RAMILLA MARIANE SILVA CAVALCANTE[1]
(Orientadora)
RESUMO: O presente trabalho analisa a perda do tempo útil e o dever de indenizar, voltando-se, a análise do valor social e jurídico do tempo. Primeiramente, será feita uma abordagem do tempo e a sociedade, com ênfase para a evolução da sociedade artesanal para a sociedade da informação, o valor do tempo, conceito, tempo livre e elementos da relação de consumo. Analisar-se-á, o dano moral nas relações de consumo, a dignidade da pessoa humana no contexto do estudo, o dever de indenizar e dano moral e mero aborrecimento. Por fim, a pesquisa se voltará para a questão do tempo como bem jurídico, com destaque para a indenização satisfativa e não enriquecimento sem causa. Para melhor compreensão, abordar-se-á a tutela implícita na Constituição Federal Brasileira e ainda tutela da perda do tempo útil. O presente estudo foi produzido com base no método dedutivo, exploratório e descritivo, com técnica de pesquisa bibliográfica.
Palavras-chave: Tempo. Perda. Valor Jurídico. Valor Social. Indenização.
ABSTRACT: This paper examines the loss of good time and the duty to indemnify turning the analysis of social and legal value of time. First, an approach to time and society with emphasis on the evolution of small-scale society to the information society, the value of time, concept, leisure and consumer interface elements will be taken. , Will be examined moral damages in consumer relations, the dignity of the human person in the context of the study, the duty to indemnify and moral damages and mere annoyance. Finally the research will turn to the question of time as well as highlighting the legal satisfativa compensation and no unjust enrichment, for better understanding will address itself to implicit protection in the Brazilian Federal Constitution and further protection from the loss of good time. This study was produced based on the deductive, exploratory and descriptive method, technique literature.
Keywords: Time. Loss. Legal value. Social Value. Indemnification.
1. INTRODUÇÃO
O presente estudo trata da perda do tempo útil e o dever de indenizar. Sabe-se, que hoje vivemos em uma constante busca por mais tempo, cada minuto pode representar um divisor de águas para aqueles em que o relógio é primordial na determinação de suas tarefas diárias, e um minuto desperdiçado coloca em dificuldade toda a programação do indivíduo.
Nota-se, que a questão do tempo parecer cada vez mais corrido, mais curto, reside no modelo de sociedade que se vive hoje. Sociedade em que a evolução parece ter perdido o freio, e a forma encontrada por nós de acompanhá-la é correr cada vez mais rápido, por isso, o tempo passou a ser valorado tanto em aspectos sociais como jurídicos.
O presente estudo busca compreender como e de que forma, o tempo passou a ter valor diferente de outrora, e também, o que vem a ser o tão invocado instituto do tempo útil e suas características sociais e jurídicas, buscando compreender como a sociedade se comporta ante a dificuldade de coordenar o tempo.
Nem sempre das relações de consumo respeita-se aquilo que pressupõe a lei (Código de Defesa do Consumidor), e a violação da norma enseja a depender da situação o dano moral. Por isso abordar-se-á quando esse dano fere a dignidade da pessoa humana, como os tribunais valoram a indenização e por fim quando em uma relação de consumo o incômodo causado ao consumidor pelo fornecedor ou prestador de serviço deixa de ser um mero aborrecimento e passa a ser dano moral.
A partir dessas relações de consumo advém o dano moral que engloba as lesões a direitos subjetivos da pessoa, como por exemplo, os sentimentos, a dignidade da pessoa humana, e assim sendo os tribunais passaram a ter o dever ressarcir aqueles que forem moralmente lesados, desde que consiga comprovar a lesão e que esta ultrapassou o limite de um mero aborrecimento.
Não é licito que o consumidor perda tempo, ora escasso na sociedade da informação, para resolver problemas decorrentes dos bens concebidos, exatamente com o objetivo de lhe poupar tempo. Nesse contexto, não a que se falar em mero aborrecimento em decorrência de dano causado pelo fornecedor, mas, de dano moral configurado.
2. DESENVOLVIMENTO
2.1 DANO MORAL NAS RELAÇOES DE CONSUMO
O dano moral nas relações de consumo, buscando relacionar a obrigação do fornecedor em relação à perda do tempo útil do consumidor. A questão específica do dano material deixa de ser abordado, pois sobre ele não recai nenhum ponto de controvérsia.
Inicialmente faremos um breve comentário sobre direitos humanos, o qual envolve uma série de direitos e liberdades civis e públicas de maneira que a contemplação desta expressão de forma simples compõe uma série de benefícios à coletividade. Todavia, a ausência do mesmo impede que sejam aplicados alguns princípios, como o princípio da igualdade e dignidade da pessoa, “atributos irrenunciáveis e inalienáveis”. HAONAT, (2007, p 57).
A designação de direitos humanos abrange pela concepção de Estado Democrático de Direito os aspectos éticos, culturais, sociais e econômicos. Contudo, as relações de mercado, na prática, privilegiam apenas o lucro; o capital tem valor maior que a vida humana. O entendimento dos doutrinadores, tanto quanto a lei e jurisprudência, tem sido essencial na busca pela proteção do mais fraco, considerando como mais fraco todo o tipo de hipossuficiência, inclusive, a anteriormente citado: econômica, de informação disponibilizada pelo fornecedor, e técnica. JUNQUEIRA, (2005, p 38).
Nesse sentido, o mesmo autor cita Fábio Konder Comparato, (2005, p 38). Leciona que a norma deve ser aplicada a todos. Vejamos:
[...] essa convicção de que todos os seres humanos têm direito a ser igualmente respeitados pelo simples fato de sua humanidade, nasce vinculado a uma instituição social de capital importância: a lei escrita, como regra geral e uniforme, igualmente aplicada a todos os indivíduos que vivem numa sociedade organizada.
