ANDREIA AYRES GABARDO DA ROSA[1]
RESUMO:O estudo a seguir pretende apontar a importância do ensino de constitucional na educação básica. Utilizou-se como caminho metodológico uma investigação bibliográfica a partir de publicações científicas, da Constituição Federal, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação e o Projeto de Lei nº 70 de 2015, que prevê a inclusão da disciplina constitucional no ensino base, além de artigos de autores que abordam o assunto. A Constituição Federal é considerada o principal instrumento normativo norteador do direito à educação, bem como dos direitos sociais. O direito à educação como um dos direitos sociais, constitui-se como um instrumento básico para a construção da cidadania, uma vez que isso certamente viabilizará o acesso e exercício aos demais direitos civis e políticos, aos quais estão previstos constitucionalmente.
Palavras-chave: Constitucional. Ensino. Cidadania.
ABSTRACT: The following study intends to point out the importance of constitutional teaching in basic education. A bibliographical research based on scientific publications, the Federal Constitution, the Law on the Guidelines and Bases of Education and the Draft Law No. 70 of 2015, which provides for the inclusion of constitutional discipline in basic education, was used as a methodological path. articles by authors who approach the subject. The Federal Constitution is considered the main normative instrument guiding the right to education, as well as social rights. The right to education as a social right constitutes a basic instrument for the construction of citizenship, since this will certainly enable access to and exercise of other civil and political rights, which are constitutionally foreseen.
Keywords: Constitutional. Teaching. Citizenship.
1 INTRODUÇÃO
A CRFB/1988 – Constituição da República Federativa do Brasil inseriu a Educação como um Direito Fundamental entre os direitos sociais com intuito de fortalecer constitucionalmente a importância deste para a formação do indivíduo e a sua inserção na sociedade.
Não há como desenvolver a consciência e a criticidade de um povo quando ele desconhece as suas próprias regras, e é nesse raciocínio que se desenvolve este estudo, apregoando a importância de conhecer onde se apoiam os seus direitos, as suas obrigações, a aplicabilidade da cidadania e a importância dela na formação do indivíduo, com a inclusão do Ensino Constitucional nas grades curriculares da formação básica, inserindo o educando ativamente no exercício da democracia, e que isso seja estruturado bem antes do voto, para que ele aprenda a exercê-lo dignamente.
Piaget (2003) explica que a interação ocorre pelos conceitos de assimilação, acomodação e adaptação. Do equilíbrio desses processos advém uma adaptação ao mundo cada vez mais adequada e uma consequente organização mental. Reforça a sua tese sobre a importância do construtivismo na formação integral do ser humano como algo que possibilita um adequado caminho da aquisição da linguagem escrita, contestando o inatismo que defende a ideia de que o indivíduo nasce pronto.
Essa é a ideia, de que o indivíduo se constrói de acordo ao meio que está inserido. Portanto, seria inconcebível no cenário atual, que um aluno passe pelo processo de formação básica, sem conhecer a lei maior do seu país, desconhecendo suas funções e importância, sem saber quais direitos não podem ser retirados ou maculados de alguma forma, o que certamente fragmenta o exercício da cidadania uma vez que não conhece o seu papel social, tão pouco conhece o que um governante pode fazer com o voto que lhe fora atribuído.
Não se propõe nesse estudo um aprofundamento do ensino jurídico aplicado nas academias de Direito, mas sim um estudo que proporcione conceitos básicos e fundamentais dos textos constitucionais vivenciados cotidianamente e então desconhecidos dos filhos de sua pátria.
A formação do cidadão está estruturada na Lei de Diretrizes e Bases da Educação nacional não somente para o conhecimento em si, mas para um conjunto de saberes que prepara o indivíduo também para o trabalho e a vida em sociedade. Ela expressa em seus artigos:
Art. 2º A educação, dever da família e do Estado, inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 22. A educação básica tem por finalidades desenvolver o educando, assegurar-lhe a formação comum indispensável para o exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no trabalho e em estudos posteriores (LDB, Lei nº 9394, 1996).
