Resumo: Com a crise econômica de 1929, iniciada nos Estados Unidos da América, o modelo de Estado Liberal sofre sua grande derrocada, alterando a livre regulamentação do mercado pela intervenção do Estado na economia, com respeito ao interesse público. Nesse diapasão, emerge o Estado do Bem-Estar Social, que adquiri uma força ainda maior no período pós-guerra, na segunda metade do século XX, trazendo um viés de atuação positiva bastante acentuada, com a população cobrando ações efetivas da Administração Pública para a resolução dos problemas comuns. Bem por isso, a tributação ganhou uma importância crescente, aliando a proteção aos direitos do cidadão com a necessidade arrecadatória do estado, visando à consecução do bem comum. Visto isso, a responsabilidade tributária por substituição, como forma de concentração da incidência tributária num único sujeito passivo, mesmo diante de uma produção em escala, reduz a possibilidade de evasão fiscal e, consequentemente, incrementa a arrecadação estatal. Atento a realidade, o legislador brasileiro disciplinou a figura do responsável tributário como sujeito passivo da obrigação tributária principal, por disposição em lei, atribuindo a terceira pessoa, relacionada ao fato gerador, responsabilidade pela obrigação tributária. Consolidou-se, assim, a responsabilidade tributária, principalmente na sua via por substituição, com fundamento na atual Constituição da República, no art. 150, § 7º, amparado na disposição genérica do art. 128, do CTN.
Palavras-chave: Responsabilidade Tributária por substituição. Regressiva e progressiva. Administração Fiscal.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Relação jurídico-tributária 2.1. Breve consideração da necessidade de tributar. 2.2. Relação jurídico-tributária: Hipótese de incidência, fato gerador, obrigação tributária e credito tributário. 2.3. Obrigação tributária: sujeitos ativo e passivo, objeto e causa. 2.4. Responsabilidade Tributária por substituição e por transferência. 3. Responsabilidade tributária por substituição: progressiva e regressiva. 3.1. Substituição tributária regressiva, antecedente ou para trás. 3.2. Substituição tributária progressiva, para frente ou subsequente. 4. Considerações Finais. 5. Bibliografia.
1. Introdução
No Direito Tributário, pelo próprio conceito de tributo, presente no artigo 3º, do CTN, como uma “prestação pecuniária compulsória”, houve vários métodos de burla a legislação, na forma de pagamento de tributos no valor inferior ao efetivamente devido ou mesmo o não recolhimento. Nessa seara, a linha de produção complexa, com várias atividades, de contribuintes distintos, para a produção final, acabava por gerar uma perda de tributos, por evasão fiscal, na linha de montagem do produto, quando não se onerava de sobremaneira um ou alguns dos empresários da linha de produção.
Otimizando o sistema tributário, por disciplina jurídica, definiu-se dois conceitos distintos para o sujeito passivo da responsabilidade tributária: o contribuinte e o responsável. Bem delimitados no CTN, consoante § Ù do art. 121, o conceito de responsável é negativo, exclui o de contribuinte, sendo este a pessoa com responsabilidade direta e pessoal que a situação de constituição do fato gerador; sendo aquele alguém que não constitua a condição de contribuinte e que tenha sua responsabilidade decorrente de disposição legal.
Nesse sentido, a responsabilidade tributária adquiriu status constitucional, prevista expressamente no art. 150, § 7º, do Texto Maior. Celeuma não haverá, portanto, para identificar o responsável e o contribuinte, este como sujeito passivo direto que consequentemente realiza o fato gerador, já esse é sujeito passivo indireto, por não ter relação de natureza econômica direta e pessoal com o fato gerador.
Tradicionalmente, o CTN classifica a responsabilidade em três divisões distintas, quais sejam a responsabilidade: dos sucessores (art. 129 a art. 133); dos terceiros (art. 134 e art. 135) e por infrações (art. 136 a art. 138). Não obstante, há outra classificação, quanto ao “...momento em que surge o vínculo jurídico entre a pessoa designada por lei como responsável e o sujeito ativo do tributo...”[1], dividindo-se em responsabilidade: por substituição ou por transferência. Esta ainda comporta três subdivisões de responsabilidade: por solidariedade, dos sucessores e a de terceiros.