Dessa forma, o fraco e o forte se igualam levando em consideração a desigualdade entre ambos, princípio da isonomia Constitucional artigo 5º “caput”, para questionar em juízo o Direito do Consumidor, o que de outra forma seria impossível. Assim, o mais fraco tem amplas condições de responder ao insulto do maior, que nesse contexto é o furto do tempo útil do consumidor hipossuficiente.
Para equilibrar essa igualdade material é necessário a intervenção do Estado para garantir os direitos dos mais fracos. Proposição que nos remete à Revolução Francesa que trouxe a ideia de liberdade, igualdade e fraternidade.
A base dos Direito do Consumidor é a Constituição Federal e a parte da filosofia que cuida dos valores humanos (axiologia). Nesse contexto, o direito do consumidor evoluiu do Princípio do Favor “debilis” ao Princípio de proteção e liberdade do mais fraco, Princípio do favor “Libertatis” que também é aplicado sempre de forma desfavorável a quem determinou as cláusulas contratuais ”contra stipularem”.
Esse crescimento do Direito Privado trouxe grandes mudanças no decorrer da história, que até então, se preferia amparar o credor e o crédito, por este ter desprendido seu patrimônio em favor daquele. Mas ocorreu à grande evolução do Direito do Consumidor com o advento da CF/88, antes disso, o devedor de uma obrigação era considerado o próprio objeto da obrigação, de modo que, o devedor de uma obrigação era passível de ser escravizado juntamente com sua família, além de ser permitida, a hoje extinta, prisão civil em decorrência de dívida.
A evolução se deu no sentido de considerar o devedor como Sujeito de Direito, com autorização para permanecer livre apesar da obrigação, Princípio conhecido como favor “Libertatis”. MARQUES, (2007.p.30-31).
Na sociedade moderna de consumo e capitalista, é impossível permanecer em vigor o instituto da prisão por dívidas. Em virtude, do grande número de transações comerciais necessariamente efetuadas. Se, o instituto estivesse em vigor, à economia estaria em constante declínio. Porquanto, se formaria uma cadeia de excluídos da sociedade, em razão da prisão civil, e como todas as relações comerciais são em escala, ter-se-ia então, o efeito conhecido como dominó que levaria a sociedade ao fracasso econômico.
Os ensinamentos de Dessaune (2011) corroboram com o atendimento ao consumidor baseado no princípio da isonomia. O doutrinador cita o artigo 28 “caput’ e respectivos parágrafos do Código de Atendimento do Consumidor-CAC, em que o tratamento ao consumidor deve ser personalizado, baseado na Igualdade, boa-fé e respeito, não pode haver discriminação”. Vejamos na íntegra o § 3º do mesmo diploma: “Igualdade consiste em tratar os consumidores essencialmente iguais de forma igual, e os essencialmente desiguais de forma desigual, isto é, buscar justiça para o caso concreto, o que diminuí a desigualdade naturalmente existente e não discrimina”. Dessaune, (2012, p 355).
A vida humana se constitui tanto pelos bens materiais quanto morais. A Carta Magna atribui o valor moral, ao valor ético-social tanto da pessoa quanto familiar, artigo 221, IV CRFB. O mesmo diploma tornou indenizável o valor moral em caráter individual, conforme depreende o artigo 5º, V e X da CRFB.
Ademais, a moral individual está diretamente ligada a honra do ser humano, e sua falta reduz a pessoa insignificância, motivo pelo qual, o respeito a integridade moral toma o formato de direito fundamental desse modo, todos tem direito de não ter a vida privada turbada por terceiros.
Dessa feita, Para José Afonso da Silva, “a honra é o conjunto de qualidades que caracterizam a dignidade da pessoa”, uma das referidas qualidades é o respeito ao cidadão. JOSÉ AFONSO DA SILVA (2008, p.201, 209).
O desrespeito ao direito do cidadão gera dano. Nos dizeres do doutrinador Nunes, dano é o prejuízo sofrido por uma pessoa, consequentemente causado por outrem. Está diretamente ligado a subtração do patrimônio da pessoa prejudicada. Sendo que, patrimônio é tudo aquilo que se encontra no âmbito material ou moral do ser humano. NUNES, (2010, p. 125).
2.2 A TUTELA DO TEMPO COMO BEM JURIDICO
Nesse contexto poderíamos estar tranquilos, ter nossas demandas resolvidas em tempo hábil, todavia o que acontece é exatamente o contrário, passamos horas ou até mesmo dias na busca por soluções para problemas simples provenientes das relações de consumo.
A par de tudo que temos para “facilitar” a vida é um contra-senso passarmos horas nas filas dos bancos para descontar um cheque já que hoje a realidade da compensação dos cheques é outra, muito mais rápida, 24 ou 48 horas, um ato que não corresponde a legitima expectativa do consumidor do século XXI, quando um milésimo de segundo é uma eternidade GUGLINSKIN, (2012, n/p).
Ao adquirir uma prestação de serviço com problemas ou um produto com defeito o consumidor já sofre com a decepção de não ter aquilo que almejou e ainda tem que perde seu precioso tempo tentando solucionar problemas que ele não buscou, precioso tempo sim, haja vista tratar-se de um bem jurídico.
Por razões que ultrapassam o aceitável no tempo de espera para a solução de problemas relacionados à relação de consumo é que os tribunais têm se posicionado no sentido de que esse “tempo perdido” pode ser valorado, como se nota na seguinte decisão:
“[...] A visão eclesiástica do tempo diz-nos que tudo tem o seu tempo determinado e há tempo para todo propósito debaixo do céu: há tempo de nascer e tempo de morrer; tempo de chorar e tempo de rir; tempo de abraçar e tempo de afastar-se; tempo de amar e tempo de aborrecer; tempo de guerra e tempo de paz. [...] A questão é de extrema gravidade e não se pode admiti-la, por retóricas de tolerância ou de condescendência, que sejam os transtornos do cotidiano que nos submetam a esse vilipêndio de tempo subtraído de vida, em face de uma sociedade tecnológica e massificada, impessoal e disforme, onde nela as pessoas possam perder a sua própria individualidade, consideradas que se tornem apenas em usuários numerados em bancos informatizados de dados [...]”. Apelação Cível 230521-7, julgada pela 4ª Câmara Cível do TJ-PE.
