Resumo: o artigo investiga interpretação dada pelo STF ao conceito de “serviços de qualquer natureza” como hipótese de incidência do imposto de competência municipal previsto no art. 156, III da Constituição Federal. Objetiva-se delimitar a definição dada pela Corte a fim de resolver problemas atuais e futuros na aplicação do imposto. Abordam-se criticamente, através do estudo de acórdãos paradigmáticos, três fases sucessivas do entendimento do Tribunal: (i) adoção do conceito econômico desde 1987; (ii) virada ao conceito jurídico em 2000 (caso da locação de guindastes), restrito às obrigações de fazer; (iii) retomada gradual do conceito econômico a partir de 2009 (caso do leasing), que prevalece atualmente e teve como paradigma o caso dos planos de saúde em 2017. Depois, examinam-se dois recentes julgados do Tribunal que confirmaram a incidência do imposto em situações antes controvertidas a partir da aplicação do conceito econômico (contratos de franquia e apostas). Por fim, sugere-se a consolidação desse conceito nas discussões ainda pendentes referentes a tributação da economia digital.
Palavras-chave: Direito Tributário. Imposto Sobre Serviços. Prestação de serviços. Jurisprudência. Supremo Tribunal Federal.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Primeira fase: adoção do conceito econômico. 3. Segunda fase: o primado das “obrigações de fazer”. 4. Terceira fase: retomada gradual do conceito econômico e consolidação no caso dos planos de saúde. 5. Implicações mais recentes da adoção do conceito econômico. 5.1. Contratos de franquia. 5.2. Apostas. 6. Próximos passos: a tributação da economia digital. 7. Conclusão. 8. Referências.
1.Introdução
O imposto municipal sobre serviços de qualquer natureza (ISS) está previsto no art. 156, III da Constituição Federal de 1988 e é regulado pela Lei Complementar nº 116/03, que sucedeu o Decreto-lei 406/1968. Trata-se da principal fonte de receita tributária própria de boa parte dos Municípios brasileiros, mas, como de costume no Sistema Tributário Nacional, sua cobrança envolve inúmeras controvérsias jurídicas cuja equalização final fica por conta do Poder Judiciário.
A principal celeuma em torno do ISS diz respeito ao aspecto material de sua hipótese de incidência. Inicialmente, entende-se que a materialidade do imposto é a “prestação de serviços”, embora o primeiro vocábulo não conste da literalidade do texto constitucional:
“Não se pode considerar a incidência tributária restrita à figura de ‘serviço’, como uma atividade realizada; mas, certamente, sobre a ‘prestação do serviço’, porque esta é que tem a virtude de abranger os elementos imprescindíveis à sua configuração, ou seja, o prestador e o tomador, mediante a instauração de relação jurídica de direito privado, que irradia os naturais efeitos tributários. O tributo não incide unicamente sobre utilidade, comodidade, coisa, bem imaterial etc. A circunstância de no âmbito estadual a CF haver estipulado ‘prestações e serviços de transporte interestadual e intermunicipal, e de comunicação’ (art. 155, II – ICMS); e no âmbito municipal haver omitido o referido vocábulo (‘prestações’) – só mencionando ‘serviços de qualquer natureza’ (art. 156, III – ISS) – não significa que também não se estaria cogitando da necessidade de efetiva prestação. O DL 406/68 (art. 8º) estabelecera que o fato gerador do ISS é a prestação desserviço previsto em lista específica. A LC 116/03 (art. 1º) repete essa materialidade, e acrescenta que a incidência ocorre, ‘ainda que os serviços não se constituam como atividade preponderante do prestador”[1]
Tratando da zona negativa de certeza do conceito de prestação de serviços, a doutrina exclui, a priori, ao menos as seguintes hipóteses: a) serviço público abrangido por imunidade (art. 150, IV, a da CF); b) trabalho para si próprio (ponto crucial para compreensão da não-incidência nas incorporações imobiliárias, por exemplo); c) relação de emprego; d) serviços abrangidos pelo ICMS[2].
Mesmo assim, a conceituação do que seja serviço prestado não é tarefa fácil. Embora o art. 156, III da CF remeta à lei complementar a definição dos serviços sujeitos à tributação, é certo que a norma infraconstitucional não pode desbordar da base econômica reservada pela Constituição ao imposto. Por isso, o STF é chamado a decidir sobre o tema desde antes da Constituição de 1988, embora a polêmica continue atual.
Nesse trabalho, identificam-se três fases da jurisprudência da Corte na conceituação de prestação de serviço a permitir a incidência do ISS. A primeira, vigente desde antes do advento da Carta de 1988 até 2000, compreende a adoção de conceito amplo, mais preocupado com a inclusão das atividades econômicas de oferecimento de utilidade a terceiros do que com uma definição jurídica afeta a um tipo contratual utilizado no Direito Ccivil. A segunda fase, de adoção do conceito jurídico (mais restrito), começa em 2000 com a exclusão da locação de bens móveis do campo de incidência do imposto, e se enfraquece a partir de 2009, com o reconhecimento da constitucionalidade da incidência sobre o leasing. Em 2017, o Tribunal retoma mais claramente o conceito econômico com julgamento favorável ao Fisco no caso de incidência sobre planos de saúde, inaugurando a terceira e atual fase de sua jurisprudência.
