JOSÉ ARAÚJO PINHEIRO JUNIOR
(Orientador)
RESUMO: Neste estudo, analisa-se as mais variadas formas de controle, tanto em caráter preventivo quanto no repressivo. Com os apontamentos de atos de improbidade, há discussão dos meios legais para repressão dos mesmos, apontando quais são os pontos determinantes e aspectos sociais influenciadores para a resistência dos agentes ímprobos, que insistem em causar danos ao erário público. Os princípios da Administração Pública, o papel das Cortes de Contas, os códigos de ética, as variações patrimoniais e o Poder Judiciário como ponte para o controle por parte da sociedade serão delimitados para detecção de condutas alheias aos mandamentos legais, quando da tutela do patrimônio público, além de definir os papeis desses meios fiscalizatórios de forma conjunta ou separada. São abordados os agentes de controle bem como as funções, dificuldades e alternativas encontradas no que diz respeito ao exercício da Controladoria Interna e Externa nos mais variados entes públicos e sua relevância para a segurança jurídica da coletividade e da própria gestão, concomitantemente o estudo apresenta uma breve reflexão acerca das consequências de curto prazo, no caso de pertinência das atitudes de agentes descompromissados com a manutenção do patrimônio público.
Palavras-chave: Improbidade Administrativa. Códigos de Ética. Controle Interno.
ABSTRACT: The work analyzed the most varied forms of control, at the same time in preventive and repressive. There is a discussion of the illegal means with the remarks for the repression of misconduct acts, pointing out which are the determining points and social aspects that influence the resistance of the unworthy agents, who insist on causing damage to the public purse. The principles of Public Administration, the role of the Courts of Auditors, the codes of ethics, the patrimonial variations and the Judiciary Power were the delimitation, to detect of conduct outside the legal commandments. It is as a bridge for the control by the society, as regards the protection of the public patrimony, besides defining the roles of these supervisory means both jointly and separately. The study approached the control agents and the functions, difficulties and alternatives found, related to the exercise of Internal and External Controlling, in the most varied public organs and its relevance to the legal certainty of the collective and the management itself. Simultaneously the study presented a brief reflection on the short-term consequences, in the case of the pertinence of the attitude of uncommitted agents with the maintenance of the public patrimony.
Keywords: Administrative Misconduct. Codes of ethics. Internal control.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Delimitação da improbidade. 2.1. Administração Pública. 2.2. Apontamentos da Lei da Ficha Limpa. 3. Expedientes de Controle. 3.1. O Poder Judiciário como ferramenta de controle. 3.2. Agentes Públicos X Variação Patrimonial. 3.3. Acesso ao Judiciário pela coletividade. 3.4. Controlador X Sociedade. 4. Relevância do Controle nos atos de Gestão. 4.1. Funções, Desafios e Alternativas para o Controle Interno. 5. Conclusão. Referências.
1 INTRODUÇÃO
O Direito Administrativo como ramo do direito público, é desenvolvido e exercido, em se tratando de Administração Pública, na esfera da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, no Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Consequentemente, esse ramo do direito se demonstra nas atividades executadas pelos seus agentes e integrantes, quaisquer que sejam os Órgãos e Entidades, sendo o objeto desse ramo, sempre com interesse na preservação do Patrimônio Público.
No que diz respeito a gestão das atividades na administração pública, o controle exercido sobre a mesma é normatizado pela Lei n° 8.429/92, considerada a Lei de Improbidade Administrativa, assim como os princípios basilares, que estão descritos na Carta Magna em seu artigo 37, sendo eles o da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência bem como o princípio da supremacia do interesse público sobre o particular.
As transgressões a esses princípios produzem consequências diretas ao Patrimônio Público, vez que, ao ferir o disposto na Lei de Improbidade Administrativa, que tem por objetivo o combate à corrupção e imprimir sanções àqueles que exercem atividades em nome da municipalidade, está ferindo concomitantemente os princípios básicos que regem a Administração Pública. Para Abraão Filho (2007, p. 11) “ A expressão improbidade administrativa designa tecnicamente, uma corrupção administrativa”, e aqui é entendido que essas transgressões cometidas contra o patrimônio público devem ser analisadas, investigadas e muito mais ainda, punidas de acordo com a prescrição disposta na Lei.
Os Tribunais de Contas dos Municípios, dos Estados e da União, juntamente com o Ministério Público, Poder Judiciário, Poder Legislativo, os Partidos Políticos, Sindicatos e Associações exercem o controle de forma direta e indireta sobre tais atividades. O contribuinte também pode exercer tal controle, vez que o art. 31, § 3° da Constituição Federal resguarda esse direito, pois, no que concerne a finanças públicas, o interesse é da coletividade. Estes fiscalizam e acompanham as condutas dos agentes políticos e públicos com um único objetivo: o de evitar lesão ao erário público, ao passo que promove, por consequência, a obediência aos princípios constitucionais conforme os dispositivos da Lei.
Outra via fiscalizatória garantidora da transparência e informação à coletividade, são os veículos de comunicação, capitaneados pela imprensa, exercendo trabalhos de divulgação, investigação e denúncias; trazendo para a sociedade conhecimento situacional acerca dos fatos e atos dos mais variados entes da Administração Pública do Brasil. Desta forma, verifica-se que os diferentes mecanismos de controle externo da atividade administrativa, têm apresentado resultados bastante variados na sua atuação acerca de acompanhamento e vigília aos agentes públicos e políticos, não culminando sempre nas devidas e necessárias punições dos mesmos.
Essa última observação se aplica pelo fato de haver certo nível de efetividade no Controle, principalmente o Externo, bem como na aplicação das sanções aos agentes a nível Federal e Estadual, onde, frente as expectativas apresentadas nas últimas eleições e resultados apresentados no começo da nova gestão, os olhos da sociedade estão mais voltados.