Pela composição dos artigos, são perceptíveis as finalidades da Educação no sentido de assegurar e preparar o educando para o exercício da cidadania, o que não será possível se não for inserido como disciplina do currículo. O aluno precisa conhecer, saber das suas responsabilidades sociais e políticas. Somente pelo conhecimento sistematizado e gradativo, o educando poderá compreender e vivenciar de fato o verdadeiro Estado Democrático de Direito.
O estudo partiu de uma investigação bibliográfica a partir de publicações científicas, da Constituição Federal, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação e o Projeto de Lei nº 70 de 2015, que prevê a inclusão da disciplina constitucional no ensino base, além de artigos de autores que abordam o assunto.
O estudo pretende ainda relacionar o ensino de constitucional com a construção da cidadania do educando na educação básica.
2 CIDADANIA: CONCEPÇÕES HISTÓRICAS
O conceito de cidadania tem se modificado bastante ao longo do tempo, apesar de não sair da concepção ordeira e cumprimento do civismo de alguma forma. Se direcionava precipuamente na perspectiva do voto ou de quem vota, consciente e participativa, sendo, portanto, cidadania como uma condição de acesso aos direitos sociais e econômicos, de forma a permitir que o cidadão possa desenvolver todas as suas potencialidades, incluindo a de participar de forma ativa, organizada e consciente, da construção da vida coletiva no Estado democrático.
Nesse sentido:
A palavra cidadania provém do latim civitatem que significa cidade. Isto nos remete a expressão grega polis, cidades-estados antigas, ou tipo de organização a que é atribuído, pela maioria dos historiadores, ao conceito tradicional de cidadania. Nesta fase cidadania se restringia à participação política de determinadas classes sociais, onde o cidadão era o que morava na cidade e participava de seus negócios. Não é incorreto afirmar que na Grécia antiga, cidadania era confundida com o próprio conceito de naturalidade, visto que cidadãos eram somente os nascidos em solo Grego e só esses podiam exercer e usufruir dos direitos políticos. E assim era devido ao regime aristocrático dominante (MOREIRA, 2011, p. 11).
O mesmo ocorria em Roma, onde se via claramente a exclusão dos romanos não nobres e de estrangeiros, que não detinham nenhuma espécie de direitos.
Nota-se, portanto, que tanto na Grécia quanto em Roma a cidadania mostrava-se como um direito de poucos, havendo uma discrepância entre o discurso teórico e a aplicação prática na sociedade.
Para Melo (2013), na Idade Média, com o advento das mudanças trazidas pelo feudalismo logo no primeiro período, isto é, o que sucedeu à queda do Império Romano, a preocupação política cedeu espaço à questão religiosa e a ideia de cidadania foi relegada em segundo plano. A sociedade de estamentos apresentava uma organização que incluía a nobreza, o clero e os camponeses, tendo referidas classes, direitos e privilégios distintos.
Tal situação só se modificou com o surgimento dos estados nacionais. Neste período, denominado historicamente como Baixa Idade Média, reaparece a noção de estado centralizado e com ele a clássica visão da cidadania, ligada aos direitos políticos.
Contudo:
As mudanças sociais advindas das novas necessidades materiais aliada ao fenômeno da cristianização passou a exigir uma reformulação do conceito de cidadania que já não atendida às demandas, surgindo daí a semente do ideal de igualdade. Com o iluminismo foi vivenciado um período de transição e de transformações políticas, econômicas, artísticas, contribuindo também para o despertar do ideal de liberdade. Movidos por esta chama filósofos como Locke e Rousseau defenderam a democracia liberal, distante do direito divino e que tinha por base a razão. Merece destaque as ideias de Rousseau que preconizava ainda um caráter universal para os direitos. Muito influenciaram essas ideias nas lutas políticas da época, sendo alicerce para os movimentos de independência de colônias americanas e de revoluções tais como a Francesa e a Inglesa. Entretanto, neste período, diante do fato de que a sociedade ideal apontava desigualdades sociais, a cidadania também foi tolhida, de certa forma, de seu sentido mais amplo (MELO, 2013, p. 12).
