RESUMO: O direito à inamovibilidade assegura a possibilidade de remoção do profissional apenas com sua concordância. O artigo se propôs a analisar se, diante da atual conjuntura social e jurídica, e sobretudo diante do crescimento da importância do papel da atividade policial na sociedade, tal direito não poderia ser garantido aos Delegados de Polícia. A conclusão positiva se impõe, de modo que tal direito significaria mais um reconhecimento, em meio a tantos outros que já ocorreram nas últimas décadas, da essencialidade da carreira, o que contribui para a consecução do interesse público no exercício da função do Delegado.
Palavras-chave: delegados, garantia, direito, inamovibilidade.
ABSTRACT: The right to immovability ensures the possibility of removal of the professional only with their agreement. This ressearch examines if, against the current social and legal conjuncture, and especially in view of the growing importance of the role of police activity in society, that right could not be guaranteed to Police Commissioner´s. The awnser is positive, so that such a right would mean another recognition, among many others that have occurred in recent decades, of the essentiality of the career, which contributes to the achievement of the public interest in the exercise of the Delegate's role.
Key-words: police, commissioner´s, guaranty, right, irremovability.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho científico terá por finalidade analisar a aplicação da garantia (ou, conforme se demonstrará, do direito) à inamovibilidade profissional aos Delegados de Polícia. Para tanto, terá como abordagem inicial o papel jurídico e social da citada carreira, bem como a forma pela qual a aplicação do princípio se compatibiliza com o atual tratamento jurídico que a dita profissão recebe do ordenamento jurídico.
Para tanto, o presente artigo será estruturado em três tópicos. No primeiro, serão expostas as circunstâncias jurídicas, sociais e fáticas que se apoiam os dois capítulos seguintes, os quais se mostrarão interligados por uma relação lógica, na qual o autor acredita existir. Também será analisada a disposição normativa contida na Lei nº 12.830/2013, a qual suscita debates sobre se tratar ou não de inamovibilidade, bem como o papel que o Supremo Tribunal Federal – STF pode assumir em potencial mudança.
Nos dois capítulos seguintes, o autor exporá os problemas sociais que demandam a adoção da ideia proposta e a apresentará, analisando as possíveis consequências de tal adoção.
Para alcançar tal desiderato, o trabalho se valerá, sobretudo, da análise de trabalhos científicos, do conteúdo legislativo e das decisões judiciais do STF sobre o tema, de modo a concluir pela necessidade ou não de adequação do entendimento ora vigente com o que será aqui proposto.
A Constituição Federal de 1988 prescreve que é dever do Estado, e direito e responsabilidade de todos, garantir a segurança pública (art. 144, caput). É certo que, apesar da previsão textual atribuir caráter genérico ao munus¸ a obrigação de manter a segurança pública recai sobretudo no Estado, que a exerce por meio das Polícias.
A segurança pública, em todos os seus níveis, encontra-se organizada em unidades administrativas com suas competências claramente definidas pela Constituição Federal e complementadas pelas normas estaduais respectivas. Desse modo, cabe à Polícia Federal apurar as infrações penais praticadas contra a ordem política e social, que desestabilizem o regime democrático, bem como prevenir e reprimir crimes contra bens da União, como também aqueles que tenham repercussão internacional ou interestadual e, ademais, prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes.
Da mesma forma, a Polícia Rodoviária realiza tal mister no âmbito das rodovias federais, sendo-lhe assegurada a possibilidade, por exemplo, de realizar vistoria em veículos e verificar a sua documentação.
Nos Estados, a segurança é repartida entre a Polícia Militar e a Civil, as quais, por mais das vezes, têm suas funções de certo modo confundidas, haja vista a confluência de interesses em apurar e repreender a prática criminosa no âmbito estadual. Ademais, não rara igualmente é a falta de interligação entre suas atividades, o que resulta numa ineficiência no desempenho das suas atribuições e, portanto, enfraquecimento da segurança pública. Conforme ensina Agra, alguns Estados, com o intuito de evitar tal ineficiência, unificam ambas as Polícias ao comando de uma única Secretaria do Estado, como o caso de Pernambuco[1].
