RESUMO: O presente artigo tem como título os vícios nos negócios jurídicos no direito brasileiro, em que pese a ilegitimidade dos contratos de adesão entre particulares, e possui como enfoque demonstrar como os ditos contratos são eivados de cláusulas abusivas e ilegais, pois em que grande parte das vezes, ferem direitos e garantias dos consumidores que estão consagrados na Constituição Federal de 1988. Imperioso destacar que as sociedades atuais eminentemente são pautadas pelo consumo, onde diariamente pessoas adquirem produtos ou serviços de forma interna ou externa nos estabelecimentos comerciais, onde de forma ilegítima os fornecedores utilizam de uma série de disposições contratuais para lesarem a parte mais hipossuficiente da relação de consumo que é o consumidor. Assim, no cenário atual e histórico, o consumidor não tem a possibilidade de discutir essas cláusulas, em que pese antes de seu aceite, visto que as condições negociais são impostos de maneira unilateral pelo fornecedor, ou seja, em um contrato de adesão. Dessa forma, o presente trabalho demonstra que os ditos contratos de adesão são ilegais, tendo em vista, que o consumidor não possui a possibilidade de discutir determinadas cláusulas do mesmo, onde o fornecedor não aceita qualquer tipo de discussão destas cláusulas.
Palavras-chave: Direito do consumidor. Contrato unilateral. Contrato de adesão. Consumidor. Fornecedor. Ilegitimidade. Ilegalidade.
ABSTRACT: This article has as its title the defects in legal business in Brazilian law, in spite of the illegitimacy of adhesion contracts between individuals, and its focus is to demonstrate how these contracts are riddled with abusive and illegal clauses, since in most of the sometimes injure the rights and guarantees of consumers that are enshrined in the Federal Constitution of 1988. It is important to emphasize that current societies are eminently consumer-driven, where people daily purchase products or services internally or externally in commercial establishments, where illegitimately. Suppliers use a series of contractual provisions to damage the most likely part of the consumer's relationship. Thus, in the current and historical scenario, the consumer does not have the possibility to discuss these clauses, even before their acceptance, since the negotiating conditions are unilaterally imposed by the supplier, that is, in an adhesion contract. Thus, the present work demonstrates that these adhesion contracts are illegal, considering that the consumer does not have the possibility to discuss certain clauses thereof, where the supplier does not accept any discussion of these clauses.
keywords: Consumer law. Unilateral contract. Adhesion contract. Consumer. Provider. Illegitimacy. Illegality.
SUMÁRIO: 1 – Introdução. 2 – Desenvolvimento. 2.1 – Aspectos gerais sobre os contratos no ordenamento jurídico brasileiro. 2.2 – Conceito de Contratos no Direito brasileiro. 2.3 – A função social do Direito nas relações contratuais. 3 – Principiologia dos contratos. 3.1 – Princípio da dignidade da pessoa humana. 3.2 – Princípio da autonomia da vontade. 3.3 – Princípio da autonomia da vontade. 3.4 – Princípio da força obrigatória dos contratos. 3.5 – Princípio da função social do contrato. 4 – Noções gerais do Contrato de Adesão. 4.1 – Conceito e natureza jurídica dos Contratos de Adesão. 4.2 – A atuação do Código de Defesa do Consumidor nos Contratos de Adesão. 4.3 – As cláusulas e práticas contratuais abusivas na seara consumerista. 5 – Considerações finais. 6 - Referências Bibliográficas.
O presente artigo tem por objetivo e possui como recorte epistemológico demonstrar e analisar os contratos de adesão e as suas cláusulas abusivas e restritivas de direito, e como o atual sistema contratual brasileiro trata estes contratos, em uma perspectiva individual e quanto aos contratos de massa.
Tendo em vista que as sociedades sempre, desde o seu princípio sempre foi pautada pelo consumo e pelo capitalista, o mesmo principalmente consumerista buscou das celeridade nas contratações entre as partes, e uma dessas inovações foi o contrato de adesão, que no início foi utilizado como meio negocial, porém de franco debate, entretanto, no passar dos anos foi restringido e se tornou inegociável às suas cláusulas, gerando assim um grande problema para a sociedade contemporânea, quanto às aquisições e contratações de produtos e serviços.
O contrato de adesão é um documento particular de contratação na qual as suas cláusulas contratuais são escritas por uma das partes, na grande maioria das vezes pelo fornecedor dos serviços ou produtos, onde o contratante não possui o poder de alterá-las.
É importante informar que os contratos de adesão possuem validade, até mesmo porque os mesmos são aprovados por uma autoridade competente, a exemplo os contratos de energia elétrica, de telefonia, dentre outros, entretanto o que é imperioso destacar é que os contratos de adesão já são predeterminados, ou seja, os mesmos já estão prontos no momento da contratação pelo consumidor, e assim, o contratante ou o aderente não consegue negociar as cláusulas que estão constantes naquele documento, sendo na maioria das vezes essas cláusulas suprimem direitos e garantias dos seus aderentes ou contratantes.
Em que pese o direito contratual brasileiro possuir diversos princípios contratuais que protegem os contratos e os seus aderentes, como a função social do contrato, a boa-fé objetiva, em muitas das vezes os fornecedores ou uma das partes do contrato suprimem diversos direitos da outra parte, demonstrando assim a ilegalidade, ilegitimidade, e a má-fé dos contratados.
Nesse prisma, é possível perceber o quão importante é o poder judiciário nessas questões, visto que caso uma das partes se sinta lesada, a mesma poderá discutir o contrato por inteiro ou somente as cláusulas que entende como abusivas e restritivas de direito.