Observa-se assim que os séculos XIX e XX foram responsáveis por progressos significativos que repercutiram no conceito de cidadania. Consequentemente, a Revolução Francesa e a Revolução Americana inseriram no contexto mundial um novo tipo de Estado, carregando consigo os ideais de liberdade e igualdade e embora tivessem uma origem burguesa auxiliaram na busca pela inclusão social. Aliado a tudo isto despontavam as lutas sociais. A cidadania passa, por fim, a manter íntima vinculação com o relacionamento entre a sociedade política e seus membros (MARTINEZ, 2013).
Convém ressaltar que as duas guerras mundiais foram decisivas para a mudança de ideologia sobre a cidadania e o medo advindo das atrocidades praticadas e alicerçadas pela legalidade fez com que órgãos internacionais e a própria sociedade civil passassem a entender cidadania como algo indissociável dos direitos humanos (ROMANELLI, 2006).
As informações acima deixam claro que o conceito de cidadania passou a ser vinculado não apenas à participação política, representando um direito do indivíduo, mas também o dever do Estado em ofertar condições mínimas para o exercício desse direito, incluindo, portanto, a proteção ao direito à vida, à educação, à informação, à participação nas decisões públicas.
Mesmo diante de toda evolução do conceito de cidadania, ainda hoje se percebe as inúmeras violações aos direitos humanos e a ausência de cidadania plena a considerável parcela da população que se diz excluída.
Portanto, vale compreender que cidadania é uma conquista diária, inerente à sociedade na qual se vive e trata-se principalmente da aplicabilidade dos direitos e deveres de cada cidadão.
2.1 A CONSTRUÇÃO DA CIDADANIA NA PERSPECTIVA DA ESCOLA
O direito à educação como um dos direitos sociais, constitui-se como um instrumento básico para a construção da cidadania, uma vez que isso certamente viabilizará o acesso e exercício aos demais direitos civis e políticos, aos quais estão previstos constitucionalmente.
Apesar do surgimento da bandeira da escolarização universal e obrigatória pela formação da sociedade burguesa, na época moderna, com a ruptura do feudalismo e o desenvolvimento capitalista, a burguesia, ora em ascensão, se manifestou como uma classe revolucionária e, nesse ponto defendia a filosofia da essência humana como um verdadeiro suporte para proposição da igualdade social.
Nesse contexto:
Sobre essa estrutura de igualdade dos homens entre si se fundamenta a pedagogia da essência, onde, ao tornar-se dominante, a burguesia estrutura os sistemas nacionais de ensino e passa a defender a escolarização para todos. A escolarização de todos os homens era condição indispensável para que se tivesse uma participação política ativa e consistente, e com isso, fortalecer e consolidar a democracia. A escola era, pois, proposta como condição para consolidação dessa ordem democrática (SAVIANI 1997, p.73).
Nesse diapasão, a cidadania está ligada à democracia, à justiça social e à efetivação dos direitos políticos, econômicos, sociais e culturais, que são fundamentais para a pessoa humana.
No Brasil, essa concepção de igualdade educacional como direito de todos e dever do Estado reflete claramente tanto para os teóricos educacionais quanto em documentos legais que a institucionalizaram (CURY, 2002).
Historicamente:
Algumas constituições como a de 1934 e 1946, no que se refere ao compromisso formal por elas estabelecido em relação à educação e as questões democráticas, também não tinham base sólida quanto à criação de instrumentalização adequada ao cumprimento desses compromissos com a prática educacional. Os princípios nos quais se fundamenta são: a escola pública, única, laica, gratuita em todos os níveis. Estão inseridos nesses princípios os defensores da Escola Nova, em 1932, e aqueles que lutaram pela aprovação da lei de diretrizes e bases da educação Nacional, em 1958 (CURY, 2002, p. 23).
