RESUMO: O presente artigo visa analisar aspectos referentes à improbidade administrativa, sobretudo: o conceito de improbidade na CR/88 e na jurisprudência brasileira; o conceito de improbidade e culpabilidade; a improbidade culposa e constitucionalidade. Para tanto, serão utilizadas as principais abordagens feitas pela Doutrina, bem como análise da Jurisprudência e dispositivos constitucionais e legais.
PALAVRAS-CHAVE: Improbidade administrativa. Culpabilidade. Constitucionalidade.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Conceito de Improbidade na CR/88 e na Jurisprudência Brasileira. 3 Conceito de Improbidade e Culpabilidade. 4 Improbidade Culposa e Constitucionalidade. 5. Referências Bibliográficas.
1. Introdução
O presente artigo visa analisar aspectos referentes à improbidade administrativa, sobretudo: o conceito de improbidade na CR/88 e na jurisprudência brasileira; o conceito de improbidade e culpabilidade; a improbidade culposa e constitucionalidade. Para tanto, serão utilizadas as principais abordagens feitas pela Doutrina, bem como análise da Jurisprudência e dispositivos constitucionais e legais.
2. Conceito de Improbidade na CR/88 e na Jurisprudência Brasileira.
A Constituição da República de 1988 faz referência em seu conteúdo em diferentes momentos à improbidade administrativa. A despeito da menção à referida expressão, não há, de modo explícito, o seu conceito expresso no texto constitucional.
A doutrina identifica como base constitucional direta para responsabilização pelos atos de improbidade administrativa encontra-se no parágrafo 4º do artigo 37 da CR/88, que assim dispõe:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
(...)
§ 4º - Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível.
Ademais, dispõe o artigo 15, V:
Art. 15. É vedada a cassação de direitos políticos, cuja perda ou suspensão só se dará nos casos de:
V - improbidade administrativa, nos termos do art. 37, § 4º.
Segundo Alexandrino (2010) é da interpretação destes dispositivos que se extrai o conceito constitucional de improbidade administrativa, sendo a imoralidade administrativa qualificada pela desonestidade e pelo dano ao patrimônio público submetidas às sanções previstas no parágrafo 4º do artigo 37 da Constituição da República.
A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça tem agregado ao conceito a conduta praticada de má-fé do agente público. Sendo assim, tem sido atribuído elemento subjetivo para configuração da improbidade administrativa.
Decorre isso, do próprio conceito supra-apresentado, uma vez que é inerente à deslealdade e à desonestidade a configuração de um agir de má-fé.
Neste sentido se posicionou o STJ quando da apreciação do REsp 1.127.143:
EMENTA
ADMINISTRATIVO. ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. ART. 10, DA LEI 8.429/92. DANO AO ERÁRIO. MODALIDADE CULPOSA. POSSIBILIDADE. FAVORECIMENTO PESSOAL. TERCEIRO BENEFICIADO. REQUISITOS CONFIGURADOS. INCURSÃO NAS PREVISÕES DA LEI DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA.
1. O ato de improbidade administrativa previsto no art. 10 da Lei 8.429/92 exige a comprovação do dano ao erário e a existência de dolo ou culpa do agente. Precedentes.
2. Os arts. 62 e 63, da Lei 4.320/64 estabelecem como requisito para a realização do pagamento que o agente público proceda à previa liquidação da despesa. Nesse contexto, incumbe ao ordenador de despesa aferir a efetiva entrega do material ou fornecimento do serviço contratado, em conformidade com a nota de empenho que, por sua vez, expressa detalhadamente o objeto contratado pelo Poder Público, com todas as suas características físicas e quantitativas.
3. A conduta culposa está presente quando, apesar de o agente não pretender o resultado, atua com negligência, imprudência ou imperícia. Nessa modalidade, há um defeito inescusável de diligência, no qual se comete um erro sobre a condição do agir ou
sobre a consequência da conduta. A punição dessa prática justifica-se pela criação de um risco proibido ao bem jurídico tutelado.