Dessa forma, no direito civil e consumerista brasileiro, os contratos de adesão são amplamente debatidos na seara judicial, onde a parte que se sente lesada, procura demonstrar que aquele determinado contrato é totalmente nulo, ou então possível diversas cláusulas abusivas, onde o contraditório e a ampla defesa são dadas às partes, e assim, o princípio da boa-fé objetiva e negocial, além do princípio da dignidade da pessoa humana será reconhecido e assim colocado em primeiro plano naquele determinado litígio.
2.1 Aspectos gerais sobre os contratos no ordenamento jurídico brasileiro
Em que pese ao ponto de partida dos direitos dos contratos, a doutrina universal em sua maioria dispõe que o mesmo é fruto dos jusnaturalismo e da inserção do capitalismo na seara pública, onde o berço das disposições contratuais se dá em Roma.
No Direito Romano clássico, ainda não existia as disposições que temos atualmente quanto aos contratos, tão pouco esta nomenclatura, mas existia a terminologia convenções, tendo que a mesma era recebida como gênero, onde se subdividiam em contratos e pactos.
Os contratos naquela época possuíam uma solenidade mais, um rigor formalista maior, onde eram protegidas por uma actio[1], onde qualquer das partes que descumprisse o contrato, as mesmas poderiam proteger os seus direitos com uma ação, tendo em vista o descumprimento do contrato.
Dessa forma, é possível confirmar o entendimento histórico dos contratos, conforme determina em sua doutrina os autores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald:
No caminhar da história, o Direito Romano clássico estruturou o contrato sobre a base de um acordo de vontades a respeito de um mesmo ponto. Ali, tal como nas sociedades antigas, a convenção por si só não tinha o poder criador de obrigações. Para o romano, o contrato só seria possível com a existência de elemento material, uma exteriorização de forma, fundamental na gênese da própria obligatio. (FARIAS; ROSENVALD, p. 52).
No que se refere aos pactos na sociedade Romana, os mesmos não possuíam rigor algum, bem como não era protegida pela actio. Assim, a sociedades antigas possuíam duas opções para que as convenções fossem regidas, ou era pelos contratos, que possuíam uma natureza rígida e formal, ou pelos pactos, que tinham a natureza informal.
Na evolução dos contratos, já no Direito pós-classico foi conferida a proteção via actio a alguns pactos mais utilizados como a compra e venda e locação. Já no Direito Medieval houve uma atenuação do formalismo em virtude do crescimento da economia mercantil, pois o contrato começou a ver visto como um entrave nas relações entre os particulares, tendo em vista do crescimento e surgimento de novas cidades e comércios.
No Código Francês do século XIX, o contrato é um instrumento para aquisição direta da propriedade, e, por si só é suficiente para essa aquisição. Assim, o contrato possuía natureza de lei, sendo que no próprio artigo 1.134 do dito código, é possível perceber a importância do dito instituto jurídico.
Dessa forma, é possível entender sobre os contratos:
Na segunda metade do século XIX e, sobretudo, no século XX, aparecem reações contra a concepção individualista e liberal da teoria dos contratos: a) os abusos da liberdade contratual são denunciados por pensadores socialistas como Comte, Saint-Simon e Karl Marx, que se insurgem contra a ausência total de proteção dos fracos. Surgem leis regulamentando as relações de grupos a grupos, como as convenções coletivas de trabalho; b) não apenas no direito social, mesmo o indivíduo isolado vê a sua liberdade cada vez mais limitada por contrato de adesão e cláusulas contratuais gerais. (FARIAS; ROSENVALD, p. 52).
Pode-se assim citar a concepção tão bem difundida na seara do Direito contratual, que é o Contrato Social do filósofo Jean-Jacques Rousseau[2], que possuía como centro o princípio da autonomia da vontade, sendo este principio até a atualidade utilizado no direito contemporâneo.
O contrato social estabelecia direitos e garantias individuais, onde este filósofo propõe que os homens façam uma espécie de contrato social, que defenda a liberdade, se baseando no consenso, garantindo-se o direito de cada cidadão. Nesse contrato também estabelecia condições essenciais de liberdade natural, da forma de governo, da eleição dos governantes e das suas convenções, onde a soberania do povo deveria ser indivisível, tendo como princípio a vontade geral.
Assim, é possível de forma analógica veicular a ideia central da obra do autor Suíço, à ideia dos contratos, tendo em vista que os contratos são feitos de acordo com a vontade das partes, de forma espontânea, livre, ou seja, uma declaração de vontade.
Dessa forma, pode-se perceber de forma histórica o desenho da concepção dos contratos, visto é atualmente, principalmente pela globalização, internet, relações contratuais mais afloradas, são de grande importância, entretanto, como toda regra existe uma exceção, os mesmos contratos que são benéficos para a sociedade, onde legitimam relações entre particulares, e até mesmo entes públicos, podem ser maléficos, como é o caso dos contratos de adesão, que são contratos esculpidos de forma unilateral e sem oportunidade de revisão por uma das partes, sendo que na maioria delas, é o consumidor que se encontra desprotegido em um ambiente de total ilegalidade contratual.
O contrato é um acordo de promessas, ou um acordo de vontades, que gera um efeito jurídico, assim, perfaz uma relação jurídica entre as partes, onde se uma das partes não cumpri o que ora está exposto no contrato, a mesma poderá ser penalidade juridicamente. Assim, o contrato nada mais é que uma espécie de negócio jurídico, onde todo negócio jurídico é fonte de obrigações, assim é pressuposto de manifestação de vontade.
