GUILHERME AUGUSTO MARTINS SANTOS[1]
“Apenas na escuridão você pode ver as estrelas.” Martin Luther King Júnior.
RESUMO: Este estudo é dedicado à Justiça Restaurativa, em especial, às Práticas Restaurativas como Ferramentas de Prevenção e Enfrentamento dos Conflitos Escolares. Trata ainda de sua aplicação no sistema penal brasileiro, como alternativa ao atual sistema de resolução de conflitos, que não oferece condições suficientes de ressocialização para o infrator e muito menos para a vítima. Partindo desse princípio, as ferramentas de Justiça Restaurativa objetivam atender às necessidades não supridas pelo processo legal. Através desse olhar, é importante incutir em cada comunidade escolar a necessidade de envolver a sociedade na resolução de seus próprios problemas e conflitos, para que juntos encontrem as melhores saídas para reduzir a intervenção estatal. A pesquisa trata também das práticas circulares e como sua visão abrangente têm construído a paz de maneira dinâmica e possibilitado a aplicação do Direito sob um olhar humanizado, que serve como base para a resolução de conflitos. O trabalho contextualiza a Justiça Restaurativa nas escolas a partir de exemplos de alguns Estados, como Paraná, Rio Grande do Sul e São Paulo, além do Distrito Federal, que passaram a ser referência em todo o Brasil.
Palavras-Chave: Comunidade Escolar; Cultura de Paz; Justiça Restaurativa; Práticas Restaurativas.
Sumário: Introdução. 1. A violência nas escolas. 2. Justiça Restaurativa como Mudança do Paradigma de Enfrentamento dos Conflitos Escolares. 3. Práticas Restaurativas como Ferramenta de Enfrentamento dos Conflitos Escolares. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
Esta pesquisa parte do princípio de que a humanidade está em estado permanente de mudanças, adaptando-se ao constante vir a ser. Desde o início, houve muitos desvios de conduta que ficaram conhecidos como concupiscência social. Através desses caminhos não virtuosos é que aconteceram os vários delitos culposos e danosos que chegaram até os dias atuais.
Sabe-se que a violência nas escolas é uma situação grave, que aumenta e preocupa a comunidade escolar, pesquisadores e a sociedade, no mundo inteiro. Pelos meios de comunicação, chegam notícias de agressões físicas entre alunos ou praticadas por estes em relação aos professores e/ou funcionários da escola.
É a partir dessas manifestações sociais que a pesquisa discorrerá sobre as boas práticas de justiça restaurativa, capazes de colaborar com o enfrentamento dos conflitos em comunidades escolares.
Neste sentido, justifica Howard Zehr que:
A justiça precisa ser vivida, e não simplesmente realizada por outros e notificada a nós. Quando alguém simplesmente nos informa que foi feita justiça e que agora a vítima irá para casa e o ofensor para a cadeia, isto não dá a sensação de justiça. Nem sempre é agradável vivenciar, passar pela experiência da justiça. Mas ao menos saberemos que ela existiu porque participamos dela ao invés de ter alguém a fazer isso por nós. Não é suficiente que haja justiça, é preciso vivenciar a justiça. (2008, P. 191)
A construção de uma comunidade se dá, simultaneamente, pelo desejo que brota da individualidade e pela coletividade, que faz nascer uma ideia a partir de uma necessidade. Quando Platão (428/427 a.C - 348/347 a.C) relatou o mito da caverna, teve como intuito libertar o homem primitivo das amarras que o escravizavam. O indivíduo que fica escravo de suas próprias ideias não consegue sair do seu casulo e pode causar prejuízos à coletividade que o cerca.
A proposta deste estudo sobre práticas restaurativas não é diagnosticar os conflitos que existem em comunidades escolares e na sociedade em geral, mas sim, tratar dos seguintes itens: As violências nas escolas; Justiça restaurativa como mudança do paradigma de enfrentamento dos conflitos escolares; e Práticas restaurativas como ferramenta de enfrentamento dos conflitos escolares.
Consequentemente, a pesquisa vai elucidar exemplos de iniciativas que surgiram nessa linha de projeto e que se propuseram a intervir nas questões relativas à violência na escola, considerando que: a violência na escola emerge situações de conflito interpessoais/institucionais; está presente nas relações da comunidade escolar e nas desta com a comunidade onde se situa (agentes externos de violência); e pode variar de transgressões às normas disciplinares a agressões graves, inclusive as situações chamadas de incivilidades ou bullying. Por fim, a violência costuma estar atravessada por questões coletivas, nos contextos religioso, social, político, econômica e cultural.
Feitas essas considerações, este estudo se propõe a refletir como as práticas restaurativas podem oferecer à Justiça formas alternativas e complementares de lidar com as violências na escola, levando em conta a dimensão coletiva e sua capacidade de resolução. Conflitos sempre existiram e pode-se afirmar que eles expressam as relações interpessoais de forma natural, conforme explica Chrispino:
O conflito é, pois, parte integrante da vida e da atividade social, quer contemporânea, quer antiga. (…) se origina da diferença de interesses, de desejos e de aspirações. Percebe-se que não existe aqui a noção estrita de erro e acerto, mas de posições que são defendidas frente a outras, diferentes. (…) O conflito pode ocorrer entre duas ou mais pessoas, entre pessoas e grupos, entre grupos, entre pessoas e organizações, entre grupo e organizações. (…) Podemos dizer que o conflito faz parte do processo comum de interação de uma sociedade aberta (2002, p. 29-31).
A pesquisa também considera que é preciso superar a crença de que a justiça criminal irá resolver todas as situações conflitivas. Neste sentido, o Direito muitas vezes se apresenta como ferramenta de controle social, que nem sempre é a melhor saída. A prática restaurativa, por sua vez, traz um novo olhar sobre a maneira de enfrentar o conflito, sobretudo quando há o diálogo coletivo e imparcial entre ofensor e ofendido.
Nesta direção, a pesquisa demonstrará que tanto o Estado quanto o indivíduo podem auferir vantagens quando compreenderem que a aplicação das práticas restaurativas carrega consigo valores que passam pela via da paz e do amor.
1.A VIOLÊNCIA NAS ESCOLAS
Partindo do princípio de que a escola é segunda casa da comunidade que a integra, é de se destacar todo o esforço de seus integrantes em mostrar o valor do resgate a vidas que estão à berlinda da sociedade, como famílias que perderam seus referenciais culturais, éticos e morais.
Por outro lado, corre-se o risco de que a escola estabeleça uma ordem que não aceita as diferenças e impõe uma homogeneização desnecessária, que pode desencadear revoltas que se manifestam de diversas formas. A este respeito, explica Áurea Guimarães:
Se a violência é fonte de vida, e se manifesta de várias maneiras, então não é possível analisá-la de um único modo. A pluralidade da violência indica a polissemia do fato social (1990, p. 9).