Em contrassenso, a realidade no âmbito municipal apresenta-se bem distante da demonstrada anteriormente na esfera Federal e Estadual, vez que os Tribunais de Contas dos Municípios e dos Estados, esbarram em pouca efetividade de acompanhamento à gestão municipal. Muitos autores alegam que uma das razões para a baixa efetividade do controle do Tribunal de Contas nas esferas municipais se dá pela interferência política, Calandrim sintetiza essa perspectiva ao concluir:
O que se observa na prática, é que, em algumas Câmaras, não raras vezes, o aspecto técnico é totalmente desconsiderado, e isso ocorre basicamente por dois motivos: ou porque não analisam as contas propriamente ditas ou porque já estão determinados a aprovar ou desaprovar antecipadamente, dependendo do acordo político que firmaram (presidencialismo de coalizão). As razões dessa última hipótese são mais facilmente detectadas por quem conhece a realidade política do país, sujeita que è às paixões corporativistas e ao modelo patrimonialista. Acrescido a isso, a constatação de que em boa parte das vezes o eleito para o comando do Executivo detém maioria na Câmara ou então abre mão de subterfúgios para alcançá-la. (CALANDRIM, 2012, P. 57)
Os empecilhos são inerentes as estruturas de Controle Interno instalados nos municípios, ocasionando restrições de acesso dos órgãos de controle externo aos mesmos. Deve-se considerar tal inferência, pois, conforme haja omissão por parte do Poder Público municipal, no tocante à estrutura de Controle Interno, automaticamente as informações que este deveria prestar ficam comprometidas, não gerando consequentemente, o devido controle por parte dos órgãos legitimados acerca de acompanhamento das metas; índices; documentos probatórios de despesa e receita; apurações de denúncias, sempre que houver indícios, e necessárias aplicações de sanções frente as condutas dos agentes ímprobos.
Ao longo da história deve-se considerar que muitas mudanças na Constituição brasileira colaboraram para o cenário instável na administração municipal, sendo que esta esfera de poder ao mesmo tempo que recebe autonomia política e financeira em outro momento é qualificada apenas como um órgão administrativo (MEIRELLES, 2006, p. 45).
Em primeiro plano, uma estrutura mínima razoável de atuação de Controlador, na estrutura administrativa, aumenta a probabilidade de coerência dos inerentes do gestor ou agente público para com a sociedade, gerando uma ponte de acesso aos meios de fiscalização, garantindo, contudo, a imparcialidade e segurança das respectivas ações.
Diante de tamanha necessidade da ciência do que é Controle Interno e Controle Externo, bem como o que é improbidade administrativa e de como devemos combatê-la, levantamos o questionamento das razões de tamanha carga lesiva ao erário público e o que impede a imediata aplicabilidade das sanções penais pelos Poderes Legislativo, Executivo e principalmente o Poder Judiciário.
2 DELIMITAÇÃO DA IMPROBIDADE
A gestão honesta e próspera, geralmente é exercida pelo particular na condução de negócios próprios, vez que necessita praticar seus atos de maneira econômica, eficiente, eficaz e principalmente, de acordo com as normas legais para não incorrer em prejuízos e muito menos chegar a situação de colapso nas suas contas empresariais. Tal afirmativa não se verifica, de modo geral, quando se trata da coisa pública, pois os resultados obtidos com aquele trabalho executado de maneira correta e objetiva não se materializa em benefício próprio ou de seus interesses particulares.
Por essa afirmativa depreende-se que quando um particular passa a gerir o Patrimônio Público, não dispõe do mesmo interesse e compromisso dispensado nos negócios particulares. Primeiramente por conta da grande responsabilidade que a gestão do patrimônio público trás, além de tantos outros fatores que aliciam aquele agente a não priorizar o interesse público, fazendo com que ocorra graves lesões ao erário. Partindo desse pressuposto, tem-se nítida a necessidade de se atribuir cargos tão pontuais e importantes àqueles que tem um efetivo compromisso social. Claramente podemos detectar tamanha dificuldade em encontrar tal perfil, vez que o controle imposto pela sociedade é de uma deficiência sem precedentes.
A princípio, podemos conceituar probidade como um atributo a determinado indivíduo que segue de maneira correta e reta os valores morais e legais, não bastando ser integro para alcançar o status de probo, devendo além de tudo, respeitar os princípios atinentes a Administração Pública; dispondo total prioridade aos interesses coletivos e promovendo o atendimento das necessidades básicas da sociedade. Aqui concordamos com Kotsifas quando inicia seu estudo afirmando: “O dever de probidade administrativa é um princípio intimamente ligado à moralidade administrativa, que é o dever do agente público praticar atos de acordo com regras éticas, para proporcionar sempre uma boa administração voltada para os interesses públicos”. (KOTSIFAS, 2016, p.1)
Na contramão desta vertente, o ato contrário ao atributo da probidade seria assim juridicamente configurado como improbidade, e está descrito como crime na Constituição brasileira. Acerca dos atos de improbidade no âmbito da administração municipal, os que agridem ao erário público, consequentemente ocasionando enriquecimento ilícito e aos que afrontam os princípios básicos, configuram os mais evidentes e recorrentes na rotina da gestão. Não se pode, com isso, confundir a não obediência ao princípio da moralidade administrativa prevista no artigo 37 da Constituição Federal como ato de improbidade administrativa, vez que a violação do referido princípio, invalida o ato, onde, as vezes a má-fé no ato não se configura. A título exemplificativo, o mencionado pode ocorrer quando o agente nomeia parente com ampla habilidade técnica inerente ao cargo, porém, fora do determinado pela lei, sendo que aquele quem nomeou não possuía o animus de cometer ato ilícito, ou seja, apesar da legalidade violada, não há presença de ato improbo.
Em suma, nem todo ato ilícito no âmbito da administração pública ocasiona improbidade administrativa, onde, para a ocorrência, há necessidade de haver intenção do agente em transgredir os interesses da sociedade. Nesse contexto, os atos de má gestão não produzem em sua integralidade, improbidade administrativa, pois má gestão é entendida como a não observância do dever que o agente público tem de zelar pelo interesse público cuidando devidamente da coisa pública.
O fato da maioria dos municípios brasileiros não possuírem uma estrutura administrativa adequada se dá pela pouca qualificação do gestor, bem como das previsões orçamentárias nada promissoras, consequentemente, tais impropriedades se distribuem através dos servidores, que formam uma gama de pontos negativos na coisa pública municipal no Brasil. Tal fenômeno enseja aumento no número de ações e improbidade, principalmente por ineficiência na gestão, não sendo observados, em várias ocasiões, intenção de agir com desrespeito às leis pelo gestor municipal. Apesar disso, não impede o número crescente de ações movidas principalmente pelo Ministério Público, ocasionando limitação da ação do gestor na sua administração, pois os atos administrativos são visados, principalmente no tocante a poderes de decisão, deixando a impressão que os gestores municipais estão mais voltados a atender os preceitos estabelecidos pelo controle imposto, do que pela formatação político-administrativa, proposta quando da sua assunção ao cargo de gestor.