Assim, os autores os autores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2012, p. 74) conceituam que o contrato é negócio jurídico bilateral derivado da união de dois negócios jurídicos unilaterais: proposta e aceitação. Quando aludimos a duas vontades, falamos de duas partes e não duas pessoas.
Nesse mesmo sentido, o autor Pablo Stolze (2017, p. 385) dispõe que o contrato é um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias vontades.
Desta feita, pode-se perceber que se não há manifestação ou autonomia de vontade entre as partes, não há que se falar em contrato.
Para o autor De Plácido e Silva (2013, p. 377) expressa em sua obra que a palavra contrato é derivada do latim contractus, de contrahere, possui o sentido de ajuste, convenção, pacto, transação. E assim conclui:
O contrato, pois, ocorre quando as partes contratantes, reciprocamente, ou uma delas assume a obrigação de dar, fazer ou não fazer alguma coisa. Evidencia-se, por isso, que o contrato tem por efeito principal a criação de obrigações, que são assumidas pelas partes contratantes (consentimento) mostra-se elemento de valia para a sua feitura. Inicialmente, o contrato se manifesta na vontade de uma das partes contratantes, que, mediante uma proposta, solicita a manifestação da vontade de outra parte, que a pode aceitar ou pode contrapropor (contraproposta). (SILVA, 2013, p. 377).
Logo, podemos falar também sobre a função social do contrato, que está positivada no artigo 421 do Código Civil brasileiro, que versa que a liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. Assim, a função social do contrato atinge a liberdade contratual, significando que os contratantes deverão observar as regras quanto ao conteúdo e o objeto que se deseja contratar.
Desta feita, a função social do contrato está baseada na prevalência dos valores coletivos, frente aos valores individuais, tendo com ideia de finalidade e propósito social a circulação de riquezas e obtenção de fins comuns.
Nesse sentido, a ideia fundamental existente por trás da função social do contrato é a limitação da autonomia da vontade, quando tal autonomia esteja em confronto com o interesse social, visto que os contratos não é mais um ambiente de ajustes de apenas e tão somente de interesses das partes, pois o contrato não pode causar prejuízos à coletividade ou a terceiros, devendo, então, cumprir uma função social, a exemplo, a não violação do meio ambiente, do direito do consumidor, e assim por diante.
Portanto, os contratos devem possuir como esteio a boa-fé objetiva, o princípio da função social, e a vontade legítima e verdadeira das partes.
O Direito na sua essência busca atender o que de fato é o seu objetivo, que é a função social, no que concerne a fatos, parcelas, valores e propósitos sociais.
O autor Eduardo Carlos Bianca Bittar e Guilherme Assis de Almeida (2012, p. 518), versam que o Direito pertence ao domínio do mundo da vida (Ledenswelt), enquanto reunião de personalidade, sociedade e cultura. É dentro dele, portanto, que se deve perceber e acolher a definição de Direito.
A Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo 3º versa que constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
Para tanto, o autor Eduardo Carlos Bianca Bittar e Guilherme Assis de Almeida (2012, p. 525), propõem que o Direito adquire, historicamente, a feição que se lhe atribui.
Dissertando sobre a função social do Direito, os mesmos expõem em sua obra:
Por isso, não é um fenômeno estável sofre mudanças, em seu conceito, na visão que se tem dele, no conjunto de suas práticas concretas, e também na sua função social. O Direito, nesse sentido, se aprimora, ou se empobrece, conforme o estado da evolução social. Por isso, em formas sociais retrogradas, também se terá uma redução social da significação do Direito, e, em sociedades estruturadas em torno de premissas de liberdade, igualdade, solidariedade e formação humana, como reflexo, ter-se-á no Direito a expressão das conquistas de patamares morais de correlação indivíduo-indivíduo, indivíduo-grupo, grupo-indivíduo. Por isso, as grades sociais definem muito de como o Direito se configura a cada contexto. (BITTAR;ALMEIDA, 2012, p. 525).
Dessa forma, Eduardo Carlos Bianca Bittar e Guilherme Assis de Almeida (2012, p. 526) colocam que enquanto ferramenta, o Direito serve, e, enquanto sua utilidade é garantida, sua fungibilidade o torna um instrumento a mais na sociedade bipolar, de produtores e consumidores.
O Direito nitidamente nesse contexto está para a figura da Justiça, bem como a Justiça está para o Direito, visto que ambos devem ser tratados como um.
Nessa medida em sua obra Eduardo Carlos Bianca Bittar e Guilherme Assis de Almeida (2012, p. 452), entendem que pensar a justiça como John Rawls é pensar em refletir acerca do justo e do injusto das instituições. Qual seria a melhor forma de administrar a justiça de todos senão por meio das instituições sociais. Não se quer tratar do fenômeno na esfera da ética de cada indivíduo, da ação humana individualmente tomada, das concepções plúrimas que se possam produzir sobre a justiça, o que não deixa de ser considerado relevante, quer-se, pelo contrário, disseminar a ideia de que justiça das instituições é que beneficia ou prejudica a comunidade que a elas se encontram vinculadas.
Já, a Constituição da Argentina promulgada em 1853, passou por diversas emendas, sendo que em 1994 foi amplamente reformada. Nesse sentido, a Constituição do dito país versa amplamente sobre os direitos e deveres da população, bem como a função do Direito, como meio social.