Também pode-se incorrer que a violência esteja ligada somente à pobreza, ao mesmo tempo em que se esquece que isso não é via de regra, uma vez que existem outros elementos que influem nessa situação, como ressalta Charlot:
É um erro desconhecer a importância da pobreza e das estruturas sociais no nascimento e desenrolamento dos atos violentos, mas é também um erro supor que o peso desses elementos macrossociais seja sempre igual e é um abuso transformar elementos da situação em determinantes, muito mais em determinantes de “a” violência, como se houvesse uma espécie genérica, “a” violência, cujos fenômenos agrupados sob essa etiqueta fossem apenas variedades (2006, p. 22)
É preciso considerar ainda que o combate à violência escolar passa pela necessidade de superar realidades conflitantes entre si: de um lado, a pouca aceitabilidade dos alunos em relação às normas estabelecidas pela instituição escolar; e do outro, a dificuldade de professores e gestores em fazer valer a disciplina. A este respeito, o autor Nelson Pedro Silva faz associações que trazem em si características de conflitos geracionais.
A escolarização formal encontra-se igualmente em crise. As crianças e os adolescentes mostram-se, por um lado, pouco acostumados a vivenciar e a respeitar os limites que visam a assegurar a sobrevivência de si e a do grupo no qual estão inseridos. Os educadores, por outro lado, não sabem como agir. As sanções (punições), em outros tempos utilizadas por eles, não são mais aceitas e, mesmo quando são aplicadas, parecem ser ineficientes (PEDRO-SILVA, 2014, p.16).
Há de se cuidar também para que não haja generalização quanto à definição do termo violência, conforme esclarece Charlot:
Se, como pesquisador envolvido na questão da educação, tivesse que propor uma definição da violência, proporia a seguinte: Violência é o nome que se dá a um ato, uma palavra, uma situação, etc., em que um ser humano é tratado como um objeto, sendo negados seus direitos e sua dignidade de ser humano, de membro de uma sociedade, de sujeito insubstituível (2006, p. 24-25).
Fica esclarecido ainda que, segundo o pensamento de Debarbieux (2002) e Charlot (2006), é possível considerar três tipos de violência em relação ao ambiente escolar: a violência “na” escola, violência “à” escola e violência”da” escola.
No primeiro caso, trata-se de uma violência que acontece dentro da escola, mas que está ligada a uma ocorrência externa. Em linguagem coloquial, é a violência que vem de fora para a escola.
Segundo Charlot , a violência “na” escola:
[...] se produz dentro do espaço escolar, sem estar ligada à natureza e às atividades da instituição escolar: quando um bando entra na escola para acertar contas das disputas que são as do bairro, a escola é apenas o lugar de uma violência que teria podido acontecer em qualquer outro local. Pode-se, contudo, perguntar-se porque a escola, hoje, não está mais ao abrigo de violências que outrora se detinham nas portas da escola (2006, p. 434).
Quanto a violência “à” escola, vale ressaltar que esta é relacionada a fatores institucionais, como por exemplo: a depredação ou a prática de atos violentos contra os que representam a escola, como os professores ou a equipe pedagógica.
Outro fator que deve ficar em evidência nesta pesquisa é a comunidade escolar, que termina sendo “escolhida” por alguns alunos simplesmente para ser “foco” de variados tipos de violência. Estas manifestações agressivas, portanto, comumente estão ligadas à comunidade escolar.
Diante dessa premissa, explica Charlot:
Sendo assim, claro que sempre é possível encontrar um argumento para defender a tese de que a violência tem fontes nas estruturas sociais ou, pelo contrário, que se enraíza nas interações e situações contextualizadas. Mas o que importa, na verdade, não é rotular o fenômeno, é melhor entender como as fontes ditas externas e internas se articulam em casos concretos (2006, p. 20).
Jamais se pode negligenciar ou banalizar a violência. Pelo contrário: há a necessidade de saber as suas causas e efeitos em relação aos alunos que apresentam comportamento agressivo. Sobre isso, Carlos Gadea afirma que:
Tudo parece indicar que há um evidente deslocamento no objeto a ser analisado: não é mais compreendendo o movimento social que saberemos frente a que definições de situações de conflituosidade nos deparamos, mas sim conhecendo mais sobre a forma do estabelecimento de cenários de conflituosidade é que se poderá compreender o sentido de uma experiência coletiva de conflito. (2011, p. 77)
Acredita-se que a causa da violência venha a ser o conjunto de desequilíbrios e inadequações instituídas através de normas. Nesse aspecto, é necessário destacar as pesquisas de Áurea Guimarães (1990), realizadas na década de 1990 em comunidades escolares da cidade de Campinas (SP). O estudo demonstrou a dificuldade encontrada por diretores em gerir bem a escola, tanto junto ao corpo docente quanto discente. Fica claro na abordagem da autora que os diretores se ocupam apenas de assegurar o cumprimento de normas, deixando de lado o foco no trabalho pedagógico.
Diante dessa reflexão, afirma a autora que:
Os professores, ao amedrontar os alunos, não impedem os conflitos e acabam transformando-os em outra força de coerção homogeneizadora, através da qual todos ficam quietos; mas essa aparente passividade tem uma dinâmica que pode minar as possibilidades de uma solidariedade interna (GUIMARÃES, 1990, p. 204).
Desse modo, mais uma vez a falta de significação institucional está alicerçada primordialmente a um disciplinamento inadequado e com práticas antidemocráticas na escola, que só tendem a prejudicar crianças, jovens, adultos, famílias e o meio social em que vivem.
E quando é possível analisar a violência escolar sob esse prisma, é sinal de que ainda há muito a se fazer para que o mundo seja mais humanitário, com educação de qualidade e sem violências. A respeito disso, vale destacar o que diz Éric Debarbieux:
As vítimas desses pequenos delitos são deixadas com uma impressão geral de desordem e de violência num mundo mal regulamentado. O modelo psicossociológico da insegurança como “fantasia” é assim colocado em questão: longe de ser uma preocupação injustificada num período de rarefação do crime, a insegurança vincula-se a microvitimizações que não são passíveis de serem tratadas pelas autoridades públicas, em razão do seu número (2002, p. 27 – 28).
Por essas e outras razões, incute-se a olhar os vários tipos de violências aqui elencados como parte do dia a dia da escola. E ao mesmo tempo, uma realidade imanente que tem acesso livre a todos os jovens nessa fase do conhecimento.
2.JUSTIÇA RESTAURATIVA COMO MUDANÇA DO PARADIGMA DE ENFRENTAMENTO DOS CONFLITOS ESCOLARES
Quanto mais se mergulha na temática da Justiça Restaurativa (JR), mais se vê a necessidade mudar paradigmas em relação à solução de conflitos escolares, especificamente, a dificuldade de superar a visão punitiva atrelada aos atos danosos. Por isso, a JR tem sido adotada como prática há apenas poucos anos, em um processo tão lento quanto a discussão sobre a reinserção de delituosos na sociedade. E com isso, não se está pedindo que a Justiça Restaurativa substitua a retributiva em todas as situações, mas sim que a complemente, conforme apontam Santos e Gomide:
O processo restaurativo é complementar, e não excludente ao retributivo, isto é, deve-se salientar que, atualmente, a proposta do modelo restaurativo não é a de substituir o procedimento retributivo, mas de trabalhar junto a ele (SANTOS; GOMIDE, 2014, p. 23)
É importante enfatizar que não se pode simplesmente impor este tipo de ação, muito porque no âmbito social a restauração não é vista como algo bom e necessário. Desse modo, vale a pena refletir sobre o caráter ético da Justiça Restaurativa abordado por Mullet e Amstutz em sua obra Disciplina Restaurativa para Escolas, na qual apontam que ela:
Promove valores e princípios que utilizam abordagens inclusivas e solidárias para a convivência. Essas abordagens legitimam as experiências e necessidades de todos da comunidade, especialmente daqueles que foram marginalizados, oprimidos, ou vítimas de violência. Essas abordagens nos permitem agir e reagir de forma a restabelecer o outro, ao invés de alienar e coibi-lo (2012, p. 34)
Segundo Siqueira Neto, em seu livro Justiça Restaurativa em Ação – Práticas e Reflexões:
A Justiça Restaurativa tem trazido mudanças paradigmáticas aos sistemas onde é aplicada porque revoluciona a forma de gerenciamento de conflitos, transformando as relações de resistência e litígios em práticas dialógicas e processos cooperativos (2014, p. 24)
A Resolução 12/2002 de 24 julho de 2002, da Organização das Nações Unidas (ONU), define a justiça restaurativa como “um processo através do qual todas as partes envolvidas em um ato que causou ofensa reúnem-se para decidir coletivamente como lidar com as circunstâncias decorrentes desse ato e suas implicações para o futuro”.