Nesse contexto se observa o quão valoroso se tornou o tempo uma compreensão positiva para os consumidores haja vista quiçá somente a punição (em forma de pecúnia) daqueles que roubam o nosso tempo possa fazê-los entender o real valor de meia hora perdida para o consumidor que vive assoberbado tentando nessa correria diária tornar o seu tempo o mais proveitoso possível. Afinal todos certamente concordarão que meia hora perdida a espera de um atendimento pode suprimir do consumidor o direito de almoçar com sua família, brincar com seu filho, descansar para a volta ao trabalho e tantas outras incontáveis coisas que se poderia fazer.
Ademais o exemplo de meia hora aqui utilizado é no mínimo modesto em face do montante de horas que desperdiçamos diariamente a espera na fila do banco, quando temos que nos desgastar por horas para a troca de um produto e por muitos outros inúmeros motivos, e o mais interessante é que no momento de se adquirir um bem hoje tem as maiores facilidades possível, assim sendo a máxima deveria e repetir quando dessa aquisição surgisse um problema a ser solucionado.
3.3 INDENIZAÇÃO SATISFATIVA E NÃO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA
Antes de passar ao exame da questão, de a indenização ser meramente satisfativa e não ocorrer o enriquecimento sem causa cabe conceituar o dano moral direto. Que é a lesão a interesse que pretende aparar um bem jurídico ideal ou extrapatrimonial inerente aos diretos da personalidade.
Deve se entender que o dinheiro da indenização não paga a dor sofrida, pois, não se estipula preço a sentimento. Porém, procura se compensar o bem tirado da pessoa lesada, diminuindo os efeitos da perda. Em momento algum se pretende aumentar o patrimônio do lesado, e nada impede que a moral tenha reparação pecuniária. Apesar de que, não há valor suficiente para esse tipo de reparação. DINIZ, (2010, p. 94, 95, 96, 97).
Nesse sentido, aquele que diminui o tempo da vida de outrem, roubando-o, deverá repará-lo. A Apelação Cível nº 230521-7–TJPE, trouxe nos fundamentos o entendimento de Bonaparte sobre a importância do tempo, como justificativa do dever de indenizar. Na apelação está descrito, que os ladrões dos bens mais preciosos ”tempo” não recebem castigo.
Segundo a doutrinadora Maria Helena Diniz (2010), o dano moral não pode ser visto como enriquecimento sem causa. Não se repara dessa forma os bens do lesado, porquanto, o bem violado foi extrapatrimonial. Não pode haver confusão entre os dois institutos, do dano moral e o do dano material. Não há nesse sentido discussão sobre o aumento do patrimônio do lesado, sem que esse desembolse valor, porque não existe ofensa ao patrimônio pecuniário das partes, e sim ofensa direta a um bem contido na personalidade.
O que existe é apenas reparação civil em razão do dano extrapatrimonial, sendo que, faz parte apenas ao patrimônio ideal do ser humano. O qual, jamais poderá ser desvalorizado. Entre eles estão os valores que regem o convívio harmônico social. Sobre a diferença entre enriquecimento sem causa e compensação moral pecuniária, Leciona a mesma autora.
“[...] Enriquecimento sem causa, pois o credor teria, com a reparação do dano moral, um aumento patrimonial, sem que antes tivesse tido nenhum desembolso. Entretanto, é bom lembrar que a ordem jurídica apenas os bens econômicos. Deveras, a inviolabilidade do domicílio, o bom nome, a honra, a vida, o decoro, a liberdade gozam de tutela jurídica, construindo assim um patrimônio ideal que se compõe de bens íntimos e subjetivos. A reparação pecuniária não pretende refazer o patrimônio, visto que este, em certos casos, não sofreu nenhuma diminuição, mas dar ao lesado a compensação, que lhe é devida, pelo que sofreu, amenizando as agruras oriundas do dano não patrimonial [..]”. (DINIZ, 2010 p.99). (Grifo nosso).
A jurisprudência é ampla no sentido de que o objetivo da pretensão é satisfativa. Veja o acórdão do TJPR:
TJ-PR - Inteiro Teor. 875162-2 (Acórdão) (TJPR). Data de publicação: 31/10/2012. Décima Terceira Câmara Cível. Relator: Juiz Fernando Wolff Filho, em substituição ao Des. Luiz Taro Oyama.
Decisão: nesse campo possui objetivo duplo: ”satisfativo-punitivo ". É que nas palavras do autor, "por um lado, a paga... em substituição ao Des. Luiz Taro Oyama. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇAO POR DANOS MORAIS.... ENTRE AS PARTES. RELAÇAO DE CONSUMO POR EQUIPARAÇAO (ART. 29 DO CDC). RESPONSABILIDADE OBJETIVA (ART. 14.) (Grifo nosso).
O Relator fundamenta o voto, se valendo dos ensinamentos de Nunes, para lecionar que, o objetivo da indenização é satisfativa. Sendo que, o pagamento em moeda corrente servirá para proporcionar ao lesado além da satisfação, compensação para amenizar a dor e punição para infrator do Direito.
Esse é o caráter satisfativo da indenização, Diniz também leciona no mesmo sentido:
“A reparação em dinheiro viria neutralizar os sentimentos negativos de mágoa, dor, tristeza, angústia, pela superveniência de sensações positivas, de alegria, satisfação, pois possibilita ao ofendido algum prazer, que em certa medida, poderia atenuar seu sofrimento”. DINIZ, (2009, p.110).
Dessa forma, a dor é amenizada em razão da alegria, o valor pecuniário é apenas meio para atrair certa alegria. Assim, se configura a indenização satisfativa e não há que se falar em enriquecimento sem causa.