Acerca do ponto de culpa grave do agente, que se demonstra composta com conduta de má-fé, sendo pressuposto de quaisquer atos de improbidade. Contudo, para o STF é suficiente culpa simples para configuração de improbidade administrativa causando prejuízo ao erário. A sociedade aguarda evolução tanto no campo jurisprudencial concomitante à evolução social, com a exigência de zelo, cuidado e honestidade para com a coisa pública. Ainda sobre a culpa grave, depreende-se que o simples modo moroso e desleixado de atuar na gestão pública já é um correspondente de má-fé, dessa forma, pode-se qualificar como um dano consumado ao erário, ou seja, ato improbo podendo ser comparados até como a própria corrupção. Dito isso, algumas posições doutrinarias que admitem a modalidade culposa de improbidade, admitem que esta compromete a aplicabilidade dos princípios da eficiência e moralidade, devendo, portanto, haver reconsideração do apontamento no que diz respeito ao agente improbo, fazendo com que este seja considerado tanto o moroso quanto o desonesto, pois ambos, como colocado, causam danos ao erário.
2.1 Administração Pública e os Códigos de Ética
Primeiramente, antes de qualquer discussão acerca do comportamento dos agentes ímprobos, devemos apresentar um aspecto intrínseco do ser humano que necessita ser usado: a Ética. Inevitavelmente, sempre há um certo nível de dúvidas acerca do que se refere a Ética ou a Moral, onde esta tem sido muito utilizada ao invés daquela, por força dessa confusão. Spitz expõe essa intrínseca dicotomia salientando como os dois conceitos embora confundidos não podem ser tomados como sinônimos, pois ética abarcaria um universo filosófico muito mais complexo: “Esse termo (ética), que tomou uma importância cada vez maior, veio para aliviar o inextricável embaraço daqueles que desejariam falar em moral sem ousar pronunciar esta palavra” (SPITZ, 1995, p. 149).
Evidentemente, há diferença estre as mesmas, pois em espectros diferentes, uma será definida no lugar da outra: a ética está voltada para os princípios, e a moral está voltada para os costumes; a ética é adquirida pela reflexão, e a moral é adquirida no meio em que se vive, até por conta dos costumes; a moral é mutável, ao passo que a ética é imutável; os valores estão vinculados a ética, e as práticas são ligadas a moral; bem como a ética é uma imposição a si mesmo, ao tempo que a moral é uma imposição social; a ética tem uma abrangência maior que a moral, e por consequência, a moral é originária da ética; finalmente, a moral está em um contexto universal e a moral está condicionada a cultura. Concordando-se assim que “a moral responde à questão ‘que devo fazer? ”, e a ética, à questão “como viver? ” (Comte-Sponville, em Comte-Sponville & Ferry, 1998, p. 214).
Claramente é nítida a diferença entre os dois, porém, há dependência mutua entre ambos. Sinteticamente falando, a Moral se torna um caminhão para a prática da Ética. Esta facilita a distinção do que se pode exercer de maneira correta ou de maneira incorreta, da mesma forma que aquela torna-se uma referência para a conduta humana.
Partindo desse pressuposto de imposição de comportamento correto e reto para a prática da atividade laboral, especialmente no que tange a coisa pública, nasce a figura dos códigos de ética. Tais regras estão fixadas de maneira formal principalmente nas classes de profissionais, onde se prioriza o comportamento frente aos profissionais da mesma classe bem como a sociedade, usuária desses serviços prestados.
Os agentes públicos ou políticos têm a responsabilidade de colocar em atividade os princípios que direcionam a Administração Pública, sendo levado aos mesmo tempo pelas normas, obedecendo a hierarquia que lhe são estabelecidas. É nítida a visualização de tais níveis hierárquicos na própria Constituição Federal, vez que por ela há delimitações e especificações acerca de organização, Administração Pública bem como dos Servidores Públicos[1].
Seguindo uma sequência plausível, é possível identificar os níveis de acompanhamento das normas a serem seguidas quanto a sua hierarquia das normas legais de assuntos atinentes a códigos de ética. Inicialmente, a Carta Magna, como topo da pirâmide do ordenamento jurídico brasileiro, deve ser seguida em todos os níveis abaixo, a que estiver em desacordo, é considerada inconstitucional, ou seja, o conteúdo referente aos deveres do servidor público e respectivos direitos estão prescritos na lei maior brasileira, do mesmo modo constando questões de cunho ético e direcionamento de práticas a serem seguidas.
Em normas infraconstitucionais, existem variados Regimentos de servidores públicos, tanto da União, dos Estados, Distrito Federal, dos Municípios e suas respectivas autarquias e Fundações Públicas. Em última instancia, deve haver Código de Ética de categorias profissionais ou até mesmo das entidades, onde nestes textos, se apresentam de maneira mais analítica, apresentando as diretrizes que devem ser obedecidas e possíveis sanções quando de alguma transgressão.
Em se tratando dos responsáveis pelas entidades públicas tanto no Poder Legislativo, Executivo ou Judiciário, há um certo nível de responsabilidade um tanto mais elevado, pois, além de seguir a conduta ética que é inerente ao serviço público, estes devem cumprir deveres que demonstrem essa capacidade e justificativa de estar naquele posto, quer seja o dever de prestar contas.
A instituição do Sistema de Gestão da Ética do Poder Executivo Federal[2], surgiu para monitorar os códigos de conduta, na qual se refere a elaboração de consultas acerca do comportamento dos agentes detentores da responsabilidade de tutela da coisa pública. Nesse sentido, torna-se tal sistema único, uma das variadas formas de controle desses agentes, de forma preventiva e coercitiva no que tange a violação dos princípios básicos da Administração Pública, e dos danos causados ao mesmo.
Por iniciativa popular, tendo como idealizador o Juiz Márlon Reis e reunido cerca de 1,6 milhão de assinaturas, a famosa Lei da Ficha Limpa, correspondente a Lei Complementar n.º 135, de 4 de junho de 2010, lista ocasiões de inelegibilidade quando da condenação por órgão colegiado com o objetivo de resguardar justamente o objeto de estudo, quer seja a probidade administrativa, a moralidade e a idoneidade dos candidatos quando postulantes a cargos eletivos. A referida lei torna inelegível determinado candidato no período de oito anos, ainda que renuncie com intuito de evitar a cassação. O projeto da respectiva lei foi aprovado pelas duas casas legislativas em 2010, estando vigente para eleições ocorridas após o ano de 2010, conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, mesmo entendimento do Tribunal Superior Eleitoral, contudo, o Ministro Ricardo Lewandowski, no comando do TSE, já promoveu a aplicabilidade da lei ainda no exercício de 2010. O argumento utilizado foi o afastamento do artigo 16 da Constituição Federal, pois, não houve alteração no processo eleitoral podendo afastar o dispositivo estabelecido pelo princípio da anuidade, dando segurança jurídica aos Tribunais Regionais Eleitorais e Juízes eleitorais.