Para Leonardo Sica (2007), a justiça restaurativa e a mediação de conflitos traduzem conceitos “quase anárquicos, abertos, flexíveis, polissêmicos e multifuncionais” (p.19), ou melhor, conceitos que geram múltiplas possibilidades, dentre as quais a participação, o comprometimento e o empoderamento de todos os atores envolvidos em uma circunstância danosa, inclusive os membros da comunidade.
Dessa maneira, fica entendido que a justiça restaurativa é uma das práticas sociais que oferecem o mínimo de justiça que uma sociedade pode ou deve exigir: liberdade, igualdade, diálogo e respeito, estimulando o convite para a ética civil e a articulação do justo e do bom, sendo Justo compreendido como algo que deve ser e que, não o sendo, coloca a pessoa em nível inferior ao da estatura moral que requer a dignidade humana. E o Bom, entendido como algo que causa a felicidade e proporciona a autorrealização pelo alcance dos ideais de uma vida digna. Por fim a felicidade, cujo convite, quando aceito, facilita a realização subjetiva, pessoal e intransferível resultante da adoção desse modelo como norteador da conduta pessoal (ANDRADE, 2010).
A partir dessa visão filosófica e jurídica, há a possibilidade de lançar um olhar sobre a Justiça Restaurativa na polis e suas consequências. E entender o quanto ela está integralmente presente na família, alunos, professores, comunidades escolares e na formação integral do ser humano. Com base nesta afirmação, explica Gomes Pinto:
A partir desse princípio pode-se dizer que é possível acontecer e trabalhar a justiça restaurativa no Brasil. Para isso, é importante conceituar: o que é justiça restaurativa? Praticamente, baseia-se num procedimento de consenso em que vítima e infrator, e também, outras pessoas ou membros da comunidade, encontram-se prejudicados pelo crime, e como sendo sujeitos centrais possam participar coletivamente e afetivamente na construção de soluções para a cura das feridas, dos traumas e perdas causados pelo crime. Na verdade, a justiça restaurativa propõe não somente restaurar, é mais do que isso. Ela nos ajuda não somente entender o que é, mas vivenciar uma prática restaurativa baseada na participação estritamente voluntária, informal e direcionada preferencialmente em espaços comunitários ( 2005, p. 20).
Ainda de acordo com o autor, é importante ressaltar que o paradigma restaurativo vai além do procedimento dos juizados especiais para “resgatar a convivência pacífica no ambiente afetado pelo crime, em especial naquelas situações em que o ofensor e a vítima tem uma convivência próxima” (Gomes Pinto, 2005, p. 20). Diante dessa realidade, o Juiz Asiel Henrique de Sousa, num estudo preliminar para a implantação de um projeto piloto em Brasília, no Núcleo Bandeirante 2, em suas anotações ainda não publicadas, acrescenta que:
Em delitos envolvendo violência doméstica, relações de vizinhança, no ambiente escolar ou na ofensa à honra, por exemplo, mais importante do que uma punição é a adoção de medidas que impeçam a instauração de um estado de beligerância e a consequente agravação do conflito” (GOMES PINTO, 2005 p. 20).
São estes, inclusive, alguns dos desafios que o público jovem enfrenta na sua trajetória psíquico humano-afetiva. Quando o sistema judiciário entender que o ser humano não é uma máquina inanimada, tornar-se-á possível sanar os conflitos existentes na vida de muitas crianças e adolescentes que vivem sem vez e voz na sociedade. Enquanto houver um pensamento altruísta excludente e individualista, no qual se ouve quase sempre “manda quem pode e obedece quem tem juízo”, jamais se chegará a uma prática restaurativa como estratégia de soluções de conflitos.
A respeito disso, afirma Marshall Rosenberg:
A não violência não é uma estratégia que se possa utilizar hoje e descartar amanhã, nem é algo que nos torne dóceis ou facilmente influenciáveis. Trata-se, isto sim, de inculcar atitudes positivas em lugar das atitudes negativas que nos dominam. Tudo que fazem é condicionado por motivações egoístas (Que vantagem eu levo nisso?), e essa constatação se revela ainda mais verdadeira numa sociedade esmagadoramente materialista que prospera com base num duro individualismo (ROSENBERG, 2006, p.15)
Frente a esse contexto, questiona-se: de que maneira a prática restaurativa pode ser empregada para a prevenção de conflitos em comunidades escolares? Diante de qualquer abordagem a respeito da Justiça Restaurativa, vale ressaltar que a resolução dos conflitos penais se dá através do diálogo, propiciando às partes envolvidas e à comunidade diretamente interessada adotar a decisão que aparentar ser a mais adequada ao caso.
As primeiras práticas de justiça restaurativa foram apresentadas ao povo de diversas maneiras. Em alguns momentos, recorreu-se à ancestralidade, por meio dos antepassados. Em outros, as práticas comunitárias, por serem similares às práticas restaurativas, são defendidas como sendo a sua origem e inspiração (JACCOUD, 2005). O que é importante perceber diante dessas afirmativas é que todas tem um eixo comum: a busca da legitimação de práticas restaurativas.
Para entender melhor o modelo de justiça restaurativa, a coletânea de artigos de FAGET (1997, p. 164) sustenta três fatores que muito colaboraram para o seu aparecimento nas sociedades ocidentais contemporâneas, sendo: 1) contestação das instituições repressivas; 2) descoberta da vítima; e 3) exaltação da comunidade. Ainda de acordo com o autor, estes movimentos de contestação das instituições repressivas não apareceram do nada; surgiram nas universidades americanas, com ênfase nos trabalhos da escola de Chicago, bem como os de criminologia radical na Universidade de Berkeley, na Califórnia, que por sinal criticavam profundamente as instituições repressivas, destacando principalmente seu papel no processo de definição do criminoso.
Alguns movimentos surgiram motivados por esse desejo de mudanças. Por exemplo: nos Estados Unidos, os Quakers e os Mennonites unem-se à corrente da esquerda radical para contestar o papel e os efeitos das instituições repressivas (FAGET, 1997, p.164). Certamente, tomaram força a partir do momento em que perceberam que existiam mais pessoas envolvidas nessa causa. Ainda segundo a reflexão de Faget:
[...] movimento crítico americano encontra eco na Europa, onde os trabalhos de Michel Foucault (Surveiller et punir: naissance de la prison, 1975), Françoise Castel, Robert Castel e Anne Lovell (La société psychiatrique avancée: le modèle américain,1979), Nils Christie (Limits to Pain, 1981) e Louk Hulsman (Peines perdues: le système pénal en question, 1982) nutrem a reflexão e o desenvolvimento de um movimento que recomenda o recurso para uma justiça diferente, humanista e não punitiva (1997, p. 65).