4. Na hipótese, além do dano ao erário, a descrição dos elementos fáticos realizada na origem evidencia a negligência da autoridade municipal, pois: a) realizou o pagamento da nota de empenho sem adotar qualquer providência para aferir a entrega da mercadoria, seja por meio da verificação do processo administrativo que ensejou a contratação, seja pela provocação da empresa contratada para comprovar a entrega do bem; b) deixou transcorrer praticamente três anos entre o pagamento integral do débito e a entrega parcial da mercadoria, sem ter adotado qualquer medida ou cobrança do particular; c) após todo esse tempo, sequer a totalidade da quantia contratada foi entregue.
5. A lei de improbidade administrativa aplica-se ao beneficiário direto do ato ímprobo, mormente em face do comprovado dano ao erário público. Inteligência do art. 3º da Lei de Improbidade Administrativa. No caso, também está claro que a pessoa jurídica foi beneficiada com a prática infrativa, na medida em que se locupletou de verba pública sem a devida contraprestação contratual. Por outro lado, em relação ao seu responsável legal, os elementos coligidos na origem não lhe apontaram a percepção de
benefícios que ultrapassem a esfera patrimonial da sociedade empresária, nem individualizaram sua conduta no fato imputável, razão pela qual não deve ser condenado pelo ato de improbidade.
6. Recurso especial provido em parte.
Vale ressaltar, contudo, que o elemento subjetivo, não há que ser necessariamente o dolo, podendo também se configura em culpa, ou mesmo dolo genérico, conforme corrobora o seguinte posicionamento do STJ:
ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE. ELEMENTO SUBJETIVO. CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS DE TRANSPORTE SEM LICITAÇÃO.ATO ÍMPROBO POR ATENTADO AOS PRINCÍPIOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO. APLICAÇÃO DAS SANÇÕES.
1. O Juízo de 1º grau julgou procedente o pedido deduzido em Ação Civil Pública por entender que os réus, ao realizarem contratação de serviço de transporte sem licitação, praticaram atos de improbidade tratados no art. 10 da Lei 8.429/1992. No julgamento da Apelação, o Tribunal de origem afastou o dano ao Erário por ter havido a prestação do serviço e alterou a capitulação
legal da conduta para o art. 11 da Lei 8.429/1992.
2. Conforme já decidido pela Segunda Turma do STJ (REsp 765.212/AC), o elemento subjetivo, necessário à configuração de improbidade administrativa censurada nos termos do art. 11 da Lei 8.429/1992, é o dolo genérico de realizar conduta que atente contra os princípios da Administração Pública, nãose exigindo a presença de dolo específico.
3. Para que se concretize a ofensa ao art. 11 da Lei de Improbidade, revela-se dispensável a comprovação de enriquecimento ilícito do administrador público ou a caracterização de prejuízo ao Erário.
4. In casu, a conduta dolosa é patente, in re ipsa. A leitura do acórdão recorrido evidencia que os recorrentes participaram deliberadamente de contratação de serviço de transporte prestado ao ente municipal à margem do devido procedimento licitatório. O Tribunal a quo entendeu comprovado o conluio entre o ex-prefeito municipal e os prestadores de serviço contratados, tendo consignado que, em razão dos mesmos fatos, eles foram criminalmente condenados pela prática do ato doloso de fraude à licitação, tipificado no art. 90 da Lei 8.666/1993, com decisão já transitada em julgado.
5. O acórdão bem aplicou o art. 11 da Lei de Improbidade, porquanto a conduta ofende os princípios da moralidade administrativa , da legalidade e da impessoalidade , todos informadores da regra da obrigatoriedade da licitação para o fornecimento de bens e serviços à Administração.
