RESUMO: Com intuito de discussão sobre o complexo assunto de regulação de recursos hídricos e de saneamento básico, eminentemente para solução de quem é o ente competente para fiscalização em momentos de crises hídricas, necessário se faz melhor definição e compreensão dos limites de competência de cada órgão e ente para a melhoria das políticas públicas dessas duas áreas e para incentivar o aumento da eficiência dos serviços de saneamento básico. Discute-se, ainda, a recente editada a Medida Provisória nº 844 de 06 de julho de 2018, que atualiza o marco legal do saneamento básico e altera a Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000, para atribuir à Agência Nacional de Águas competência para editar normas de referência nacionais sobre o serviço de saneamento, a Lei nº 10.768, de 19 de novembro de 2003, para alterar as atribuições do cargo de Especialista em Recursos Hídricos, e a Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, para aprimorar as condições estruturais do saneamento básico no País.
Palavras-chave: Regulação; Políticas Públicas; Gestão de Recursos Hídricos; Saneamento Básico; Medida Provisória nº 844/2018.
1. Declaração de escassez hídrica
A declaração de situação de escassez hídrica deve ser embasada em estudo de disponibilidade de água em quantidade e qualidade para os usos múltiplos, dentre outros elementos que possam estabelecer a segurança hídrica, bem como que possibilitem a indicação de diretrizes e critérios gerais para a definição de situação crítica de escassez hídrica e estado de restrição de uso de recursos hídricos de domínios hidrográficos federais ou estaduais.
O uso racional dos recursos hídricos permeia toda a legislação da matéria. O art. 46 da Lei de Diretrizes Nacionais de Saneamento dispõe que:
Art. 46. Em situação crítica de escassez ou contaminação de recursos hídricos que obrigue à adoção de racionamento, declarada pela autoridade gestora de recursos hídricos, o ente regulador poderá adotar mecanismos tarifários de contingência, com objetivo de cobrir custos adicionais decorrentes, garantindo o equilíbrio financeiro da prestação do serviço e a gestão da demanda.
Sobre os Planos de Recursos Hídricos o art. 7º da Lei nº 9.433/97 esclarece que:
Art. 7º Os Planos de Recursos Hídricos são planos de longo prazo, com horizonte de planejamento compatível com o período de implantação de seus programas e projetos e terão o seguinte conteúdo mínimo:
I - diagnóstico da situação atual dos recursos hídricos;
II - análise de alternativas de crescimento demográfico, de evolução de atividades produtivas e de modificações dos padrões de ocupação do solo;
III - balanço entre disponibilidades e demandas futuras dos recursos hídricos, em quantidade e qualidade, com identificação de conflitos potenciais;
IV - metas de racionalização de uso, aumento da quantidade e melhoria da qualidade dos recursos hídricos disponíveis;
V - medidas a serem tomadas, programas a serem desenvolvidos e projetos a serem implantados, para o atendimento das metas previstas;
VI - (VETADO)
VII - (VETADO)
VIII - prioridades para outorga de direitos de uso de recursos hídricos;
IX - diretrizes e critérios para a cobrança pelo uso dos recursos hídricos;
X - propostas para a criação de áreas sujeitas a restrição de uso, com vistas à proteção dos recursos hídricos.
Nesse sentido, verifica-se que nos termos do inciso IV do artigo acima descrito cabe aos Planos de Recursos Hídricos, que são de longo prazo, a previsão de metas de racionalização de uso.
Em tempos de racionamento do uso da água cada vez mais verifica-se a determinação de racionalização dos usos dos recursos hídricos, que podem ser de domínio federal ou estaduais.
O art. 29 a 31 da Lei nº 9.433/1997 estabelece o sistema de competências sobre os recursos hídricos:
Art. 29. Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, compete ao Poder Executivo Federal:
I - tomar as providências necessárias à implementação e ao funcionamento do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos;
II - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos, e regulamentar e fiscalizar os usos, na sua esfera de competência;
III - implantar e gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, em âmbito nacional;
IV - promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental.
Parágrafo único. O Poder Executivo Federal indicará, por decreto, a autoridade responsável pela efetivação de outorgas de direito de uso dos recursos hídricos sob domínio da União.