A Lei da Ficha Limpa contempla o artigo 14, § 9 da Carta Magna, demonstrando avanço quanto a moralidade, rechaçando os indivíduos que trazem consigo histórico de ações ensejadoras de prejuízos a coisa pública, devendo manter o Estado Democrático de Direito com a estrita condução do processo eleitoral exercido pelo sufrágio universal, com moralidade e legalidade.
O Ministro Ayres Brito, ao julgar as Ações Declaratórias de Constitucionalidade n° 29 e 30, de certa forma insinua a necessidade de orientar o povo a proferir seu voto se valendo da Lei da Ficha Limpa:
[...] a ‘Lei da Ficha Limpa’ ambição de mudar uma cultura perniciosa, deletéria, de maltrato, de malversação da coisa pública, para implantar no país o que se poderia chamar de qualidade de vida política, pela melhor seleção, pela melhor escolha dos candidatos, candidatos respeitáveis. (BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADPF 144. Relator: Min. Luiz Fux. Plenário, Julgamento em 16 fev. 2012)
Em suma, a evolução do povo no que tange o espectro eleitoral é vagarosa, contudo, é um processo gradual e constante, com o resultado futuro de extirpar da vida política os sujeitos desprovidos de probidade e principalmente moralidade, trazendo lisura ao tão protegido Estado Democrático de Direito.
3 EXPEDIENTES DE CONTROLE
Há de se mencionar as mais variadas maneiras de mapear e prevenir atos que não são alinhados as normas e os princípios. No entanto, tais métodos estão, ainda que com o avanço tecnológico, estão restritos ao acesso público por força da desinformação e/ou estimulo das áreas públicas e sociais na conscientização do indivíduo quanto a importância de tais informações, vez que são fundamentais ao seu próprio bem-estar.
Ao longo deste capitulo, vamos elencar alguns dos principais meios de acesso e estudo do controle as movimentações da chamada “coisa pública”. Em primeiro plano, vamos discutir o que é o principal auxiliar do Poder Legislativo, executando a função de fiscal e auditor do Poder Executivo, que são os chamados “Tribunais de Contas”; exercendo a fiscalização contábil, financeira, orçamentária e patrimonial da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, mediante controle externo, e pelo controle interno de cada Poder[3].
Em análise subsequente, depreende-se que o controle adstrito às Cortes de Contas é executado de maneira ulterior, ou seja, não pode, previamente, reprimir atos de improbidade, com isso, são suscetíveis de lacunas técnicas de resultados duvidosos[4].
No tocante a uma tentativa de preencher esse hiato, a Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União, possibilita resolução de eventuais consultas formuladas acerca de duvidas referentes a matéria de sua competência[5], possibilitando ao Agente Público, quando da execução de seus atos, exercê-los com integral segurança jurídica, bem como conduzindo aos respectivos ajustes no quesito formulação da despesa pública e em formulando os atos, podendo reconsiderar seus resultados através da autotutela[6].
A Suprema Corte brasileira, no intuito de maximizar o controle do Tribunal de Contas, atribuiu a competência a esta no quesito analise de leis e atos administrativos, vez que é perfeitamente possível determinado contrato ou instrumento análogo, estar vinculado a lei ou norma eivada de vícios que estão em contrariedade à Constituição[7].
Em suma, a assertiva acerta do controle ulterior das Corte de Contas, fica um tanto superada pelo fato da análise anterior em contratos administrativos, fazendo com que aquele ato que só seria submetido ao crivo da auditoria após sua realização, pode nem mesmo chegar a existir, vez que a análise da constitucionalidade de tais instrumentos.
O enriquecimento ilícito tem monitoramento especial dos Tribunais de Contas, vez que com analises de rendimentos em confronto com o patrimônio dos agentes públicos[8], há uma possibilidade real de rechaçar atitudes que colocam o patrimônio público em vias de delapidação.
A proteção dos direitos individuais, coletivos e sociais é a função do Poder Judiciário, vez que resolve litígios entre o Estado e o Cidadão, entre os cidadãos e entre Estado e entidades, ocorrendo quando provocado, incidindo diretamente a atividade administrativa quanto aos aspectos legais, de forma autônoma administrativa e financeiramente, ou seja, através do poder jurisdicional. Os atos administrativos praticados pelo Poder Executivo, Legislativo e até mesmo pelo próprio Judiciário, quando este desempenha atividade administrativa são passíveis de controle judicial.
Dependente de iniciativa popular, o controle jurisdicional é exercido por meio de Ação Popular, do Ministério Público por meio da Ação Civil Pública e das pessoas jurídicas lesadas pelos atos e condutas ímprobas, mediante a adoção de medidas judiciais. Qualquer cidadão é parte legitima para proposição de Ação Popular, com o objetivo de anular ato lesivo ao patrimônio público, bem como entidade de que o Estado participe, conforme preceitua o artigo 5°, LXXIII da Constituição Federal, demonstrando suma importância da participação do cidadão no sistema de controle, pois todos são iguais perante a lei sem qualquer forma de distinção, devendo, a administração pública em todas as esferas do governo respeitar os princípios básicos que os norteiam, quer sejam o da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, prescritos no artigo 37 da Carta Magna.
Outro operador do controle externo, o Ministério Público foi criado para tutelar os valores e interesses da sociedade, principalmente sobre aqueles que lesam o patrimônio público. Resguardar a ordem jurídico-democrática, bem como os interesses individuais e coletivos indisponíveis é a função básica do Ministério Público, objetivando a preservação do Patrimônio Público com ações de fiscalização dos atos dos Gestores Públicos, conforme artigo 127 da Constituição Federal.
No Brasil, o controle externo da atividade administrativa é respaldado pela Lei de Improbidade Administrativa - LIA, Lei nº 8.429/92, através do Ministério Público, da Polícia Federal, dos Partidos Políticos, dos Tribunais de Contas e dos Poderes Legislativo e Judiciário, bem como participação da imprensa. As condutas e atividades lesivas aos princípios constitucionais e ao erário são os principais objetos do controle de improbidade promovidas pelos órgãos de controle.
Deve ser levado em consideração a participação da sociedade na intervenção e fiscalização das ações orçamentárias, financeiras e patrimoniais da administração, que é um elemento indispensável ao estado democrático de direito através do Poder Legislativo, sendo esta outra via de controle externo. A Constituição Pátria em seu artigo 31, § 3º; assegura a apreciação das contas públicas municipais de forma direta pelo cidadão no período de sessenta dias, podendo este estabelecer quaisquer questionamentos. No mesmo caminho, o art. 74, § 2º do mesmo dispositivo possibilita ao cidadão, aos partidos políticos e aos sindicatos denunciar possíveis irregularidades junto ao Tribunal de Contas da União.