Já quase no final da Segunda Guerra Mundial surge e se desenvolve um discurso de cunho científico sobre as vítimas: a vitimologia, conhecimento focado na pura tradição positivista, que caracteriza a criminologia da época ao se preocupar com as razões da vitimização, que tenta identificar os fatores que predispõem os indivíduos a tornarem-se vítimas. São estes – os lobbys vitimistas ligados e apoiados pelos sábios discursos sobre a vítima – que vão sensibilizar profundamente os críticos teóricos do modelo retributivo para as necessidades, mas sobretudo para a ausência da vítima no processo penal. Vale ressaltar ainda que o movimento vitimista inspirou a formalização dos princípios da justiça restaurativa, mas não endossou seus princípios nem participou diretamente de seu advento (FAGET, 1997, p. 165).
Mesmo assim, é importante lembrar que nas comunidades tradicionais os conflitos eram menos frequentes, menos numerosos e, com certeza, mais administrados entre eles. Isso porque existia a cultura da negociação, que muito contribuiu para o surgimento da Justiça restaurativa (FAGET, 1997, p. 165). Que por sinal, ficou conhecida e denominada como “exaltação da comunidade”, sendo este o terceiro e último fator.
Para Howard Zehr (2008, p. 170-171), a Justiça Retributiva trata o crime como uma transgressão contra o Estado, em virtude da desobediência à lei. Por isso, determina a culpa e impõe dor no contexto de disputa entre o transgressor e o Estado, por meio de suas regras sistemáticas. Na justiça restaurativa, por sua vez, o crime é encarado como violação de pessoas, sentimentos e relacionamentos, criando meios que ajudem a corrigir erros. Sob esse prisma, sua prática implica envolvimento entre o receptor, o autor do ato violento e a comunidade, na busca por soluções de reparação, reconciliação e segurança. Consequentemente, a família, os jovens, escola e sociedade são pilares de suma importância na evolução e transformação do adolescente em busca de uma vida íntegra, sem violência e discriminação social.
Antes de dar continuidade, é preciso trazer elementos importantes. Muito do que se busca resolver hoje na vida de um jovem intitulado de mau caráter, possivelmente tem raízes no fato de que o mesmo não tenha sido ajudado na sua formação psíquico humano-afetiva. E essa é uma realidade presente na vida de muitas famílias e instituições voltadas a uma formação humanizada e aberta ao diálogo.
Por isso, é importante entender e propor meios que ajudem a solucionar os conflitos existenciais, que possivelmente foram adquiridos ao longo da vida ou até mesmo no momento da concepção.
Diante desses relatos, é importante compreender o que diz Howard Zehr:
O crime significa um agravo à vítima, mas poderá também ser um agravo ao ofensor. Muitos crimes nascem de violações. Muitos ofensores foram vítimas de abusos na infância e carecem das habilidades e formação que possibilitariam um emprego e uma vida significativa. Muitos buscam validação e empoderamento. Para eles, o crime é uma forma de gritar por socorro e afirmar sua condição de pessoa. Em parte, prejudicam os outros porque foram prejudicados. E não raro, são prejudicados ainda mais pelo sistema judicial. Tal dimensão nasce, em certa medida, de outras questões da justiça retributiva (ZEHR, 2008, p.171).
A relação psíquico humano-afetiva é de suma importância na vida de professores, alunos, pais e filhos. Um dos pontos relevantes da justiça restaurativa é estabelecer entre esses agentes uma relação integral, baseada no afeto ou afetividade (ABBAGNANO, 1982).
Jamais se pode esquecer que o afeto é um ingrediente primordial em qualquer relação humana e deve estar presente em todas as fases da vida. Ao se analisarem essas relações na atualidade, percebe-se que há um distanciamento da afetividade e uma banalização deste sentimento. E os resultados são visíveis: crianças se tornam verdadeiros “adultos em miniatura”, manifestando um comportamento precoce, antissocial e, muitas vezes, agressivo.
A esse respeito observa-se o seguinte, nas palavras de Nicola Abbagnano:
(lat.Affectus; ingl.Affection; franc. Afeection; al.Affektion). Entende-se com esse termo, no uso comum, as emoções positivas que se referem a pessoas e que não tem o caráter dominante e totalitário da paixão(v). Enquanto as emoções podem referir-se tanto a pessoas quanto a coisas, fato ou situações. Os A. constituem aquela classe restrita de emoções que acompanham algumas relações interpessoais (entre pais e filhos, entre amigos, parentes), limitada àquela tonalidade indicada com o adjetivo “afetuoso” e que por isso exclui o caráter exclusivista e dominante da paixão. A palavra designa o conjunto de atos ou de atitudes como bondade, a benevolência, a inclinação, a devoção, a proteção, o apego, a gratidão, a ternura etc., que, no seu todo podem ser caracterizados como a situação em que uma pessoa “toma cuidado de” ou “nutre solicitude por” uma outra pessoa ou em que esta outra responde, positivamente, ao cuidado ou à solicitude de que foi objeto. O que comumente se chama “necessidade de A.” é a necessidade de ser compreendido, assistido, ajudado nas próprias dificuldades, seguindo com olhar benévolo e confiante. Nesse sentido A. não é senão uma das formas de amor(v). (ABBAGNANO, 1982, p. 19-20).
Faz-se necessário saber o quanto é importante a presença de um ambiente agradável e propício ao desenvolvimento do corpo e da alma na vida de um jovem, inserido numa cultura de justiça e paz. Quando se pergunta: de que maneira a justiça restaurativa pode ser empregada como estratégia de prevenção de conflitos em comunidades escolares? – Leva-se a perceber que ela surge não somente para ser um bálsamo paliativo na resolução de conflitos. A respeito disso, também afirma Marshall Rosenberg:
À medida que a Comunicação não violenta substitui nossos velhos padrões de defesa, recuo ou ataque diante de julgamentos e críticas, vamos percebendo a nós e aos outros, assim como nossas intenções e relacionamentos, por um enfoque novo. A resistência, a postura defensiva e as reações violentas são minimizadas (2006, p.22).
Concretamente, esta fala do autor veio como uma alternativa ao paradigma da Justiça Retributiva tradicional. O seu parecer vivencial passa a fazer parte da sociedade como um grito de socorro, como um remédio para o mal da violência e como uma forma de promover a paz, a dignidade e a restauração das relações. Deve-se refletir e analisar de que não resta dúvida a respeito do fracasso do paradigma retributivo, onde o Estado é o protagonista da ação penal, para a qual se busca um culpado para punir com a aplicação de uma pena que cause sofrimento (ZEHR, 2008).