Art. 30. Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, cabe aos Poderes Executivos Estaduais e do Distrito Federal, na sua esfera de competência:
I - outorgar os direitos de uso de recursos hídricos e regulamentar e fiscalizar os seus usos;
II - realizar o controle técnico das obras de oferta hídrica;
III - implantar e gerir o Sistema de Informações sobre Recursos Hídricos, em âmbito estadual e do Distrito Federal;
IV - promover a integração da gestão de recursos hídricos com a gestão ambiental.
Art. 31. Na implementação da Política Nacional de Recursos Hídricos, os Poderes Executivos do Distrito Federal e dos municípios promoverão a integração das políticas locais de saneamento básico, de uso, ocupação e conservação do solo e de meio ambiente com as políticas federal e estaduais de recursos hídricos.
Observe que o art. 31 da lei de gestão de recursos hídricos menciona a necessidade de atuação conjunta dos poderes para implementação da Política Nacional e Estadual de Recursos Hídricos e integração com a política de saneamento básico.
E é nesse ponto que este artigo merece quer trazer reflexão, como integrar as políticas de saneamento básico e de recursos hídricos, que facilitem tanto o uso adequado e racional das águas quanto melhorem a eficiência da prestação dos serviços de saneamento básico?
2. Gestão de Recursos Hídricos Estaduais
Para melhor compreensão da Gestão dos Recursos Hídricos torna-se primordial o esclarecimento sobre os instrumentos dispostos na Política Nacional de Recursos Hídricos, nos termos da Lei federal nº 9.433/97, a qual geralmente encontra legislação similar de âmbito estadual, como a lei do estado de Goiás nº 13.123/97, que dispõe sobre normas de orientação à política estadual de recursos hídricos, bem como ao sistema integrado de gerenciamento de recursos hídricos de sua competência.
A gestão dos recursos hídricos constitui-se em um processo compartilhado, de decisão descentralizada, da forma dos usos das águas, proteção e conservação, em que participam o poder público, a sociedade e os usuários, por meio do Conselho de Recursos Hídricos e dos Comitês de Bacias Hidrográficas.
Um dos princípios da política estadual de recursos hídricos é o gerenciamento participativo e integrado e a compatibilização do gerenciamento dos recursos hídricos com o desenvolvimento regional, observando os aspectos econômicos, sociais, culturais e políticos e com a proteção do meio ambiente, conforme incisos I e VII da Lei do estado de Goiás nº 13.123/97.
Nos termos do art. 33 da Lei federal nº 9.433/97 temos que o Sistema de Gestão de Recursos Hídricos é integrado essencialmente pelo:
- Conselho de Recursos Hídricos (nacional ou estadual): um Conselho consultivo, normativo e deliberativo, responsável pelas diretrizes da gestão e organização do sistema;
- Comitês de Bacias Hidrográficas: Colegiado com atribuições consuntivas, normativas e deliberativas, responsável pelas diretrizes da gestão na bacia hidrográfica;
- Órgão Gestor: órgão responsável por executar as ações necessárias à gestão e aplicação dos instrumentos de gestão.
Dentre as atribuições dos Comitês de Bacia Hidrográfica verifica-se que é de sua competência o acompanhamento da execução do Plano de Recursos Hídricos da bacia e sugestão necessárias ao cumprimento de suas metas, conforme descrição do inciso IV do art. 38 da Lei federal nº 9.433/97.
Nesse sentido denota-se que os comitês de bacia hidrográfica deliberam sobre o uso das águas e aos órgãos gestores de recursos hídricos competem a execução das ações para colocar em prática as decisões dos comitês de bacia hidrográfica.
Os estados brasileiros e o Distrito Federal possuem órgãos específicos para a gestão da água. O gerenciamento é realizado por meio da emissão da autorização de uso dos recursos hídricos de domínio dos Estados e através da fiscalização dos usos da água. Além disso, os órgãos gestores são responsáveis por planejar e promover ações direcionadas à preservação da quantidade e da qualidade das águas.