Marcos José Porto Soares e Alexandre Araújo Pereira explicam que, os atos de má gestão se dividem em duas categorias: aqueles derivados de ineficiência e aqueles derivados de desonestidade. Enquanto a primeira “corresponde a uma conduta que não reproduz o efeito esperado, seja pela inabilidade ou incompetência de um sujeito para atingir objetivos predeterminados”, a má gestão por desonestidade seria aquela em que o ato é praticado com “falta de pudor ou honradez do indivíduo”.
Com a tentativa de reduzir o ímpeto dos agentes ímprobos investidos em cargos confiados pelo povo, foi instituída a Lei Complementar n° 135/10 – Lei da Ficha Limpa, com objetivo de proteger a probidade administrativa bem como a moralidade no transcurso do exercício de mandato eletivo.
De plano, são nítidos os mais variados meios de controle das atividades administrativas, tanto interno quanto externo em todas as esferas de Governo. Os meios são eficazes, porém, não deixam de sofrerem percalços concernente à aplicação das punições aos agentes ímprobos, que, por morosidade ou leniência, não deixam de aplicar instrumentos nocivos ao Patrimônio Público.
3.2 Agentes Públicos X Variação Patrimonial
Uma das vias mais nítidas de identificação e configuração de atos de improbidade, diz respeito ao patrimônio do agente ímprobo, dessa feita, é um dos pontos mais vigiados pelos Órgãos de controle, tanto o externo quanto o interno[9], onde através de aparecimento de patrimônio de valores incompatíveis com os ganhos e exercícios de determinado servidor, chamam a atenção da coletividade, através dos instrumentos de controle.
Evidente que o simples fato de ocorrência de aumento patrimonial não enseja em investidas dos Órgãos de controle, vez que a Lei n° 8.429/92 determina a apresentação de declarações que visam a apresentação de bens e direitos do servidor bem como dos seus dependentes para habilitação ao exercício do cargo. Tal informação prestada a Administração Pública tem a necessidade de atualização de suas informações em período anual, com o objetivo de manter o acompanhamento da evolução patrimonial daquele que detém a prerrogativa de manusear os recursos pertencentes a sociedade. Tal obrigatoriedade não se resume ou se limita somente aos servidores públicos de um modo geral, mas também alcançam agentes da alta patente, mantendo a isonomia e imparcialidade no campo do controle social[10].
Em síntese, os dispositivos legais em questão, quer seja a Lei n° 8.429/92, bem como a Lei n° 8.730/93, levam os agentes públicos e políticos para o mesmo tratamento[11], em todas as esferas de governo e em todos os Poderes. Esse acompanhamento que diz respeito ao patrimônio dos indivíduos que operam os recursos públicos em quaisquer áreas de atuação, demonstra um importante passo à erradicação ou ao menos a uma considerável redução dos atos que levam o patrimônio social a uma situação de deterioração.
3.3 Acesso ao Judiciário pela Coletividade
Com o advento no Novo Código de Processo Civil, a tutela coletiva ganhou força, sugerindo uma necessidade de visualizar melhor os direitos trazidos pelas ações coletivas, podendo haver maior acompanhamento dos atos na esfera social e na esfera econômica da gestão pública municipal. Com essa evolução da tutela coletiva, os processos ganham repercussões cada vez mais evidentes por ocasião dos resultados alcançados.
Fazendo uma distinção entre os interesses, podemos afirmar que os direitos difusos são os que apresentam a indeterminação dos titulares bem como onde não há relação jurídica entre os mesmos; os direitos coletivos são considerados transindividuais, por serem de natureza indivisível, com titularidade de determinado grupo, seja categoria ou classe de pessoas com relação entre os membros, sendo necessária a existência da lesão ou ameaça desta do interesse do grupo; acerca dos interesses individuais homogêneos ocorre pela lesão ou ameaça do direito por determinado fato que repercuta negativamente de forma homogênea, sendo que não há relação jurídica entre os indivíduos, ocorrendo essa relação quando do fato lesivo. Com isso, verifica-se que os direitos individuais homogêneos assim como os difusos são oriundos de fatos comuns, sendo indetermináveis esses sujeitos em tutela difusa e determináveis na tutela dos interesses individuais homogêneos, sendo o objeto da pretensão divisível.
A homogeneidade e a origem comum são outras características da tutela individual homogênea, podendo ser considerada a origem comum de fato ou de direito. A homogeneidade pode ser confundida com a origem comum, contudo, pode não ser considerada a homogeneidade frente a origem comum remota. Os direitos metaindividuais versam o direito difuso bem como os interesses coletivos e individuais homogêneos. Em suma, a defesa dos direitos coletivos é de sujeitos indeterminados e de indivisibilidade material, ao passo que a tutela coletiva de direitos representa a salvaguarda de direitos individuais por meio coletivo.
A proteção dos interesses coletivos e difusos se limitava a Lei de Ação Civil Pública. Com o advento do Código de Defesa do Consumidor originou o direito individual homogêneo, ampliando, dessa forma, os direitos pela via das ações coletivas surgindo por consequência a expressão tutela coletiva de direitos.
Acerca da legitimidade prescrita na Lei da Ação Civil Pública e no Código de Defesa do Consumidor, apresentam pontos distintos que são: os parâmetros legais versam da legitimidade extraordinária, exclusiva, concorrente, autônoma e disjuntiva. Onde autônoma se perfaz na presença do legitimado ordinário; extraordinária quando há substituição da coletividade, onde é pouco provável essa legitimidade extraordinária, vez que os entes legitimados nos moldes legais podem propor ações em interesses próprios, não remetendo à substituição; exclusiva em relação a essa coletividade substituída, pois para o contraditório basta a presença do legitimado ativo; concorrente sob o aspecto dos representantes adequados para propositura da ação; disjuntiva pelo fato de qualquer entidade propor a ação, sem quaisquer interferências.
O outro ponto direciona a natureza de legitimação ordinária das associações e outros organismos intermediários criados para resguardar interesses difusos, contudo, tal teoria resulta na obrigação de aferir as necessidades composta nos estatutos das entidades que se julgam legitimadas a ajuizar, para então constatar essa legitimidade, causando redução do ímpeto nas ações coletivas.