6. Na hipótese dos autos, a sanção de proibição de contratar e receber subsídios públicos ultrapassou o limite máximo previsto no art. 12, III,cabendo sua redução. As penas cominadas (suspensão dos direitos políticos e multa) atendem aos parâmetros legais e não se mostram desprovidas de razoabilidade e proporcionalidade , estando devidamente fundamentadas.
7. A multa civil é sanção pecuniária autônoma, aplicável com ou sem ocorrência de prejuízo em caso de condenação fundada no art. 11 da Lei 8.429/92. Precedentes do STJ.
8. Consoante o art. 8º da Lei de Improbidade Administrativa, a multa civil é transmissível aos herdeiros, "até o limite do valor da herança", somente quando houver violação aos arts. 9° e 10° da referida lei (dano ao patrimônio público ou enriquecimento ilícito), sendo inadmissível quando a condenação se restringir ao art. 11.
9. Como os réus foram condenados somente com base no art. 11 da Lei da Improbidade Administrativa, é ilegal a transmissão da multa para os sucessores do de cujus, mesmo nos limites da herança, por violação ao art. 8º do mesmo estatuto.
10. Recurso Especial parcialmente provido para reduzir a sanção de proibição de contratar e receber subsídios públicos e afastar a
transmissão mortis causa da multa civil.( REsp 951.389)
3 Conceito de Improbidade e Culpabilidade.
Conforme visto no item anterior, pode-se conceituar a improbidade administrativa como o ato ilegal ou contrário aos princípios básicos da Administração praticado por agente público, enquanto em exercício na função pública ou em decorrência desta, impregnado de desonestidade e deslealdade.
Decorre disso, segundo afirma a doutrina majoritária, que é indispensável a verificação, no caso concreto, do elemento subjetivo na conduta do agente público.
Para fins de avançar na discussão do tema, importante é conceituar culpabilidade. Tal tarefa, todavia, não é simples, uma vez que doutrina se divide, identificando-se, principalmente, três teorias: psicológica; psicológico-normativa; e normativa pura.
Na primeira, a culpabilidade é a relação psíquica do agente com o fato, na forma de dolo ou de culpa. Na segunda, o dolo e a culpa não são espécies da culpabilidade, mas apenas elementos integrantes desta, ao lado da imputabilidade, da consciência da ilicitude e da exigibilidade de conduta diversa. Na terceira, a culpabilidade consiste em mero juízo de reprovação ao autor da infração cometida.
Em sede de improbidade administrativa, a adoção da teoria levará ao juízo de não configuração do ilícito ou da não culpabilidade, quando não praticado o ato com a presença de algum dos elementos subjetivos.
4 Improbidade Culposa e Constitucionalidade.
Conforme salientado nos tópicos anteriores, é indispensável a presença do elemento subjetivo na conduta do agente público para configuração da prática de ato de improbidade administrativa.
Este elemento subjetivo pode ser tanto o dolo quanto a culpa, havendo, portanto, duas modalidades de improbidade, a dolosa e a culposa.
A primeira decorre de quando o agente público intencionalmente pretende realizar a conduta ímproba. Destaque-se, conforme visto acima que o Superior Tribunal de Justiça, entende ser necessário apenas o dolo genérico, ou seja, que o agente tenha consciência e vontade de concretizar os requisitos objetivos do tipo.
Na segunda hipótese, discute-se a presença ou não da culpa do agente público.
Segundo o ministro do STJ Castro Meira, a conduta culposa ocorre quando o agente não pretende atingir o resultado danoso, mas atua com negligência, imprudência ou imperícia. Contudo, deve-se destacar que a configuração da improbidade na modalidade culposa é exceção, conforme consignou o ministro Luis Fux, quando do julgamento do Recurso Especial 980.706:
PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. APROPRIAÇÃO INDEVIDA DE DIÁRIAS. ART. 10, CAPUT, DA LEI 8.429/92. AUSÊNCIA DE DANO A ERÁRIO. MÁ-FÉ. ELEMENTO SUBJETIVO. ESSENCIAL À CARACTERIZAÇÃO DO ATO DE IMPROBIDADE. SANÇÕES. DOSIMETRIA. CUMULATIVIDADE. PRINCÍPIOS DA PROPORCIONALIDADE E DA RAZOABILIDADE (ART. 12, PARÁGRAFO ÚNICO DA LEI 8429/83). VIOLAÇÃO AO ART. 535. INOCORRÊNCIA.