Não obstante, a responsabilidade tributária por substituição é o cerne da pesquisa, pois, aqui, o terceiro (substituto) já se coloca no lugar do contribuinte (substituído) antes da ocorrência do fato gerador, por imposição da lei, onde a obrigação tributária principal, desde o seu nascedouro, fica com o responsável, desonerando o contribuinte.
2. Relação jurídico-tributária.
2.1. Breve consideração da necessidade de tributar.
De proêmio, no final do século XVIII, o estado pós Revolução Francesa eclode numa ideia de Estado abstencionista, pois se venerava a ausência do ente público, pela face diametralmente oposta do absolutismo monárquico então vigente, onde o Estado se confundia com a própria realeza, seus administradores. Bem por isso, a liberdade surge na primeira dimensão dos direitos fundamentais, de forma vertical, liberdade dos cidadãos frente a administração pública. Já no início do século XX, tem-se a concretização dos direitos sociais, representados pela igualdade, mesmo que formal, entre os cidadãos e o pensamento fraterno internacional, ligado a cooperação entre os Estados Soberanos para o bem-estar comum, perfazendo-se a segunda e terceira dimensão de direitos fundamentais, respectivamente.
Com isso, o Estado começa, principalmente pós-segunda guerra mundial, a ser cobrado pela realização de programas intervencionistas, melhorando a qualidade de vida pela disponibilidade de serviços públicos acessíveis a todos que deles necessitassem. Tendo em análise a necessidade do novo Estado do Bem-estar Social, a Administração Tributária ganhou importância ainda maior, pois os tributos são a maior fonte de receita para a realização do bem comum, os equipamentos públicos.
Nessa toada, os Fiscos nacionais passaram a dispor de mecanismos mais eficazes para evitar a evasão de receitas fundamentais para a prestação dos serviços coletivos, trazendo inovações para o direito tributário.
2.2. Relação jurídico-tributária: Hipótese de incidência, fato gerador, obrigação tributária e credito tributário.
Diz-se que será devido o tributo quando verificar-se no mundo fático a realização da hipótese de incidência. Conforme legislado, a obrigação tributária será dividida em principal e acessória; esta deriva da legislação tributária e consiste numa obrigação de fazer ou não fazer do sujeito passivo, já aquela surge com a ocorrência do fato gerador, tendo por função o pagamento do tributo ou penalidade pecuniária (art. 113, §§ 1º, 2º e 3º, CTN).
A hipótese de incidência, por sua vez, é definida como “...o momento abstrato, previsto em lei, hábil a deflagrar a relação jurídico-tributária”[2]. É um conceito abstrato que liga a ideia do legislador a fatos do mundo fenomênico, observados no cotidiano das interações sociais, nascendo daqui a obrigação tributária.
Por outro lado, o fato gerador do tributo marca sua natureza jurídica específica (art. 4º, CTN), este é o fato imponível, em concreto e definido em lei. Dele surge a obrigação tributária, seja a principal, de pagar o tributo e decorrente de lei em sentido estrito, seja a acessória, impondo-se a prática ou abstenção de um ato que não se caracterize como obrigação principal, dado seu caráter de subsidiariedade.
Esclarecedoras as palavras do professor Ricardo ALEXANDRE[3]: “para o surgimento do vínculo obrigacional, é necessário que a lei defina certa situação (hipótese de incidência), que, verificada no mundo concreto (fato gerador), dará origem à obrigação tributária.”
Verificada a obrigação tributária será necessário constituir o crédito tributário, pelo procedimento administrativo do lançamento, momento que confere exigibilidade para a relação jurídico-tributária. O lançamento é um procedimento complexo, conforme delimita o art. 142 do CTN[4], possui várias finalidades legais, mas também é o instrumento adequado para constituir o crédito tributário e declarar a ocorrência da obrigação tributária, em atividade vinculada e obrigatória, transformando-se em obrigação líquida. Nessa toada, o crédito tributário decorrerá da obrigação tributária principal, assumindo sua natureza (art. 139, CTN).
Constituído o crédito tributário, pelo lançamento, que declara a existência da obrigação tributária, estará determinada a matéria tributável, em valor líquido, com o sujeito passivo específico, seja como contribuinte ou responsável tributário.
2.3. Obrigação tributária: sujeitos ativo e passivo, objeto e causa.
Nessa toada, constada a hipótese de incidência e o fato gerador, tem-se a formação da obrigação tributária, com seus elementos caracterizadores próprios, definindo o credor e devedor da relação jurídico-tributária.