Outro ponto afirma que o pedido proposto em Ação Civil Pública ou Coletiva não diz respeito ao interesse restrito do autor e sim daquele grupo lesado, ou seja, os legitimados ativos zelam pelos interesses do grupo, quer sejam classe ou categoria de pessoas. O último ponto afirma que a legitimação não seria nem ordinária nem extraordinária e sim de natureza especial, com isso, o legislador, em autorizando determinadas entidades a propor ações coletivas, automaticamente é conferida autonomia processual, obtendo maior efetividade na tutela jurisdicional coletiva.
Legitimidade é um nexo de causalidade que existe entre o sujeito e o objeto, perfazendo relação jurídica. Dessa forma, não estaria restrita as efetividades estabelecidas pela Lei de Ação Civil Pública e Código de Defesa do Consumidor. Na tutela coletiva pode ocorrer abandono ou renúncia do ente legitimado, nesse caso, haverá substituição da parte por determinação judicial, aproveitando o processo.
3.4 Controlador X Sociedade
Seguindo uma tendência contemporânea, cada vez mais a sociedade está mais próxima dos atos de seus Agentes, se tornando o meio mais objetivo de acompanhamento de tais atos. Nesse sentido, surgiu a figura de uma pessoa que estava a serviço do Estado com a atribuição de vigiar os direitos da sociedade[12], figura essa que tinha como um de seus deveres receber e consequentemente investigar supostos abusos de poder, bem como denúncias de má prestação de serviços públicos, de forma imparcial no intuito de exercer um papel de mediador. Quando da formulação da atual Carta Magna, houve uma previsão de um cargo de defensor do povo no anteprojeto, o que levaria a conotação de controle estatal originaria da figura do Ombudsman.
No entanto, setores sociais imprimiram pressão para a não adoção desse objeto, levando a criação das funções essenciais à justiça, previstas nos artigos 127 a 135 da Constituição Federal. O alto nível de independência funcional traz acesso livre para exercício de suas atribuições, levando a um nível maior de controle e fiscalização estatal.
Em suma, podemos identificar entes que salvaguardam a sociedade frente a atos administrativos: O Ministério Público Federal através da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, fiscalizando atos executados pelo Governo; Defensoria Pública e os Advogados. A estes últimos foram confiados a prerrogativa de defesa do cidadão, com a legitimidade de ingressar no judiciário através de ações, o que chamamos de controle concentrado de constitucionalidade, onde os mesmos têm assentos nos Tribunais através do quinto constitucional.
Em se tratando do Ombudsman, podemos identificar muito claramente na pessoa do Controlador Interno de determinado ente, pois este tem a prerrogativa de tomar medidas de acompanhamento das atividades administrativas, podendo se utilizar de quaisquer meios legais para tanto, dentro da discricionariedade.
O Brasil se dissemina em milhares de órgãos e entidades públicas em uma escala continental, devendo estas estar equipadas com os mais variados meios de controle de suas atividades e principalmente, das ações dos seus gestores. Tais meios são distribuídos por órgãos que cumprem esse papel, quer seja a Corregedoria Geral da União, Ouvidorias e o Ministério Público.
A atribuição das ouvidorias basicamente se delimita, em síntese, a ser um receptador de denúncias, sugestões, bem como de críticas, devendo o respectivo ouvidor levar tal informação ao responsável, ocorrendo a consequente analise das sugestões ou apuração dos fatos.
Em se tratando de administração pública no âmbito federal, há a presença da Corregedoria-Geral da União, onde se coloca como unidade da Controladoria –Geral da União (CGU), exercendo atividades de órgão central do Sistema de Correição do Poder Executivo Federal, que garante uma movimentação de atividade correcional no que diz respeito a estratégia do combate a corrupção, bem como do aperfeiçoamento da gestão pública[13], assistindo o Presidente da República no que concerne a manutenção e cuidado com o patrimônio público.
Acerca desse objetivo de salvaguardar a coisa pública, é discricionário atuação de oficio, podendo requisitar eventuais sindicâncias e demais meios necessários para investigação no âmbito administrativo, aplicando a sanção pertinente. A Advocacia Geral da União será acionada pela CGU quando da ocorrência de atos que se consideram de improbidade, devendo a mesma tomar medidas judiciais no intuito de ressarcimento do erário público.
4 RELEVÂNCIA DO CONTROLE NOS ATOS DE GESTÃO
A aplicabilidade de sanções correspondentes ao exercício de atos de corrupção e incompetência nas atividades públicas fica comprometida pelo ordenamento jurídico que, além da morosidade e recursos protelatórios, ficam definidos apenas como ato ilícito civil, sem conteúdo penal, considerado apenas uma falta grave de cunho administrativo.
Nesse sentido, a discussão no que tange a necessidade de distinção entre má gestão e atos ímprobos são pertinentes, levando em consideração a importância do Controle Interno e Externo no sentido de adequação e definição de tais atos à realidade prática da Administração Pública Municipal, objetivando devolução do patrimônio à sociedade, que sempre comporta gestores e servidores sem um nível técnico razoável de capacidade administrativa.
No que diz respeito a atividades da administração pública, quer seja os atos e fatos administrativos, podemos afirmar que são atividades regulamentadas por Leis, Decretos, Resoluções, Instruções Normativas no âmbito do Governo Federal, Estadual e Municipal, tanto na Administração Direta como indireta. Tais atividades devem ser orientadas, acompanhadas e fiscalizadas. Com o objetivo de ocupar tal atribuição, o Controle Interno consiste nesse controle das atividades exercidas pelo Poder Público conforme os Princípios básicos que regem a Administração Pública, ou seja, autocontrole.
Pelo fundamento do princípio da autotutela, a administração Pública tem o poder de anular seus próprios atos, quando composto de vícios que os tornem ilegais, e por conveniência e oportunidade podem ser revogados, resguardados os diretos adquiridos, claro, com o objetivo de melhor atender a sociedade.
Segundo Diógenes Gasparini “o fundamento do controle administrativo reside no dever-poder de autotutela que a Administração Pública tem sobre suas atividades, atos e agentes. Esse poder-dever, de autotutela é exercitado, normalmente, por órgãos superiores, em relação aos inferiores, e por órgãos especializados”.
Interessante destacar que o controle interno pode ser convertido em externo quando partido da Administração Direta para a Indireta, ocasião que ocorre quando do controle de entes descentralizados, mediante fiscalização e auditorias. Necessariamente, os gestores devem fiscalizar e serem fiscalizados possibilitando controle interno mais consolidado e objetivo, evitando e suprimindo o ímpeto de atos que possam desencadear irregularidades ou agressões ao bem público e seus respectivos princípios norteadores. Para tanto, além do próprio sistema de controle interno da administração indireta, os Tribunais de Contas exercem essa função de fiscal no âmbito da administração indireta.
