RESUMO: O presente artigo visa estabelecer um tema muito discutido no século XXI, em que seria o crucial paradoxo do direito do trabalho na atualidade, o mais afamado reconhecimento de vinculo empregatício para empresas de aplicativos. Muito se tem polemizado esse assunto, porquanto, no judiciário brasileiro há divergências de entendimentos entre as empresas UBER e LOGGI.
Palavras-chave: Paradoxo. Empregado. Empresa. Vínculo Empregatício. UBER. LOGGI.
1. INTRODUÇÃO
Hodiernamente há grande celeuma no Direito do Trabalho brasileiro e de outros países acerca do reconhecimento ou não do vínculo empregatício entre os condutores e a empresas de aplicativo de transporte. Dentro do judiciário trabalhista brasileiro, há um grande paradoxo: não foi reconhecido o vínculo do motorista com a UBER, enquanto que foi reconhecido o vínculo do condutor com a LOGGI.
Ambas as empresas são de aplicativos, desitnada a intermediar clientes e prestadores de serviços. Nesse sentido, a empresa UBER é do ramo tecnológico, que abrange o transporte privado urbano, na qual, o próprio aplicativo busca seus motoristas baseados na localização.
De outro lado, a empresa LOGGI também é do ramo de tecnologia, que por intermédio de uma plataforma digital consegue conectar os seus clientes que necessitam de entregas a um mensageiro disponível, podendo ter como modal as motos, automovéis ou aviões.
Conquanto o Brasil não tenha reconhecido o vínculo empregatico com a UBER, no direito comparado a tese do vínculo empregatício se rebustesse, visto que grande número de países consolidou esse entendimento e reconheceu o vinculo empregatício entre os condutores e a empresa UBER, tais quais, EUA, França, Inglaterra, Suíça e Espanha. Assim, o entendimento desses 5 países se convergem no sentido de compreenderem que ao motorista se conectar à plataforma digital Uber, fica estabelecida uma relação de subordinação entre o motorista e a empresa.
A partir desse momento fica a grande questão, por que praticamente em todo o mundo reconhece-se o vínculo empregatício e no Brasil não foi reconhecido? E por que com a LOGGI o Brasil reconheceu o vínculo de emprego?
2. ASPECTOS TEÓRICOS
O critério chave para distinguir a relação de emprego e a prestação de serviço está na subordinação. Assim, é necessário entender esse critério diferenciador para ao final concluir pela (in)existência de vinculo empregatício.
Nesse ensejo, Maurício Godinho Delgado leciona que a relação de emprego é caracterizada pela “a prestação de trabalho por pessoa física a um tomador qualquer, com pessoalidade pelo trabalhador, também efetuada com não eventualidade, sob subordinação ao tomador dos serviços, com onerosidade.”
De igual forma prescreve o art. 3º da CLT dando ênfase ao sujeito da relação empregatícia, ao dizer que “Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.”
Ainda nesse ponto salienta-se, a explicação de Arnaldo Süssekind, um dos criadores da CLT, na qual, para este autor, o artigo vem revelar o conceito de empregado, aludindo à dependência sem esclarecer se possui um caráter econômico ou técnico. Ainda também de forma hierárquica, resultante da “subordinação jurídica assumida pelo próprio trabalhador ao ajustar o contrato de trabalho, de modo reverso da medalha do poder de comando atribuído ao empregador”.
Diante desse contexto, extrai-se os elementos da vínculo empregatício: Pessoalidade, Não eventualidade, Onerosidade, Alteridades e a Subordinação, sendo este último o mais importante para diferenciar o empregado do prestador de serviços.
3. ASPÉCTOS JURISPRUDÊNCIAIS
Diante disso, passa-se à analise de dois casos concretos: um da LOGGI e outro da UBER para notar se encontra o reconhecimento ou não dos vínculos empregatícios.
3.1 CASO UBER
No dia 05 de fevereiro de 2020 os ministros julgaram improcedente por unanimidade a reclamação trabalhista, na qual, o motorista MARCIO VIEIRA JACOB, disse que havia trabalhado por quase um ano com o aplicativo UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA., entre julho de 2015 e junho de 2016. Dessa maneira, o anseio desse recorrente era o registro do contrato na carteira de trabalho e o recebimento das parcelas decorrentes da relação de emprego.