Portanto, o autor Kildare Gonçalves Carvalho (2013, p. 36), versa que o preâmbulo da Constituição Argentina expressa o objetivo de se constituir união nacional, realizar a justiça, consolidar a paz interior, prover a defesa comum, promover o bem-estar geral e assegurar a todos os benefícios da liberdade, invocando-se Deus como fonte de toda razão e justiça.
Como todos os ramos do Direito são moldados por princípios, o ramo do Direito Contratual não é diferente, visto a sua relevância para a vida social e comunitária.
Notadamente no plural, princípios significam as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa. E, assim, princípios revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixam para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica. Desse modo, exprimem sentido mais relevante que o da própria norma ou regra jurídica. Mostram-se a própria razão fundamental de ser das coisas jurídicas, convertendo-se em perfeitos axiomas. Princípios jurídicos, sem dúvida, significam os pontos básicos, que servem de ponto de partida ou de elementos vitais do próprio Direito. Indicam o alicerce do Direito. (SILVA, p. 1097).
Portanto, os princípios pressupõem as bases das leis de um determinado ordenamento, tendo por composição estruturas e características específicas de preceitos fundamentais para a prática e sistematização de um correto ordenamento jurídico.
Como todos os ramos do Direito são moldados por princípios, o ramo do Direito Contratual não é diferente, visto a sua relevância para a vida social e comunitária.
O princípio da dignidade da pessoa humana perfaz todos os ramos do direito, pois é uma cláusula geral para qualquer relação, negocio, transação, pois versa de um direito intrínseco ao homem, que é a vida digna.
Historicamente um dos grandes expositores quanto à matéria da dignidade da pessoa humana é o autor Immanuel Kant, que versa sobre o tema dentro da metafísica dos costumes, onde disserta que o homem possui o direito legítimo ao respeito de terceiros, bem como, o mesmo deve respeitar estes perante a sociedade. Assim, a dignidade está intrínseca ao homem, sendo a mesma o acessório do direito principal que é os direitos humanos.
De Plácido e Silva (2013, p. 1097) em sua obra expõe que princípio é também a expressão que designa a espécie de norma jurídica cujo conteúdo é genérico, contrapondo-se à regra ou ao preceito, que é a norma mais individualizada.
Notadamente no plural, princípios significam as normas elementares ou os requisitos primordiais instituídos como base, como alicerce de alguma coisa. E, assim, princípios revelam o conjunto de regras ou preceitos, que se fixam para servir de norma a toda espécie de ação jurídica, traçando, assim, a conduta a ser tida em qualquer operação jurídica. Desse modo, exprimem sentido mais relevante que o da própria norma ou regra jurídica. Mostram-se a própria razão fundamental de ser das coisas jurídicas, convertendo-se em perfeitos axiomas. Princípios jurídicos, sem dúvida, significam os pontos básicos, que servem de ponto de partida ou de elementos vitais do próprio Direito. Indicam o alicerce do Direito. (SILVA, p. 1097).
Portanto, os princípios pressupõem as bases das leis de um determinado ordenamento, tendo por composição estruturas e características específicas de preceitos fundamentais para a prática e sistematização de um correto ordenamento jurídico.
Em que pese o princípio da dignidade da pessoa humana, o mesmo é amplamente discutido em diversas obras doutrinárias, como um dos princípios mais relevantes para os seres humanos. É relevante versar que há direitos que pertencem aos humanos, simplesmente pelo fato de serem humanos, e o dito princípio é um desses.
Entende-se, dessa forma por dignidade a qualidade moral no determinado ser visto que o mesmo deve ser respeitado como tal.
Para o doutrinador Kildare Gonçalves Carvalho (2013, p. 30) a dignidade da pessoa humana, que a Constituição de 1988 inscreve como fundamento do Estado, significa não só um reconhecimento do valor do homem em sua dimensão de liberdade, como também de que o próprio Estado se constrói com base nesse princípio.
Assim, o princípio da dignidade da pessoa humana é base de inteira importância na Constituição brasileira, bem como na Declaração Universal de Direitos Humanos, visto da sua inerência à humanidade.
Nesse sentido, é possui de forma analógica fazer um contraponto com o imperativo categórico de Immanuel Kant, pois o ser humano jamais deve ser visto ou usado como meio para atingir outras finalidades, se não como fim de si mesmo.
A doutrina majoritária consagra o entendimento de que o princípio da dignidade da pessoa humana possui quatro pontos de aplicação prática, onde o primeiro versa sobre a intangibilidade da vida humana, relacionado a defesa e proteção da vida humana, a exemplo a eutanásia e o aborto, o segundo versa sobre a integridade física e psíquica do indivíduo, podendo citar como exemplo o respeito ao corpo, honra, a imagem, a privacidade, e a vedação de qualquer tratamento desumano e degradante.
A terceira forma de aplicação refere-se às condições mínimas para o exercício da vida, o que implica ao direito ao salário em pecúnia, moradia, e a vedação a onerosidade excessiva dos contratos. A quarta e última aplicação do dito princípio se dá pelo respeito a convivência social igualitária, o que implica basicamente a proteção daquelas pessoas que se encontram em uma situação de maior vulnerabilidade, como as crianças, os idosos, os consumidores, dentre outros.
O doutrinador Immanuel Kant, já versava que no mundo social existem dois tipos de valores, o preço e a dignidade, sendo que analisando esta tipologia é possível entender que as coisas possuem preços, porém os seres humanos possuem dignidade.
Assim, percebe-se o quão importante é o dito princípio na regulação da vida social e particular da sociedade, tendo em vista o seu poder regulatório e protetivo para o ser humano, bem como de toda a humanidade.