Acredita-se na proximidade de uma realidade mais justa e fraterna quanto a experiência familiar e escolar. Por isso, é preciso cultivar e vivenciar uma comunicação não violenta. A partir do momento em que a humanidade não precisar da violência, crime, exploração sexual infantil e tantos outros males para sobreviver, haverá a capacidade de entender, com mais clareza, que a comunicação não violenta leva a uma grandeza maior, conforme explica Marshall Rosenberg:
Para usarmos a CNV, as pessoas com quem estamos nos comunicando não precisam conhecê-la, ou mesmo estar motivadas a se comunicar compassivamente conosco. Se nos ativermos aos princípios da CNV, motivados somente a dar e a receber com compaixão, e fizermos tudo que pudermos para que os outros saibam que esse é nosso único interesse, eles se unirão a nós no processo, e acabaremos conseguindo nos relacionar com compaixão uns com os outros. Não estou dizendo que isso sempre aconteça rapidamente. Afirmo, entretanto, que a compaixão inevitavelmente floresce quando nos mantemos fiéis aos princípios e ao processo da CNV (ROSENBERG, 2008, p. 24).
Como falar em uma Prática de Justiça Restaurativa quando há violação do próprio direito humano? Quando se escuta de muitas vítimas, em especial os jovens, de que as argumentações atuais ainda não são convincentes, é de se ficar estarrecido com o Estado, que tem como responsabilidade objetiva zelar pela pessoa humana. A esse respeito, Cavalieri afirma:
Independentemente de qualquer falta ou culpa do serviço, desenvolvida no terreno próprio do Direito Público. Chegou-se a essa posição com base nos princípios da equidade e da igualdade de ônus e encargos sociais. Se a atividade administrativa do Estado é exercida em prol da coletividade, se traz benefícios para todos, justo é, também, que todos respondam pelos seus ônus, a serem custeados pelos impostos. O que não tem sentido, nem amparo jurídico, é fazer com que um ou apenas alguns administrados sofram todas as consequências danosas da atividade administrativa (2012, p. 256).
Quanto às queixas relativas ao processo criminal, as argumentações ouvidas são as de que as partes não são escutadas, a dignidade da pessoa humana não é respeitada e o ofensor é desumanizado e tratado como um marginal, independente do histórico de vida, das violações de direitos já sofridas por ele e dos motivos que o levaram a determinado comportamento. A vítima só é questionada a respeito do fato; o Judiciário não se preocupa com seus sentimentos e necessidades. Quanto à reparação do dano, esta inexiste, visto que a pena é somente uma punição para o comportamento do ofensor, nada representando para a vítima (ZEHR, 2008).
É possível detectar ainda que a vivência da juventude nas camadas periféricas é árdua e difícil: os jovens enfrentam desafios consideráveis. E o mais agravante é que, ao lado de sua condição como jovens, encontra-se a pobreza, ambas interferindo diretamente em sua trajetória de vida e possibilidades. É lamentável dizer, mas é uma corrida constante contra o tempo, um desafio cotidiano para garantir a própria sobrevivência, numa tensão constante entre a busca de gratificação imediata e um possível projeto de futuro.
Numa coletânea de artigos sobre justiça restaurativa nas Escolas, foi publicado um estudo longitudinal nacional de saúde de adolescentes nos Estados Unidos, que confirmou que estudantes que estão conectados à comunidade escolar são menos propensos ao uso de álcool e drogas ilegais, a engravidar, a mostrar comportamento violento ou anticonvencional e, surpreendentemente, a sofrer de angústia emocional:
A conclusão para a justiça restaurativa é que através da construção da capacidade de estimular relações de companheirismo entre estudantes, as escolas podem abordar os sentimentos de alienação e desesperança que alguns estudantes sentem. A evidência sugere que a base do bem-estar individual, da resiliência, do desenvolvimento social e da cidadania produtiva é nutrir relações positivas dentro da comunidade escolar e da comunidade mais ampla. As teorias que apoiam a prática de justiça restaurativa têm, de diferentes modos, realçado a influência recíproca entre os indivíduos e os grupos na construção de uma cidadania responsável e zelosa (MORRISON, 2005. p.297).
Nessa mesma dimensão, o autor continua a expressar em seu artigo o quanto é importante criar relações interdisciplinares entre família-comunidade, aluno-escola. E nesta visão, o Conselho de Pesquisa Nacional – CPN – recomendou que todos os membros da comunidade escolar estejam atentos, observando e respondendo às ansiedades, angústias, decepções e preocupações dos adolescentes, proporcionando oportunidades e caminhos onde as pessoas jovens sentir-se-ão valorizadas, empoderadas e necessárias. Se o acesso às oportunidades e caminhos não é criado quando o status de um jovem foi cronicamente ameaçado, eles simplesmente se retirarão ou contra-atacarão. Esta é uma realidade vivenciada in loco por muitos jovens espalhados pelo Brasil e que .merece um olhar familiar e escolar mais intenso e corresponsável (MORRISON, 2005, p. 298).
E quanto às práticas restaurativas, vale ressaltar que o Conselho Nacional de Justiça aprovou em 31 de maio de 2016 a Resolução n° 225/2016, que trata da política criminal da Justiça Restaurativa no âmbito do Poder Judiciário. Essa Resolução apresenta em seu artigo 1º e incisos I e III a ideia de justiça restaurativa, conforme citado por Guilherme Santos em seu livro “Práticas Restaurativas no Judiciário: Institucionalização e lócus de implantação”:
Como corresponsabilidade individual e coletiva, em que o objetivo era entender as estruturas das causas e suas necessidades, visando sempre à reparação do dano e à recomposição das relações interpessoais e sociais, ao envolver a participação direta dos afetados” (SANTOS, 2019).
Observa-se ainda o que relata esta resolução:
Art. 1º. A Justiça Restaurativa constitui-se como um conjunto ordenado e sistêmico de princípios, métodos, técnicas e atividades próprias, que visa à conscientização sobre os fatores relacionais, institucionais e sociais motivadores de conflitos e violência, e por meio do qual os conflitos que geram dano, concreto ou abstrato, são solucionados de modo estruturado na seguinte forma:
I – é necessária a participação do ofensor, e, quando houver, da vítima, bem como, das suas famílias e dos demais envolvidos no fato danoso, com a presença dos representantes da comunidade direta ou indiretamente atingida pelo fato e de um ou mais facilitadores restaurativos;
III – as práticas restaurativas terão como foco a satisfação das necessidades de todos os envolvidos, a responsabilização ativa daqueles que contribuíram direta ou indiretamente para a ocorrência do fato danoso e o empoderamento da comunidade, destacando a necessidade da reparação do dano e da recomposição do tecido social rompido pelo conflito e as suas implicações para o futuro (BRASIL. Resolução CNJ 225/2016).
Outra fonte de pesquisa indispensável para compreensão da justiça restaurativa é a autora Kay Pranis, que em seus trabalhos propõe criar espaços nos quais as pessoas possam estar em conexão mais amorosa umas com as outras. É através desse alicerce que se tem alavancado o interesse de muitas escolas em desenvolver e construir uma comunidade de paz, por meio do envolvimento de famílias, jovens e professores, como verdadeiras comunidades abertas ao diálogo em prol de um mundo melhor.
Em seu livro – Círculos de Justiça Restaurativa e de Construção da Paz – Guia do Facilitador –, Kay Pranis deixa claro que o círculo é um processo de diálogo que trabalha de maneira intencional na criação de espaços seguros para dialogar e solucionar problemas muito difíceis ou dolorosos, a fim de melhorar os relacionamentos e resolver diferenças, sejam elas no âmbito familiar, escolar ou social. Estes círculos procuram encontrar soluções que sirvam para cada membro participante. E o mais importante sentir e perceber é que cada integrante do círculo tem igual valor e dignidade. Ou seja, todos são importantes com seus dons recebidos, uma vez que podem oferecê-los como busca de soluções conflitivas (PRANIS, 2011).
