RESUMO: O presente artigo tem por objetivo discutir a recente legislação no que se refere a alterações que facilitaram a posse e o porte de arma de fogo.
Palavras chaves: registro de arma de fogo, posse de arma de fogo, porte de arma de fogo, novos requisitos, efetiva necessidade, calibres permitidos, calibres restritos.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Nova nomenclatura e facilitação para o registro e posse de arma de fogo. 3. Recentes Entendimentos jurisprudências sobre o tema. 4. Conclusão.
1. INTRODUÇÃO
A lei 10.826/2003 conceituou registro, posse, porte e crimes referentes a arma de fogo, e em seu art. 23 previu o disciplinamento da matéria por parte do Poder Executivo, conforme proposta do Comando do Exército. Os principais decretos que regulam essa lei foram recentemente publicados no mês de junho do corrente, decretos 9.845/2019, 9.846/2019 e 9.847/2019; percebe-se, de acordo com os novos ordenamentos, uma diminuição da dificuldade para registrar, possuir e portar uma arma de fogo, o que vem também se refletindo em recentes jurisprudências.
2. NOVA NOMENCLATURA E FACILITAÇÃO PARA O REGISTRO E POSSE DE ARMA DE FOGO.
Com a edição dos decretos surgiram novos conceitos no que se refere a armas de fogo, uma nova classificação foi utilizada denominando haver armas de Porte, Portáteis e não Portáteis.
No art. 2 º, incisos VII, VIII e XI , do decreto 9.845/2019 encontramos que:
VII- arma de fogo de porte – as armas de dimensões e peso reduzidos que podem ser disparadas pelo atirador usando apenas uma de suas mãos, a exemplo de pistolas, revólveres e garruchas.
VIII- arma de fogo portátil- as armas de fogo que, devido a suas dimensões ou ao seu peso, podem ser transportadas por uma pessoa, tais como fuzil, carabina e espingardas
XI- armas de fogo não portátil- as armas que, devido ás suas dimensões ou ao seu peso, precisam ser transportadas por mais de uma pessoa
Duas grandes novidades trazidas pelo decreto 9.845/2019 fazem menção ao aumento da energia cinética no final do cano permitindo que alguns calibres(conforme listado na Portaria 1.222 de 12 de agosto de 2019) antes restritos agora passem a ser permitidos atendidos aos requisitos legais; a outra grande novidade foi a apresentação da declaração de efetiva necessidade para aquisição e registro de arma de fogo.
No art. 2 º do decreto 9.845/2019 há a previsão de que a arma de porte e de portáteis de alma raiada serão de uso permitido se a energia produzida pelo projétil no final do cano não ultrapassar á seiscentos e vinte joules. Se ultrapassar esse limite ou se for não portátil será considerada de uso restrito.
Interessante notar que com relação as armas de alma lisa, não há menção no citado decreto quanto a energia do projétil o que leva a interpretação de que não haverá restrição.
As armas proibidas, ainda segundo esse decreto, seriam aquelas disfarçadas como por exemplo uma caneta que dispara projeteis e também aquelas proibidas devido acordos e tratados internacionais.
Com esse aumento da energia alguns calibres que antes eram considerados restritos passaram a ser permitidos tais com .40, 357 Magnum e 45 colt.
Para um aprofundamento sobre os calibres permitidos vide Portaria n º 1.222 de 12 de agosto de 2019 onde consta o calibre nominal, a energia e a classificação entre permitido e restrito.
Para aferimento da efetiva necessidade, de acordo com o decreto 9.845/2019, basta a declaração, isso facilitou a posse de arma de fogo registrada, antes havia um juízo discricionário para entendimento sobre a real necessidade. Podemos afirma que houve uma facilitação para a posse de arma de fogo e o aumento significativo do poder de fogo das armas de uso permitido, sendo observados, é claro, outros requisitos legais previstos notadamente no artigo 3 º do citado decreto.