Em que pese a dignidade da pessoa humana, o doutrinador brasileiro Kildare Gonçalves Carvalho dispõe em sua obra:
A dignidade da pessoa humana significa ser ela, diferentemente das coisas, um ser que deve ser tratado e considerado como um fim em si mesmo, e não para a obtenção de algum resultado. A dignidade da pessoa humana decorre do fato de que, por ser racional, a pessoa é capaz de viver em condições de autonomia e de guiar-se pelas leis que ela própria edita: todo homem tem dignidade e não tem preço, como as coisas, já que é marcado, pela sua própria natureza, como fim em si mesmo, não sendo algo que pode servir de meio, o que limita, consequentemente, o seu arbítrio, consoante o pensamento kantiano. (CARVALHO, 2013, p. 30).
A autora Flavia Bahia (2015, p. 117) expõe que o dito princípio é um dos mais fáceis de ser compreendido, mas, sem dúvidas, um dos mais difíceis de conceituar, visto que o mesmo é carregado de sentimentos pessoais e interpessoais.
Assim, versa também a Declaração Universal dos Direitos Humanos:
Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade. (ASSEMBLÉIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS, 1948).
Dessa forma, pode-se entender que o princípio da dignidade da pessoa humana tem como objetivo ultrapassar o status somente de um simples ser social, no que se refere ao ser humana, mas sim de alcançar um status de proteção, igualdade, defesa e de não degradação da pessoa humana, tendo em vista a sua notória importância humanitária, e isso se reflete no âmbito contratual, em que nenhuma das partes deverá ser lesada por uma cláusula, ou um contrato que possui vícios jurídicos.
É impossível falar em contrato ou vínculo contratual sem citar a autonomia da vontade, sendo esse o principal liame entre o vínculo contratual entre as partes.
Os autores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2012, p. 142) expõem que na órbita do direito, a autonomia da vontade, fruto do voluntarismo dos oitocentos, concebia o vínculo contratual como resultado de simples fusão entre manifestações de vontade. A autonomia do querer era o único fundamento da vinculatividade. A autonomia clássica era absoluta, como valor em si, abstratamente conferida a todos.
Laerte Marrone de Castro Sampaio (2004, p. 09) disserta que a concepção clássica de contrato era centrada no princípio da autonomia da vontade. Entendia-se que as artes tinham o poder de estabelecer todo o conteúdo do contrato. A vontade individual, como fonte produtora de efeitos contratuais, era praticamente absoluta, encontrando obstáculo apenas na ordem pública e nos bons costumes.
É possível então entender que a autonomia da vontade se rege pelo poder das partes em transigir de forma livre os termos que estarão constantes naquele contrato, onde se dá pela liberalidade, pela opção de contratar ou não determinada produto ou serviço, o fato diverso, sempre se pautando pela boa-fé na relação contratual.
Assim, a base de um contrato inicialmente é regida pela vontade entre as partes, onde a vontade perfaz à autonomia, e que essa última é dada com a liberalidade de contratar e ser contratado.
O dito princípio também é uma das bases das relações contratuais, que também é conhecido como pacta sunt servanda[3], que possui como conceituação textual de que os acordos, ou os pactos entre as partes devem ser cumpridos, ou também que o contrato faz lei entre as partes.
Nesse sentido, o autor Pablo Stolze (2017, p. 394) disserta que o princípio da força obrigatória, denominado classicamente pacta sunt servanda, traduz a natural cogência que deve emanar do contrato, a fim de que se lhe possa reconhecer utilidade econômica e social, pois de nada valeria o negócio, se o acordo firmado entre os contraentes não tivesse força obrigatória.
Assim, Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald destacam:
Tendo o contrato como fundamento a vontade intersubjetiva, em princípio, ninguém é obrigado a se vincular, mas, se o individuo assim o fizer, o contrato deverá ser cumprido em todos os seus termos. (FARIAS; ROSENVALD, 2012, p. 154).
É fato que sem a dita força obrigatória dos contratos, muitas relações advindas da contratualidade seriam no decorrer da vigência do contrato descumpridas, gerando assim uma enorme insegurança jurídica, no que se refere às obrigações dos contratos.
É fato que a ética e a boa-fé deveriam presumir qualquer tipo de situação e conduta no mundo real, visto da sua importância nas relações interpessoais. Nas relações contratuais, o princípio da boa-fé deveria ser o principal aspecto da relação, visto da sua importância para ambas às partes.
É perfeitamente possível traçar um paralelo com a autonomia da vontade e boa-fé objetiva nas relações contratuais, pois ambas são alicerçadas na confiança, e a boa-fé objetiva nada mais é que a confiança de uma parte na outra, no sentido que esta não irá lesar a outra por uma própria vontade.
Assim, em sua obra o autor Laerte Marrone de Castro Sampaio expõe em sua obra:
Na primeira referência, inserida no título relativo à política nacional das relações de consumo, a boa-fé objetiva aparece como princípio orientador da interpretação, de molde que viabilize os valores nos quais se funda a ordem econômica (art. 170 da Constituição Federal). Num segundo momento (art. 51, IV), a boa-fé é chamada para servir como medida da abusividade das cláusulas contratuais, permitindo ao juiz interferir no pactuado entre as partes, a fim de garantir o equilíbrio contratual. (SAMPAIO, 2004, p. 41-42).
No que tange em específico ao princípio da boa-fé, o autor José Cairo Junior (2016, p. 104), discorre que o princípio da boa-fé norteia diversos ramos do Direito, mas todo e qualquer Direito que se dedique principalmente à regulação das obrigações, sejam elas derivadas dos negócios jurídicos, do ato ilícito ou do abuso de direito.