Ressalta-se, nesse sentido, que no conceito liberal o dever do Estado com a educação se estrutura no conteúdo igualitário desta, ou seja, se a educação é realmente direito de todos, é dever do Estado assegurar o cumprimento desse direito em condições igualitárias, indistintamente, através do ensino público gratuito (MARTINEZ, 2013).
Pode-se evidenciar que na educação dos anos 80, era importante entonar o hino nacional nas escolas semanalmente, o que proporcionava um maior envolvimento dos alunos com sua pátria e com os seus deveres para com ela. Mesmo timidamente, ainda se instaurava nas escolas a disciplina de Estudos Sociais, EMC – Educação Moral e Cívica e finalmente OSPB – Organização Social e Política Brasileira, as quais foram extintas por entenderem que não tinham muita importância.
Para Carvalho (2002), desenvolver cidadãos críticos e responsáveis ante aos seus direitos e deveres é um raciocínio que se desenvolve acerca da importância de conceitos mínimos sobre constitucionalismo aos educandos da educação básica.
Guarinelo (2003) considera que a evolução da cidadania foi lenta no decorrer dos séculos e divergente nos países orientais e ocidentais, mas dois modelos teóricos serviram para resumir o conceito de cidadania na modernidade. Havia aqueles que acreditaram que a cidadania se organizava pela distribuição dos poderes e por um ordenamento jurídico estável capaz de guiar uma pluralidade de cidadãos que têm seus direitos garantidos. E os que tinham o cidadão como fonte direta da lei, e que deveriam ter uma relação de intimidade com o corpo político.
Considera-se, mediante o exposto, que o Brasil precisa de uma reestruturação moral e política emergente, onde a educação sistematizada é o canal, se não o mais rápido, o mais eficaz para se chegar a esses indivíduos ainda no processo de formação, e concomitante ao aprendizado. Assim, seria possível desenvolver um processo cognitivo coerente com a realidade do educando, e é a possibilidade de exercitar a cidadania que fará com que ele se sinta participante ativo desse processo constitucional, tão desconhecido e tão entranhado no dia a dia de cada brasileiro.
3. ENSINO BRASILEIRO: AVANÇOS E RETROCESSOS
A Constituição Federal é considerada o principal instrumento normativo norteador do direito à educação, bem como dos direitos sociais. Respectivamente em seu art. 6º, está estabelecido que fossem direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados.
A Constituição, em seu art. 205, preceitua que a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (CFRB/88).
Ainda, no art. 206 da Constituição Federal, está previsto que o ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - Igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; III - pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais (BRASIL, 1988 p. 48).
A Educação, na Constituição Federal de 1988, é um bem jurídico, principalmente porque com ela se constrói uma sociedade livre, justa e solidária e só com ela se garante o desenvolvimento nacional, dentro do que determina o seu artigo 3º, no qual se acham os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil (VIEIRA, 2001).
Ao se fazer uma retrospectiva do ensino no Brasil observa-se que no final dos anos 70 e início dos 80, a abertura política decorrente do final do regime militar coincidiu com a intensa mobilização dos educadores para buscar uma educação crítica à serviço das transformações sociais, econômicas e políticas, tendo em vista a superação das desigualdades existentes no interior da sociedade. Ao lado das denominadas teorias crítico-reprodutivistas, firma-se no meio educacional a presença da “pedagogia libertadora” e da “pedagogia crítico-social dos conteúdos”, assumida por educadores de orientação marxista (BRASIL, 1997).
Diante de tal fato é importante caracterizar as pedagogias acima citadas:
A “pedagogia libertadora” tem suas origens nos movimentos de educação popular que ocorreram no final dos anos 50 e início dos anos 60, quando foram interrompidos pelo golpe militar de 1964; teve 32 seu desenvolvimento retomado no final dos anos 70 e início dos anos 80. Nessa proposta, a atividade escolar pauta-se em discussões de temas sociais e políticos e em ações sobre a realidade social imediata; analisam-se os problemas, seus fatores determinantes e organiza-se uma forma de atuação para que se possa transformar a realidade social e política. O professor é um coordenador de atividades que organiza e atua conjuntamente com os alunos (BRASIL, 1997, p. 134).