O que se busca demonstrar, ao expor as funções de cada ramo da atividade policial do Estado, é a importância dos bens a serem tutelados pela segurança pública. O patrimônio público, a ordem social, a paz, a vida, entre outros bens jurídicos merecem, por parte da lei, um aparato jurídico tamanho que ofereça condições de resguardar a proteção a tais valores. Dessa forma, a partir do momento em que o Estado estrutura seu “braço” policial de modo a exercer dignamente os objetivos previstos na Constituição, na verdade manifesta sua preocupação na manutenção dos valores acima citados, dada a relevância que possuem no cenário de pacificação social e implementação do Estado Democrático de Direito.
Portanto, a relevância dos bens a serem resguardados pela atividade policial do Estado demanda atribuição a sujeitos suficientemente capacitados para tanto.
Nesse contexto, é possível perceber que a Constituição de 1988 ofereceu novos contornos às carreiras que compõem o cenário jurídico atual. Isso porque, por exemplo, separou as funções designadas ao Ministério Público Federal daquelas atribuídas à Advocacia-Geral da União (com previsão de direito de opção aos então membros – art. 29 § 2º do ADCT), bem como previu a representação de Estados por meio de Procuradoria própria (art. 132), e também assegurou a prestação de assistência jurídica gratuita aos economicamente hipossuficientes através da Defensoria Pública.
Tais carreiras, ao longo dos anos, passaram por constantes avanços que contribuem para seu fortalecimento institucional, de modo a fomentar o bom funcionamento de suas atividades e assegurar, cada vez mais, que os profissionais responsáveis pelo seu exercício possuam garantias para o seu máximo desempenho.
Exemplo disso é o crescimento do tratamento constitucional conferido aos Defensores Públicos, que, por ordem do art. 134 § 2º, por exemplo, possuem iniciativa de sua proposta orçamentária; bem como lhe são asseguradas a autonomia funcional e administrativa, o que exclui qualquer subordinação ao Executivo e contribui para sua independência.
Dessa forma, o fortalecimento das carreiras jurídicas é um meio de solidificar as bases do Estado de Direito, pois as funções a elas conferidas dizem respeito ao que há de mais fundamental no papel do Estado na sociedade: a garantia dos direitos do cidadão através de suas instituições.
No que diz respeito aos Delegados de Polícia, o sistema normativo vigente optou por configurar uma certa assimetria se comparado o regime ao qual se submetem os Delegados, em relação às outras carreiras já apontadas. A garantia de inamovibilidade, por meio da qual Magistrados, membros do Ministério Público e Defensores Públicos não podem ser transferidos do local de sua lotação sem seu consentimento, não é conferida aos Delegados de Polícia, muito embora a relevância das funções que estes desempenhem seja equivalente às daqueles.
Ademais, tal assimetria representa, ao fim e ao cabo, uma inexplicável desigualdade de garantias entre funções que, além de atuarem em conjunto no desempenho de várias atividades (e, por isso, mereceriam as mesmas garantias), possuem a mesma importância na consecução das finalidades precípuas do Estado.
A falta da inamovibilidade aos Delegados permite, portanto, que o Governador de um determinado Estado, por liberdade própria, desloque um Delegado de Polícia das suas atribuições. Ou seja, o trabalho desempenhado pela Polícia, que é função de Estado e não deve se submeter ao juízo de conveniência dos governantes, pode, em dadas circunstâncias, sofrer interferência da filosofia de governo vigente em um determinado momento.
O que se busca afirmar é que, diante da relevância que a atividade do Delegado de Polícia ostenta perante a sociedade, o aumento das garantias profissionais a ele conferidas, tal qual a inamovibilidade, significam uma valorização do exercício de uma função irrenunciável por parte do Estado, e, portanto, insuscetível de interferência fundada em razões políticas.
Primeiramente, necessário que se faça o enquadramento da natureza que aqui se defende da inamovibilidade. Embora haja opiniões no sentido de se tratar de um princípio, ou de uma garantia, no nosso entender melhor seria tratar a inamovibilidade como um direito.