O doutrinador Ricardo Resende disserta em sua obra:
Segundo este princípio, tanto o empregado, quanto o empregador devem agir, em sua relação, pautados pela lealdade e boa-fé. Em que pese ter sido encartado por Plá Rodriguez como princípio especial trabalhista, a maioria da doutrina brasileira se posiciona no sentido de que este é um princípio geral do direito, aplicável a todos os ramos da ciência jurídica. Este entendimento restou cristalizado pelo artigo 422 do Código Civil de 2002, o qual dispõe que os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé. (RESENDE, 2014, p. 21).
Neste mesmo sentido, o autor De Plácido e Silva (2013, p. 225) que a boa-fé no sentido de expressar a intenção pura, isenta de dolo ou engano, com que a pessoa realiza o negócio ou executa o ato, certa de que está agindo na conformidade do direito, consequentemente protegida pelos preceitos legais.
Assim, o autor José Junior (2016, p. 104), versa que a boa-fé tem como pressuposto a existência de uma obrigação e de um direito correlatos, dentro de uma relação jurídica, e deriva da máxima romana neminem laedere, ou seja, da intenção de não lesar ninguém.
Então, é possível entender que o próprio texto da Constituição da República Federativa do Brasil possui como diretriz a boa-fé como princípio social, tendo em vista que em seu artigo 3º, I, expõe que a sociedade deve ser livre, justa e solidária.
Nessa linha, os doutrinadores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2012, p. 170) destacam que a boa-fé funciona como modelo capaz de nortear o teor geral da colaboração intersubjetiva, devendo o princípio ser articulado de forma coordenada às outras normas integrantes do ordenamento, a fim de lograr adequada concreção.
Dessa forma, pode-se entender que deve haver uma reciprocidade mútua entre as partes da relação contratual, no que se refere aos bons costumes e boa-fé, pois inexiste uma boa relação contratual, tendo como pressuposto à desconfiança e a má-fé.
Em que se pese a função social do contrato no âmbito do direito brasileiro, a mesma se refere a qual destinação, para qual fim aquele determinado contrato está sendo feito, cumulando ainda que o mesmo acarretará algum tipo de dano naquela sociedade.
Nesse sentido, o doutrinador Paulo Lôbo (2011, p. 67) expõe que o princípio da função social determina que os interesses individuais das partes do contrato sejam exercidos em conformidade com os interesses sociais, sempre que estes se apresentem.
Portanto, é imperioso destacar que os contratos entre as partes não podem prejudicar a coletividade, caso contrário, o mesmo não atende ao dito princípio, visto que os interesses da coletividade se sobrepõem aos interesses individuais entre as partes.
Desta feita, o próprio Código Civil pátrio reza em seu texto normativo:
Artigo 421. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato. (BRASIL, 2002).
Assim, o presente princípio disciplina que os interesses individuais entre as partes, estejam estritamente em conformidade com os interesses coletivos e sociais, tendo em vista que o contrato particular não pode ferir regras e objetivos da coletividade.
O contrato de adesão é um documento na qual as cláusulas expostas são escritas por uma das partes, na grande maioria das vezes pelo fornecedor dos serviços ou produtos, onde o contratante não possui o poder de alterá-las.
É importante informar que os contratos de adesão possuem validade, até mesmo porque os mesmos são aprovados por uma autoridade competente, a exemplo os contratos de energia elétrica, de telefonia, dentre outros, o que é imperioso destacar é que os contratos de adesão já são predeterminados, ou seja, os mesmo já estão prontos no momento da contratação do consumidor, e assim, o contratante não consegue negociar as cláusulas que estão constantes naquele documento, sendo na maioria das vezes cláusulas que suprimem direitos e garantias dos seus consumidores, ou seja, dos contratantes.
Dessa forma, os autores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald destacam em sua obra:
De fato, um dos contratantes não possui a liberdade de estipulação do conteúdo das cláusulas, restando-lhe apenas a liberdade de aceitar ou não a contratação (take it or leaveit). A qualificação de um contrato como paritário ou de adesão dependerá, portanto, da perquirição se o conteúdo das cláusulas pode ser atribuído a ambas as partes ou se nasceu de uma prévia imposição inegociável de um dos contraentes. Isto evidencia que os contratos de adesão não se distinguem dos modelos clássicos de contrato pelo seu tipo, mas pela sua forma. (FARIAS; ROSENVALD, 2012, p. 299).
O contrato de adesão nada mais é que um documento feito de forma unilateral, ou seja, feito de forma exclusiva entre as partes, onde a outra parte daquela relação contratual não pode efetuar nenhuma alteração, somente aceitar o dito contrato. Este tipo de contrato é o espelho atual da sociedade capitalista e consumista, onde os fornecedores de produtos e serviços não se preocupam com o indivíduo de forma isolada, e sim, na coletividade, mas contratações em massa.
Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2012, p. 298) destacam que o conceito de contrato, fundado na condição de paridade entre sujeitos que definem o conteúdo normativo da regulação de seus interesses, há muito não guarda conexão com a realidade do mercado.
Assim, pode-se conceituar o contrato de adesão como um contrato que é celebrado entre particulares, sendo definido de maneira unilateral, onde uma das partes possui a opção de somente aderir e concordar com as cláusulas, não sendo possível que essa altere qualquer disposição constante naquele documento.