Em consonância com as informações acima, os objetivos do Ensino Fundamental, segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais é que os alunos sejam capazes de compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia-a-dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito (BRASIL, 1997).
Já no Ensino Médio, é preconizado que a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos no ensino fundamental, deve possibilitar o prosseguimento de estudos; a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores; o aprimoramento do educando, como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico; a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos produtivos, relacionando a teoria com a prática, no ensino de cada disciplina (BRASIL, 2018)
Contudo, se observa um paradoxo entre o que se estabelece nos documentos legais que direciona o ensino do país e o desempenho insuficiente dos alunos nos anos finais do Ensino Fundamental. Ora, a grande questão é a organização curricular do Ensino Médio vigente, com excesso de disciplinas curriculares, e uma abordagem pedagógica distante da realidade dos jovens e do contexto do trabalho (MOEHLECKE, 2012).
A proposta dos Parâmetros Curriculares Nacionais concebia a educação escolar como uma prática que tem a possibilidade de criar condições para que todos os alunos desenvolvam suas capacidades e aprendam os conteúdos necessários para construir instrumentos de compreensão da realidade e de participação em relações sociais, políticas e culturais diversificadas e cada vez mais amplas, condições estas fundamentais para o exercício da cidadania na construção de uma sociedade democrática e não excludente (BRASIL, 1997).
Paradoxalmente, por mais que os Parâmetros Curriculares Nacionais preconizem o que foi mencionado anteriormente, o que ainda se observa é um ensino com conteúdos muito distante do interesse do aluno, e a indisponibilidade de atividades culturais e sociais correspondente à faixa etária, que o auxilie em sua formação integralmente.
Nesse sentido, para a reformulação do ensino no Brasil, em 2018 foi aprovada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que é um documento de caráter normativo que define o conjunto orgânico e progressivo de aprendizagens essenciais que todos os alunos devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica, de modo a que tenham assegurados seus direitos de aprendizagem e desenvolvimento, em conformidade com o que preceitua o Plano Nacional de Educação - PNE (BRASIL, 2018).
O referido documento reconhece, assim, que a Educação Básica deve visar à formação e ao desenvolvimento humano global, o que implica compreender a complexidade e a não linearidade desse desenvolvimento, rompendo com visões reducionistas que privilegiam ou a dimensão intelectual (cognitiva) ou a dimensão afetiva. Significa, ainda, assumir uma visão plural, singular e integral da criança, do adolescente, do jovem e do adulto considerando-os como sujeitos de aprendizagem e promover uma educação voltada ao seu acolhimento, reconhecimento e desenvolvimento pleno, nas suas singularidades e diversidades (BRASIL, 2018).
Na Base Nacional Comum está explicito que os currículos devem assegurar as aprendizagens essenciais definidas para cada etapa da Educação Básica, uma vez que tais aprendizagens só se materializam mediante o conjunto de decisões que caracterizam o currículo em ação.
É importante citar alguns aspectos que a Base Nacional Comum (2018) concebe em relação ao currículo:
contextualizar os conteúdos dos componentes curriculares, identificando estratégias para apresentá-los, representá-los, exemplificá-los, conectá-los e torná-los significativos, com base na realidade do lugar e do tempo nos quais as aprendizagens estão situadas; decidir sobre formas de organização interdisciplinar dos componentes curriculares e fortalecer a competência pedagógica das equipes escolares para adotar estratégias mais dinâmicas, interativas e colaborativas em relação à gestão do ensino e da aprendizagem; selecionar e aplicar metodologias e estratégias didático-pedagógicas diversificadas, recorrendo a ritmos diferenciados e a conteúdos complementares, se necessário, para trabalhar com as necessidades de diferentes grupos de alunos, suas famílias e cultura de origem, suas comunidades, seus grupos de socialização etc.; conceber e pôr em prática situações e procedimentos para motivar e engajar os alunos nas aprendizagens (BRASIL, 2018, p. 29).