Houve um aumento do prazo de validade do registro que passou a ser de dez anos, segundo 2 º do art. 4 do decreto 9.845/2019.
Vale mencionar o art. 57 do decreto 9.847/2019 que prevê que no prazo de 60 dias serão apreciados pela Polícia Federal, Exército, Sinarm e Sigma. Transcorrido esse prazo sem deliberação serão considerados aprovados tacitamente. Contudo poderão ser cassados se forem encontradas irregularidades posteriormente se houverem preenchidos os requisitos legais.
A lei 13.870/2019 alterou o art. 5 º da lei 10.826/2003 de modo a permitir a posse da arma de fogo em toda extensão do imóvel rural, o que em tese significa que havendo o registro correto da arma vai ser possível portar a mesma nos limites da propriedade.
O Decreto 10.030 de 30 de setembro de 2019 que alterou parte do decreto 9.845/2009 permitindo a diversas carreiras na área de segurança publica, dentre elas a policia, a possibilidade de adquirir armas de fogo de uso permitido ou restrito não havendo necessidade de comprovar a inexistência de inquérito policial ou processo criminal.
Recentemente nova alteração na legislação permitiu ao cidadão a possibilidade de solicitar à Polícia Federal autorização para comprar uma arma importada sem CR(Certificado de Registro de arma de fogo para as atividades de tiro desportivo, caça ou coleção ), conforme previsto na EB10-N-03.002 aprovada pela portaria nº 1.729 de 29 de outubro de 2019.
3. RECENTE JURISPRUDÊNCIA SOBRE O TEMA.
Decisão liminar suspendeu norma da ANAC que restringe a casos específicos o porte de arma de fogo dentro de aviões. Em atendimento a um pedido de liminar interposto pela Adepol(Associação de Delegados de Policia do Brasil foi proferida a seguinte decisão:
D E C I S Ã O Cuida-se de ação sob o procedimento comum ajuizada por ASSOCIAÇÃO DE DELEGADOS DE POLÍCIA DO BRASIL – ADEPOL DO BRASIL em face da AGÊNCIA NACIONAL DE AVIAÇÃO CIVIL – ANAC, objetivando que “seja concedida liminarmente a tutela de urgência pleiteada, para determinar a Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC(…)a suspensão imediata da Resolução no 461/2018 (...). Conta que a “a Agência Nacional de Aviação Civil – ANAC, editou a Resolução no 461/2018, a qual, dentre outras disposições, restringiu e normatizou o embarque armado de policiais de diferentes instituições, dentre as quais os Delegados de Polícia Civil das Policias Civis dos 27 Estados da Federação e Distrito Federal, alterando a forma como a mesma deve ser feita”, uma que que a “referida norma supramencionada passou a obrigar os Delegados de Polícia Civil (além de outros policiais civis, militares, rodoviários federais) a entregarem sua arma de fogo a empresa aérea sem os procedimentos anteriormente vigentes, que apenas remetiam a obrigatoriedade de desmuniciamento para o embarque na aeronave com porte de arma”. Alega que a “referida Resolução criou uma restrição que ofende diretamente prerrogativa funcional conferida originariamente pelo legislador federal e pelo próprio Governo Federal a tais categorias de servidores, uma vez que a Lei 10.826/03 e o Decreto Federal 5.123/04 foram expressos em considerar o porte de arma de fogo em todo território nacional como intrínseco à função exercida pelos Delegados de Polícia e demais servidores integrantes de diferentes corporações da área de segurança pública”. É, no essencial, o relatório. Decido. (... )De início, transcrevo, parcialmente, o artigo 6º da Lei n° 10.826/03, que trata, entre outros temas, do registro de armas de fogo: Art. 6 É proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os o casos previstos em legislação própria e para: (…) II - os