Apesar de a discussão oferecer pouca relevância prática, é crescente a discussão doutrinária, por exemplo, sobre a força normativa dos princípios e os limites de aplicabilidade dessas espécies normativas. Portanto, considerando, em uma definição objetiva, que princípios são espécies de norma que prescrevem um fim almejado sem, contudo, determinar uma conduta específica a ser observada, melhor seria afastar a inamovibilidade desse conceito e enquadrá-la como um direito. Não seria garantia, também, pelo fato de que, segundo os autores que realizam essa distinção, garantias são direitos que precisam de instrumentalização para sua efetivação[2]. Direitos, por si sós, são executáveis plenamente, sem que seja necessário qualquer providência de caráter procedimental para tanto.
Dessa forma, tendo em vista que a inamovibilidade é oponível, pelo seu titular, sem a necessidade de um processo para tal, melhor situá-la no campo dos direitos. Ao revés, segundo a Constituição a existência de um procedimento se dá para afastá-la, já que a Carta exige o voto da maioria absoluta dos membros do Tribunal ou Conselho de Justiça, garantida a ampla defesa (art. 93, VIII, CF). A denominação de “garantia” no corpo do texto constitucional, justifica-se ter sido adotada por uma questão linguística e didática, já que situada em conjunto com, essas sim, garantias, como a aposentadoria.
O direito à inamovibilidade, por meio da qual se garante a impossibilidade de remoção sem o consentimento do profissional, é historicamente garantida aos Magistrados (art. 95, II, CF)[3] e aos membros do Ministério Público (art. 128, § 5º, I, b, CF).
Com o advento da Constituição de 1988, o direito à inamovibilidade foi assegurado, igualmente, aos Defensores Públicos, agentes incumbidos de função da mais alta importância: o acesso à Justiça dos mais necessitados. Percebe-se, portanto, que a carreira de Defensor Público foi, aos poucos, incorporando garantias que fortalecem a sua atividade profissional e valorizam o papel dos agentes públicos na promoção da Justiça. O mesmo pode ser afirmado em relação aos Delegados de Polícia.
A importância social e jurídica de seu papel profissional é proporcional com a extensão, a estes, da inamovibilidade prevista para outras carreiras. Ainda no que diz respeito a sua atividade, existem particularidades, não presentes, por exemplo, na carreira dos Defensores Públicos, que justificam o direito à inamovibilidade.
Cite-se, por exemplo, a possibilidade de um Delegado estar responsável por conduzir determinada investigação criminal que envolva, efetiva ou potencialmente, agentes públicos de alto escalão, tais como a cúpula do órgão administrativo ao qual se encontra vinculado. É de se imaginar que o progresso da investigação não seja de interesse dos potenciais atingidos, que, não raro, teriam a prerrogativa de, ao seu juízo, deslocar determinado delegado de suas funções, prejudicando o andamento imparcial da atividade.
O reconhecimento da inamovibilidade, em longo prazo, pode contribuir também pela solidificação das Delegacias de Polícia como estruturas administrativas fundamentais no Estado de Direito. O direito conferido aos Delegados, seria, portanto, apenas mais uma forma de tornar a atividade policial, enquanto função de Estado, um múnus intangível à filosofias políticas passageiras.
À semelhança do que ocorre com as carreiras já agraciadas com esse direito, a inamovibilidade, caso estendida aos Delegados de Polícia, obviamente não seria garantida em termos absolutos. Da mesma forma que existe a ressalva do interesse público na possível remoção do magistrado ou membro do MP, poderia ser prevista tal possibilidade no que tange aos Delegados. É possível imaginar, por exemplo, a existência de interesse público na remoção de um Delegado que atue em uma Delegacia em conjunto com mais um ou dois colegas, para outra que esteja no momento sem Delegado.
Por se tratar de ato administrativo, evidentemente que a remoção não estaria imune ao controle externo de legalidade, no qual poderia ser comprovada a existência de desvio de finalidade ou de competência (abuso de poder).
A discussão sobre o direito à inamovibilidade dos Delegados de Polícia remete à análise do conteúdo do artigo 2º, §5º da Lei nº 12.830/2013, o qual possui a seguinte redação:
Art. 2º As funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais exercidas pelo delegado de polícia são de natureza jurídica, essenciais e exclusivas de Estado.