Segundo Bruno Medeiros, Ministro do TST, no Acórdão da 5ª Turma, o motorista do Uber não possui relação de emprego por faltar um dos elementos que caracterizam essa relação de emprego, na qual, seria a falta de subordinação.
Por mais que a empresa Uber possua um sistema de Feedback, uma ferramenta utilizada para a gestão do recursos humanos cuja finalidade serva para o desenvolvimento das equipes para o desempenho dos funcionários. Os motoristas do Uber possui uma maior autonomia e flexibilização na sua rotina, como exemplo, o sistema do motorista ficar “off-line”, sem uma delimitação de tempo. Outrossim, possui um horário de trabalho e local de trabalho autônomo, ou seja, onde ele quiser e no horário que ele quiser. Dessa forma, percebe-se claramente a completa ausência de Subordinação.
Por conseguinte, os ministros deram improcedente o pedido do reclamante, não o reconhecendo como empregado por faltar a caracterização de um dos 5 elementos da relação de emprego, o de Subordinação.
3.2 CASO LOGGI
Doravante, no dia 06 de dezembro de 2019, a juíza de primeiro grau julgou o caso da lide entre a empresa LOGGI TECNOLOGIA LTDA., e o MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO, na qual, esse órgão público pedia o reconhecimento do vinculo empregatício dos motoristas que prestam serviços de transportes de mercadoria através dessas plataformas digitais. Aliás, a decisão foi proferida em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Púbico do Trabalho (MPT).
De acordo com Lávia Lacerda Menendez, juíza titular da 8ª vara do Trabalho de São Paulo, os condutores profissionais da LOGGI são considerados empregados pelo motivo de estar presente todos os requisitos da relação empregatícia. Tendo como exemplo, a habitualidade na mera expectativa da prestação de serviço por parte do motorista, sendo que este não pode passar o serviço a outrem, sob pena de fraude ao sistema. Além do que, persiste a subordinação estrutural, com onerosidade, e a mercadoria garantida pela LOGGI, frente ao cliente, comprovando a alteridade.
Não obstante, a juíza ainda ousa em dizer um sexto requisito, o da exclusividade, pois para esta, quando mais exclusivo for a prestação de serviços, mais notório se deparará na relação jurídica dos contratos de empregos. Ainda complementa que haverá motoristas que irão trabalhar somente para a LOGGI, e os que trabalharam para várias empresas de transporte logístico ao mesmo tempo, e em ambos os casos estarão presente o tal vínculo. Neste sentido, um dos pontos primordiais que a LOGGI oferece aos seus clientes, é a entrega de documentos, compras online, comida e além disso, maquininha de cartão e bolsa térmica especial para que seus clientes possam identificar a marca da empresa em seus entregadores.
Do mesmo modo, a juíza ainda conclui que o controle da produção, de tarefas, de horário, itinerário, local de prestação de serviços, modus operandi são fortes indícios da existência de vínculo. Mesmo a subordinação estrutural, sem o controle direto, é indicativa de contrato de emprego. Por outro lado, quanto mais tênue o controle, mais se revela a autonomia. Também o poder hierárquico se mostra um vetor para a aferição da subordinação, tal qual o poder disciplinar. O recebimento de ordens e de punições implica no reconhecimento da relação de emprego.
Outrossim, ao analisar o caso, essa juíza inteirou a concorrência desleal, na qual, pormenorizando, seria reconhecer o vinculo empregatício entre empregado de pequena empresa de frete e não nas de maiores segmento, com o indevido favorecimento de mercado. Neste sentido, possui a importância de preservar os trabalhadores, para não os deixar à margem das garantias e dos direitos individuais.
Logo, a juíza deu procedente o pedido do MPT - Ministério Público do Trabalho, no quesito de reconhecer o vínculo empregatício dos motoristas que prestam o serviço de transporte.