Os juízes não devem arbitrar valores muito pequenos para servir de reparação civil, porque podem ter efeito contrário e servir de estímulo ao ofensor. Além de, nada satisfazer ao ofendido. DINIZ, (2009, p.108).
Assim, ao invés de ocorrer à compensação, com efeito, satisfativo e punitivo apenas ocorrerão à sensação de impunidade do ofensor.
2.3.1 A PERDA DO TEMPO ÚTIL E O DEVER DE INDENIZAR
As citações abaixo são uma forma de buscar demonstrar o quanto o tempo é valioso, e com o seu desperdício pode fazer a diferença na vida das pessoas, desde texto sagrado, a determinação da vida, os prazos processuais até a letra da música o tempo é colocado como algo imprescindível. Quando no texto sagrado cita que a “tempo de nascer e tempo de morrer”, daí já se pode ter uma ideia do quanto esse bem é irrenunciável.
Para tudo há uma ocasião, e um tempo para cada propósito debaixo do céu: tempo de nascer e tempo de morrer, tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou, tempo de matar e tempo de curar, tempo de derrubar e tempo de construir, tempo de chorar e tempo de rir, tempo de prantear e tempo de dançar, tempo de espalhar pedras e tempo de ajuntá-las, tempo de abraçar e tempo de se conter, tempo de procurar e tempo de desistir, tempo de guardar e tempo de lançar fora, tempo de rasgar e tempo de costurar, tempo de calar e tempo de falar, tempo de amar e tempo de odiar, tempo de lutar e tempo de viver em paz. (ECLESIASTES 3:1-8).
O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) José Antonio Dias Toffoli extinguiu a Ação Rescisória (AR) 40122 por ter sido ajuizada um dia depois do prazo limite em que seria possível á União propô-la. No mérito, era questionado acórdão (decisão colegiada) proferido no Recurso Extraordinário (RE) 169050/RS, no qual a Segunda Turma do Supremo reconheceu no Fim social as características de contribuição social para a seguridade. (NOTÍCIAS STF, 07 DE JULHO DE 2010).
O vento toca o meu rosto, me lembrando que o tempo vai com ele. Levando em suas asas os meus dias, desta vida passageira. Minhas certezas, meus conceitos, minhas virtudes, meus defeitos Nada pode detê-lo. O tempo se vai. Mas algo sempre guardarei. O teu amor, que um dia eu encontrei. [...]. (O Tempo, Compositor: JUNINHO AFRAM).
Cumpre ressaltar também que o direito deve valorar as coisas conforme a evolução, o anseio humano e a necessidade, nesse sentido fazem-se necessário um parêntese sobre a Teoria Tridimensional do Direito de Miguel Reale que defende que “todo fato (acontecimento, ação) possui um valor (aspecto axiológico) e para tal uma determinada norma jurídica”, logo “fato valor e norma”, ou seja, o fato já existe e resta demonstrado, haja vista o reconhecimento pelos tribunais da perda do tempo útil, o valor também, pois com o passar das épocas o tempo ganhou conotações diferentes, faltando somente uma norma que o reconheça para assim dá segurança e proteção jurídica a quem tem usurpado esse direito.
Igualmente no decorrer dessa pesquisa em que muito se falou das regras e ciências que cercam a sociedade hodierna, suas limitações e angústias pelo desrespeito daqueles que detêm as técnicas produtivas e de serviços ou dominam por meio do poder econômico concentrado e suas mãos.
No modelo de sociedade atual, o mercado de trabalho exige cada vez mais criatividade de seus colaboradores e tem se notado que para um melhor rendimento esse colaborador necessita ter uma melhor qualidade do seu tempo livre. A teoria do Òcio criada por de De Masi, a qual já ganha espaço nas grandes empresas, como especificado no item 1.4, é essencial para se obter mais e melhores resultado, algo almejado pelo empregador e importante para a construção da sociedade atual e futura.
Considerando a grande massa consumerista a alta tecnologia a massificações dos aparelhos eletrônicos e a substituição das técnicas manuais e arcaicas pelas tecnologias de ponta, surge nesse momento uma indagação, pois a par de tantas “facilidades” se verifica constantemente algum tipo de abuso pelos fornecedores em face do consumidor.
A Ascensão da tecnologia deverá contribuir com a melhoria na comunicação entre pessoas, com a liberação dos recursos produtivos, conforme leciona Dessaune, (2012), e não, para prender o tempo dos consumidores em solver problemas causados pelos grupos fornecedores.
Os Tribunais têm reconhecido ainda de forma tímida o direito ao tempo livre, como objeto de reparação civil, caso seja usurpado, mas, a Constituição de forma implícita já garante o lapso temporal como fonte de direito desde sua criação. O mesmo pode ser verificado nas garantias constitucionais, tais como: Direitos sociais, Art. 6º, de tempo ao lazer, direito à vida (a mesma não pode ser desperdiçada, porque tempo é vida, conforme Vitor Guglinskin), a liberdade, o consumidor deverá ter liberdade para escolher como usar seu tempo produtivo DESSAUNE, (2012).
Encontramos também a tutela no artigo LXXVIII da CF, na declaração do direito a razoável duração do processo. Além de outros diplomas garantidores do lapso temporal como direito tutelado, exemplo no item 3.3.
A lei maior artigo 5º positiva que “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. Perante a normativa, não ha como deixar de garantir pelas vias judiciais o direito ao Òcio do consumidor. Se ocorrer a não tutela legal do tempo, o fornecedor ficará impune e livre para esbulhar o tempo do consumidor, com isso, diminuir seu tempo de vida, do consumidor que o tempo passa rápido e não volta.
Ante as considerações mencionadas a justificativa da tutela da perda do tempo útil se torna perfeitamente possível, quiçá só o seu reconhecimento possa coibir os abusos que o consumidor sofre diariamente, fazendo com que fornecedores e prestadores de serviços sintam de fato que não ficarão impunes caso violem o tempo útil de outrem.