Esses órgãos fazem parte da estrutura do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (SINGREH) e atuam de forma integrada e articulada com os demais entes do Sistema.
Em todo o território brasileiro apenas à Agência Nacional de Águas (ANA) e a Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (ADASA) são agências reguladoras e concomitantemente órgão gestor dos recursos hídricos e ente fiscalizador do serviço de saneamento básico. Nos demais estados brasileiros a adoção de medidas em relação aos recursos hídricos estaduais demandam de ação da estrutura da gestão das referidas águas e execução pelo órgão gestor estadual que compete a Administração Direta.
O gestor das porções de recursos hídricos estaduais é quem executa a eventual declaração de escassez hídrica, realizando atos como a suspensão tanto da emissão de novas outorgas de direito de uso consuntivo de recursos hídricos como o provimento de solicitações de retificação de aumento de vazões e/ou de volumes captados.
3. Política de Saneamento Básico
A lei federal nº 11.445/2007 estabelece as diretrizes nacionais para o saneamento básico e para a política federal de saneamento básico.
O conceito de saneamento básico é previsto na indicada lei como o conjunto de serviços, infraestruturas e instalações de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e drenagem de águas pluviais urbanas.
A Lei federal nº 11.445/2007 reforçou o papel das entidades reguladoras dos serviços públicos de saneamento básico, atribuindo-lhes competências para regular sobretudo os aspectos técnicos, econômicos e sociais, visando a melhoria da qualidade dos serviços, a sustentabilidade econômico-financeira e a modicidade tarifária.
Houve também a definição das competências quanto à coordenação e atuação dos diversos agentes envolvidos no planejamento e execução da política federal de saneamento básico no País.
O art. 52 da lei que estabelece a política nacional de saneamento básico impõe obrigação à União a elaboração do Plano Nacional de Saneamento Básico e dos Planos Regionais de Saneamento Básico, que devem ser elaborados e executados em articulação com os entes estatais, Distrito Federal e Municípios, senão vejamos:
Art. 52. A União elaborará, sob a coordenação do Ministério das Cidades:
I - o Plano Nacional de Saneamento Básico - PNSB que conterá:
a) os objetivos e metas nacionais e regionalizadas, de curto, médio e longo prazos, para a universalização dos serviços de saneamento básico e o alcance de níveis crescentes de saneamento básico no território nacional, observando a compatibilidade com os demais planos e políticas públicas da União;
b) as diretrizes e orientações para o equacionamento dos condicionantes de natureza político-institucional, legal e jurídica, econômico-financeira, administrativa, cultural e tecnológica com impacto na consecução das metas e objetivos estabelecidos;
c) a proposição de programas, projetos e ações necessários para atingir os objetivos e as metas da Política Federal de Saneamento Básico, com identificação das respectivas fontes de financiamento;
d) as diretrizes para o planejamento das ações de saneamento básico em áreas de especial interesse turístico;
e) os procedimentos para a avaliação sistemática da eficiência e eficácia das ações executadas;
II - planos regionais de saneamento básico, elaborados e executados em articulação com os Estados, Distrito Federal e Municípios envolvidos para as regiões integradas de desenvolvimento econômico ou nas que haja a participação de órgão ou entidade federal na prestação de serviço público de saneamento básico.
A regulação e atuação das agências reguladoras que fiscalizam os serviços de saneamento básico fica limitada à busca da eficiência da prestação dos serviços de saneamento básico e para verificação das condições de sua sustentabilidade e equilíbrio econômico-financeiro, nos termos dos artigos 12 e 22 da Lei federal nº 11.445/2007:
Art. 12. Nos serviços públicos de saneamento básico em que mais de um prestador execute atividade interdependente com outra, a relação entre elas deverá ser regulada por contrato e haverá entidade única encarregada das funções de regulação e de fiscalização.
§ 1o A entidade de regulação definirá, pelo menos:
[…]
II - as normas econômicas e financeiras relativas às tarifas, aos subsídios e aos pagamentos por serviços prestados aos usuários e entre os diferentes prestadores envolvidos;
[...]
§ 2o O contrato a ser celebrado entre os prestadores de serviços a que se refere o caput deste artigo deverá conter cláusulas que estabeleçam pelo menos:
[..]