No direito brasileiro, os contratos de adesão estão disciplinados tanto no Código de Defesa do Consumidor, como no Código Civil. No que tange ao CDC[4], o mesmo dispõe:
Artigo 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.
Nesse sentido, diversos doutrinador a exemplo César Fiuza e Giordano Bruno Soares Roberto conceituam o contrato de adesão:
Contrato de adesão é aquele que se celebra pela aceitação de umas das partes de cláusulas contratuais gerais propostas pela outra, a fim de constituir a totalidade ou ao menos a porção substancial do conteúdo de sua relação jurídica. Explicando, tem-se, em primeiro lugar, que o instituto é um contrato, pois o vínculo jurídico é criado pelo acordo de vontades, ainda que uma seja total ou parcialmente preestabelecida. (FIUZA; ROBERTO, 2002, p. 68).
Então, é possível perceber a forma que é concebido um contrato de adesão, onde somente uma das partes impõem as regras, não sendo possível alterá-las, somente aceitá-las.
Já na visão do autor Markus Samuel Leite Norat (2013, p. 309) o contrato de adesão é, portanto, o oposto do contrato de comum acordo, que é aquele contrato realizado mediante a negociação das cláusulas pelas partes (contrat de gré à gré).
Paulo Lôbo (2011, p. 184) destaca em sua obra sobre contratos, que os contratos de adesão as regras de intepretação dos contratos paritários são totalmente inaplicáveis. As regras de interpretação dos contratos são inadequadas em virtude das condições gerais serem unilateralmente predispostas ou utilizadas por uma das partes, não permitem negociação ou acordo, independerem de consentimento e terem natureza abstrata e geral.
Quanto à natureza jurídica dos contratos de adesão, a doutrina informa que a mesma é contratual, vista da relação de contratação e aceite entre as partes.
Assim, pode-se concluir que o contrato de adesão é um contrato extremamente temerário, onde a sua confecção se dá mediante as condições e possibilidades que uma das partes dará a outra, sem que essa tenha a oportunidade de indagar qualquer alteração, tendo em vista que todas as cláusulas já são preestabelecidas.
O Código de Defesa do Consumidor atua como protetor dos consumidores, no que tange às relações consumeristas, e isso se dá tendo em vista que o consumidor é a parte mais hipossuficiente da relação contratual.
É fato e conforme tudo o que ora foi disciplinado, os contratos de adesão são feitos de forma unilateral e não cabe discursão quanto às suas cláusulas, cabendo a outra parte o mero fato de dar o seu aceite ou rejeitá-lo.
Acontece que a grande maioria dos produtos e serviços que possuem contratos de adesão, os mesmos são essenciais para vida humana e em sociedade, a exemplo, os contratos de energia elétrica, de abastecimento de água, de aquisição de equipamentos domiciliares e diversos outros, e assim, cabe o consumidor somente aceitar, não podendo discutir as cláusulas constantes nesse documento, a não ser na seara judicial, onde estão sendo discutidas as ditas cláusulas abusivas ou de restrição de direitos.
Com os presentes normativos jurídicos, é fato que o direito brasileiro positivou a proteção do consumidor, tanto em um texto específico que é o CDC, como no Código Civil, e ainda a própria Constituição Federal em seu artigo 5º protegeu em seu texto o consumidor, pois é sabido que o mesmo é a parte que pode sofrer maiores abusos em uma relação contratual.
Em que pese que o Direito do Consumidor é regido entre partes e por via de contratos de compra e venda, locação, prestação de serviços, dentre outros, estes mesmos contratos, conforme já tratado e quando se referem à contratos de adesão, os mesmos são eivados de cláusulas abusivas e ilegais, onde uma das partes tenta de forma maliciosa restringir os direitos e garantias de outras.
Dessa forma, o autor César Fiuza e Giordano Bruno Soares Roberto (2002, p. 63) expõe que nos contratos de adesão não é possível a negociação do conteúdo substancial da obrigação, enquanto nos demais há possibilidade de debate de cláusulas.
Tendo em vista que os contratos de adesão são confeccionados somente por uma das partes, ou seja, pelo fornecedor ou pelo prestador dos serviços, aquele que efetivamente o construí irá incluir as cláusulas que o mesmo entender que são viáveis para aquele negócio, entretanto, essas ditas cláusulas podem ser abusivas e restritivas de direito, lesando assim o direito da outra parte.
Quanto às cláusulas abusivas nos contratos de adesão, Paulo Lôbo dispõe:
Consideram-se abusivas as cláusulas de contrato de consumo ou as condições gerais dos contratos que atribuem vantagens excessivas ao fornecedor ou predisponente, acarretando em contrapartida demasiada onerosidade ao consumidor ou aderente e desarrazoado desequilíbrio contratual. Por meio delas, o fornecedor ou o predisponente, abusando da atividade que exercem e da debilidade jurídica do aderente ou consumidor, estabelece conteúdo contratual iníquo, com sacrifício do razoável equilíbrio das prestações. (LÔBO, 2011, p. 135).
Nesse esteio, o Código Civil de 2002 brasileiro buscou positivar a proteção e elevar o grau dos abusos contratuais às cláusulas abusivas e restritivas de direito dos contratos de adesão. Assim, versa o dito código:
Artigo 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.
Artigo 423. Quando houver no contrato de adesão cláusulas ambíguas ou contraditórias, dever-se-á adotar a interpretação mais favorável ao aderente.
Artigo 424. Nos contratos de adesão, são nulas as cláusulas que estipulem a renúncia antecipada do aderente a direito resultante da natureza do negócio.