1. O caráter sancionador da Lei 8.429/92 é aplicável aos agentes públicos que, por ação ou omissão, violem os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, lealdade às instituições e
notadamente: (a) importem em enriquecimento ilícito (art. 9º); (b) causem prejuízo ao erário público (art. 10); (c) atentem contra os princípios da Administração Pública (art. 11) compreendida nesse
tópico a lesão à moralidade administrativa.
2. A má-fé, consoante cediço, é premissa do ato ilegal e ímprobo e
a ilegalidade só adquire o status de improbidade quando a conduta antijurídica fere os princípios constitucionais da Administração Pública coadjuvados pela má-intenção do administrador.
3. A improbidade administrativa está associada à noção de desonestidade, de má-fé do agente público, do que decorre a conclusão de que somente em hipóteses excepcionais, por força de inequívoca disposição legal, é que se admite a sua configuração por ato culposo (artigo 10, da Lei 8.429/92).
4. O elemento subjetivo é essencial à caracterização da improbidade administrativa, sendo certo, ainda, que a tipificação da lesão ao patrimônio público (art. 10, caput, da Lei 8429/92) exige a prova de sua ocorrência, mercê da impossibilidade de condenação ao ressarcimento ao erário de dano hipotético ou presumido.
5. In casu, a ausência de má-fé (elemento subjetivo) dos demandados E.O. M. e L. M. M. representado por seu espólio, coadjuvada pela inexistência de obtenção de proveito patrimonial, conforme consta do voto condutor do acórdão recorrido, revela error in judicando a analise do ilícito apenas sob o ângulo objetivo.
6. Ademais, a exegese das regras insertas no art. 11 da Lei 8.429/92, considerada a gravidade das sanções e restrições impostas ao agente público, deve se realizada com ponderação, máxime porque uma interpretação ampliativa poderá acoimar de ímprobas condutas meramente irregulares, suscetíveis de correção administrativa, posto ausente a má-fé do administrador público e preservada a moralidade administrativa e, a fortiori, ir além do que o legislador pretendeu.
7. Outrossim, é cediço que não se enquadra nas espécies de improbidade o ato praticado por administrador inepto. REsp 980.706
Assim, expôs o ministro no inteiro teor do supracitado acórdão “Somente em hipóteses excepcionais, por força de inequívoca disposição legal, é que se admite a sua configuração por ato culposo (artigo 10 da Lei 8.429)” REsp 980.706
A discussão que se faz, é se o conceito constitucional de improbidade administrativa, conforme exposto no primeiro tópico do trabalho, permitiria a ocorrência da modalidade culposa da improbidade, uma vez que a deslealdade seria inerente à sua constatação. A despeito disso, conforme visto, o STJ já se firmou no sentido de admitir, excepcionalmente a improbidade em tal modalidade. Desta forma, tem-se por constitucional, a improbidade culposa.
5. Referências Bibliográficas.
Constituição da República Federativa do Brasil
ALEXANDRINO, Marcelo; PAULO, Vicente. Direito administrativo descomplicado. 14. ed., rev. e atual. Niterói: Impetus, 2007
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 30. ed. atual. São Paulo: Malheiros, 2005.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: GANEM, Leandro Wehdorn. Aspectos constitucionais da improbidade administrativa culposa Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 jun 2018, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/51852/aspectos-constitucionais-da-improbidade-administrativa-culposa. Acesso em: 22 nov 2024.
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