As consequências da recuperação do conceito econômico são sentidas em vários recentes julgados da Corte, como no reconhecimento da incidência do ISS nos contratos de franquias e de apostas, que serão analisados um a um.
Ao final, sugere-se a consolidação do conceito amplo de modo a possibilitar o adequado enquadramento tributário de atividades econômicas relevantíssimas na era digital como os serviços de streaming, delivery, transporte e locação por aplicativo etc.
2.Primeira fase: adoção do conceito econômico
A Constituição Federal de 1967, com redação dada pela Emenda nº 1/1969, previa o Imposto sobre Serviços nos seguintes termos:
Art. 24. Compete aos municípios instituir impôsto sôbre:
II - serviços de qualquer natureza não compreendidos na competência tributária da União ou dos Estados, definidos em lei complementar.
O imposto era regulado pelo Decreto-lei nº 406/68 e sua lista anexa, que previa, na redação dada pelo Decreto-lei 834/69, a locação de bens móveis como hipótese de incidência (item 52). O Supremo Tribunal Federal confirmou mais de uma vez a constitucionalidade do dispositivo, a partir da adoção de conceito de “prestação de serviços” que não se limitava à concepção civilista vinculada à obrigação de fazer.
A tese dos contribuintes era de que o direito tributário, ao buscar em outros ramos jurídicos as categorias utilizadas para descrever as hipóteses de incidência, não lhes poderia conferir leitura própria. É o que seria depreendido do art. 110 do Código Tributário Nacional:
Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias.
A Corte rechaçou o argumento. Entendeu-se que o importante, para o Direito Tributário, é a identificação de capacidade contributiva revelada em um determinado fato econômico. A utilização dos institutos de Direito Privado é meramente instrumental. Veja-se elucidativo trecho do voto do min. Carlos Madeira no julgamento do Recurso Extraordinário nº 112.947/SP, em 19/06/1987:
Não há, porém, recepção plena de um conceito de direito privado, nem da regulação pertinente a esse direito, pois a referência a ele é feita, em direito tributário, utilitatis causa. Importa ter em consideração que são diversos os modos de tratar os mesmos institutos jurídicos e as finalidades que se têm em vista, ao considerá-los, diferem profundamente em cada uma das disciplinas. Assim, quando o direito civil regula a compra e venda, ele tem em vista os efeitos da relação jurídica e as condições de validade necessárias para a sua constituição. Quando o direito tributário, entretanto, encara a mesma relação, ele tem o objetivo de aí encontrar um índice de capacidade econômica, ou de capacidade contributiva e, assim, considerando a operação como um fato econômico, despido de todo o formalismo e de todas as aparências, vai ali buscar ou verificar a realidade econômica subjacente, através do exame da circulação de riqueza que se operou.
Na locação de bem móvel, observa-se a entrega do bem a terceiro para sua utilização mediante remuneração, obrigando-se o locatário a restituí-la em tempo determinado. A atividade revela capacidade econômica ou contributiva, e não pode ser onerada por imposto de venda de bem material (antigo ICM, de competência dos Estados), mas é possível enquadrá-la na definição de circulação de bem imaterial, qual seja, a faculdade de uso e gozo da coisa, a atrair a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza. Na didática explicação do min. Oscar Corrêa, em voto proferido no Recurso Extraordinário 115.103/SP, julgado em 22/08/1988:
Embora [a locação de bem móvel] não seja locação de serviços ou fornecimento de trabalho, constitui venda de bem imaterial (serviço). Na locação de bens móveis, o objeto do contrato é a coisa (o bem móvel), jamais o fornecimento de trabalho, embora exista intimamente ligada à locação a função acessória de se manter a coisa a ser locada em estado de bem servir ao seu destino econômico. O que existe, já dissemos, ê a venda de um bem imaterial (venda do direito de uso e gozo da coisa), fato que constitui serviço. [...]
Já a redação inicial do art. 71, § 1, do Código Tributário Nacional incluía a "locação de bens móveis" entre os serviços, o que os textos posteriores explicitaram. Pode-se ler em Baleeiro: o imposto de serviços "reflete a sua anterior conceituação de imposto sobre profissões e industrias, uma das quais é a de alugar veículos, tratores, máquinas, roupas e chapéus de rigor, instrumentos e, em geral, móveis, como meio de vida ou habitual atividade remuneradora" (Direito Tributário Brasileiro, cit. p. 293).
Este conceito vigorou no STF por longos anos, mas foi modificado em emblemático julgamento no ano 2000, como se verá a seguir.