Inicialmente, tem-se o sujeito ativo como aquele a quem é conferido a prerrogativa de cobrar a dívida tributária, o “lado credor da relação intersubjetiva tributária”[5]. Em suma, será a pessoa jurídica de direito público com competência para exigir o cumprimento do tributo (art. 119, CTN), de atuação vinculado, ou seja, verificado o fato gerador e a hipótese de incidência estará caracterizada a obrigação tributária, obrigando-se a declará-la e constituir o crédito pelo procedimento administrativo do lançamento. O sujeito ativo poderá ser classificado como direto ou indireto. Este, quando a capacidade tributária ativa, de arrecadação e fiscalização tributária, são transferidas para entes parafiscais; aquele se caracteriza quando o próprio ente tributante, titular da competência tributária e consequente poder legiferante de instituição do tributo, exerce as funções de arrecadar e fiscalizar.
Por outro lado, o sujeito passivo é justamente aquele de quem se cobra a exação tributária, ou seja, o “lado devedor da relação intersubjetiva tributária, representado pelos entes destinatários da invasão patrimonial na retirada compulsória de valores, a título de tributos.”[6]. Daí, tem-se a distinção entre responsável e contribuinte. Este possui relação direta e pessoal com a situação constituinte do fato gerador, já aquele, em disposição subsidiária quanto ao contribuinte, terá sua obrigação decorrente de previsão expressa em lei (art. 121, § Ú, inc. I e II, CTN). Importante lembrar que as convenções particulares não serão opostas ao fisco no sentido de alterar a sujeição passiva tributária (art. 123, CTN), pois seria uma ofensa ao princípio da estrita legalidade tributária a alteração do polo passivo da obrigação tributária por mera convenção particular, somente sendo válidas e tendo eficácia no âmbito do direito privado, não oponíveis ao Fisco.
Quanto ao objeto da obrigação tributária, este será a própria prestação a ser adimplida pelo sujeito passivo. Diz-se principal quando for o pagamento do tributo ou penalidade pecuniária, uma obrigação de dar, equivalendo “à prestação a que se submete o sujeito passivo diante do fato imponível deflagrador da obrigação tributária”[7], de cunho pecuniário. Será instrumental ou acessória quando encerra numa obrigação de fazer ou não fazer para o sujeito passivo, de cunho não pecuniário.
Por fim, causa da obrigação tributária é o vínculo jurídico motivador do evento obrigacional que se estabelece entre o sujeito ativo e o passivo, definidos pela lei ou legislação tributárias. A obrigação principal será estabelecida por lei em sentido estrito, em atenção ao princípio da estrita legalidade, enquanto a acessória poderá ser estabelecida por disposição em legislação tributária, por se tratar de uma mitigação da legalidade estrita.
Frise-se, quanto a figura do responsável, que este não possui relação direta e pessoal com o fato gerador da exação tributária, sendo, em verdade, terceiro indicado por lei para efetuar o pagamento do tributo, nesse sentido “integra a relação jurídico-tributária como devedor de um tributo, sem possuir relação pessoal e direta com o respectivo fato gerador”[8]. Entretanto, não cabe uma definição arbitrária do sujeito passivo da obrigação tributária, devendo esta terceira pessoa, responsável, estar vinculada ao fato gerador da respectiva obrigação (art. 128, CTN), exigindo expressa disposição legal.
2.4. Responsabilidade Tributária por substituição e por transferência.
A complexidade da cadeia produtiva, principalmente para a incidência de tributos plurifásicos[9], como IPI e ICMS, fez com que o legislador criasse mecanismos para facilitar o controle da arrecadação o cálculo e a fiscalização perante o sujeito passivo da obrigação tributária. Com isso, pensou-se em otimizar a arrecadação, transferindo a cobrança de tributo do autor direto do fato gerador (sujeito passivo direto) para direcioná-lo ao responsável tributário (sujeito passivo indireto).
Conforme explica o professor Hugo de Brito Machado[10], verbis:
“...no Direito Tributário a palavra responsabilidade tem um sentido amplo e outro restrito. (...) Em sentido amplo, é a submissão de determinada pessoa, contribuinte ou não, ao direito do Fisco de exigir a prestação da obrigação tributária. (...) Em sentido estrito, é a submissão, em virtude de disposição legal expressa, de determinada pessoa que não é contribuinte, mas está vinculada ao fato gerador da obrigação tributária, ao direito do Fisco de exigir a prestação respectiva.”