2.4 DEVER DE INDENIZAR NOS TRIBUNAIS
Com o advento da Constituição de 1988 e a progressão da informação, os brasileiros despertaram em relação a vários direitos tutelados pelo Estado, dentre eles esta o de ser ressarcido pelo dano moral sofrido.
Dispõe a norma civil, que quando alguém causar dano/prejuízo a outrem, ainda que na esfera moral, terá que reparar. (Código Civil Brasileiro, artigo 927). O vocábulo dano provém do Latim “damnum”, o efeito de damnare, ou seja, toda ofensa a um bem jurídico. EFING, (2005, p. 169).
O objeto da pesquisa apresentado abrange apenas dano moral, ou seja, tudo que está diretamente ligado ao íntimo, honra paz interior, alma, ao patrimônio ideal, do ser humano. O que não tem valor econômico atribuído, mas, que lhe cause dor, sofrimento, tanto físico como psicológico tudo que traz prejuízo à moral. NUNES, (2010, p. 126)
O dano moral ou psicológico nunca deve ser confundido com o resultado do evento danoso. Porque muitas vezes a lesão não é gerada pelo ato em si, mas, pelo resultado do evento, que é o abalo emocional. Isso porque o ato danoso é diferente do resultado provocado por tal atitude.
Se o dano, não afeta de forma negativa ao patrimônio contábil, é classificado como dano moral. Esse aflige o ser humano em direitos. RUI STOCO, (2011, p. 1873).
O Código Doutrinário de Dessaune Código de Atendimento do Consumidor-CAC artigo 31, enumera as espécies de prejuízos ou danos que o fornecedor esta proibido de causar aos consumidores, se infringir deverá repará-los; quais sejam, dano ambiental, material, imaterial ou moral e desvio produtivo. A problemática do trabalho em comento recai sobre as duas últimas hipóteses possíveis de dano. As mesmas estão dispostas no artigo 31, III, do referido Código.
[...] desvio produtivo, caracterizado quando o consumidor, diante de uma situação de Mau atendimento, precisa desperdiçar o seu recurso produtivo limitado “tempo” e desviar as suas “competências” de uma atividade necessária ou por ele preferida para tentar resolver um problema criado pela empresa, a um custo de oportunidade indesejado, de natureza irrecuperável; [...]. (DESSAUNE2012, p 359).
A reparação em comento é arbitrada em pecúnia. O valor recebido pelo prejudicado será para reparar o dano causado, ou pelo menos, tentar amenizá-lo. Sendo que, o valor imposto ao causador, é de natureza pedagógica, afim, de impedir que o mesmo volte a praticar atos ofensivos aos semelhantes. NUNES, (2010, p. 126)
Pois bem, como já dito, em repressão ao agravo do dano moral provocado, surgiu o “quantum” indenizatório, justamente para amenizar, ou se possível, aproximar ao “status aquo” antes do abalo emocional sofrido pelo indivíduo. (NUNES; 2010, p. 126).
Importante destacar, que o dano moral e material pode ser cumulativo sobrevindo do mesmo fato, súmula n º 37 do Superior Tribunal de Justiça. (NUNES, 2010, p. 125). No CDC esta expresso, no artigo 6°,VI, a indenização por danos morais. O qual, já havia disposição no artigo 5º, X da Suprema Carta de 1988.
Além da visão normativa positivada no Código Civil Brasileiro, pontua o doutrinador Dessaune, (2012), que, com evolução da responsabilidade civil, surgiu novo modelo de investigação relacionado ao dano indenizável. Antes, a investigação tinha por base o ato ilícito, agora, a hipóteses de dano moral indenizável devem ser estendida ao dano injusto.
Nos dizeres de Dessaune, o dano é injusto, mesmo que advenha de conduta lícita. Desde que, afete aspecto fundamental da dignidade humana e lesiona a integridade psicofísica da pessoa, contraria normas constitucionais e infraconstitucionais, deverá ser indenizável. Ao aplicar o princípio da dignidade da pessoa humana na teoria da responsabilidade civil, se determina o injusto dano gerado e sua quantificação. DESSAUNE, (2012, p. 69,70).
De maneira considerável, algumas Cortes Pátria, vêm adotando à tese da perda do tempo útil pela má prestação de serviços ao consumidor. O crescimento da nova modalidade de dano indenizável não deve ser confundido com banalização do dano moral. Mas, como reconhecimento da lesão temporal, que precisa ser barrada pelo ordenamento jurídico e sua proteção jamais poderão ser negados, por se confundir com a indústria do dano moral. Haja vista, serem direitos tutelados pela nossa legislação. MELO, (2013, p. 63).
O Portal âmbito jurídico publicou um artigo sobre perda do tempo útil do consumidor. Considerando o entendimento do juiz de Direito do TJPE, Luiz Mário Moutinho, que emitiu segundo o artigo o seguinte parecer sobre o assunto:
A sensação do tempo é algo que varia com o tempo. Veja o exemplo dos computadores. Temos um equipamento que têm um processador com certa velocidade, e depois compramos outra máquina mais rápida alguns milésimos de segundos, e logo achamos que o PC antigo é lento demais.
Da mesma forma as pessoas mais velhas viveram num tempo onde passavam horas nas filas dos bancos para descontar um cheque ou esperavam dias para que um cheque depositado fosse compensado.
Hoje a realidade da compensação dos cheques é outra, muito mais rápida, 24 ou 48 horas. Porém, permanecer horas na fila de um banco não corresponde à legitima expectativa do consumidor do século XXI, quando um milésimo de segundo é uma eternidade.
O tempo é hoje um bem jurídico e só o seu titular pode dele dispor. “Quem injustificadamente se apropria deste bem, causa lesão que, dependendo das circunstâncias pode causar dano que vai além do simples aborrecimento do cotidiano, ou seja, dano moral. (GUGLINSKI, 2012, p. s/p).