Portanto, ao falar de uma cultura de paz focada no cotidiano escolar e na vida familiar dos adolescentes, revela-se a necessidade da compaixão em suas vidas, um fluxo entre eles e os outros com base numa entrega mútua, do fundo do coração (ROSENBERG, 2008). Consequentemente, por não estarem inseridos nessa cultura do bem, da paz e da não violência, tem crescido o número de jovens envolvidos em conflitos escolares e até mesmo familiares, por não saberem lidar com situações pertinentes à sua vida, como por exemplo: a falta de diálogo e dedicação familiar, respeito mútuo, poucas oportunidades de emprego, ausência de vida contemplativa, comunitária e instrução no mundo do saber.
Em meio a este invólucro, torna-se quase inviável incutir na comunidade escolar a responsabilidade de transformar um jovem estudante em um cidadão pleno de direitos e deveres, conforme previsto na Lei.
Art. 227 É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL, 2016, p.68).
É com este olhar que se constata o quanto é importante um jovem cidadão pleno de seus direitos e deveres perceber e acreditar que educar não é apenas instruir, mas oferecer uma experiência significativa que o prepare para uma vida plena e saudável. É por meio desse aprendizado que nos tornamos cidadãos críticos, autônomos e plenamente participativos da dignidade humana. Ainda de acordo com Rosenberg:
A CNV se baseia em habilidades de linguagem e comunicação que fortalecem a capacidade de continuarmos humanos, mesmo em condições adversas. Ela não tem nada de novo: tudo que foi integrado à CNV já era conhecido havia séculos. O objetivo é nos lembrar do que já sabemos - de como nós, humanos, deveríamos nos relacionar uns com os outros - e nos ajudar a viver de modo que se manifeste concretamente esse conhecimento (2008, p.21)
A partir desse pressuposto de que os conflitos são inerentes a todos os processos humanos, faz-se necessário tomar iniciativas que sejam voltadas para a educação da paz e justiça restaurativa, envolvendo valores para uma cultura democrática, como participação, diálogo, igualdade, justiça social, respeito à diversidade e aos direitos humanos.
3.PRÁTICAS RESTAURATIVAS COMO FERRAMENTA DE ENFRENTAMENTO DOS CONFLITOS ESCOLARES
É necessário aprofundar neste capítulo a legitimação das práticas da Justiça Restaurativa em solo nacional, principalmente após alguns incentivos institucionais, a exemplo do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio do Protocolo de Cooperação para a sua difusão e operacionalidade, firmado em agosto de 2014 com a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), em consonância com a Resolução CNJ n. 125, que fomenta a busca por soluções extrajudiciais para os conflitos. Diante das aproximações entre CNJ, AMB e em consonância com essas Resoluções, é possível linear uma prática restaurativa acessível a todos.
De forma destacada, quando se fala em práticas restaurativas aplicadas aos conflitos juvenis, já existem previsões normativas como portarias, resoluções e também legislação, a Lei nº 12.594/12 – Lei do Sinase - Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, que recepcionam a Justiça restaurativa, embora ainda não seja uma realidade presente em todos os tribunais.
Contudo, é preciso avançar e romper com a cultura jurídica da lei que transforma comportamentos. Naturalmente, a sua efetiva implementação requer zelo e não imediatismo. Partindo dessa problemática, pode-se perguntar: é possível aplicar suas práticas também em outros ambientes que não o judiciário, como por exemplo, o ambiente escolar?
Este é, concretamente, um dos questionamentos desta pesquisa: encontrar alternativas para soluções de conflitos escolares, trazendo à tona alguns exemplos de círculos reintegrativos e restaurativos aplicados nas escolas e transformando conflitos em oportunidades de aprendizagem e construção de paz social.
É extremamente importante lembrar que a criação de uma resolução do Conselho Nacional de Justiça que dispõe sobre a conciliação e a mediação partiu da premissa de que cabe ao Judiciário estabelecer a política pública de tratamento adequado dos conflitos de interesses resolvidos no seu âmbito – seja por meios heterocompositivos, ou por meios autocompositivos. Esta orientação foi adotada de forma a organizar, em todo o território nacional, não somente os serviços prestados no curso da relação processual (atividades processuais), como também os que possam incentivar a atividade do Poder Judiciário de prevenção de demandas com as chamadas atividades pré‐processuais de conciliação e mediação.
Sabe-se que a Resolução 125 do CNJ foi criada diante da necessidade de se estimular, apoiar e difundir a sistematização e o aprimoramento de práticas já adotadas pelos tribunais. Na verdade, quando se aprofunda um pouco mais o estudo dessa temática, identifica-se que desde a década de 1990 já existiam estímulos na legislação processual à autocomposição, acompanhada na década seguinte de diversos projetos-piloto: mediação civil, mediação comunitária, mediação vítima‐ofensor (ou mediação penal), conciliação previdenciária, conciliação em desapropriações, entre outros, bem como práticas autocompositivas denominadas como: oficinas para dependentes químicos, grupos de apoio e oficinas para prevenção de violência doméstica; oficinas de habilidades emocionais para divorciandos, oficinas de prevenção de sobre-endividamento, entre outras (Manual de Mediação Judicial, 2015, pp.33 e 34).
Todo trabalho levado a sério tende a obter bons resultados. E estes projetos demonstram a necessidade de se estabelecer uma política pública nacional em resolução adequada de conflitos. Para atender a essas necessidades, o Conselho Nacional de Justiça aprovou em 29 de novembro de 2010 a Resolução 125.
Todos os objetivos desta Resolução estão indicados de forma bastante taxativa: i) disseminar a cultura da pacificação social e estimular a prestação de serviços autocompositivos de qualidade (art. 2º); ii) incentivar os tribunais a se organizarem e planejarem programas amplos de autocomposição (art. 4º); iii) reafirmar a função de agente apoiador da implantação de políticas públicas do CNJ (art. 3º).
Com base nos considerandos e no primeiro capítulo da Resolução 125, pode-se afirmar que o Conselho Nacional de Justiça tem se empenhado e esforçado para mudar a forma com que o Poder Judiciário se apresenta. Não apenas de forma mais ágil e como solucionador de conflitos, mas principalmente como um centro de soluções efetivas do ponto de vista do jurisdicionado (Manual de Mediação Judicial, 2015, pp.33 e 34).
Diante da urgente necessidade de sanar a violência que cresce entre os jovens e da dificuldade em encontrar alternativas para coibi-la, surge a Justiça Restaurativa como nova possibilidade de colaborar de maneira prática para a solução de conflitos escolares e sociais.
Acredita-se que este novo modelo de Justiça seja uma possibilidade a ser aplicada, num primeiro momento, em casos envolvendo atos infracionais de menor potencial ofensivo, assim como para a solução de conflitos decorrentes da indisciplina (ZEHR, 2008, p. 80).
A partir deste olhar comunitário e escolar, é possível entender melhor a dinâmica da Justiça Restaurativa ou prática restaurativa, que é buscar o protagonismo dos envolvidos em um conflito na solução do problema. Vê-se aqui a possibilidade de vítima e ofensor falarem sobre sentimentos e necessidades que permeiam o conflito.