3.Segunda fase: o primado das “obrigações de fazer”
A Corte alterou seu entendimento em 11 de outubro de 2000, no julgamento do Recurso Extraordinário 116.121/SP, rel. min. Octavio Gallotti, que recebeu a seguinte ementa:
TRIBUTO - FIGURINO CONSTITUCIONAL. A supremacia da Carta Federal é conducente a glosar-se a cobrança de tributo discrepante daqueles nela previstos. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS - CONTRATO DE LOCAÇÃO. Terminologia constitucional do Imposto sobre Serviços revela objeto da tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o tributo considerado contrato de locação de bem móvel. Em Direito, os institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprio, descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições são de observância inafastável - artigo 110 do Código Tributário Nacional.
Questionava-se a constitucionalidade da expressão “locação de bens móveis“ constante do item 79 da Lista de Serviços do mesmo Decreto 406/68, agora na redação dada pela LC nº 56/87. Argumentava-se não se tratar de serviço, porque gera apenas obrigação de dar, inexistente atividade pessoal do locador que possa ser juridicamente caracterizada como prestação de serviço. O caso tratava da locação de guindastes para operação pelas próprias locatárias em construção civil.
O relator, em substancioso voto, decidiu pela manutenção da jurisprudência do Tribunal, tecendo considerações históricas sobre o imposto desde sua instituição pela Emenda nº 18/1965 à Constituição de 1946, bem como destacando a utilização da expressão “de qualquer natureza” para justificar a interpretação ampla do espaço reservado pelo Constituinte à definição do campo de incidência do imposto. Seguiram-no os ministros Carlos Velloso, Nelson Jobim, Maurício Corrêa e Ilmar Galvão.
Abriu divergência o ministro Marco Aurélio, entendendo que a locação pura e simples, desacompanhada da prestação de serviços tal como definida no Código Civil, não atraía o imposto sobre serviços; a definição técnica de cada instituto, sustentou, prevalece sobre a interpretação econômica. O min. Celso de Mello o acompanhou, destacando que a locação de bens móveis configura obrigação de dar, e que a prestação de serviços pressupõe um fazer; a interpretação tributária não poderia destoar da definição civilista, a teor do art. 110 do CTN. A divergência foi secundada ainda pelos ministros Sepúlveda Pertence, Sydney Sanches, Néri da Silveira e Moreira Alves.
O Tribunal, por 6 votos a 5, alterou sua jurisprudência para considerar inconstitucional a incidência do ISS sobre locação de bens móveis, considerando não haver, na hipótese, serviço prestado. A decisão nos parece desacertada, merecendo transcrição as precisas ponderações do ministro Ilmar Galvão:
O SENHOR MINISTRO ILMAR GALVÃO - Senhor Presidente, verifico, primeiramente, que se está diante de dispositivo legal que já se acha em vigor há trinta e dois anos, período de tempo durante o qual nunca teve a sua inconstitucionalidade arguida perante está Corte. Em segundo lugar, diante da afirmativa feita pelo em. Ministro Celso de Mello, de que o contrato de locação implica uma obrigação de dar, gostaria de observar que, segundo o art. 1.189 do Código Civil, o locador, além de pôr a coisa à disposição do locatário, o que não corresponde com rigor à prestação de dar, é obrigado a manter a coisa no estado e a garantir o uso pacífico dela, comportamento próprio da obrigação de fazer. Vale dizer que a locação envolve prestação de serviço. Manter um guindaste em funcionamento envolve serviços de manutenção. Assegurar o uso pacifico exige uma assistência permanente, que implica prestação de serviço.
Ora, nem no Direito Privado o conceito em análise é unívoco. No Direito do Consumidor, por exemplo, locação de bem móvel pode ser considerada serviço, porque a definição dada pelo art. 3º, §2º do Código de Defesa do Consumidor é amplíssima[3]. Parece-nos que a corrente vencedora adotou leitura da Constituição a partir estritamente do Código Civil de 1916.
Seja como for, a decisão do STF teve por consequência o veto presidencial do item “3.01 – locação de bens móveis” da lista anexa à Lei Complementar nº 116/03, que veio a substituir o Decreto 406/68 na regulamentação do ISS. O Tribunal também editou a Súmula Vinculante nº 31, a reiterar o entendimento[4].
4.Terceira fase: retomada gradual do conceito econômico e consolidação no caso dos planos de saúde.
Mesmo com a consolidação do entendimento do Tribunal em súmula vinculante, perdurou candente controvérsia a respeito das chamadas “locações mistas”, que envolvem, ao mesmo tempo, locação de bem móvel e prestação de serviços. O STF, nesses casos, afastava o entendimento veiculado na referida súmula, chancelando a incidência do imposto se não fosse possível cindir as operações em uma dada relação contratual:
É certo que, nos debates travados ao exame da Proposta de Súmula Vinculante 35, que resultou na SV 31, suscitada dúvida no Plenário desta Corte quanto à situação em que a locação de bens móveis está associada à prestação de serviços, tendo-se concluído pela exclusão do termo “dissociadas da prestação de serviços”, uma vez não analisada a questão relativa aos contratos mistos. (...) 6. Em relações contratuais complexas ou mistas, apenas há falar em descumprimento da Súmula Vinculante 31 quando a locação de bem móvel esteja evidentemente dissociada da prestação de serviços, seja em relação ao objeto, seja no tocante ao valor detalhado da contraprestação financeira. (...) 8. Não há falar, pois, em contrariedade à Súmula Vinculante 31, que não contempla contratos mistos – locação de bens móveis acompanhado de prestação de serviço. 9. Verifica-se da sentença trazido pelo reclamante que, ao analisar o caso concreto, entendeu o Juízo de origem que as atividades prestadas não são apartadas, visto que, além da locação dos aparelhos de audiovisual, são disponibilizados os operadores, na prestação de serviço (...)