Não há duvida, que o tempo do consumidor é a própria vida, então, não poderá ser desperdiçado. Haja vista, a vida é um lapso temporal curto, considerando a média de vida humana de 70 (setenta anos), conforme artigo publicado pelo médico Dráuzio Varella. (Varela, 2014).
Na AC nº 230521-7, o Magistrado Luiz Mário, enfatiza que o tempo é um bem jurídico que não pode ser disposto, a não ser, pelo próprio titular. Também, enfoca no terceiro parágrafo de sua fala, a importância do tempo nessa relação, na qual, equipara um milésimo de segundos, à eternidade. Dessa forma, quando a má prestação de um serviço aflige a paz, tranquilidade e rouba parte do tempo considerado vida da pessoa, deverá reparar. Lembrado que, os direitos acima são inerentes à dignidade da pessoa humana. Nessa mesma linha, a 4ª Câmara Cível do TJPE julgou a apelação nº230521-7.
Condenando, o condenou o Banco do Brasil a pagar a uma consumidora o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização, por ter passado 3h56min na fila aguardando atendimento.
O Relator do processo Desembargador Eurico de Barros Correia, citou sabiamente os ensinamentos de Charles Darwin, Napoleão Bonaparte, e o escritor francês Victor Hugo, entre outros. Inclusive, traça considerações pessoais e eclesiásticas para fundamentar sua decisão enfocando sempre o valor do tempo e considerando sua subtração ato gravíssimo passível de reparação.
Vejamos na íntegra as citações usadas pelo Desembargador:
Citando de Charles Darwin ("o homem que tem a coragem de desperdiçar uma hora de seu tempo não descobriu o valor da vida") a Napoleão Bonaparte ("há ladrões que não se castigam, mas que nos roubam o bem mais precioso: o tempo"), Jones Figueirêdo Alves dissertou sobre o vilipêndio do tempo, quando o tempo da vida das pessoas se torna refém de outro, muitas vezes de um outro institucionalmente não individualizado - apontando como questão de extrema gravidade a subtração do tempo por defeitos do serviço bancário. Apelação Cível nº 230521-7 – 4ª CÂMARA CÍVEL –TJPE
Continua a fundamentar o voto afirmando que a vida do homem é sutilmente roubada em forma de tempo perdido, na verdade usurpado. O tempo vai e não volta, a vida passa de forma silente, segundo Shakespeare passa como uma sombra. Nesse ínterim, concluímos que o precioso tempo da vida contemporânea vira refém de interesses de terceiros.
No quinto parágrafo do voto em comento, o julgador fala da sociedade, em que os mais ricos, compram as horas de vida dos mais pobres. Não há melhor forma para definir o objeto dessa pesquisa, a não ser utilizando a interpretação do Desembargador que menciona: ‘‘[...] uma sociedade onde os seres nela existentes viviam em função das horas disponíveis na sua contabilidade da vida, os mais ricos comprando as horas de vida dos mais pobres [...]”. Apelação Cível nº 230521-7 – 4ª CÂMARA CÍVEL –TJPE.
O voto foi parcialmente transcrito, por especificar de forma singular tanto o valor, quanto, importância da tutela legal do tempo. Do texto se extrai que o tempo é tão precioso, ao ponto de merecer tutela legal explícita, e que todos que o desrespeitar merece ser penalizado.
Mas ainda não temos essa cultura de respeito natural entre fornecedor e consumidor, sempre a parte hipossuficiente fica em desvantagem. O consumidor para ver seus direitos resguardados tem que contratar advogado e entrar nas longas filas do judiciário, o que gera além do dano moral, também dano material. Razão pela qual, o magistrado deve aplicar no caso concreto, o caráter pedagógico da pena, para desestimular futuras práticas abusivas e diminuir os prejuízos sofridos.
Ressalta-se, que o magistrado deverá impor um valor pecuniário suficiente à propiciar algum momento de distração ou bem estar. Se isso for capaz!. Porque para o lesado a melhor opção seria nunca ter sofrido o dano, por maior que seja o valor da indenização. Sendo que, não há quantia capaz de corresponder economicamente de forma integral ao valor íntimo do bem lesado. DINIZ, (2010 p.97,98,99). Pré leciona Nehemias, que ocorrendo dano à pessoa, o responsável pela lesão ao direito terá que restabelecer tanto a ordem quanto o direito que foi rompido. NEHEMIAS, (2004, p.09).
Voltando aos ensinamentos da doutrinadora Maria Helena (2010), o dano moral jamais deve ser analisado com a ótica do enriquecimento sem causa, e também não pode ser confundido com tal instituto. Pois, não está em discussão o aumento do patrimônio do ofendido sem que esse desembolse valor, porque nesse caso, não existe ofensa ao patrimônio pecuniário, por nem uma das partes.
O que existe é apenas reparação civil por ter causado dano extra patrimonial ou ao patrimônio, sendo que, faz parte apenas ao patrimônio ideal do ser humano. O qual, jamais poderá ser desvalorizado. Entre eles estão os valores que regem o convívio harmônico social. Sobre a diferença entre enriquecimento sem causa e compensação moral pecuniária, Leciona a mesma autora.
“[...] Enriquecimento sem causa, pois o credor teria, com a reparação do dano moral, um aumento patrimonial, sem que antes tivesse tido nenhum desembolso. Entretanto, é bom lembrar que a ordem jurídica apenas os bens econômicos. Deveras, a inviolabilidade do domicílio, o bom nome, a honra, a vida, o decoro, a liberdade gozam de tutela jurídica, construindo assim um patrimônio ideal que se compõe de bens íntimos e subjetivos. A reparação pecuniária não pretende refazer o patrimônio, visto que este, em certos casos, não sofreu nenhuma diminuição, mas dar ao lesado a compensação, que lhe é devida, pelo que sofreu, amenizando as agruras oriundas do dano não patrimonial [...]”. (DINIZ, 2010 p.99).