Antes de qualquer crítica, é importante conhecer como um projeto funciona e acreditar que todo trabalho requer muito esforço, planejamento, conscientização e boa vontade de uma equipe gestora para que provoque mudança, como por exemplo, o almejado novo olhar sobre a justiça.
Uma mudança de paradigmas sociais, culturais e históricos que revelam “(...) o quanto a nossa visão do mundo é moldada por lentes específicas, através das quais vemos esse mesmo mundo” (ZEHR, 2008, p. 80) e o quanto os pensamentos são organizados através de percepções, valores e bom senso, baseados em paradigmas pré-existentes, que definem como resultado de pensamentos tradicionais a forma retributiva da punição como resolução dos conflitos. Então, como é possível mudar esta visão de duas justiças distintas?
Segundo o escritor Howard Zehr, é possível entender que:
Por um lado, a justiça retributiva, onde o crime é uma violação contra o estado, definida pela desobediência à lei e pela culpa. A justiça determina a culpa e inflige dor no contexto de uma disputa entre ofensor e Estado, regida por regras sistemáticas. Já na justiça restaurativa, o crime é uma violação de pessoas e relacionamentos. Ele cria a obrigação de corrigir os erros. A justiça envolve a vítima, o ofensor e a comunidade na busca de soluções que promovam reparação, reconciliação e segurança. (2008, p. 170-171).
Ao deparar-se com esse tipo de análise, é perceptível o quanto a sociedade é excludente, individualista e, ao mesmo tempo, busca o imediatismo como forma de sanar os conflitos sociais, tirando a criança ou o adolescente da rua como forma de resolver o conflito apresentado. Sendo uma inverdade essa tomada de atitude social ou jurídica, vale ressaltar o que diz Rosemberg:
A não violência não é uma estratégia que se possa utilizar hoje e descartar amanhã, nem é algo que nos torne dóceis ou facilmente influenciáveis. Trata-se, isto sim, de inculcar atitudes positivas em lugar das atitudes negativas que nos dominam. Tudo que fazem é condicionado por motivações egoístas (Que vantagem eu levo nisso?), e essa constatação se revela ainda mais verdadeira numa sociedade esmagadoramente materialista que prospera com base num duro individualismo. (2006, p.18).
Por outro lado, alegra saber que este novo enfoque da justiça restaurativa abre horizontes e oportuniza uma leitura mais humana das diversas situações de conflito apresentadas – segundo a qual a vítima, devido à sua fragilidade, torna-se prisioneira de sentimentos de culpa, vergonha da sociedade e necessita ser empoderada, para que sua autonomia pessoal possa ser restituída e sua dignidade restaurada.
Sob esta visão, a restauração envolve uma participação ativa da vítima, ofensor e comunidade, oportunizando assim um momento de escuta, entendimento, respeito, pertencimento e acolhimento, que precisam ser garantidos e efetivados, potencializando sua capacidade emancipatória.
Quando um grupo de pessoas tem a coragem de fazer uma experiência desafiadora e o propósito de concretizar uma ação que transforma e motive pessoas da comunidade a conhecer e se sensibilizar com o Projeto Justiça Juvenil Restaurativa, há uma mudança radical no agir de cada indivíduo.
Em um primeiro momento, a execução de qualquer projeto requer um trabalho de conscientização na comunidade, o que pode ser feito por meio de visitas às instituições nela existentes, como escolas (públicas ou privadas), as comunidades de fé (igrejas), postos de saúde , comércios, entre outras, para que haja sensibilização, divulgação do projeto e a criação do mesmo. Quão importante seria se a sociedade dedicasse um pouco mais de tempo neste momento de sensibilização. Faz-se necessário trocar as lentes, como bem define Howard Zehr, “um modo de começar esta exploração é tirando o crime de seu pedestal abstrato (...) compreendê-lo como um dano e uma violação de pessoas e relacionamentos” (ZEHR, 2008, p. 170).
É preciso enxergar o crime como um conflito de pessoas e aceitar uma nova forma de lidar com ele, que não seja somente o da Justiça Retributiva, que busca um culpado para punir e não dispensa a devida importância às pessoas envolvidas no conflito em questão. “A Justiça deveria se concentrar na reparação, em acertar o que não está certo” (ZEHR, 2008, p. 170).
Nessa perspectiva, elencam-se aqui algumas experiências significativas de Justiça Restaurativa no Brasil. Uma delas ocorreu em São Caetano do Sul (SP), onde o projeto-piloto teve início com foco nos atendimentos e, aos poucos, foi se transformando em práticas de multiplicação da cultura de paz e dos princípios e valores norteadores da Justiça Restaurativa. Relata a comunidade que, neste momento, surgiu a ideia de retomar o contato com as instituições da comunidade e oferecer Workshops de Sensibilização. A partir dessa retomada, perceberam a capacidade de criar uma cultura de práticas restaurativas e que este não seria só mais um projeto, mas que com certeza deixaria frutos (MELO, 2008).
Outro brilhante exemplo de práticas restaurativas se deu no município de Restinga (SP), onde o eixo de formação foi destinado aos profissionais vinculados à rede de atendimento e proteção da criança e do adolescente, bem como à própria comunidade, com a realização de três Workshops de Sensibilização do Curso de Iniciação em Justiça Restaurativa (JR) e do Curso de Formação de Coordenadores.
Durante o Curso de Iniciação em JR, tivemos a oportunidade de trocar conhecimentos com as pessoas da comunidade, perceber qual é a real preocupação delas em relação aos crimes e conflitos enfrentados diariamente. Identificamos que, apesar das pessoas ainda terem pensamentos retributivos, elas não acreditam mais na forma como o Judiciário lida com os crimes. Elas buscam uma maneira mais eficaz de lidar com eles, pelo menos com aqueles de menor potencial ofensivo, que são os mais recorrentes nas escolas. A Justiça Restaurativa vem ao encontro desse anseio, vem trazer uma nova forma de os indivíduos lidarem com seus conflitos, de responsabilização do infrator pelos seus atos e de respeito às emoções das vítimas, para que ambos sejam empoderados e ouvidos na resolução do conflito. (MELO, 2008).
O que surpreende a cada dia sãos as expectativas quanto aos resultados e conscientização das pessoas. E uma delas ocorreu durante o Curso de Formação de Coordenadores, no qual se registrou uma grata surpresa: uma das participantes, Orientadora Educacional, apresentou um projeto na Secretaria Municipal de Educação (SMED) para trabalhar a Justiça Restaurativa na Escola Municipal de Ensino Fundamental Lidovino Fanton, o qual foi autorizado, conforme relato de Eduardo Rezende Melo (et. al) na obra: Justiça Restaurativa e Comunitária em São Caetano do Sul: aprendendo com os conflitos e a respeitar direitos e promover cidadania (2008, p. 91)
A partir dessas palestras, experiências e testemunhos, passou-se a realizar de forma permanente Workshops de Justiça Restaurativa e de Comunicação Não Violenta (com professores, educadores, crianças e adolescentes), que foram extremamente gratificantes, surgindo com esta nova demanda de sensibilizações e informações uma necessidade da comunidade de criar uma nova cultura de paz e respeito aos direitos humanos, muito além dos Círculos Restaurativos realizados na Central de Práticas, com os seus procedimentos de pré-círculo, círculo e pós-círculo (cf. Portal Justiça Restaurativa).