[...]
§ 5º A remoção do delegado de polícia dar-se-á somente por ato fundamentado.
Tanto o caput do artigo como o seu parágrafo 5º oferecem comandos normativos que merecem ser analisados no presente estudo.
O caput do art. 2º atesta a ideia já defendida nesse trabalho de que a função de polícia (judiciária, na linha do que trata o artigo), a ser exercida pelos Delegados, representa uma função exclusiva de Estado. Além disso, o artigo, também na linha aqui defendida, qualifica a atividade como “essencial”, o que demonstra a valorização da atividade no contexto de pacificação ao qual o Direito se propõe.
A garantia do direito à inamovibilidade, entre outras razões, foi defendida aos Delegados de Polícia, também por conta da essencialidade de sua função, a qual, reconhecida sua importância, é merecedora de direitos e garantias que permitam o mais eficiente funcionamento em prol da coletividade.
No que diz respeito ao parágrafo 5º, é certo que a exigência de fundamentação para o ato de remoção do Delegado pode conduzir ao entendimento de que àqueles é conferido o Direito de inamovibilidade. Aliás, há brilhantes manifestações[4] que emanam da comunidade jurídica no sentido de que a garantia do parágrafo supracitado é hipótese de inamovibilidade, dados os limites que a legislação impôs para a remoção de ofício dos Delegados, opinião que ousamos discordar.
Acreditamos que existe uma sutil diferença entre o tratamento legal conferido às demais autoridades e a garantia prevista no artigo 2º da Lei nº 12.830/2013. Muito embora, em termos terminológicos, a diferença seja pequena, sua dimensão se agiganta no momento da aplicabilidade prática entre direito à inamovibilidade e o direito à remoção fundamentada.
A presença de motivo lícito em qualquer ato administrativo, tal qual o ato de remoção de um servidor, é uma exigência legal e é pressuposto de sua legalidade. Especificamente quanto a uma remoção legalmente autorizada, a existência de motivo que atenda ao interesse público, na verdade, não deve ser vista como uma garantia profissional, mas sim como um mero atendimento ao que determina a lei, pois caso o motivo que rege o ato estivesse eivado de ilegalidade, o ato seria ilegal, já que o vício decorrente do motivo ilegal não é convalidável[5].
Dessa forma, ao expor a motivação do ato de remoção do Delegado, em obediência ao comando previsto no artigo 2º, §5º da Lei nº 12.830/2013, o administrador público nada mais faz do que cumprir seu dever de, como gestor da coisa pública, atender ao interesse público no que rege a sua atividade.
Porém, acreditamos que o direito à inamovibilidade vai além. O que o diferencia do dever de fundamentação previsto na lei supra é um aspecto determinante: a valoração da vontade do servidor. O traço diferenciador da inamovibilidade para o dever geral de motivação reside justamente na analisar o elemento volitivo do agente envolvido. O que caracteriza o direito à inamovibilidade é justamente o servidor a ser removido estar de acordo com a remoção a ser realizada. Ou seja, existe uma confluência de interesses: um, o público, materializado no ato a ser praticado pelo administrador; o outro, particular, do servidor removido.
A violação à independência profissional reside justamente quando o interesse público é viciado no seu motivo, na medida em que a remoção do servidor é praticada com vistas à interesses escusos. Ocorre que é plenamente imaginável que tais interesses, muito embora não sejam compatíveis com o interesse público, sejam mascarados pela existência de motivação com aparência de legalidade.
Tal possibilidade é ainda mais palpável quando se ratifica a ideia (já solidificada na jurisprudência e doutrina pátria) da impossibilidade de controle do mérito administrativo por parte do Judiciário. Ou seja, caso o ato de remoção ou transferência contenha uma motivação fundada em premissas de aparente legalidade, não existe maneira de se invalidar o ato administrativo mesmo que aquelas digressões, na verdade, escondam um interesse ilegal do administrador.