V - as regras para a fixação, o reajuste e a revisão das taxas, tarifas e outros preços públicos aplicáveis ao contrato;
Art. 22. São objetivos da regulação:
I - estabelecer padrões e normas para a adequada prestação dos serviços e para a satisfação dos usuários;
II - garantir o cumprimento das condições e metas estabelecidas;
III - prevenir e reprimir o abuso do poder econômico, ressalvada a competência dos órgãos integrantes do sistema nacional de defesa da concorrência;
IV - definir tarifas que assegurem tanto o equilíbrio econômico e financeiro dos contratos como a modicidade tarifária, mediante mecanismos que induzam a eficiência e eficácia dos serviços e que permitam a apropriação social dos ganhos de produtividade.
No Brasil a responsabilidade pelo planejamento e execução dos serviços de saneamento básico é municipal.
O art. 23, inciso IX da Constituição Federal atribui à União, Estados e Municípios a competência comum para a promoção de melhorias nas condições de saneamento básico. Entretanto, a titularidade dos serviços de saneamento foi alvo de grande discussão jurídica, vez que não há designação expressa do ente titular desses serviços.
O inciso V do art. 30 da carta Magna indica que compete aos municípios organizar e prestar, diretamente ou sob o regime de concessão ou permissão, os serviços públicos de interesse local, incluindo o de transporte coletivo que tem caráter essencial.
Com o intuito de resolver a questão o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.842/RJ decidiu que a titularidade dos serviços de saneamento é realmente municipal, com exceção das regiões metropolitanas, onde essa titularidade municipal é dividida com o poder estadual.
A lei federal 11.445/2007 define em seu artigo 8° que os titulares dos serviços de saneamento poderão delegar a organização, a regulação, a fiscalização e a prestação desses serviços. Nesse sentido, torna-se possível a delegação dos serviços de saneamento básico de ente titular do serviço.
O art. 19 da Lei nº 11.445/2007 reforça a competência do titular do serviço de saneamento nos parágrafos abaixo transcritos:
Art. 19. A prestação de serviços públicos de saneamento básico observará plano, que poderá ser específico para cada serviço, o qual abrangerá, no mínimo:
§ 1oOs planos de saneamento básico serão editados pelos titulares, podendo ser elaborados com base em estudos fornecidos pelos prestadores de cada serviço.
§ 2o A consolidação e compatibilização dos planos específicos de cada serviço serão efetuadas pelos respectivos titulares.
§ 3o Os planos de saneamento básico deverão ser compatíveis com os planos das bacias hidrográficas em que estiverem inseridos.
[...]
Assim temos, uma situação interessante. Apesar dos recursos hídricos e saneamento básico serem indissociáveis a fiscalização e controle pelos usos das águas, sua outorga e gestão dos recursos hídricos de domínios estaduais são realizadas pelo órgão gestor que geralmente são distintos daqueles que realizam a fiscalização dos serviços de saneamento básico, titular do serviço ou o Estado, mediante convênio ou em região metropolitina, com exceção do ente distrital - Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (ADASA) - que é concomitantemente agência reguladora fiscalizadora dos serviços de saneamento básico e órgão gestor dos recursos hídricos.
4. Medida Provisória nº 844/2018
A recente Medida Provisória nº 844 de 06 de julho de 2018 atualiza o marco legal do saneamento básico e altera a Lei nº 9.984, de 17 de julho de 2000, para atribuir à Agência Nacional de Águas competência para editar normas de referência nacionais sobre o serviço de saneamento, a Lei nº 10.768, de 19 de novembro de 2003, para alterar as atribuições do cargo de Especialista em Recursos Hídricos, e a Lei nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007, para aprimorar as condições estruturais do saneamento básico no País.