Bons exemplos de aplicação das práticas de Justiça Restaurativa também podem ser observados em escolas do Rio Grande do Sul, também de acordo com o relato de Melo (et. al) em sua obra sobre Justiça Restaurativa (2008, p.93). Na EMEF Alberto Pasqualini – Viamão (RS) e EMEF Dolores Alcaraz Caldas – Porto Alegre (RS), foram realizados workshops para todos os docentes e os resultados foram ótimos. Algumas professoras, em ambas as escolas, resolveram formar grupos de estudos de Práticas Restaurativas, para posteriormente implantar um projeto de resolução não violenta de conflitos em suas instituições.
Na EMEF Carlos Pessoa de Brum e na EEEM Raul Pilla, ambas em Porto Alegre (RS), os grupos de JR foram convidados a realizar os Workshops de Sensibilização nos dias de formação dos docentes. Perceberam o quanto os encontros foram produtivos, com inúmeros questionamentos a respeito da teoria e sua aplicabilidade na escola. Outra experiência diferenciada, ocorrida na escola EEEM Raul Pilla, foi a realização de uma dinâmica de escuta ativa e outra de círculo de construção de paz, ensinada a eles pela capacitadora Kay Pranis, pois uma das preocupações da direção desta escola era conseguir restaurar a relação entre os professores, para que estes conseguissem trabalhar os valores da Justiça Restaurativa e da Cultura de Paz com os alunos e a comunidade escolar (PRANIS, K. 2010).
Diantes desses relatos, pode-se dizer que a escola, como instituição de ensino e de formação de cidadãos, tem todo o conhecimento e respaldo para inserir as práticas restaurativas em seu cotidiano escolar e, desta forma, tornar natural a resolução pacífica de conflitos.
Vale ressaltar ainda que uma prática comprometida com os legítimos interesses da comunidade consegue superar os entraves existentes e ampliar os espaços de uma participação popular nas questões que lhe dizem respeito e que são, por excelência, necessárias para um convívio social humanizado (PRANIS, 2010).
Contudo, é preciso mencionar que foi através da experiência de São Caetano do Sul (SP) que a metodologia da justiça restaurativa integrando os Sistemas de Justiça e Escolar se expandiu e foi adotada, com a finalidade de:
[...] divulgar e aplicar as práticas restaurativas na resolução de conflitos em escolas, ONGs, comunidade e Sistemas de Justiça e Infância e Juventude, com estratégias de enfrentamento e prevenção à violência em Porto Alegre, como consta no documento-base do Programa (BRANCHER;AGUINSKY,2006).
Nota-se que a “institucionalização das práticas restaurativas no Rio Grande do Sul inicialmente se deu mediante Decreto do Presidente da Secretaria do Conselho de Magistratura, em 05 de Fevereiro de 2010, através da Resolução nº 822/2010 – Conselho da Magistratura (Comag TJ / RS), que possibilitou a criação da Central de Práticas Restaurativas – CPR - junto ao Juizado Regional da Infância e Juventude da Comarca de Porto Alegre/RS (SANTOS, 2019. p. 107).
Este projeto alcançou uma dimensão maior a partir do ano de 2005, com o tema “Promovendo Práticas Restaurativas no Sistema de Justiça Brasileiro”, que foi promovido pelo PNUD / Ministério da Justiça, que possibilitou a criação dos três programas-piloto do País (Porto Alegre, São Caetano do Sul e Brasília), que tinham como foco os jovens. E a partir daí, esse projeto passou a ser referência nacional e, ao mesmo tempo, a difusão da Justiça Restaurativa nesses estados e também em todo o Brasil. (SANTOS, 2019. p. 107 e 108).
Com base no referencial teórico e exemplos expostos até aqui, pode-se constatar o potencial das práticas de Justiça Restaurativa para solucionar conflitos, inclusive no ambiente escolar, que é o objeto desta pesquisa. É preciso, pois, torná-la cada vez mais conhecida, para que sua aplicação cresça na mesma proporção.
CONCLUSÃO
Na seara do entendimento humano, é possível imaginar e construir uma cultura de paz, cooperação, não violência e resolução pacífica dos conflitos. Este é um desafio permanente, que deve fazer parte de uma filosofia cotidiana de trabalho, sobretudo na escola, local ideal para que as crianças e jovens desenvolvam concretamente o aprendizado dos valores essenciais de convivência social.
No decorrer deste trabalho, viu-se que a Justiça Restaurativa busca empoderar todas as partes envolvidas em um determinado conflito, transformando-as em agentes ativos ao invés de meros espectadores do processo. Assim, a autonomia é devolvida a esses sujeitos, que se tornam capazes de se responsabilizar por suas atitudes e de se posicionar diante do processo que é de seu interesse. Ocorre, assim, uma equidade de poder.
Faz-se necessário reconhecer que os códigos não tem conseguido acompanhar o dinamismo vivenciado na sociedade. As relações estão passando por constantes mudanças e nem sempre é possível ter a percepção ou convicção de que os meios judiciários convencionais são os únicos ou os mais habilitados a tratar dos conflitos da sociedade, pois esta também vem se tornando mais responsável, empoderada, consciente dos seus direitos e, por isso, mais exigente e participativa no equacionamento e na solução dos conflitos que são de seu próprio interesse.
A responsabilidade, no modelo restaurativo, consiste em olhar de frente para os atos praticados, significa estimular o ofensor a compreender o impacto do seu comportamento, os danos causados e instá-lo a adotar medidas para repará-los no que for possível.
A Justiça Restaurativa envolve escuta, presença, atenção, humanização, pois ela é inclusiva e parte de dois princípios: somos interconectados e interdependentes, trazendo a acepção de que é uma resposta diferenciada para o dano, para o crime, para o ato infracional, pois é um modo de ser e estar no mundo, de estabelecer relações, de olhar para o outro como igual, ou seja, é uma alternativa que pode propiciar uma diferença significativa na vida das pessoas.
Portanto, ela deve ser vista, promovida e adotada como conjunto de ferramentas de um sistema que melhor cuide, receba, trate e responda aos anseios sociais no que diz respeito aos seus conflitos, inclusive dentro do ambiente escolar. Sendo a escola um espaço no qual as relações sociais são reproduzidas, há a necessidade de se trabalhar nele maneiras de buscar solucionar os conflitos ali gerados, a fim de que se criem condições para que as futuras gerações sejam mais pacificadoras e, assim, criem uma verdadeira cultura de paz. As práticas de Justiça Restaurativa apresentam-se como caminho seguro e viável rumo à plena concretização desses objetivos.
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[1]Mestre em Direito pelo Centro Universitário de Brasília. Professor de Direito do Centro Universitário Católica do Tocantins. Advogado. E-mail: [email protected]
Graduando do nono período do Curso de Direito da Faculdade Unicatólica do Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BEZERRA, ARLIR RODRIGUES. Práticas restaurativas como ferramenta de prevenção e enfrentamento dos conflitos escolares Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 23 jun 2020, 04:25. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/54769/prticas-restaurativas-como-ferramenta-de-preveno-e-enfrentamento-dos-conflitos-escolares. Acesso em: 22 nov 2024.
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