integrantes de órgãos referidos nos incisos I, II, III, IV e V do caput do art. 144 da Constituição Federal e os da Força Nacional de Segurança Pública (FNSP); (Redação dada pela Lei nº 13.500, de 2017) (...) Verifica-se que, de fato, o porte de arma, no contexto desta demanda, é deferido aos integrantes das carreiras de segurança pública, constituindo verdadeira prerrogativa de seus membros, não estando à mercê de disposições genéricas aplicáveis aos demais cidadãos. Entretanto, a Resolução ANAC nº 461/2018 estipula o seguinte: “Art. 3o. O embarque de passageiro portando arma de fogo a bordo de aeronaves deve se restringir aos agentes públicos que, cumulativamente, possuam porte de arma por razao de oficio e necessitem comprovadamente ter acesso a arma no período compreendido entre o momento do ingresso na sala de embarque no aeródromo de origem e a chegada a área de desembarque no aeródromo de destino. Art. 4o A necessidade de acesso a arma para fins de embarque limita-se as hipóteses em que o agente publico, durante o período mencionado no caput do art. 3o desta Resolução, realiza qualquer das seguintes atividades: I - escolta de autoridade ou testemunha; II - escolta de passageiro custodiado; III - execução de técnica de vigilância; ou IV - deslocamento após convocação para se apresentar no aeródromo de destino preparado para o serviço, em virtude de operação que possa ser prejudicada se a arma e munições forem despachadas. §1o Na hipótese dos incisos I e II do caput, a necessidade de acesso a arma abrange o voo no qual o escoltado efetivamente e transportado. (…) Ocorre que é possível verificar que a prerrogativa inscrita no inciso II do art. 6º da Lei nº 10.826/03 foi reafirmada pela redação dada pela Lei nº 13.500, de 2017, configurando norma específica posterior à legislação mencionada pela ANAC, com prevalência sobre a regra menos específica anterior, portanto. Com relação aos limites da competência normatizadora das agências reguladoras, invoco os argumentos esposados pela Exma. Ministra Rosa Weber, em seu relatório, quando do julgamento da ADI 4874, no sentido de que “o poder normativo exercido pelas agências reguladoras vê os seus limites materiais condicionados aos parâmetros fixados pelo legislador. (...) a norma regulatória deve compatibilizar-se com a ordem legal, integrar a espécie normativa primária, adaptando e especificando o seu conteúdo, e não substituí-la ao inovar na criação de direitos e obrigações. Seu domínio próprio é o do preenchimento, à luz de critérios técnicos, dos espaços normativos deixados em aberto pela legislação, não o da criação de novos espaços(...). Além disso, destaco a melhor doutrina sobre o tema, do professor José Afonso da Silva : “O poder regulamentar não é poder legislativo, por conseguinte não pode criar normatividade que inove a ordem jurídica. (...) Ultrapassar esses limites importa em abuso de poder, usurpação de competências, tornando írrito o regulamento dele proveniente, e sujeito a sustação pelo Congresso Nacional (art. 49, V). Doutrinariamente, pelo menos, o regulamento assemelha-se à lei em seu caráter geral, impessoal e permanente; mas dela se distingue não só por ser diferente o órgão que o estabelece, como por ser uma norma jurídica secundária e de categoria inferior à da lei. (..) Diante do exposto, DEFIRO a tutela de urgência para suspender, imediatamente, os efeitos da Resolução nº 461/2018 em favor dos associados da impetrante.
BRASIL. 20ª Vara Federal Cível da SJDF. Procedimento Cível nº 1022488-19.2018.4.01.3400. Juiz Renato Borelli. Ação ajuizada pela Associação dos Delegados do Brasil. 2019. Grifo nosso.