Diante as informações acima é possível que com a implantação da Base Nacional Comum em 2018 haja transformações no ensino brasileiro, pois o que apontam as pesquisas, o que propõem os currículos da educação básica é algo ainda intangível. De acordo com o Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf), 38% dos estudantes do ensino superior não dominam habilidades básicas de leitura e escrita. Tais informações deixam em evidência que os alunos ainda saem do Ensino Médio sem habilidades com a leitura e a escrita, fator esse que impossibilita o educando de exercer sua cidadania.
Conclui-se, mediante o exposto nas palavras de Silva (2003), que a questão central do ensino é a definição da sua função social, dos seus objetivos e da consequente concepção curricular adotada. Sempre se esperou do ensino médio a formação da pessoa humana, do cidadão, do trabalhador e do futuro universitário.
Para Araújo (2017), isso coincide com a etapa final da consolidação da educação básica, na faixa etária ideal da adolescência. Período justamente em que o jovem estrutura valores e conceitos e faz escolhas essenciais. Trabalho, profissão, família, grupo social, esporte, política, enfim, modo de viver, constituem opções fundamentais dessa fase da vida humana.
3.1 ENSINO DE CONSTITUCIONAL OBRIGATÓRIO NOS CURRÍCULOS DA EDUCAÇÃO BÁSICA
É papel fundamental da educação básica o preparo para o exercício da cidadania, cuja consagração está assegurada tanto constitucionalmente como no direito nacional e internacional. A Educação Básica está definida no artigo 21, I da LDB, é constituída por Educação Infantil, Ensino Fundamental e Ensino Médio.
Para Araújo (2017) a escola tem um papel fundamental no processo de civilizar o cidadão, pois as condições concretas vivenciadas não são as fontes alimentadoras do processo de aprendizagem, mas sim todos os estágios de transformação e harmonia social que levam o aluno a introduzir os conceitos cidadãos ao seu dia-a-dia.
Porém, o que ainda se vê na instituição escolar são conteúdos partindo de uma metodologia em que as atividades pedagógicas têm enfatizado os aspectos instrutivos, em detrimento de aspectos criativos, reflexivos, construtivos e cooperativos. Observa-se um processo rígido de transmissão de conteúdo que privilegia informações isoladas e que desconsidera o contexto, o envolvimento dos alunos e suas diferenças. O aluno é concebido como um espectador, que deve copiar, memorizar e reproduzir os conteúdos apresentados pelo professor (BEHRENS, 2007).
É dentro dessa concepção que se considera importante o ensino de constitucional na educação básica. Sobre esse assunto, tramita no Congresso Nacional o projeto de lei nº 70 de 2015 que prevê a inclusão da disciplina constitucional no ensino base, o projeto de Lei do Senado nº 70 de 2015, que altera a redação dos artigos n.º 32 e 36 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
O referido projeto cita que é por meio do ambiente natural e social, do sistema político, do exercício da cidadania, da tecnologia, das artes e dos valores morais e cívicos que se fundamenta a sociedade. Preconiza assim, que o currículo do ensino fundamental incluirá, obrigatoriamente, a disciplina Constitucional, além de conteúdo que trate dos direitos das crianças e dos adolescentes, tendo como diretriz a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente). Observada a produção e distribuição de material didático adequado, serão incluídas ainda a disciplina Constitucional, a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias em todas as séries do ensino médio.
Pode se depreender a partir da proposta acima que a grande questão da educação contemporânea está ligada ao desconhecimento do ensino da educação cidadã, da educação democrática, sendo ministrada juntamente com as disciplinas tradicionais da escola, trabalhando o senso crítico e reflexivo dos alunos.