[Rcl 28.324, rel. min. Rosa Weber, dec. monocrática, j. 25-5-2018, DJE 107 de 30-5-2018. ]
Também a cessão do uso de marca não é abrangida pela Súmula Vinculante 31, tendo o STF julgado a incidência do ISS constitucional nesse caso, já indicando uma evolução de sua jurisprudência com o advento da Lei Complementar nº 116/03:
Ressalte-se que há alterações significativas no contexto legal e prático acerca da exigência de ISS, sobretudo após a edição da LC 116/2003, que adota nova disciplina sobre o mencionado tributo, prevendo a cessão de direito de uso de marcas e sinais na lista de serviços tributados, no item 3.02 do Anexo. Essas circunstâncias afastam a incidência da Súmula Vinculante 31 sobre o caso, uma vez que a cessão do direito de uso de marca não pode ser considerada locação de bem móvel, mas serviço autônomo especificamente previsto na LC 116/2003.
[Rcl 8.623 AgR, voto do rel. min. Gilmar Mendes, 2ª T, j. 22-2-2011, DJE 45 de 10-3-2011. ]
A interpretação da Corte começou a dar sinais de mudança especialmente a partir do julgamento sobre a incidência em contratos de leasing, no RE 592.905/SC, de relatoria do ministro Eros Grau, DJ 02/12/2009, que recebeu a seguinte ementa:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DIREITO TRIBUTÁRIO. ISS. ARRENDAMENTO MERCANTIL. OPERAÇÃO DE LEASING FINANCEIRO. ARTIGO 156, III, DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL.
O arrendamento mercantil compreende três modalidades, [i] o leasing operacional, [ii] o leasing financeiro e [iii] o chamado lease-back. No primeiro caso há locação, nos outros dois, serviço.
A lei complementar não define o que é serviço, apenas o declara, para os fins do inciso III do artigo 156 da Constituição. Não o inventa, simplesmente descobre o que é serviço para os efeitos do inciso III do artigo 156 da Constituição. No arrendamento mercantil (leasing financeiro), contrato autônomo que não é misto, o núcleo é o financiamento, não uma prestação de dar. E financiamento é serviço, sobre o qual o ISS pode incidir, resultando irrelevante a existência de uma compra nas hipóteses do leasing financeiro e do lease-back.
Entendeu-se que o contrato de leasing financeiro, espécie mais comum e utilizada no Brasil, embora composto de elementos oriundos de tipos contratuais diversos como a locação e a compra e venda, tinha como caráter preponderante o financiamento, que é serviço. Portanto, o imposto poderia incidir sobre o valor cheio do contrato, ainda que a prestação de serviço envolvesse a utilização de um bem. A tentativa de categorização estanque em obrigação de dar e fazer seria imprópria. Nas palavras do relator:
Em síntese, há serviços, para os efeitos do inciso III do artigo 156 da Constituição, que, por serem de qualquer natureza, não consubstanciam típicas obrigações de fazer. Raciocínio adverso a este conduziria à afirmação de que haveria serviço apenas nas prestações de fazer, nos termos do que define o direito privado. Note-se, contudo, que afirmação como tal faz tábula rasa da expressão "de qualquer natureza", afirmada do texto da Constituição. Não me excedo em lembrar que toda atividade de dar consubstancia também um fazer e há inúmeras atividades de fazer que envolvem um dar.