A responsabilidade tributária poderá se caracterizar desde ou após a ocorrência do fato gerador, dizendo-se por substituição ou por transferência, respectivamente.
Estará caracterizada a responsabilidade por transferência quando “por expressa previsão legal, a ocorrência de um fato, posterior ao surgimento da obrigação, transfere a um terceiro a condição de sujeito passivo da obrigação tributária, que até então era ocupada pelo contribuinte.”[11]. Há uma mudança na sujeição passiva da obrigação tributária, já realizada com a ocorrência do fato gerador, não se desprezando a presença do contribuinte, que terá sua responsabilidade excluída ou mantida de forma de forma supletiva (art. 128, CTN). Nesse parâmetro, de responsabilidade supletiva do contribuinte quanto ao responsável, esta poderá ser dividida em responsabilidade: solidária, dos sucessores ou de terceiros.
De início, há responsabilidade solidária quando cada um dos devedores (contribuinte e responsável) respondem pela dívida no todo, ou seja, pode-se exigir de cada um dos coobrigados o cumprimento da obrigação. A solidariedade advirá de determinação legal ou do interessa comum que advém da situação constitutiva do fato gerador (art. 124, CTN).
Por outro lado, vislumbra-se a responsabilidade dos sucessores quando o sujeito passivo direto desaparece, por um dos motivos previstos em lei para caracterizar a sucessão tributária, sendo o responsável pela dívida o sucessor, por transmissão mortis causa, quando será transferido aos herdeiros por responsabilidade pessoal, ou inter vivos, quando será transferida a obrigação ao adquirente, respondendo pelos fatos geradores ocorridos antes do ato ou fato que marcou a sucessão.
Posteriormente, a responsabilidade de terceiros se prende “...no dever de zelo, legal ou contratual, que certas pessoas devem ter com relação ao patrimônio de outrem...”[12]. Aqui, percebe-se a transferência do dever de pagar do contribuinte para o responsável, por este ser administrador ou gestor da vida econômica e patrimonial daquele, numa responsabilidade subsidiária, apesar do disposto no caput do art. 134 do CTN trazer esta responsabilidade como solidária, numa falta de técnica jurídica do legislador, já que dispõe de benefício de ordem, devendo primeiro ser acionado o contribuinte para, então, se frustrado o adimplemento, poderá pleitear o pagamento pelo responsável tributário.
Não obstante, a previsão do art. 135 do CTN, que dispõe sobre a responsabilidade de terceiro quando restar caracterizada sua atuação irregular, será caso de responsabilidade por substituição, pois o dever de responsabilidade se apresenta concomitante com o fato gerador. Portanto, trata-se de responsabilidade pessoal e exclusiva, mas não solidária[13], decorrentes de atos cometidos por mandatários, prepostos, empregados, diretores ou gerentes (art. 135, incs. I, II e III, CTN) com excesso de poderes ou infração legal na relação jurídico-tributária.
Por conseguinte, a responsabilidade tributária por substituição tem na sua principal fonte legitimadora índole constitucional, expressa no art. 150, § 7º da Lei Maior. Assim, pela simplificação e incremento na arrecadação tributária, combatendo a evasão fiscal, vê-se a importância do instituto da responsabilidade tributária.
3. Responsabilidade tributária por substituição: progressiva e regressiva.
3.1. Substituição tributária regressiva, antecedente ou para trás.
Conforme é sugerido pela classificação, aqui, o fato gerador ocorre no antecedente, perfazendo a obrigação tributária e constituindo seu credito, postergando o pagamento para frente, em outra etapa da cadeia produtiva, conforme ensina Ricardo Alexandre[14]:
“...ocorre nos casos em que as pessoas ocupantes de posições anteriores nas cadeias de produção e circulação são substituídas, no dever de pagar tributo, por aquelas que ocupam as posições posteriores nessas mesmas cadeias.(...)
Por fim, perceba-se que as pessoas que ficaram ‘para trás’ na cadeias de produção e circulação são substituídas por aquelas que estão mais à frente nessa cadeia. Vale dizer, a terminologia consagrada qualifica a substituição como ‘para frete’ ou ‘para trás’ sob a ótica do substituído, e não do substituto.”