Nada impede, portanto, que a vontade de remover um Delegado de Polícia seja estimulada pelo objetivo de interferir na atividade daquele profissional mas que, através do ato administrativo devidamente fundamentado, seja conferida uma aparência de legalidade, com o fim de cumprir os requisitos exigidos pela lei.
Dessa forma, a necessidade de fundamentação não é garantia de atendimento ao interesse público que a lei exige, sobretudo diante da impossibilidade de discussão, no Judiciário, do mérito contido no ato administrativo. A concordância do servidor se mostra, pois, como um requisito demasiadamente mais rígido para que se pratique um ato legal e consentâneo com o interesse público envolvido na remoção.
É evidente, também, que o direito de inamovibilidade não seria, caso conferido aos Delegados, implementado de maneira absoluta, pois assim já não o é em relação às carreiras que hoje usufruem dessa prerrogativa. Conforme assevera o art. 93, VII, da Constituição, o direito à inamovibilidade para os magistrados pode ser afastado caso assim manifeste o interesse público. Da mesma forma poderia ser assegurado aos Delegados de Polícia, estabelecendo uma chancela ao afastamento da garantia por parte de um órgão superior de controle.
É evidente que, haja vista o direito à inamovibilidade ser garantido, para as outras carreiras que dele gozam, através de previsão constitucional, o mesmo poderia ser feito em relação aos Delegados. Contudo, não se pode afastar, igualmente, a possibilidade de que o Supremo Tribunal Federal o garanta através de jurisprudência vinculante.
Muito embora não se possa excluir a possibilidade de, futuramente, seja promulgada uma Emenda Constitucional nesse sentido, o que não ofenderia os limites ao poder de reforma constitucional, o STF, da mesma maneira que assegura a fruição de direitos semelhantes por meio de sua jurisprudência, poderia fazê-lo na hipótese aqui tratada.
Aliás, foi através dos posicionamentos da Suprema Corte que se garantiu, a diversas carreiras, vantagens das mais diversas naturezas que abrem o caminho para a discussão sobre a inamovibilidade dos Delegados de Polícia. Há tempos que a via legislativa, sobretudo pela demora que lhe é inerente, não é a única via de conquista de direitos individuais e coletivos, sobretudo em tempos de altivez judicial ante às permissões concedidas pelo ordenamento.
Foi por meio de manifestação do Supremo Tribunal Federal que se garantiu, por exemplo, o direito à inamovibilidade dos juízes substitutos[6], o que representou atuação positiva da Corte no sentido de confirmar a garantia a parte da carreira que até então sofria questionamento. Igualmente, o STF garantiu aos Defensores Públicos o recebimento de honorários advocatícios em causas que atuem contra o próprio ente federativo[7]. Do mesmo modo, garantiu que Constituições Estaduais previssem foro por prerrogativa de função para Procuradores Estaduais[8].
Especificamente quanto à inamovibilidade em relação aos Delegados, o STF possui um precedente bastante antigo[9] no qual o direito à inamovibilidade, garantido pelo Estatuto dos Funcionários Públicos de Santa Catarina, foi negado aos Delegados de Polícia em razão da autonomia administrativa em relocar seus funcionários conforme seu interesse.
Considerando que o precedente data de mais de 50 anos, acreditamos que é chegada a hora de revisitá-lo, sobretudo diante de várias Ações Diretas de Inconstitucionalidade em trâmite no Supremo (ADI´s 5520, 5522 e 5528)[10], de estabelecer novos contornos à temática, tendo em conta, inclusive, que desde a citada decisão ocorreram incontáveis mudanças na estrutura profissional e no tratamento legal conferido aos Delegados, o que reforça a necessidade de se conferir garantias e direitos compatíveis com o atual estágio de relevância profissional que enfrentam.