Sequencialmente, o Controle Externo é aquele exercido por entidades não integrantes do Poder Executivo, bem como associações, representações integrantes da sociedade civil e obviamente, pelo cidadão. O Ministério Público Federal e Estadual, bem como Conselhos de Contas, além dos Poderes Judiciário e Legislativo; são as principais vias de controle do Poder Executivo.
Se tratando do Poder Legislativo, este controle é exercido por órgãos que compõem o mesmo, quer seja o Congresso Nacional, composto pela Câmara dos Deputados e o Senado Federal; Assembleias Legislativas e Câmara de Vereadores, Comissões Parlamentares de Inquérito e mediante ação dos Tribunais de Contas. As Comissões Parlamentares de Inquérito, mais conhecidas como CPI’s, possuem atribuições e poderes especiais de investigação das autoridades judiciais.
Levando em consideração o controle externo partindo do Poder Executivo, devemos destacar que, em virtude do princípio da separação de Poderes, tal hipótese está prevista na Constituição Federal, devendo os critérios estabelecidos ser respeitados, pois do contrário, se configura afronta ao referido princípio.
O controle externo da atividade do Poder Público exercido pelo Poder Legislativo, através dos Tribunais de Contas por meio de critérios políticos e financeiros, deve ser efetivo e eficaz diante de situação de irregularidades, não excluindo, claro, o controle judicial e respectivas penalidades previstas em caso de ato de improbidade administrativa. Enquanto órgão auxiliar do Legislativo, o Tribunal de Contas tem a finalidade de controlar e orientar a Administração Pública, corrigindo-a quando necessário principalmente, nos processos licitatórios e nas contratações de obras, serviços, compras, alienações, convênios e outros procedimentos administrativos. No caso dos Tribunais de Contas, sua atuação sempre será a posteriori, através de auditorias e inspeções, sobre os atos e fatos da Administração Pública ou sobre particulares que gerenciam, arrecadam ou guardam bens ou valores públicos. Em suma, toda a Administração Pública está sujeita às atividades dos Tribunais de Contas, desempenhados em nível federal, pelo Tribunal de Contas da União, Estados, Distrito Federal e Municípios pelos Tribunais de Contas correspondentes.
4.1 Funções, desafios e alternativas para o Controle Interno
Para a boa fruição dos métodos de controle, faz-se necessário a implementação de algumas formas de execução das atividades. Contudo, entendamos que estando ciente de suas funções, as dificuldades estarão aparentes, fazendo com que os meios de aperfeiçoamento e regulagem do sistema possam estar disponíveis.
Em primeiro plano, destaca-se como função primordial ao controle interno, a permissão de maior segurança ao cidadão, vez que este estará sendo representado no seio da Administração Pública, acompanhando, avaliando, consignando e opinando acerca dos atos dos seus gestores. Além de permitir igual segurança aos gestores, bem como aos ordenadores de despesas, pois estes possuem discricionariedade para dispêndio financeiro.
Da forma que transmite segurança jurídica e administrativa aos gestores, os Controladores têm a função de elaborar as Prestações de Contas com o intuito de transmitir a sociedade, os resultados das contas públicas no aspecto orçamentário, financeiro e patrimonial; ao tempo que otimiza o direcionamento de uma gestão responsável da entidade.
Outro ofício do Controle Interno é o de proporcionar apoio ao Controle Externo no exercício de sua missão institucional, acautelando formalmente as autoridades administrativas para que estes promovam ações com finalidade de apurar fatos ou atos apócrifos, ilegais ou que não detenham compatibilidade, resultando prejuízos ao erário; sob pena de responsabilidade solidária. Por iniciativa própria ou por solicitação, a controladoria do ente organiza e executa a programação de auditoria contábil, financeira, orçamentaria, operacional e patrimonial nas unidades sob seu controle, conservando a documentação e relatórios organizados com o objetivo de análise do Controle Externo.
Ainda que as atividades de controle estejam bem definidas no contexto legal e administrativo, ocorrem empecilhos que proporcionem sua efetiva finalidade, pontos esses também abordados por este estudo. A visão distorcida sobre controle leva o gestor a achar que a função do Controlador Interno é tão somente executar atividades inerentes ao cargo sob sua estrita subordinação. Tal assertiva leva a crer que a missão básica do controle, que é a de levar a sociedade os dados extraídos dos atos e fatos administrativos, ficam dependentes da vontade do gestor, que na maioria dos casos aliciam moralmente os profissionais que ali estão.
A nível municipal, as Prefeituras carecem de uma estrutura aceitável para a acomodação dessas atividades, onde na maioria dos casos não acompanham a modernidade que diariamente se atualiza concomitantemente às normas, ao tempo que afasta o cidadão. Somado a isso, a alta taxa de rotatividade dos profissionais[14] igualmente prejudicam nos objetivos a serem alcançados, pois os cargos disponíveis para o Controle geralmente são comissionados, de livre nomeação e exoneração.
No caminho desses desafios, podem ser distribuídos algumas soluções para um eficiente e confiável sistema de controle interno, tais como: automatização de regras de controle, avaliação das metas e riscos fiscais, cruzamento de banco de dados, auditorias, pedidos de esclarecimentos, mudança na visão da gestão quanto a importância de um sistema de controle e compartilhamento de conhecimento através de intercâmbios.
Em suma, a ausência de estrutura profissionalizada e contínua, com a devida estabilidade e respectiva autonomia e de seus colaboradores, são as principais críticas ao Controle Interno dos mais variados entes da Administração Pública. Há de se colocar em pauta, o meio de extinguir a forma mais predominante de acesso ao cargo de Controlador, pois, como exposto, são cargos em comissão que, por força da livre nomeação e exoneração, do Poder Executivo, frustram a postura desejável do profissional frente a analises e fiscalizações, pois, em essa postura não sendo compatível aos interesses do titular da Entidade, ficam sob a expectativa de dispensa do cargo. Além disso, a entidade fica comprometida pela depreciação de todo um projeto inicialmente executado.
5 CONCLUSÃO
Está enraizado no contexto brasileiro determinada forma de ganho através de facilidades, contudo, tal afirmativa não se aplica a integralidade da sociedade. Nesse diapasão é o que o estudo deixou cristalina as mais variadas formas de combate e aos atos dos agentes ímprobos. Não obstante, foi destacado as dificuldades que os responsáveis por levar a sociedade informações de cunho administrativo passam quando do cumprimento de suas prerrogativas.