O abandono definitivo pelo Tribunal da leitura da Constituição a partir de conceito jurídico do Código Civil veio com o julgamento do RE 651.703/PA, rel. min. Luiz Fux, em 29/09/2016, no qual se julgou constitucional a incidência do ISS sobre planos de saúde. Eis os principais trechos da primorosa ementa, no que interessa ao presente trabalho:
[...] 2. A coexistência de conceitos jurídicos e extrajurídicos passíveis de recondução a um mesmo termo ou expressão, onde se requer a definição de qual conceito prevalece, se o jurídico ou o extrajurídico, impõe não deva ser excluída, a priori, a possibilidade de o Direito Tributário ter conceitos implícitos próprios ou mesmo fazer remissão, de forma tácita, a conceitos diversos daqueles constantes na legislação infraconstitucional, mormente quando se trata de interpretação do texto constitucional. 3. O Direito Constitucional Tributário adota conceitos próprios, razão pela qual não há um primado do Direito Privado.4. O art. 110, do CTN, não veicula norma de interpretação constitucional, posto inadmissível interpretação autêntica da Constituição encartada com exclusividade pelo legislador infraconstitucional. 5. O conceito de prestação de “serviços de qualquer natureza” e seu alcance no texto constitucional não é condicionado de forma imutável pela legislação ordinária, tanto mais que, de outra forma, seria necessário concluir pela possibilidade de estabilização com força constitucional da legislação infraconstitucional, de modo a gerar confusão entre os planos normativos. 6. O texto constitucional ao empregar o signo “serviço”, que, a priori, conota um conceito específico na legislação infraconstitucional, não inibe a exegese constitucional que conjura o conceito de Direito Privado. 7. A exegese da Constituição configura a limitação hermenêutica dos arts. 109 e 110 do Código Tributário Nacional, por isso que, ainda que a contraposição entre obrigações de dar e de fazer, para fins de dirimir o conflito de competência entre o ISS e o ICMS, seja utilizada no âmbito do Direito Tributário, à luz do que dispõem os artigos 109 e 110, do CTN, novos critérios de interpretação têm progressivamente ampliado o seu espaço, permitindo uma releitura do papel conferido aos supracitados dispositivos. 8. A doutrina do tema, ao analisar os artigos 109 e 110, aponta que o CTN, que tem status de lei complementar, não pode estabelecer normas sobre a interpretação da Constituição, sob pena de restar vulnerado o princípio da sua supremacia constitucional. [...]13. Os tributos sobre o consumo, ou tributos sobre o valor agregado, de que são exemplos o ISSQN e o ICMS, assimilam considerações econômicas, porquanto baseados em conceitos elaborados pelo próprio Direito Tributário ou em conceitos tecnológicos, caracterizados por grande fluidez e mutação quanto à sua natureza jurídica. 14. O critério econômico não se confunde com a vetusta teoria da interpretação econômica do fato gerador, consagrada no Código Tributário Alemão de 1919, rechaçada pela doutrina e jurisprudência, mas antes em reconhecimento da interação entre o Direito e a Economia, em substituição ao formalismo jurídico, a permitir a incidência do Princípio da Capacidade Contributiva. 15. A classificação das obrigações em “obrigação de dar”, de “fazer” e “não fazer”, tem cunho eminentemente civilista, como se observa das disposições no Título “Das Modalidades das Obrigações”, no Código Civil de 2002 (que seguiu a classificação do Código Civil de 1916), em: (i) obrigação de dar (coisa certa ou incerta) (arts. 233 a 246, CC); (ii) obrigação de fazer (arts. 247 a 249, CC); e (iii) obrigação de não fazer (arts.250 e 251, CC), não é a mais apropriada para o enquadramento dos produtos e serviços resultantes da atividade econômica, pelo que deve ser apreciada cum grano salis. 17. A lei complementar a que se refere o art. 156, III, da CRFB/88, ao definir os serviços de qualquer natureza a serem tributados pelo ISS a) arrola serviços por natureza; b) inclui serviços que, não exprimindo a natureza de outro tipo de atividade, passam à categoria de serviços, para fim de incidência do tributo, por força de lei, visto que, se assim não considerados, restariam incólumes a qualquer tributo; e c) em caso de operações mistas, afirma a prevalência do serviço, para fim de tributação pelo ISS. 18. O artigo 156, III, da CRFB/88, ao referir-se a serviços de qualquer natureza não os adstringiu às típicas obrigações de fazer, já que raciocínio adverso conduziria à afirmação de que haveria serviço apenas nas prestações de fazer, nos termos do que define o Direito Privado, o que contrasta com a maior amplitude semântica do termo adotado pela constituição, a qual inevitavelmente leva à ampliação da competência tributária na incidência do ISSQN.19. A regra do art. 146, III, “a”, combinado com o art. 146, I, CRFB/88, remete à lei complementar a função de definir o conceito “de serviços de qualquer natureza”, o que é efetuado pela LC nº 116/2003.20. A classificação (obrigação de dar e obrigação de fazer) escapa à ratio que o legislador constitucional pretendeu alcançar, ao elencar os serviços no texto constitucional tributáveis pelos impostos (v.g., serviços de comunicação – tributáveis pelo ICMS, art. 155, II, CRFB/88; serviços financeiros e securitários – tributáveis pelo IOF, art. 153, V, CRFB/88; e, residualmente, os demais serviços de qualquer natureza – tributáveis pelo ISSQN, art. 156. III, CRFB/88), qual seja, a de captar todas as atividades empresariais cujos produtos fossem serviços sujeitos a remuneração no mercado. 21. Sob este ângulo, o conceito de prestação de serviços não tem por premissa a configuração dada pelo Direito Civil, mas relacionado ao oferecimento de uma utilidade para outrem, a partir de um conjunto de atividades materiais ou imateriais, prestadas com habitualidade e intuito de lucro, podendo estar conjugada ou não com a entrega de bens ao tomador. [...]