Os Tribunais brasileiros vêm reconhecendo a necessidade de aplicar um “quantun” capaz de compensar a perda do tempo, embasando as decisões na teoria de Dessaune.
O Tribunal do Rio de Janeiro é assente nesse contexto, coleciona vários julgados nessa linha. A 27ª Câmara deu provimento ao recurso interposto pela consumidora (Apelação Cível n° 2216384-69.2011.8.19.0021), o processo teve como relator o Des. Fernando Antônio de Almeida, foi considerado desvio produtivo do consumidor em razão da consumidora haver comprado aparelho celular com vício do produto.
Compulsando o acórdão, verifica-se que a página 172 (cento e setenta e dois), o desembargador afasta o mero aborrecimento e caracteriza dano moral, decorrente do lapso temporal, gasto pelo consumidor para ver solucionado o problema que a ré lhe causou, o relator, considerou esse interregno, como impacto negativo a vida do consumidor.
Além dessas, temos várias outras decisões que poderão ser encontradas no “sitio” do TJ-RJ. Como Apelação Cível 0019108-85.2011.8.19.0208, Apelação Cível 0460569-74.2012.8.19.0001.
A corte publicou o recente julgado que envolve a matéria. Observe:
TJ-RJ - APELACAO APL 00350920820128190004 RJ 0035092-08.2012.8.19.0004 (TJ-RJ). Data de publicação: 12/03/2014.
Ementa: APELAÇÃO CÍVEL ¿ DIREITO DO CONSUMIDOR ¿ AÇÃO SOB O RITO SUMÁRIO ¿ DEMORA NA FILA DO BANCO ¿ CONSUMIDOR QUE PERMANECEU ESPERANDO POR APROXIMADAMENTE UMA HORA E MEIA NA FILA DO BANCO SENTENÇA QUE JULGOU PROCEDENTE O PLEITO AUTORAL PARA CONDENAR O RÉU AO PAGAMENTO DE R$ 3.110,00 DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - APELA A EMPRESA RÉ AFIRMANDO QUE SE O CONSUMIDOR FICOU NA FILA, FOI POR SUA ESCOLHA, JÁ QUE OFERECE TERMINAIS DE AUTO-ATENDIMENTO ¿ CONTINUA AFIRMANDO QUE NÃO HÁ PROVAS DE QUE O AUTOR FICOU REALMENTE NA FILA DO BANCO POR DUAS HORAS, POIS PODERIA TER PEGO A SENHA, SAÍDO DA FILA E RETORNADO MAIS TARDE ¿ POR FIM, ALEGA QUE A DEMORA NA FILA CONSTITUI MERO ABORRECIMENTO, O QUAL NÃO GERA DANO MORAL, NOS TERMOS DA SÚMULA 75 DO TJRJ ¿ NÃO ACOLHIMENTO ¿ O RÉU NÃO SE DESINCUMBIU DO ÔNUS DE DEMONSTRAR FATO IMPEDITIVO DO DIREITO DO AUTOR - RESTOU CARACTERIZADA A VIOLAÇÃO AO DEVER DE QUALIDADE ¿ FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO ¿ DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR - SÃO INACEITÁVEIS AS ALEGAÇÕES DO APELANTE DE QUE O AUTOR PODERIA TER REALIZADO O PAGAMENTO DAS CONTAS POR TERMINAIS DE AUTOATENDIMENTO, UMA VEZ QUE CABE A ESTE OPTAR PELO MEIO QUE AVALIE MAIS CONVENIENTE, CABENDO, POR CONSEGUINTE, AO BANCO DISPONIBILIZAR UM SERVIÇO DE QUALIDADE, O QUE NÃO SE VERIFICOU - DESSA FORMA, ENTENDE-SE QUE OS FATOS NARRADOS PELO CONSUMIDOR ULTRAPASSAM O MERO ABORRECIMENTO COTIDIANO, EM RAZÃO DE TER ESPERADO NA FILA DO BANCO POR QUASE 02 HORAS, PERDENDO TEMPO PRODUTIVO, ENSEJANDO O DEVER DE INDENIZAR. DESPROVIMENTO DO RECURSO. (Grifo nosso).
O Colegiado considerou a tese do desvio produtivo em razão do consumidor ter passado 02 (duas) horas na fila de um banco. E também, por ter afastado hipótese de mero aborrecimento.
Antigamente o tempo gasto para resolver matéria de consumo era tratado pelos tribunais como mero aborrecimento simples, dissabor da vida moderna. Mas, os tribunais brasileiros estão evoluindo e aderindo a nova tese doutrinária que atribui responsabilidade civil, ao fornecedor que descumpre um dos princípios básicos do Código de Atendimento ao Cliente-CAC. Isto é liberar os recursos produtivos, para que o consumidor possa utilizá-lo como lhe aprouver.
Responsabilizando o fornecedor, pelo tempo em que o consumidor irá dispor para solver problemas criados pelo fornecedor. (artigo 1°,§ 3º do CAC 2011. DESSAUNE (2012, p. 342).
A corte do Rio Grande do Sul julga nesse sentido há algum tempo, o acordão abaixo foi publicado no ano de 2012.
TJ-RS - Recurso Cível 71003680824 RS (TJ-RS). Data de publicação: 16/07/2012. Ementa: RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. VÍCIO DO PRODUTO. PRAZOS DE GARANTIA LEGAL E CONTRATUAL QUE SE SOMAM. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 50 DO CDC. PRECEDENTES DA TURMA. PRODUTO NÃO REPARADO NO PRAZO DO ARTIGO 18, § 1º, DO CDC. AGRAVAMENTO DA CONDIÇÃO DE VULNERABILIDADE DO CONSUMIDOR. "DESVIO PRODUTIVO DO CONSUMIDOR" PELO TEMPO DESPERDIÇADO. DANO EXTRA REM. DANOS MORAIS INDENIZÁVEIS. DIREITO À SUBSTITUIÇÃO DO PRODUTO OU À RESTITUIÇÃO DO PREÇO. DANOS MORAIS. RECURSO PROVIDO. (Recurso Cível Nº 71003680824, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Fabio Vieira Heerdt,...). (Grifo nosso).