É certo que o Brasil vem se destacando no tocante aos atos e improbidade administrativa, não havendo razão ou necessidade imediata de implementação de novas regras ou normativos legais, vez que no ordenamento jurídico brasileiro há inúmeros meios de investida contra atos ímprobos, tanto preventiva quanto repressiva. Como exemplo desses instrumentos, destaca-se para a tutela do patrimônio público bem como a administração pública que é a Lei n° 8.429/92, tratando das sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional.
Resta cristalina a finalidade do normativo em questão, quer seja o de penitenciar o agente causador do dano ao erário ao cumprimento das sanções previstas, salvaguardando o patrimônio social. Demais vias de controle foram expostas na presente análise. Foi verificada a presença dos Tribunais de Contas, tanto da União quanto dos Estados que fazem o controle posterior dos atos de gestão, contudo, causa influência nas atitudes dos tutores da coisa pública, pois sabem seus atos serão auditados e se verificando inconsistências, este gestor será responsabilizado de forma regular.
O controle preventivo, por sua vez, evita a ocorrência do ato, dando maior segurança jurídica tanto para a sociedade quanto para o gestor. Claro que o mínimo que se pretende de um indivíduo que tem como função conduzir o patrimônio público, é a ética e a honestidade; não sendo esse comportamento que verificamos ao longo da história.
Ainda que não evite a consumação do ato ilegal, o controle preventivo possibilita a detecção de suposto desvio de conduta, podendo em seguida ser acionado o princípio da autotutela, com o fim de retificar os atos praticados, causando menor prejuízo na seara pública, mantendo a vigilância constante a obediência aos princípios básicos da Administração Pública. Tal obediência a estes princípios, se configuram como um marco inicial no que concerne ao controle, lembrando que desde já o instituto da improbidade administrativa já se configura em caso de inobservância dos mesmos.
A conduta dos agentes públicos e políticos são igualmente acompanhados pelos códigos de ética, estipulando proibições e obrigações quando do exercício de determinada função pública, com o intuito de reverenciar aquelas regras impostas nos respectivos códigos. A impessoalidade é a base de manutenção do tratamento igualitário entre os cidadãos, não admitindo incompatibilidades, ou seja, repudiando quaisquer meios de acesso a benesses pela via da coisa púbica.
O estudo demonstrou meios de detecção de atos de improbidade, dentre eles o do acompanhamento da evolução patrimonial dos agentes públicos, para tanto, há de se observar a declaração de renda bem como dos bens no momento da nomeação ou exoneração de função pública. Destaca-se a mesma exigência durante o período de exercício de determinada função, justamente para fazer efeito a medida de acompanhamento do patrimônio dos servidores públicos.
O controle interno é um dos meios mais acessíveis para a coletividade acompanhar os atos dos gestores do patrimônio público. Contudo, existe no Brasil uma nítida ausência de subsídios para a maximização dos sistemas de controle das entidades, visando uma maior segurança jurídica a sociedade e a própria gestão. Tal dado é reflexo da cultura que se consolidou na sociedade através dos gestores que defendem o entendimento que são possuidores dos cargos inerentes aos sistemas de controle, vez que em grande parte dos casos, tais cargos são de livre nomeação e exoneração, deixando aquele que tem a prerrogativa de apoio ao Controle Externo, a coletividade e demais Poderes, sob a pressão de continuidade ou não de um projeto.
A sociedade deve ter uma atenção especial a esse aspecto, pois numa realidade de curto prazo os comportamentos e a desatenção nesses detalhes que aparentemente são inexpressivos, cobrarão essa conta. Esse cuidado mais estreito não necessariamente se traduz em edição de mais normas, e sim na observância das já existentes.
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[i] Professor, Especialista e Orientador deste artigo. Endereço para acessar este CV: http://lattes.cnpq.br/4895425583418758
[1] Constituição Federal, Título III (Da Organização do Estado), Capítulo VII (Da Administração Pública), Seção II (Dos Servidores Públicos)
[2] Decreto nº 6.029/07.
[3] Constituição Federal, art. 70. Define o exercício do Controle externo pelo Congresso Nacional e interno através de seus respectivos Poderes.
[4] Constituição Federal, art. 71, incisos I ao VIII, onde descreve a competência do Tribunal de Contas da União.
[5] Artigo 1°, XVII da Lei n° 8.443/92 – Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União.
[6] Conforme esse princípio, a Administração Pública controla seus próprios atos, podendo anular os ilegais e de revogar os inoportunos. Nesse compasso, a Súmula 346, do Supremo Tribunal Federal: "a administração pública pode declarar a nulidade dos seus próprios atos". No mesmo sentido, Súmula 473, também da Suprema Corte, "a administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial".
[7] Súmula 347 do Supremo Tribunal Federal.
[8] Lei n. 8.730/93, Art. 1°, § 2°, II. Estabelece o exercício da legalidade e legitimidade desses bens e rendas, com o apoio nos sistemas de controle interno de cada Poder.
[9] Lei nº 8.429/92, Art. 9º - Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de cargo, mandato, função, emprego ou atividade
[10] Lei nº 8.730/93, art. 1º Lei nº 8.730/93, que expressamente obriga à apresentação de declaração de rendas, bens e direitos ao Presidente e ao Vice-Presidente da República, aos Ministros de Estado, aos membros do Congresso Nacional, aos membros da Magistratura Federal, aos membros do Ministério Público da União, e, enfim, a todos quantos exerçam cargos eletivos, empregos ou funções de confiança na Administração Pública, direta ou indireta, de qualquer dos poderes da União.
[11] O princípio da igualdade prevê a igualdade de aptidões e de possibilidades virtuais dos cidadãos de gozar de tratamento isonômico pela lei. Por meio desse princípio são vedadas as diferenciações arbitrárias e absurdas, não justificáveis pelos valores da Constituição Federal, e tem por finalidade limitar a atuação do legislador, do intérprete ou autoridade pública e do particular.
[12] Trata-se do Ombudsman, originário da Constituição Sueca de 1809, com o objetivo de receber e fiscalizar os serviços públicos, devidamente eivado de independência funcional.
[13] Decreto n° 5.480/2005.
[14] Turn over.
Técnico em Administração de Empresas, Bacharel em Ciências Contábeis pela Universidade Federal do Piauí (UFPI), Especialista em Contabilidade Aplicada ao Setor Público (UFPI), Graduado no Curso de Bacharelado em Direito pelo Centro Universitário Santo Agostinho - UNIFSA
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, DANIEL BASTOS DA. Adversidades do controle interno frente aos atos dos gestores públicos Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 02 dez 2019, 04:37. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/53860/adversidades-do-controle-interno-frente-aos-atos-dos-gestores-pblicos. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Danilo Eduardo de Souza
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