Na concepção de Moro (2008) pode-se observar que, apesar de amplo, o sistema educacional atual ainda sofre com a falta de disciplinas capazes de transformar a educação definitivamente num exercício de cidadania. Foi um grande avanço introduzir as disciplinas de Sociologia e Filosofia na grade curricular, entretanto ainda falta o conteúdo primordial para o aluno compreender como e por que devemos ser e nos comportar desta ou daquela maneira, sem infringir as leis e ultrapassar limites éticos e morais.
Valente (2008) corrobora a afirmação acima afirmando que as modernas teorias pedagógicas pregam que a escola deve, acima de tudo, preparar as pessoas para a vida, para o convívio em sociedade. Nessa concepção, Bastos (2002) assevera que oferecer um conceito de Constituição não é uma das tarefas mais fáceis de serem cumpridas, em razão de este termo ser equívoco, ou seja, prestar-se a mais de um sentido.
Ainda para Valente (2008), para se ter um ensino completo, parece evidente que o Direito Constitucional seja contido na educação básica, pois é na Constituição que estão presentes os ditames de como devemos agir dentro da sociedade, quais são nossos deveres, e nossos direitos, quais garantias o Estado nos dá diante das nossas prestações como cidadãos brasileiros.
É importante citar que o método de ensino utilizado no Brasil visa concretizar o amplo sentido da educação, e foi estruturado por dezenas de autores, professores, sociólogos, entre outros profissionais que desenvolveram esse sistema baseado em pesquisas teóricas acerca da temática da educação e de experiências práticas em modelos de sucesso utilizados em outros países. Mas como o ritmo de mudanças é muito grande, o sistema atual se torna facilmente ineficaz quando não acompanha o cotidiano das transformações da sociedade brasileira (VELLOZO, 2002).
Para Moro (2002) o Brasil vive um Estado Democrático de Direito, portanto é natural que os componentes desse Estado tenham pleno conhecimento e acesso aos seus direitos e deveres como cidadãos, mas não é o que acontece com a população brasileira em geral, visto que a educação é falha tanto na teoria como na prática, pois muitos não têm acesso à educação e aqueles que têm não conseguem um ensino de qualidade e com eficiência para realmente transformar o país como deveria.
Ainda assim:
Com a atual política adotada no país, nada mais natural que seus membros tenham total acesso às informações que lhes propiciem lutar e participar das atuações do Estado, sabendo como se deve agir e quais os instrumentos para isso. E o meio mais adequado para atingir esses objetivos é a educação. E a simples inclusão da disciplina de Direito Constitucional na Educação Básica, ensinada por bacharéis no curso de Direito, Sociologia, Antropologia, ciência Política, pode possibilitar grandes avanços na formação do indivíduo, no exercício da cidadania e construção de um Estado efetivamente Democrático de Direito (MORO, 2002, p. 384).
Pode-se observar que o ensino de constitucional já deveria estar consolidado nas grades curriculares, visto que, no ano de 2010, foi homologada pelo Ministério da Educação a Resolução nº 4, de 13 de julho de 2010, determinando em seu art. 2º, I, seu objetivo, que é definir as Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais para a Educação Básica, sistematizando os princípios e as diretrizes gerais da Educação Básica contidos na Constituição, na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e demais dispositivos legais, traduzindo-os em orientações que contribuam para assegurar a formação básica comum nacional, tendo como foco os sujeitos que dão vida ao currículo e à escola.