Sobre o tema a Associação Brasileira de Agências de Regulação – ABAR emitiu em 9 de julho de 2018 nota de repúdio à MP 844/2018, pois entende que a ampliação da competência da Agência Nacional de Águas – ANA, para também exercer a regulação do saneamento básico em caráter referencial, com vinculação do repasse de recursos da União à aderência às normas editadas pela Agência, interfere na autonomia das entidades reguladoras subnacionais[1] e esclarece que adotará todas as medidas que julgar necessárias para a manutenção do Pacto Federativo. Segue nota integral abaixo colacionada:
9 de julho de 2018
A Associação Brasileira de Agências de Regulação – ABAR emitiu em 9 de julho de 2018 nota de repúdio à MP 844/2018, assinada por seu Presidente, Fernando Alfredo Rabelo Franco. Confira:
O Governo Federal apresentou, no dia 06 de julho, a Medida Provisória (MP) nº 844/2018, que altera o marco regulatório do saneamento básico. A referida MP apresenta temas complexos e polêmicos, com propostas em graus de maturidade diferentes, razão pela qual a sua aprovação necessitaria de um debate aprofundado com a sociedade e as instituições afetas ao setor. Neste sentido, lamentamos profundamente a falta de sensibilidade por parte do Governo ao editar tais mudanças na forma de MP que, se aplicadas, causarão desorganização do setor, com impactos nos investimentos e prejuízos à prestação e regulação dos serviços.
Na MP nº 844/2018, a competência da Agência Nacional de Águas – ANA foi ampliada para a regulação do saneamento básico. Embora seu caráter seja referencial, a MP impõe a atuação da regulação pela ANA, uma vez que vincula o repasse de recursos da União à aderência às normas editadas pela Agência.
Numa leitura inicial, considerando que o setor depende de recursos federais, verifica-se que a ANA se tornará a agência setorial, o que enfraquecerá a autonomia das entidades reguladoras subnacionais, que se tornarão, por conseguinte, meras executoras das decisões da ANA.
No que tange ao aspecto da competência regulatória, a nosso ver, na forma apresentada, o texto é inconstitucional, ao adentrar na competência das agências reguladoras subnacionais, posto que as regras contidas no §1º do artigo 4º da citada MP tratam de matéria eminentemente regulatória, que não pode ser minimizada mediante a malsinada conotação de se tratar tais imposições como normas de referência.
A Associação Brasileira de Agências de Regulação – ABAR apoia a iniciativa de elaboração de normas de referência e, desde a sua fundação, tem atuado neste sentido, ofertando às Agências Reguladoras documentos de referência para a edição de normas regulatórias, respeitadas as características regionais.
Além disso, atua fortemente em capacitação e parcerias com o Governo Federal, em especial junto aos Ministérios das Cidades e do Planejamento, elevando, desta forma, o nível de atuação dos reguladores.
Atribuir os problemas que impedem a universalização dos serviços de saneamento básico ao Marco Regulatório consiste em um grande equívoco. Sua reformulação na forma imposta em nada contribuirá para a modificação dos índices de cobertura do saneamento básico, haja vista a necessidade de se avançar, por exemplo, no planejamento e em regras que estimulem de forma transparente e eficaz a participação do segmento privado, bem como o fortalecimento da regulação subnacional.
Diante do exposto e considerando a relevância do tema, faz-se necessária a revisão da Lei nº 11.445/2007. Porém, o processo de debate necessita ser ampliado em termos de participação das entidades setoriais, possibilitando a manifestação da sociedade e impedindo que Estados e Municípios sejam prejudicados ou tenham suas competências constitucionais usurpadas.
Com fundamento nas razões expostas, a ABAR considera a aprovação da aludida MP uma afronta às suas iniciativas já levadas a efeito, bem como as contribuições encaminhadas aos diversos setores do governo, sempre no sentido de cooperar para que o Marco Regulatório do Saneamento fosse aperfeiçoado de maneira a atender as expectativas de todos os segmentos envolvidos, públicos e privados, entes de governo em seus diversos níveis, sem gerar consequências que julgamos danosas e irreversíveis para a sociedade brasileira, principalmente se considerarmos o atual momento político, econômico e social pelo qual atravessa o País.
A ABAR adotará, doravante, todas as medidas que julgar necessárias para a manutenção do Pacto Federativo, mediante mobilização de suas Associadas, visando à conscientização da base parlamentar em seus respectivos Estados, com o objetivo de levar ao conhecimento do Congresso Nacional os efeitos negativos que a mencionada MP trará ao setor do saneamento básico brasileiro.