Realmente, o Direito Tributário é ramo próprio, cujo principal fundamento é a necessidade de conferir ao Estado recursos para a realização de direitos fundamentais. Para isso, vale-se da identificação da capacidade contributiva dos cidadãos, revelada, por exemplo, no exercício de atividades econômicas. A operação é possibilitada através da delimitação, pela Constituição, na atribuição de competências, de tipos abertos, e não de conceitos técnicos fechados. Estes, cabe à lei complementar definir, guardados os limites da interpretação possível do texto constitucional. A listagem por lei complementar dos serviços tributáveis, no caso do ISS, é o que conferirá segurança jurídica ao contribuinte.
Além disso, a expressão “de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II (ICMS)” revela a intenção do Constituinte de não deixar qualquer operação de circulação de bem imaterial infensa à tributação, abarcando-se todas as manifestações econômicas de serviços, e não apenas aquelas relacionadas à realização de trabalho humano em favor de outrem (obrigação de fazer), como quer o Código Civil.
Quanto aos planos de saúde, é fácil perceber que o serviço prestado consiste em disponibilizar ao usuário uma rede credenciada de profissionais de saúde e hospitais, garantir de cobertura dos procedimentos médicos previstos no contrato, mediante a administração de fundo composto das contribuições dos contratantes, bem como celebrar de convênios e efetuar pagamentos aos prestadores dos serviços médicos em si. Trata-se, aliás, de atividade econômica muito lucrativa, a revelar evidente capacidade contributiva das sociedades prestadoras.
Vencido apenas o Ministro Marco Aurélio, o Supremo Tribunal Federal retomou, nesse julgamento, o conceito econômico de prestação de serviços, elaborado pelo ministro Fux nos seguintes termos:
[Prestação de serviços é] oferecimento de uma utilidade para outrem, a partir de um conjunto de atividades materiais ou imateriais, prestadas com habitualidade e intuito de lucro, podendo estar conjugada ou não com a entrega de bens ao tomador.
5.Implicações atuais da adoção do conceito econômico
A tese teve uma série de relevantes repercussões expressas em julgamentos mais recentes do Tribunal, que se passam a analisar, sem pretensão de exaurimento.
5.1 Contratos de franquia
Em 29/05/2020, o tribunal decidiu, vencidos os ministros Marco Aurélio e Celso de Mello, o tema 300 da repercussão geral (recurso extraordinário 603.136/RJ), relativo a incidência do ISS em contratos de franquia, fixando a seguinte tese:
É constitucional incidência de Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) sobre contratos de franquia (franchising) (itens 10.04 e 17.08 da lista de serviços prevista no Anexo da Lei Complementar 116/2003).
No recurso extraordinário interposto em ação movida contra o Município do Rio de Janeiro, empresa que firmou franquia com rede de fast-food sustentou não haver prestação de serviços pelo franqueador, e sim mera obrigação de dar. A argumentação foi rechaçada pelo relator, ministro Gilmar Mendes, que fez constar das razões de decidir diversas menções ao entendimento adotado no precedente dos planos de saúde, como revelador da evolução da jurisprudência do Supremo na interpretação do que seja prestação de serviços.
Em seu voto, o relator considerou tratar-se de contrato complexo a envolver cessão do uso de marca, assistência técnica, distribuição de produtos ou serviços, administração de negócios, direcionamento na montagem e modo de operação das lojas, treinamento de funcionários, publicidade etc. Além disso, a distinção entre obrigações de dar e fazer é inadequada na investigação do enquadramento da atividade econômica no conceito de prestação de serviços:
A mim me parece que a velha distinção entre as ditas obrigações de dar e de fazer não funciona como critério suficiente para definir o enquadramento do contrato de franquia no conceito de “serviço de qualquer natureza”, previsto no texto constitucional. Digo isso porque, para mim, está mais do que evidente que esta tal estrutura negocial inclui tanto prestações de “dar” como prestações de “fazer”. A rigor, nem mesmo entre os civilistas a distinção entre essas duas situações – obrigações de dar e de fazer – é posta sempre com tal clareza.
Tampouco seria adequada a divisão entre “atividade-meio” e “atividade-fim” no bojo da relação entre franqueador e franqueado, dada a imbricação dessas atividades no mesmo contrato. Semelhante distinção, aliás, incentivaria a manipulação de cláusulas contratuais para reduzir artificialmente o campo de incidência do imposto. A consequência seria a criação de atividade econômica infensa à tributação, o que viola princípios-chave do Sistema Tributário Nacional como a isonomia e a capacidade contributiva e dificulta a promoção de direitos fundamentais pelo Estado Fiscal.
5.2 Apostas
Também de relatoria do Ministro Gilmar Mendes, o tema 700 da repercussão geral (recurso extraordinário 634.764/RJ) tratou da incidência do ISS sobre exploração da atividade de apostas. O Tribunal, vencido o ministro Marco Aurélio, fixou a seguinte tese:
É constitucional a incidência de ISS sobre serviços de distribuição e venda de bilhetes e demais produtos de loteria, bingos, cartões, pules ou cupons de apostas, sorteios e prêmios (item 19 da Lista de Serviços Anexa à Lei Complementar 116/2003). Nesta situação, a base de cálculo do ISS é o valor a ser remunerado pela prestação do serviço, independentemente da cobrança de ingresso, não podendo corresponder ao valor total da aposta.