Desse modo, há uma postergação no pagamento do tributo, já que o fato gerador ocorreu num momento pretérito, enquanto o pagamento é adiado para um momento posterior da cadeia produtiva. Com o diferimento do momento do pagamento tributário o Fisco diminui o número de sujeitos passivos para exercer a fiscalização e concentra o recolhimento tributário para outra etapa da cadeia produtiva, já fixada em lei.
Numa visão prática, imagine-se um conjunto de dezenas de pequenos produtores rurais que vendem seus produtos diretamente para uma grande indústria, responsável por seu processamento e transformação em bens de consumo. O fato gerador, por exemplo, de um tributo plurifásico, já será a venda do produto rural dos pequenos produtores para a indústria, entretanto, seu pagamento será diferido para a próxima etapa da cadeia produtivo, quando a indústria beneficiar e processar o produto bruto. Assim, o pagamento do tributo incide nesta primeira relação de compra e venda poderá ser pago somente na segunda negociação, quando a indústria fornecer ao varejista ou atacadista, assim até o consumidor final.
Neste modelo, os pequenos produtores rurais, em grande número, com poucos recursos e quase nenhum conhecimento técnico-tributário são dispensados do recolhimento, apesar da ocorrência do fato gerador. Assim, a lei tributária prevê que a indústria substitua os vários pequenos agricultores como devedor dos tributos incidentes sobre a alienação feita ele mesmo, na condição de responsável tributário, enquanto os produtores rurais são os contribuintes. Por certo, facilita-se a negociação do pequeno produtor rural, que não dispõe de apoio jurídico-contábil para o recolhimento da exação; além disso, potencializa a arrecadação tributária, tendo um único sujeito passivo para fiscalizar e fazer a cobrança de tributos oriundos de fatos geradores distintos, com sujeitos passivos diferentes.
Esta substituição tributária atende a uma conveniência da Administração Fiscal, facilitando não só o recolhimento, como também a fiscalização do pagamento da exação tributária no valor devido.
Sem dúvida, pela substituição tributária o Fisco incrementa sua receita e potencializa sua atuação no combate a práticas evasivas, além de incentivar os pequenos produtores, que, por regra, não dispõe de apoio jurídico para realizar suas atividades.
3.2. Substituição tributária progressiva, para frente ou subsequente.
Diferentemente da responsabilidade por transferência, aqui, presume-se um fato gerador futuro, que poderá ocorrer, antecipando-se o recolhimento do tributo, cobrado com fundamento na base de cálculo presumida, em momento anterior ao fato gerador. Apesar de contestada a sua constitucionalidade, pois violaria princípios como a segurança jurídica, estrita legalidade, tipicidade tributária, capacidade econômica e outros, a substituição tributária progressiva possui respaldo constitucional, inserido pela EC nº 3/1993, acrescentando o art. 150, § 7º, embora, mesmo antes do dispositivo constitucional, o STF e STJ já davam guarida ao instituto.
Didática é a explicação do professor Ricardo Alexandre[15], para quem a responsabilidade por substituição progressiva ocorrerá nos casos em que “...as pessoas ocupantes das posições posteriores das cadeias de produção e circulação são substituídas, no dever de pagar tributo, por aquelas que ocupam as posições anteriores nessas mesmas cadeias.”. Na sistemática, concentra-se o pagamento dos tributos de toda a cadeia produtiva, mesmo que só tenha sido verificado o primeiro fato gerador, realizado o cálculo do valor total sobre o montante que se presume vendida a mercadoria ao consumidor final, definido mediante o regime de valor agregado, legislado no art. 8º da LC 87/96, observado o caso concreto. Observe-se, ainda, que o modelo do valor agregado, estabelecido para a cobrança do ICMS antecipado, não se confunde com o de pauta fiscal[16], reconhecido ilegal pelo STJ.