Decisão Liminar alarga o porte de arma as guardas municipais. Em ação ajuizada por um partido político foi proferida a seguinte decisão:
(...)Conclui que o porte de arma de fogo, dentro ou fora do horário de serviço, é imprescindível a todos os guardas municipais e não apenas para aqueles que exercem suas funções em capitais ou em Municípios com população superior a 500.000 habitantes, de sorte que, ao conceber restrição discriminatória a esse direito, incorreu o Estatuto do Desarmamento em flagrante inconstitucionalidade. Pede o deferimento de medida cautelar inaudita altera parte, até o julgamento de mérito da presente ação, para suspender a eficácia do inc. IV do art. 6º, bem como das expressões das capitais dos Estados e com mais de 500.000 (quinhentos mil) habitantes , constantes no inc.III, do art. 6º da Lei nº 10.826/2003, intimando-se o Presidente da República e os Presidentes do Senado Federal e da Câmara dos Deputados, seguindo-se a oitiva do Advogado-Geral da União e do Procurador-Geral da República e, ao final, a procedência do pedido de declaração de inconstitucionalidade. É o relatório. Decido(...)
BRASIL. STF. Medida Cautelar Na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.948. DF. Relator: Min. Alexandre de Moraes. Requerente: Democratas - Diretório Nacional. 2018.
Os julgados acima demonstram uma tendência dos Tribunais de adequar uma interpretação da norma de modo a fortalecer o direito ao porte de arma relacionado a categorias que cuidam da segurança pública.
4. CONCLUSÃO
Os novos decretos permitiram uma facilitação do registro e posse de arma de fogo na medida em que tornou a declaração da necessidade como suficiente para comprovar sua existência. Houve ainda um aumento no poder de fogo das armas permitidas liberando calibres antes restritos tais como .45, e Magnum 357. Ocorreu um alargamento do prazo de validade do registro de armas de fogo para 10 anos. A importação também ficou mas branda, não sendo mais preciso CR (Certificado de Registro) para aquisição de armas importadas. Policiais, dentre outros cargos previstos na legislação, ao adquirirem arma de uso permitido ou restrito estão dispensados do requisito da inexistência de inquérito policial ou processo criminal.
5. BIBLIOGRAFIA
1. Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003 disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.826.htm> , Acessado em 08.11.2019
2. Lei nº 13.870, de 17 de setembro de 2019 disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Lei/L13870.htm>. Acessado em 08.11.2019.
3. Decreto nº 9.845 de 25 de junho de 2019. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Decreto/D9845.htm>. Acessado em: 08.11.2019.
4. Decreto nº 9.846 de 25 de junho de 2019. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2019-2022/2019/Decreto/D9846.htm>. Acessado em: 08.11.2019.
5. Decreto nº 9.847 de 25 de junho de 2019. Disponível em:< http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/D9847.htm>. Acessado em 08.11.2019.
6. Decreto n º 10030 de 30 de setembro de 2019. Disponivel em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2019/decreto/D10030.htm >. Acessado em 08.11.2019.
7. Decreto nº1.222. de 12 de agosto de 2019 . Disponível em:< http://www.in.gov.br/en/web/dou/-/portaria-n-1.222-de-12-de-agosto-de-2019-210735786>. acessado em 08.11.2019.
8.Portaria n 1729 de 29 de outubro de 2019. Disponível em: <https://www.lex.com.br/legis_27902307_PORTARIA_N_1729_DE_29_DE_OUTUBRO_DE_2019.aspx> acessado em 08.11.2019
9. BRASIL. 20ª Vara Federal Cível da SJDF. Procedimento Cível nº 1022488-19.2018.4.01.3400. Juiz Renato Borelli. Ação ajuizada pela Associação dos Delegados do Brasil. 2019.
10. BRASIL. STF. Medida Cautelar Na Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.948. DF. Relator: Min. Alexandre de Moraes. Requerente: Democratas - Diretório Nacional. 2018.
Bacharel em Direito pela Universidade Católica de Pernambuco, Especialista em Ciências Penais pela Universidade Anhanguera - UNIDERP, Delegado de Polícia Civil em Pernambuco.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: MONTE, Valmir Gomes do. Novos aspectos legais referentes a posse e porte de arma de fogo Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 11 nov 2019, 04:58. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53747/novos-aspectos-legais-referentes-a-posse-e-porte-de-arma-de-fogo. Acesso em: 26 nov 2024.
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