Outros grandes colegiados jurisdicionais do país, como TJSP e TJPR, adotaram a nova tese do lapso temporal usurpado como dano moral indenizável. E não, como simples aborrecimento da vida moderna ou enriquecimento sem causa. A exemplo desses tribunais pode-se conferir os seguintes julgados Apelação Cível nº 0007852-15.2010.8.26.0038 julgada pela 5º Câmara TJSP e Apelação Cível 1.094 389-0 TJPR.
Não é licito que o consumidor perda tempo, ora escasso na sociedade da informação, para resolver problemas decorrentes dos bens concebidos, exatamente com o objetivo de lhe poupar tempo. Nesse contexto, não a que se falar em mero aborrecimento em decorrência de dano causado pelo fornecedor, mas, de dano moral configuração.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Infere-se do estudo que a ideia de valor do tempo foi aos poucos sofrendo transformações que foram influenciadas pela evolução social, na época da sociedade artesanal os indivíduos não tinham a mesma pressa que tem hoje era uma época de trabalhos artesanais em pequena escala e não havia necessidade de grandes produções, mas aos poucos essa sociedade foi sendo modificada e juntamente com ela novas demandas foram surgindo sendo, por exemplo, a necessidade do aumento da produção e esta exigia que se produzisse cada vez mais e melhor chegou então, a chamada sociedade da informação.
A partir desse novo modelo de sociedade o tempo passou a ser cada vez mais imprescindível, onde minutos deixam de ser algo de menor importância e passou a fazer toda a diferença no contexto produtivo e consequentemente na vida das pessoas que agora passaram a contabilizar e dividir o seu tempo com vistas à desenvolver as inúmeras solicitações da vida moderna.
Outra observação interessante no decorrer do estudo foi quanto ao conceito de tempo que apesar das considerações de alguns autores sobre o assunto nota-se não haver um conceito fechado do que seria o tempo, haja vista a relativização do que ele representa para cada pessoa em determinada época ou situação.
Entende-se também que acumulo de tarefas, a busca por mais tempo e as exigências da vida moderna fizeram surgir para o tempo outras conotações com a questão do tempo livre e o direito ao ócio, que é direito que tem cada indivíduo de ter tempo para outras coisas que não seja o trabalho.
Entretanto a teoria tempo livre e o direito ao ócio não surgiu somente das questões ligadas à produção e trabalho na verdade o grande norteador dessa teoria são as relações de consumo que são tidas como as que mais levam a perda do tempo útil.
Nesse ínterim, verificam-se como os elementos da relação de consumo o consumidor, o fornecedor, os produtos e os serviços.
Nos apontamentos sobre dano moral e mero aborrecimento restou demonstrado que trata de dois institutos distintos em que o primeiro tem a garantia legal tutelada e o segundo é apenas um leve impasse entre o indivíduo e o fornecedor ou prestador de serviço, todavia não se trata de uma celeuma jurídica.
No que diz respeito ao dano moral como uma forma de punição o estudo mostra que os tribunais têm compreendido que a valoração do dano leva em conta o efeito pedagógico e punitivo, com o objetivo de satisfazer a pretensão da vítima e evitar a repetição de condutas que lesem o consumidor.
Da análise do tema em questão contata-se a necessidade de se tutelar o tempo como bem jurídico, restando comprovado a tutela implícita presente na Constituição Federal Brasileira, bem como em outros institutos legais infraconstitucionais.
O estudo também apontou que a indenização buscada em virtude da lesão da perda do tempo útil não é uma indenização que possa ser vista como algo que ensejará o enriquecimento sem causa, haja vista a pretensão alcançada se de caráter satisfativo.
Ao final da análise pode-se concluir que é justificável a tutela da perda do tempo útil tendo em vista a evolução social, a sua proteção no texto Constitucional e outros institutos legais e o direito do indivíduo de poder dispor do seu tempo útil da forma que melhor lhe convier e não perdê-lo compulsoriamente em virtude de problemas gerados a partir de relações consumeristas.
5. REFERÊNCIAS
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<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2002/L10406.htm>. Acesso em: 09 de julho de 2018.
BRASIL. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Recurso Cível 71003680824 RS (TJ-RS). Disponível em: <http://www3.tjrs.jus.br/versao_impressao/imprimirjurisprudencia.php>. Acesso em: 09 de julho de 2018.
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DINIZ, Maria Helena, Curso de Direito Civil Brasileiro . vol 07 Responsabilidade Civil. São Paulo: 24ª ed, editora Saraiva, 2010.
EFING, Carlos Antonio, (coordenador) Direito do Consumo. Curitiba PR: 1ª ed, (2005,) editora Juruá, 1ª reimpressão 2008.
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HAONAT, Ângela Issa, O Direito Ambiental em face da qualidade de Vida, Em Busca do Trânsito e do Transporte Sustentáveis, São Paulo-SP: 1ª ed, Editora RCS, 2007.
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SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. São Paulo: 32º ed, editora Malheiros, 2009.
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[1] Graduada em Direito pela UFT, pós-graduada em Direito Eleitoral e Processo Eleitoral pela UFT e Grandes Transformações do Direito Processual pela UNISUL.
acadêmica do Curso de Direito, da Faculdade Serra do Carmo, Palmas Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DAMASCENO, Lúcia de Fátima Medeiros Cardoso. A perda do tempo útil e o dever de indenizar Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 jun 2019, 04:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53032/a-perda-do-tempo-util-e-o-dever-de-indenizar. Acesso em: 22 nov 2024.
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