Novamente rememorando a jurisprudência do STF na conceituação da prestação de serviços, e mencionando inclusive precedentes específicos da década de 80 em que a Corte julgara constitucional a tributação das apostas, a corrente vencedora considerou presente, na hipótese, a prestação de trabalho humano remunerado em favor de terceiro, independentemente da qualificação do contrato no âmbito do direito civil. Por isso, é legítima a incidência do ISS, que terá como base de cálculo a parcela da aposta destinada à entidade turfística.
6.Próximos passos: a tributação da economia digital
É seguro dizer que se assiste atualmente a verdadeira revolução mercadológica a partir da popularização do acesso à internet e aos smartphones. A chamada economia digital ou colaborativa modificou a forma de consumir e fez surgir materialidades econômicas que o Direito Tributário ainda luta para conseguir alcançar adequadamente. Citem-se, por exemplo, os aplicativos de transporte urbano, de entrega de comida (delivery), de streaming de músicas, filmes, séries, livros e outros produtos culturais, de intermediação de locação de imóveis etc.
Todas essas atividades já operam a pleno vapor no Brasil e movimentam valores vultuosos na economia, mas ainda há muitas dúvidas sobre como devem ser tributadas. Discute-se, por exemplo, se o oferecimento dessas utilidades ao usuário final coaduna-se ao conceito de prestação de serviço, a permitir a incidência do ISS.
É certo que o Congresso Nacional já fez inserir na lista anexa à Lei Complementar 116/03 as atividades de streaming:
1.09 - Disponibilização, sem cessão definitiva, de conteúdos de áudio, vídeo, imagem e texto por meio da internet, respeitada a imunidade de livros, jornais e periódicos (exceto a distribuição de conteúdos pelas prestadoras de Serviço de Acesso Condicionado, de que trata a Lei no 12.485, de 12 de setembro de 2011, sujeita ao ICMS). (Incluído pela Lei Complementar nº 157, de 2016)
Já os aplicativos de transporte e locação de imóveis, que envolvem intermediação negocial entre usuários, podem ser enquadrados no seguinte item da lista:
10.02 – Agenciamento, corretagem ou intermediação de títulos em geral, valores mobiliários e contratos quaisquer.
No entanto, como as principais controvérsias tributárias nacionais sempre chegam, mais cedo ou mais tarde, ao STF - ainda que seja para o Tribunal negar a existência de repercussão geral e não enfrentar o cerne da matéria -, procuraremos responder a dúvida a partir do estudado a respeito da jurisprudência do Tribunal. Rememore-se, a partir de trecho do voto do ministro Roberto Barroso no acórdão dos planos de saúde (RE 651.703/PA), que o entendimento da Corte já evoluiu para muito além da dicotomia entre obrigações de dar e de fazer, concluindo-se que a preocupação do Constituinte está muito mais em abranger a realidade econômica do que fixar conceitos tecnicamente fechados:
Na linha dos julgados mais recentes sobre o tema, penso que o conceito de serviço para os fins do art. 156, III, da Constituição, não deve ser entendido exclusivamente à luz da legislação de direito civil, muito menos como mera obrigação de fazer em contraposição a uma obrigação de dar, como pretende o recorrente. Em verdade, o conceito de serviço disposto na Constituição é mais amplo do que o descrito na legislação civil e busca abranger as múltiplas e complexas atividades econômicas existentes no mercado. Isso ocorre em razão de dois motivos.
Em primeiro lugar, o texto constitucional delimita como fato gerador do tributo “serviços de qualquer natureza”. Há, portanto, uma clara intenção de inserir uma ampla gama de serviços, levando à necessária extensão da competência tributária. A amplitude semântica do termo “qualquer natureza” parece denotar a intenção do constituinte de incluir todas as atividades empresariais cujos produtos tenham características semelhantes a serviços e que não estejam englobadas no conceito de serviço de comunicação e serviço de transporte interestadual ou intermunicipal (tributáveis pelo ICMS, nos termos do art. 155, II, CF/88) ou serviços financeiros e securitários (tributáveis pelo IOF, nos termos do art. 153, V, CF/88). Em outras palavras, excetuando as atividades em que o constituinte determinou a incidência de ICMS ou IOF, todas as demais que envolvam a prestação de uma utilidade com elementos de um serviço devem ser tributadas pelo ISS.
Em segundo lugar, o perfil constitucional do conceito de serviço é necessariamente intermediado por uma definição legal. Vale dizer: a Constituição determinou que os contornos jurídicos do serviço de qualquer natureza deveriam ser delimitados por lei complementar específica. Ao definir o conceito de serviço, a Lei Complementar nº 116/2003 inclui em sua lista: (i) atividades tradicionalmente entendidas como prestação de serviços (e.g.: assessoria, consultoria, planejamento, guarda e vigilância); (ii) atividades que passam a categoria de serviço para fins de incidência do tributo, pois, caso contrário, ficariam imunes de qualquer tributo; e (iii) operações mistas, em que se afirma a prevalência do serviço para fins de tributação (e.g.: reparação, conservação e reforma de edifícios; execução de empreitada e subempreitada; conserto, reparo e manutenção e máquinas, veículos e equipamentos).