Em consequência, não vale confundir a monofasia, incidência única do tributo, com a substituição tributária progressiva, como assevera Eduardo Maneira[17]:
“Em primeiro lugar vamos distinguir monofasia da ‘substituição tributária para a frente plena’, cuja aplicação somente é possível nos casos de tributos plurifásicos submetidos à não-cumulatividade. Na substituição tributária para a frente plena haverá, como ocorre com a monofasia e daí a possibilidade de serem confundidas, um único recolhimento. É o caso da refinaria substituir a distribuidora e o posto de gasolina no ICMS, nas operações com combustível. O recolhimento é único na base, na refinaria, mas o cálculo deste imposto levou em consideração a ocorrência de todas as operações. A refinaria recolhe na condição de contribuinte pela primeira operação, da sua venda para a distribuidora e depois recolhe na condição de substituta sobre as outras operações. Na monofasia, ao contrário, tributa-se apenas uma operação; monofasia significa incidência única. A tributação monofásica é antagônica à plurifasia e por via de consequência à substituição. É também diferente de cumulatividade. Contudo, somente existe monofasia se o legislador escolher um determinado agente econômico e somente tributá-lo na alíquota normal. A escolha de uma alíquota maior que proteja algumas operações futuras com incidência única é substituição tributária disfarçada e perversa, eis que sem direito à restituição na hipótese de uma das operações futuras não se realizar.”
Por certo, na substituição tributária para frente há o pagamento antecipado do tributo, não ocorre o recolhimento do tributo antes de ocorrido o fato gerador, não antecipa a incidência tributária, só verificada com o fato gerador, apenas se antecipa o pagamento.
Noutro ponto, caso não se realize o fato gerador presumido, o responsável tributário, que antecipou o pagamento, terá garantida a preferencial e imediata restituição da quantia paga (art. 150, § 7º, CRFB/88). Assim, o responsável que realizou inicialmente o pagamento antecipado, se não ocorre o fato gerador presumido, no final da cadeia produtiva, geralmente pela venda do produto ao consumidor final, será cabível a restituição do valor antecipado, já que não ocorrido o fato gerador.
Interessante notar que o dispositivo constitucional, em disposição expressa, atrela a substituição progressiva a impostos e contribuições, excluindo-se taxas, empréstimo compulsório e contribuição de melhoria da sistemática do fato gerador presumido. Também, aqui no mesmo viés da substituição regressiva, concentra-se o pagamento, no caso da substituição progressiva a antecipação do pagamento, a um sujeito passivo, por disposição legal, estabelecido como responsável tributário, dinamizando a arrecadação tributária e a atuação fiscalizatória do Fisco.
4. Considerações Finais.
Na esteira do novo conceito de Estado de Bem-Estar Social, principalmente no período Pós-Segunda Guerra Mundial, altera-se a ideia de abstencionismo, onde a função do Estado era garantir a liberdade do cidadão, sem interferir na convivência social, para um Estado intervencionista, de atuações positivas, no sentido de alterar a realidade social com a prestação de comodidades com o objetivo de garantir a igualdade entre os cidadãos.
Com essa nova característica, pela cobrança da própria sociedade por uma atuação intervencionista, o ente estatal necessita de fonte financiadora, que lhe garanta recursos públicos para serem aplicados. Nesse espaço, a arrecadação de tributos adquiri grande importância, seja pelas vultosas quantias arrecadadas ou pela legitimidade de apropriar-se de parte do patrimônio particular com o respaldo em atividades para a coletividade.
Por conseguinte, a relação jurídico-tributária adquiriu relevância e atenção, tanto do Estado tributante quanto do cidadão contribuinte. Para tanto, o legislador brasileiro criou mecanismo de arrecadação e fiscalização tributárias garantidores do implemento de receita para os cofres públicos. Nessa toada, definiu-se que ocorrida a hipótese de incidência e o fato gerador estaria realizada a obrigação tributária, sendo função do lançamento tributário declarar sua existência e constituir o crédito tributário, em procedimento de arrecadação vinculada.
A obrigação tributária formada possui os seus sujeitos passivo e ativo, bem como a causa e o objeto. Atentando-se ao sujeito passivo, quando estiver com elação direta e pessoal com o fato gerador tributário será denominado contribuinte; lado outro, quando for terceiro, não realizador direto do fato gerador, mas indicado por lei para adimplir o crédito tributário será indicado como responsável tributário.
Assim, no bojo de uma cadeia produtiva complexa, especialmente para incidir a tributação nos impostos plurifásicos, o legislador criou o mecanismo da responsabilidade tributária, concentrando num único responsável a arrecadação de tributos originários de diversos fatos geradores, de outros sujeitos passivos, estes os contribuintes. Dessa forma, a responsabilidade será classificada de acordo com o seu momento de caracterização, se desde a ocorrência do fato gerador a obrigação já estava com o responsável trata-se de responsabilidade por substituição; por outro lado, se a obrigação nasce com o contribuinte e, por expressa previsão legal, após a ocorrência do fato gerador, transfere-se ao responsável estará caracterizada a responsabilidade por transferência.