Pode-se assim entender que é possível a apreciação pelo judiciário das cláusulas que uma das partes entender como nula ou invalidade, visto que o direito brasileiro consagrou essa proteção tanto no CDC, como no CC.
O autor Paulo Lôbo (2011, p. 137) acerta ao dizer que o direito brasileiro cominou às cláusulas abusivas o grau mais elevado de invalidade (nulidade), porque o regime de proteção do aderente e do consumidor independe de sua iniciativa, pois de interesse geral.
Atualmente no Brasil existe uma grande quantidade de processos que estão tramitando tanto na Justiça Comum, como nos Juizados Especiais Cíveis, onde as partes tendo em vista da sua autonomia tentam demonstrar os grandes absurdos que determinados contratos de adesão possuem, principalmente os contratos de massa, onde determinados contratados possuem modelos predeterminados de contratos para atender a coletividade.
Um caso prático que trata de cláusulas abusivas são os contratos de plano de saúde, a nível Brasil, onde o plano de saúde limita no tempo a internação hospitalar do segurado. Assim, o Tribunal de Justiça brasileiro de pronunciou por meio da orientação jurisprudencial 302 que versa:
Súmula 302 Enunciado - É abusiva a cláusula contratual de plano de saúde que limita no tempo a internação hospitalar do segurado. (BRASIL, 2004).
Imperioso destacar que tanto o contrato de adesão pode ser inteiramente nulo ou invalidado pela justiça, ou somente às cláusulas que estão sendo apreciadas pelo judiciário, sendo assim adotado o princípio da conservação do negócio jurídico.
O próprio CDC em seu artigo 39º, de forma exemplificativa dispôs sobre a vedação aos fornecedores de produtos e serviços a alguns tipos de cláusulas abusivas, como constar em seus contratos cláusulas de vantagem excessiva, venda casada, elevar preços de produtos e serviços sem justo motivo, dentre outros.
Assim, é possível que mesmo que um consumidor ou contratante seja manifestamente lesado via algum contrato que fora celebrado, o mesmo poderá se valer do judiciário para requerer a nulidade total ou parcial daquele contrato.
Constatamos durante o desenvolvimento deste artigo o quão complexo e importante são os vícios nos contratos jurídicos brasileiros, e em específico os vícios que norteiam os contratos de adesão e as cláusulas abusivas e restritivas de direito.
O contrato é umas das melhores formas de resguardar um direito quanto à uma possível negociação entre particulares, mas estes mesmos contratos podem ser eivados de irregulares, a exemplo prazos irreais de entrega de mercadoria e serviços, preços exorbitantes e inúmeros outros abusos, e nesse sentido os contratos de adesão ganharam notoriedade no direito brasileiro, visto que atualmente no Brasil, o judiciário a todos os anos recebem inúmeros processos que tratam de revisões de contratos, no que tange ao seu conteúdo.
Os contratos de adesão são utilizados em sua grande maioria na seara consumerista, onde o dito contrato já possui cláusulas predeterminadas, onde as mesmas não foram discutidas entre o contratado e o aderente ou contratante, onde o mesmo somente poderá dar o seu aceite ou o rejeitá-lo.
Tendo em vista que alguns produtos ou prestações de serviços que são indispensáveis para uma vida sadia e digna no Brasil, a exemplo as prestações de serviços de água, energia elétrica, compra e venda de eletrodomésticos, os mesmos não podem ser discutidos entre as partes, cabendo apenas ao consumidor de forma obrigatória o aceite no seu inteiro teor daquele contrato determinado.
Assim, pode-se perceber a gravidade da situação, visto que o consumidor no ato da contratação não pode sequer discutir ou dispôs de algo constante naquele contrato que entende ser ilegítimo ou desnecessário, não sendo respeitado os princípios da ampla defesa e do contraditório, e assim os contratados abusam das cláusulas abusivas e restritivas de direito no corpo contratual daquele documento.
Portanto, o Código de Defesa do Consumidor, bem como o Código Civil pátrio cumulado com o judiciário possuem uma grande importância para proteger os direitos e garantias dos contratantes, pois os contratos de adesão em sua grande maioria restringem direitos e garantias dos consumidores, visto que é a parte mais hipossuficiente da relação empresário e consumidor, e que possui menores entendimentos jurídicos dos dispositivos de lei.
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[1] Palavra do latim que tem o significado de ação, atividade, atuação.
[2] Importante filósofo, teórico político, escritor e compositor autodidata suíço. É considerado um dos principais filósofos do iluminismo e um precursor do romantismo.
[3] Pacta sunt servanda é uma expressão do latim conceituada como os "acordos devem ser mantidos” ou "os pactos assumidos devem ser respeitados".
[4] Sigla para Código de Defesa do Consumidor no direito brasileiro
Graduado em Direito pelo Centro Universitário de Sete Lagoas/UNIFEMM. Pós-graduado em Direito do Trabalho e Processo do Trabalho pelo Centro Universitário UNA de Sete Lagoas. Pós-graduado em Direito Tributário pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Mestre em Direito pela Faculdade de Direito Milton Campos. Professor de Direito do Trabalho e Direito Previdenciário. Advogado.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FELIPE AUGUSTO SILVA CUSTóDIO, . Os vícios nos negócios jurídicos no direito brasileiro: a ilegitimidade das cláusulas abusivas nos contratos de adesão. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 ago 2019, 04:33. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53368/os-vcios-nos-negcios-jurdicos-no-direito-brasileiro-a-ilegitimidade-das-clusulas-abusivas-nos-contratos-de-adeso. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
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