Portanto, em razão desses dois motivos, não há como interpretar a regra de competência do ISSQN de maneira a conduzir a resultado tão restritivo quanto o que pretende o recorrente, por meio de uma mera dicotomia entre obrigação de fazer e obrigação de dar. Fica evidente que a definição de serviço disposta na Constituição buscou englobar todas as complexas relações econômicas atualmente existentes no mercado, de modo a impedir que determinadas atividades simplesmente ficassem imunes a qualquer tipo de tributação.
Entendemos que a melhor leitura será pela constitucionalidade da incidência do ISS nas hipóteses aventadas, porque se coadunam perfeitamente com o conceito econômico e moderno de serviços atualmente adotado pela Corte, qual seja, oferecimento de utilidade a outrem mediante remuneração.
No caso dos serviços de streaming, tem-se que o objeto do contrato é a “cessão de uso”, e não a transferência da propriedade, de bens imateriais como filmes, séries e músicas, além de curadoria e montagem do catálogo, bem como a indicação personalizada de produtos específicos aos clientes a partir de complexos algoritmos capazes de revelar as preferências de cada um.
Para os aplicativos de transporte, o serviço consiste em intermediar o contato entre um passageiro e um motorista a quem interesse realizar aquela corrida; receber pagamentos por plataformas seguras, oferecendo cupons e outras facilidades promocionais aos clientes; garantir o nível de qualidade do serviço através de rigorosa metodologia de avaliação de motoristas e passageiros etc.
Já os aplicativos de delivery reúnem em uma só plataforma centenas de restaurantes, facilitando enormemente o contato entre clientes, vendedores e entregadores autônomos, intermediando todo o processo de compra desde a apresentação do cardápio até a entrega na residência do usuário. Analogamente, as plataformas de locação de imóveis possibilitam o encontro de locadores e locatários do mundo todo, partindo da pesquisa de acomodações até a avaliação pública de “anfitriões” e usuários e a resolução de problemas que eventualmente podem surgir na relação contratual.
Por todo o exposto, a leitura mais atualizada da Constituição Tributária, já alcançada pelo STF conforme demonstrado, torna clara a possibilidade de incidência do Imposto Sobre Serviços nessas e em tantas outras relevantíssimas atividades econômicas próprias da era digital.
7.Conclusão
O objetivo deste trabalho foi revisar a jurisprudência do STF no que concerne ao núcleo da hipótese de incidência do Imposto sobre Serviços. Percorreu-se o entendimento da Corte desde antes da Constituição de 1988 até os dias atuais. Viu-se que o conceito contemporâneo, que se pode chamar de econômico, contempla o oferecimento de utilidade a outrem mediante remuneração, independentemente do enquadramento contratual nos tipos do Código Civil (conceito jurídico), que sugeriria interpretação mais restritiva ligada ao desempenho de obrigação de fazer. Por diversos ângulos, constatou-se que a investigação da natureza da obrigação sob as categorias civilistas é insuficiente para alcançar toda a materialidade econômica destinada pelo Constituinte ao imposto municipal. A relevância da pesquisa foi revelada na resolução de problemas contemporâneos, inclusive pelo próprio STF, a partir da aplicação do conceito mais amplo. Finalmente, sugeriu-se diretriz a ser seguida na resolução das controvérsias que ainda não chegaram à Corte envolvendo novas atividades econômicas da era digital, como o streaming, o delivery e o transporte por aplicativos, defendendo-se a manutenção do conceito econômico de serviços a confirmar a incidência do ISS sobre tais atividades.
8.Referências
CARVALHO, Paulo de Barros. Não incidência do ISS sobre atividades de franquia (Franchising). RET 56/65, jul.-ago/2007.
LUSTOZA, Helton Kramer. Impostos Municipais para Concursos. Salvador: JusPodivm, 2015.
MELO, José Eduardo Soares de. ISS – Aspectos teóricos e práticos. 5. ed. São Paulo: Dialética.
PAULSEN, Leandro. Constituição e código tributário comentados à luz da doutrina e da jurisprudência. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
PAULSEN. Leandro. MELO, José Eduardo Soares de. Impostos federais. Estaduais e Municipais. 11. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
[1] MELO, José Eduardo Soares de. ISS – Aspectos teóricos e práticos. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2008, p. 38
[2] CARVALHO, Paulo de Barros. Não incidência do ISS sobre atividades de franquia (Franchising). RET 56/65, jul.-ago 2007.
[3] Art. 3º, § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.
[4] É inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza - ISS sobre operações de locação de bens móveis.
Advogado inscrito na OAB/MG. Graduado em Direito pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: FIORINDO, Vitor Paiva. O conceito de “prestação de serviço” para fins de incidência do ISS na jurisprudência do STF Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 set 2020, 04:58. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55268/o-conceito-de-prestao-de-servio-para-fins-de-incidncia-do-iss-na-jurisprudncia-do-stf. Acesso em: 22 nov 2024.
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