Para Valente (2008):
As modernas teorias pedagógicas pregam que a escola deve, acima de tudo, preparar as pessoas para a vida, para o convívio em sociedade. Assim, por exemplo, aprendemos na escola a língua portuguesa porque ela é necessária pra a comunicação, para o trabalho, para nossa identidade cultural. Aprendemos conceitos elementares de matemática para podermos gerenciar nossas finanças pessoais, entender o sistema de preços da economia de mercado na qual todos estamos inseridos. Da mesma forma, a Geografia nos ensina, nos bancos escolares, como é o meio em que vivemos, as características do ambiente, a dimensão física e humana de nosso mundo, assim como a disciplina História nos mostra o nexo de causalidade entre os fatos históricos, nos ajudando a entender porque o mundo é do jeito que é e como poderá ser no futuro. Diante dessa perspectiva educacional, é relevante. Afinal, se a função da escola é formar cidadãos, e se ser cidadão é, entre outras coisas, ter direitos e obrigações igualitariamente perante os outros, parece fundamental que o conhecimento sobre quais são os direitos e obrigações do cidadão seja efetivamente ensinado nas instituições de ensino básico (VALENTE, 2008, p. 32).
Nesse sentido é necessário o conhecimento básico sobre o funcionamento do aparato do Estado, sobre a elaboração de leis, o que confere sua legitimidade, por que devemos obedecê-las, ou seja, tudo aquilo que consta na Constituição Federal.
Na percepção de Silva (2016), é impossível conceber, na modernidade, um aluno sair da educação básica não conhecendo a lei maior de seu país, desconhecendo qual a sua função e importância e ainda mais, não sabendo quais são os seus direitos e deveres, e seu papel na sociedade.
A menção acima deixa claro que uma das finalidades da Educação é assegurar e preparar o aluno para ser cidadão atuante e participativo no contexto político e democrático do país, bem como ser capaz de formar suas próprias opiniões, a partir do que preconiza a Constituição Federal.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo apontou que a cidadania está intimamente ligada à democracia, à justiça social e à efetivação dos direitos políticos, econômicos, sociais e culturais, que são fundamentais para a pessoa humana.
A educação básica, ao buscar desenvolver cidadãos críticos e responsáveis ante aos seus direitos e deveres, deve partir de um raciocínio que se desenvolve acerca da importância de conceitos mínimos sobre constitucionalismo aos seus educandos.
Contudo, o referido documento não preceitua o ensino de constitucional, a proposta pra a inserção dessa disciplina na grade curricular da educação básica está tramitando no Congresso Nacional por meio do projeto de lei nº 70 de 2015 que prevê a inclusão da disciplina constitucional no ensino base, o projeto de Lei do Senado nº 70 de 2015, que altera a redação dos artigos n.º 32 e 36 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional).
O referido projeto cita que é por meio do ambiente natural e social, do sistema político, do exercício da cidadania, da tecnologia, das artes e dos valores morais e cívicos em que se fundamenta a sociedade.
Pode se depreender a partir da proposta acima que a grande questão da educação contemporânea está ligada ao desconhecimento do ensino da educação cidadã, da educação democrática, sendo ministrada juntamente com as disciplinas tradicionais da escola, trabalhando o senso crítico e reflexivo dos alunos.
O estudo evidenciou a importância das escolas adotarem em seus currículos de ensino a disciplina específica de “constitucional”. Depreende-se que com a inserção dessa disciplina obrigatória, os alunos ao cursá-la na educação básica serão capazes de ter uma melhor compreensão das questões do Estado e da atuação política do cidadão, principalmente das questões relacionadas a cidadania, que por vezes é vista de forma limitada.
Observou-se que os documentos legais que norteiam a educação básica apesar ter como objetivo a construção da cidadania do educando não estão conseguindo de fato atingir esse propósito. Acredita-se com isso, que o ensino de constitucional preencheria essa lacuna na formação básica do aluno da educação básica.
REFERÊNCIAS
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[1] Psicóloga, Mestre, Professora da Disciplina de TCC I da Faculdade Serra do Carmo.
Pedagoga, Especialista. Acadêmica do 10º Período de Direito da Faculdade Serra do Carmo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: WALDOYANA DE KáCIA ALVES QUEIRóZ, . A importância do ensino de constitucional e da cidadania na educação básica Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 nov 2018, 04:45. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/52414/a-importancia-do-ensino-de-constitucional-e-da-cidadania-na-educacao-basica. Acesso em: 22 nov 2024.
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