CONCLUSÕES
Os Delegados de Polícia, atualmente não detentores do direito à inamovibilidade profissional, ganharam, ao longo dos anos, valorização e reconhecimento social. O papel que hoje desempenham na sociedade é acompanhado da crescente percepção da importância de sua atividade para o convívio social pacífico. O rigor cada vez maior nos concursos públicos de seleção, bem como a natural modernização das condições de trabalho, devem ser acompanhadas de mudanças que impliquem em maiores garantias profissionais no que diz respeito ao exercício da atividade. Dessa forma, é possível conceber que o Delegado, assim como as carreiras que já são detentoras da inamovibilidade, possui um papel de relevância tal que justifique a garantia daquele direito. Evidentemente, a prerrogativa não significaria absoluta intangibilidade de sua atuação, uma vez que o sistema investigatório no qual atua oferece inúmeras ferramentas de controle técnico e profissional que permitem o constante monitoramento da legalidade das atividades dos profissionais. Portanto, garantida a manutenção dos meios de aferição de legalidade, e sempre em vista do maior interesse público, tais profissionais, que atuam na garantia da paz social, devem ser inamovíveis, e que tal direito seja usufruído de modo a satisfazer o interesse público inerente à função.
REFERÊNCIAS
AGRA, Walber de Moura. Curso de Direito Constitucional. 7ª. Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2012.
ALEXANDRE, Ricardo. DE DEUS, João. Direito Administrativo – 3 ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2017.
HOFFMANN, Henrique. Inamovibilidade é prerrogativa do delegado e garantia do cidadão. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2015-out-27/academia-policia-inamovibilidade-prerrogativa-delegado-garantia-cidadao>. Acesso em 23 de ago 2019.
NOTÍCIAS STF: PGR questiona normas que atribuem independência funcional a delegados de polícia. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=317092>. Acesso em 22 de ago. 2019.
STF. Plenário. AR 1937 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 30/06/2017.
STF. Plenário. HC 103803/RR, Rel. Min Teori Zavascki, julgado em 01/07/2014.
STF. Plenário. MS 25747/SC, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 17/05/2012.
STF. Segunda Turma. RO em Mandado de Segurança nº 13.255/SC, Rel. Min. Pedro Chaves, julgado em 23/08/1966.
[1] AGRA, Walber de Moura. Curso de Direito Constitucional. 7ª. Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 771.
[2] AGRA, Walber de Moura. Curso de Direito Constitucional. 7ª. Ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 239.
[3] O direito à inamovibilidade dos magistrados já era previsto, inclusive, na Constituição Federal anterior, de 1967, em seu artigo 108, II, que assim previa: Art. 108 - Salvo as restrições expressas nesta Constituição, gozarão os Juízes das garantias seguintes: II - inamovibilidade, exceto por motivo de interesse público, na forma do § 2º; § 2 º - O Tribunal competente poderá, por motivo de interesse público, em escrutínio secreto, pelo voto de dois terços de seus Juízes efetivos, determinar a remoção ou a disponibilidade do Juiz de categoria inferior, assegurando-lhe defesa. Os Tribunais poderão proceder da mesma forma, em relação a seus Juízes.
[4] HOFFMANN, Henrique. Inamovibilidade é prerrogativa do delegado e garantia do cidadão. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2015-out-27/academia-policia-inamovibilidade-prerrogativa-delegado-garantia-cidadao>. Acesso em 23 de ago 2019.
[5] ALEXANDRE, Ricardo. DE DEUS, João. Direito Administrativo – 3 ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2017.
[6] STF. Plenário. MS 25747/SC, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 17/05/2012.
[7] STF. Plenário. AR 1937 AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 30/06/2017.
[8] STF. Plenário. HC 103803/RR, Rel. Min Teori Zavascki, julgado em 01/07/2014.
[9] STF. Segunda Turma. RO em Mandado de Segurança nº 13.255/SC, Rel. Min. Pedro Chaves, julgado em 23/08/1966.
[10] NOTÍCIAS STF: PGR questiona normas que atribuem independência funcional a delegados de polícia. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=317092>. Acesso em 22 de ago. 2019.
Advogado. Universidade Católica de Pernambuco - UNICAP. Pós-graduando em Direito Constitucional pela rede de ensino LFG/Anhanguera. Pós-graduado em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: VALADARES, Victor David de Azevedo. Inamovibilidade aos Delegados de Polícia: é chegada a hora? Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 set 2019, 04:38. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53465/inamovibilidade-aos-delegados-de-polcia-chegada-a-hora. Acesso em: 22 nov 2024.
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