que o mesmo não foi capaz de comprovar que não deu causa ao dano sofrido pela parte autora, ou seja, o extravio de bagagem. Por conseguinte, foi entendida a responsabilidade objetiva ocasionado pela má prestação do serviço, provocando de tal modo, angustia e indignação na parte autora do processo, levando a mesma a uma sensação de absoluta impotência. Diante disso, a parte ré foi condenada ao pagamento de indenização por dano moral de R$ 8.000,00 (oito mil reais), além dos ônus da sucumbência.
Diante de todo exposto, conclui-se, portanto, que tanto a Convenção de Montreal, como o Código de Defesa do Consumidor poderão ser invocados nos casos de falha no transporte aéreo. Todavia, nos casos em que envolver empresas de transporte aéreo internacional e os consumidores do Brasil, deverá prevalecer a Convenção de Montreal.
É relevante compreender, que no presente trabalho não se debate a necessidade de compensação dos danos ocorridos com os passageiros, pois isso é inquestionável, pois, se verificado o dano a reparação deverá existir. Entretanto, deve ser observado que devido a adesão do Brasil a Convenção de Montreal, deve-se observar o tratado em sua totalidade, principalmente em relação ao limite indenizatório.
Portanto, sabendo que houve uma má prestação na execução do serviço do transportador aéreo, caracterizando assim um dano, configura-se um serviço defeituoso, cabe então a Responsabilidade Civil do fornecedor desse serviço.
Cumpre destacar que a indenização não se refere somente aos danos ocasionados pelo extravio da mala, mas e prevista essa possibilidade de reparação de danos nos casos em que a bagagem seja devolvida com atraso, uma vez que foi de qualquer umas das formas, restou evidenciado o defeito no serviço, pois, mesmo que o passageiro tenha ficado que seja por um único dia longe de seus pertences, isso já é causa de grande aflição e aborrecimento, pois, a dor moral nunca será calculável, mas deverá ser reparada, para que dessa forma os prestadores de serviço de transporte aéreo de passageiro, aperfeiçoe cada vez mais a qualidade dos serviços prestados e por consequência, não façam novas vítimas.
Posto que o alicerce da responsabilidade civil nas relações de consumo é a teoria de risco do negócio, sabendo que uma das características das atividades econômicas e justamente o risco, assim sendo, quem exerce uma atividade consumerista, deve assumir o risco, e esse risco não poderá ser repassado ao consumidor da mesma maneira que não serão repassadas o seu provento.
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NOTAS:
[1] Overbooking: venda de passagem além do número real da mesma.
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Bacharelanda do Curso de Direito da Faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARROS, Katia Dias. O dano moral e a responsabilidade civil no tocante ao extravio de bagagem em voos nacionais e internacionais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 nov 2017, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51086/o-dano-moral-e-a-responsabilidade-civil-no-tocante-ao-extravio-de-bagagem-em-voos-nacionais-e-internacionais. Acesso em: 22 nov 2024.
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