4. ANÁLISE CRÍTICA DOS JULGADOS
No que concerne ao caso UBER, entendo que a decisão dos ministros está claramente correta, porquanto o motorista do UBER é considerado um trabalhador autônomo, impondo suas próprias regras, dentre elas, o horário e o local onde ele deseja trabalhar.
Neste sentido, Luciano Martinez, expõe que “a subordinação se dá quando o tomador de serviços determina o tempo e o modo de execução daquilo que foi contratado”. Dessa forma, comprova-se ainda mais que não há a presença do elemento da subordinação nos funcionários da UBER devido o fato deles serem independentes e possuir suas próprias regras, assim, eles próprios determinam “como, onde e quando” desejam realizar o seu serviço.
Ainda reitera-se, o fato da possibilidade da aplicação do Método de Ponderação, proposto por Robert Alexy, na qual, para este doutrinador, deveria sopesar os elementos de um conflito para que se em uma conclusão mais humanizada. Dessa forma, para aplicar esse método, deve-se seguir pelos princípios da proporcionalidade para adequar o caso na necessidade presente. No caso discutido da UBER, esse método será muito eficaz para ao mesmo tempo que não venha ser considerado vinculo empregatício, e empresa tenha meios para garantir todos os direitos desses trabalhadores.
Nesta sequência, aplicando-se o método de ponderação, considero ser de muita utilidade que o Poder Legislativo, exercido pelo Congresso Nacional (Câmara dos Deputados e do Senado Federal), redija leis a fim de transformar o Direito do Trabalho de modo que este venha a se adequar a novas transformações do mundo atual, para proteger todos esses motoristas da UBER, garantindo a todos seus direitos humanos fundamentais, tais como segurança e direitos individuais, conforme bem enumera o Art. 5 da Magna Carta.
À vista disso, Alexandre de Morais conceitua os direitos humanos fundamentais como “O conjunto institucionalizado de diretos e garantias do ser humano, que tem por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana”.
Porquanto, a proposta que considero uma solução plausível seria a criação de leis no sentido da proteção desse condutor de aplicativo estabelecendo suas condições mínimas de trabalho, como exemplo, responsabilidade da empresa a pagar o direito a auxílio acidente no caso de uma ocorrência no meio do serviço, pois se ele não seria empregado, ele não receberia absolutamente nada da empresa, e se houvesse leis no sentido dessa proteção, seria mais benéfico aos trabalhadores, bem como, em caso de furto ou roubo desses condutos, porquanto no sistema atual, o condutor arcaria com seu dinheiro pessoal, mas no caso de ter uma proteção constitucional firmada em leis, o trabalhador não haveria que ter suas perdas.
Por outro lado, quanto ao caso da LOGGI também compreendo que a decisão da juíza foi acertada, pois o funcionário está totalmente dependente e sujeito as regras da LOGGI, pois, caso esse motorista fosse autônomo, ele teria uma maquininha de cartão própria, cobrando um frete para si, não para a empresa. Bem como, possui controle de horários e locais de prestação de serviços, evidenciando que ele não podia fazer seus próprios horários.
Ressalta-se que ambas as empresas possuem como principal foco o transporte logístico, as próprias se diferenciam no objeto da matéria prima das empresas. Por quanto, no caso da UBER o primordial elemento é o transporte de pessoas, enquanto que na LOGGI se enfatiza o transporte de mercadorias.
Destarte, esse seria o ponto de partida para a defesa da tese de que em um se consideraria empregado e em outro não.
Neste sentido, a UBER não teria relação empregatícia com os seus condutores, pois este tem muita autonomia e independência, por mais que o motorista não possa fixar seu preço, ele possui o sistema “off-line”, na qual, ele pode entrar no aplicativo na hora que ele quiser sem uma delimitação de tempo, muito menos uma delimitação de espaço, pois ele pode encontrar passageiros onde ele quiser, não sendo uma defesa o fato de que ele tenha um percurso delimitado pelo aplicativo.