5. Conclusão
As porções hídricas estaduais não podem ser esquecidas quando se fala em gestão de recursos hídricos e saneamento básico, pois o que se verifica é que as discussões de interação entre as políticas públicas dessas duas áreas geralmente levam em conta apenas os recursos hídricos federais, devendo ser visto com precaução atos de inovação como a edição da Medida Provisória nº 844 de 06 de julho de 2018.
É certo que há necessidade de padronização dos atos para melhoria constante da regulação, controle e fiscalização dos serviços públicos de saneamento básico, mas que estas não sejam realizadas via engessamento e corte da autonomia dos estados e municípios pela União, via a Agência Nacional de Águas – ANA.
A atuação em cooperação entre os diversos atores é fundamental para a prestação do serviço de saneamento básico com a eficiência almejada e na forma descrita em lei. Para tanto necessário se faz a coordenação de atos que visem a melhoria da gestão de recursos hídricos de domínio estadual sem a retirada da autonomia dos titulares dos prestadores de serviços de saneamento básico do âmbito estadual e municipal, a quem compete atuar nas questões tarifárias desse setor, devendo definir inclusive sobre eventual pedido de contingência tarifária.
REFERÊNCIAS
ABAR. Nota de Repúdio à Medida Provisória nº 844/2018. Disponível em: Acesso em 10 de jul. 2018.
BRASIL. Lei 9.433, de 8 de janeiro de 1997. Institui a Política Nacional de Recursos Hídricos, cria o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, regulamenta o inciso XIX do art. 21 da Constituição Federal, e altera o art. 1º da Lei nº 8.001, de 13 de março de 1990, que modificou a Lei nº 7.990, de 28 de dezembro de 1989. Disponível em Acesso em 10 Jul. 2018.
BRASIL. Lei nº 11.455, de 5 de janeiro de 2007. Estabelece diretrizes nacionais para o saneamento básico; altera as Leis nos 6.766, de 19 de dezembro de 1979, 8.036, de 11 de maio de 1990, 8.666, de 21 de junho de 1993, 8.987, de 13 de fevereiro de 1995; revoga a Lei no 6.528, de 11 de maio de 1978; e dá outras providências. Disponível em Acesso em 10 Jul. 2018.
CARVALHO, Matheus. Manual de Direito Administrativo. 4ª ed. Salvador: JusPODIVM, 2017.
GOIÁS. Lei nº 13.123, de 16 de julho de 1997. Estabelece normas de orientação à política estadual de recursos hídricos, bem como ao sistema integrado de gerenciamento de recursos hídricos e dá outras providências. Disponível em < http://www.gabinetecivil.go.gov.br/pagina_leis.php?id=2760> Acesso em 10 de Jul. 2018.
OLIVEIRA, Guilherme Resende. Apostila de Avaliação de Políticas Públicas – avançado. Goiânia: Superintendência da Escola de Governo Henrique Santillo, 2017.
STF. Notícias STF. Julgada ADI sobre criação da região metropolitana do Rio. Disponível em: Acesso em 10 de Jul. de 2018.
[1] Disponível em: Acesso em 10 de jul. 2018.
Advogada, graduada em 2002/02 pela Pontifícia Universidade Católica de Goiás. Especialista em Direito Civil pela Universidade Federal de Goiás. Aluna especial do Programa de Pós-Graduação em Direito e Políticas Públicas - PPGDP, nível Mestrado Profissional, da Universidade Federal de Goiás. Assessora jurídica da Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização de Serviços Públicos. <br>
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NEVES, Alice Santos Veloso. Atuação das Agências Reguladoras estaduais e municipais nos serviços de saneamento básico e dos órgãos gestores de recursos hídricos estaduais Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 16 jul 2018, 05:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52024/atuacao-das-agencias-reguladoras-estaduais-e-municipais-nos-servicos-de-saneamento-basico-e-dos-orgaos-gestores-de-recursos-hidricos-estaduais. Acesso em: 22 nov 2024.
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