Especificamente, quanto a responsabilidade por substituição, esta ainda poderá ser classificada como progressiva ou regressiva, tendo-se como parâmetro a posição do substituído na cadeia produtiva. Teremos a substituição regressiva quando, ocorrido o fato gerador, posterga-se seu adimplemento, com o recolhimento do valor aos cofres públicos, para a etapa seguinte, por disposição legal, otimização a atuação fiscalizatória do fisco. Por outro lado, será progressiva a substituição, este com previsão constitucional, sempre que houver o recolhimento do tributo antes mesmo da ocorrência do fato gerador, presumindo-se que este ocorrerá nas próximas etapas da cadeia produtiva, definindo seu valor sobre o montante previsto para a venda ao consumidor final, pelo valor agregado, não verificando o fato gerador presumido será garantida a preferencial e imediata restituição.
Enfim, a responsabilidade tributária é um importante mecanismo de otimização d arrecadação e fiscalização tributárias. Concentra-se em um responsável o crédito tributário oriundo de diferentes fatos geradores, com diversos contribuintes, facilitando a fiscalização da Administração Tributária, aumentando a arrecadação e reduzindo a evasão.
Bibliografia
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SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
[1] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 5º ed. São Paulo: Método. 2011.
[2] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
[3] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 5º ed. São Paulo: Método. 2011.
[4] Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente, determinar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível.
[5] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
[6] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
[7] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
[8] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 5º ed. São Paulo: Método. 2011.
[9] “É imperioso gizar que a monofasia não se confunde com a intitulada substituição tributária para frente ou progressiva, típica do ICMS. Esta pressupõe a existência de tributação plurifásica, é dizer, incidência do gravame sobre mais de uma etapa de circulação da mercadoria. O substituto concentra em si o dever tributário correspondente a duas ou mais fases – porém, o fato de ser recolhido em um só momento não significa que o tributo seja monofásico. Monofasia equivale a incidência única; plurifasia, em todas as etapas; substituição tributária progressiva é a concentração do dever fiscal em um sujeito passivo, que fará as vezes, para o Fisco, dos demais contribuintes (os quais, se houvesse regular incidência do gravame plurifásico, teriam que fazer a recolha da exação).” (MOREIRA, André Mendes. Não-cumulatividade tributária no Brasil e no mundo: origens, conceito e pressupostos. In: Sistema Tributário Brasileiro e a Crise Atual – VI Congresso Nacional de Estudos Tributários. CARVALHO, Paulo de Barros e SOUZA, Priscila de. São Paulo: Noeses/IBET, 2009, pp. 47-88.)
[10] MACHADO, Hugo de Brito. Curso de Direto Tributário. 29. ed. São Paulo: Malheiros, 2008.
[11] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
[12] SABBAG, Eduardo. Manual de direito tributário. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
[13] Súmula 430/STJ: O inadimplemento da obrigação tributária pela sociedade não gera, por si só, a responsabilidade solidária do sócio-gerente.
[14] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 5º ed. São Paulo: Método. 2011.
[15] ALEXANDRE, Ricardo. Direito Tributário Esquematizado. 5º ed. São Paulo: Método. 2011.
[16] Súmula 431/STJ: É ilegal a cobrança de ICMS com base no valor da mercadoria submetido ao regime da pauta fiscal.
[17] MANEIRA, Eduardo. Considerações sobre o art. 166 do CTN e a Não-cumulatividade das Contribuições ao PIS e à COFINS. Revista Dialética de Direito Tributário, nº 124. São Paulo: Dialética, jan./2006, pp. 43-4.
Procurador da Fazenda Nacional. Pós-graduado em Direito Tributário e em Direito Processual Civil. Bacharel em direito pela Universidade Católica de Pernambuco.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VICENTE FéRRER DE ALBUQUERQUE JúNIOR, . Responsabilidade Tributária por Substituição: regressiva e progressiva. Conceitos, sujeitos da relação jurídico-tributária e relevância para a Administração Tributária Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 jul 2019, 04:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53129/responsabilidade-tributaria-por-substituicao-regressiva-e-progressiva-conceitos-sujeitos-da-relacao-juridico-tributaria-e-relevancia-para-a-administracao-tributaria. Acesso em: 22 nov 2024.
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