Além disso, muitos defensores alegam que o sistema de Feedback seria uma forma de caracterização da subordinação. Dessa opinião eu discordo, pois considero que o sistema de Feedback que existe na empresa UBER e nas demais empresas, é um método para melhorar o desempenho do colaborador seguindo as prioridades da empresa, assim, será uma ferramenta totalmente elucidativa para que o próprio funcionário veja e consiga aumentar seu desempenho, cuja finalidade será para o diferencial em relação a todos os outros condutores, logo, há a evidência de uma característica de trabalho autônomo, a concorrência.
Em contrapartida, o funcionário da LOGGI teria sim a relação empregatícia, pois o transportador não possuir nenhuma autonomia em relação a empresa. Como uma das razões, é a de que não é o motofretista que escolhe a entrega, mas aceita, além do que no trabalho por aplicativos ou "on demand”, este aplicativo que define o preço, as condições da oferta do bem, logística, forma de pagamento e entre outros.
Neste diapasão, enquanto que na UBER o funcionário possui o sistema “off-line”, na LOGGI isso não existe, pois o próprio aplicativo já delimita tudo o que o funcionário deve fazer. Sendo assim, pelo fato do condutor de transporte da LOGGI já possuir tudo extremamente ordenado por um aplicativo, configura ainda mais a relação de emprego com essa Subordinação Hierárquica.
Outra crucial diferença está no fato de que na UBER o condutor não precisa andar fazer merchandising da empresa, enquanto que na LOGGI o funcionário é obrigado andar com a promoções de seu próprio produto, expondo aos seus consumidores, como exemplo, a bolsa térmica e todos produtos que o funcionário deve andar com o logo da empresa.
Outrossim, evidencia-se como outras diferencias que a Não Eventualidade na UBER se nota rarefeita, enquanto na LOGGI está mais nítida, porque na UBER o motorista pode logar ou desligar o aplicativo quando quiser, e ao pegar um cliente na parte da manhã, após a entrega desse cliente ele pode não mais querer trabalhar durante todo o dia, enquanto que na LOGGI ele deve entrar e entregar todos os objetos pegos na parte da manhã, durante praticamente o dia todo neste serviço.
Por fim, vale ressaltar, que entre os pontos convergentes, estão que em ambos os casos estiveram presentes, os requisitos da Onerosidade, pois nas duas empresas não é o funcionário que expõe seu próprio e sim um aplicativo, Pessoalidade, onde não pode o funcionário mandar um terceiro em seu lugar e a Alteridade, na qual, a empresa que assume todos os riscos.
5. CONCLUSÃO
Por todo o exposto e examinado, concluo pela concordância com ambos os julgados, porquanto por mais que ambas as empresas possuem como principal foco o transporte logístico, as próprias se diferenciam no objeto da matéria prima das empresas. Por quanto, no caso da UBER o primordial elemento é o transporte de pessoas, enquanto que na LOGGI se enfatiza o transporte de mercadorias.
Ao regressar ao início desse trabalho, entende-se que o entendimento do judiciário brasileiro em relação ao condutor da UBER não converge com o posicionamento de diversos países, porquanto, no entendimento brasileiro, não haveria a relação de emprego por falta da subordinação, pois para esta corte, há diversos meios que comprovem que o motorista parceiro trabalhe de modo autônomo, sendo que o simples fato da conexão dentro da plataforma, motivo do reconhecimento da corte em diversos países, não geraria uma subordinação, pois o condutor se conecta a hora que ele quiser, evidenciando ainda mais a autonomia dele.
REFERÊNCIAS:
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2018.
SÜSSEKIND, Arnaldo. Curso de direito do trabalho. Renovar, 2019.
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. 2008
DE MORAES, Alexandre. Constituição do Brasil interpretada e legislação constitucional. Atlas, 2011.
Grupo de Estudos Ministério Público do Trabalho 2020
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graduando em Direito pela Universidade São Judas Tadeu
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SILVA, Samuel dos Santos. Motorista de aplicativo é considerado empregado? O paradoxo UBER x LOGGI Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 07 maio 2020, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54493/motorista-de-aplicativo-considerado-empregado-o-paradoxo-uber-x-loggi. Acesso em: 22 nov 2024.
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