RESUMO: É de conhecimento da maior parte da população que a construção das cidades brasileiras ocorre através de assentamentos informais e precários, como as favelas, invasões, loteamentos clandestinos etc. Como um meio de tentar amenizar isso, surgiu no campo jurídico o termo, regularização fundiária, que em seu sentido mais literal, consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, e também servem como meios de garantir o Direito à moradia, que não é somente fundamental, mas também é um direito natural do indivíduo, sendo principalmente indispensável à proteção da vida, da saúde, da liberdade, bem como ao Meio Ambiente Ecologicamente Equilibrado, pois devidos essas ocupações que muitas vezes ocorrem em áreas de Preservação Permanente, fizeram com que surgisse os impactos ambientais negativos, como por exemplo; poluição das águas, dos solos e do ar; esgotamento dos recursos naturais, que estão a levar o planeta a um avançado e preocupante estado de degradação, fazendo com que desse modo o direito à moradia e ao meio ambiente preservados se tornassem opostos, porém o uso controlado do meio ambiente, é possível que se obtenha desenvolvimento humano e econômico e um dos fatores principais para impedir o acesso à moradia digna é justamente o fator econômico.
PALAVRAS-CHAVE: Regularização Fundiária. Ocupação. Moradia. Meio Ambiente.
LAND REGULARIZATION IN A PERMANENT PRESERVATION AREA
ABSTRACT: It is known to the majority of the population that the construction of Brazilian cities occurs through informal and precarious settlements, such as favelas, invasions, clandestine subdivisions, etc. As a means of trying to alleviate this, the term, land tenure regularization, which in its most literal sense, consists of the set of legal, urban, environmental and social measures that aim to regularize irregular settlements and the titling of their occupants, appeared in the legal field. , and also serve as a means of guaranteeing the right to housing, which is not only fundamental, but also a natural right of the individual, being mainly indispensable for the protection of life, health, freedom, as well as the Ecologically Balanced Environment, because of these occupations that often occur in areas of Permanent Preservation, they caused negative environmental impacts, such as for example; pollution of water, soil and air; depletion of natural resources, which are taking the planet to an advanced and worrying state of degradation, thereby making the right to housing and the preserved environment become opposites, but the controlled use of the environment, it is possible that obtain human and economic development and one of the main factors to prevent access to decent housing is precisely the economic factor.
KEYWORDS: Land Regularization. Occupation. Home. Environment.
SUMÁRIO: 1 Introdução; 2 Breve Histórico Sobre Ocupações; 2.1 Ocupações Irregulares na Amazônia; 3 Conceito de Área De Preservação Permanente e Exemplos de Ocupações Nessas Áreas; 3.1 Lagoa dos Índios/Macapá; 3.2 Parque Estadual De Utinga/Pará; 4 Fatores Que Influenciam no Crescimento Desordenado em Assentamentos Clandestinos; 5 Instrumentos Legais de Prevenção do Meio Ambiente; 6 Regularização Fundiária; 7 Direito Fundamental ao Meio Ambiente; 8 Direito a Moradia; 9 Exigências Legais para Viabilizar a Regularização em Áreas Frágeis Ambientalmente – Moradia e Meio Ambiente; 10 Conclusão.
1 INTRODUÇÃO
É de grande importância ter uma reflexão sobre a necessidade de integrar a política ambiental em conjunto com a política de regularização fundiária, como uma forma de reconhecer que os dois problemas estão conectados na matriz do modo de produção do espaço urbano brasileiro, pautada numa ordem socioeconômica excludente do ponto de vista social e predatória para o meio ambiente, uma vez que a população residente nesses locais são famílias de baixa renda.
A Política de Regularização Fundiária é um meio que se encontrou para normatizar a ocupação do meio urbano e rural, levando em consideração que ao longo do tempo houve uma crescente ocupação do solo resultando em muitos loteamentos clandestinos e na decadência do meio ambiente, tendo em vista que tais ocupações se dão na maioria das vezes em áreas de preservação permanente.
Essas áreas de preservação permanente até um certo período e levando em consideração a letra da lei, não poderiam servir de moradias nem para qualquer tipo de exploração, devendo-as serem mantidas intactas, porém com o crescimento da população residente nesses locais, foram feitas mudanças na legislação e está acabou flexibilizando a habitação, mas somente se fossem observadas alguns pontos importantes no caso concreto, o que então resultaria na regularização fundiária sustentável, como é demonstrado.
Para isso é feito uma análise no que diz respeito ao direito à moradia e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, ambos constitucionalmente reconhecido na nossa Carta Magna, mas que devido à falta de fiscalização e planejamentos por parte do poder público, acaba se dando uma falsa ideia de que a garantia de um só se tem em detrimento do outro, porém ao se criar um diálogo e um estudo aprofundado de caso, é possível se garantir os dois.
Por fim, com o decorrer do tempo percebemos que a preocupação do legislador é justamente assegurar ao ser humano uma moradia digna, mas preservando o meio ambiente.
2 BREVE HISTÓRICO SOBRE OCUPAÇÕES
Após a chegada dos portugueses ao porto no litoral do território brasileiro, por direito de conquista da coroa, toda extensão passou a ser considerada terra pública, e foi através das denominadas Capitanias Hereditária, tendo como instrumento jurídico das sesmarias, que eram terrenos abandonados pertencentes a Portugal e entregues para ocupação, primeiro no território português em seguida, na colônia, o Brasil (1530 até 1822), que surgiu a primeira opção de política pública para demarcação de posse, tendo em vista que existia o desafio de colonizar as novas terras, ao tempo que Portugal e toda a Europa buscavam estreitamento das rotas comerciais com as Índias Orientais. Vale lembrar que esse instituto já existia no ordenamento jurídico lusitano desde 1375, por ocasião de necessidade de otimizar o uso das terras da coroa naquele território (LAMBURGINI, 2018).
Mesmo se tendo conhecimento desde o período colonial sobre a origem do posseiro, sua maior representação será no século XVIII. Porém, foi no período do ano de 1822 até 1850, que a posse se tornou a única forma de aquisição de domínio sobre as terras, ainda que apenas de fato, e é por esse motivo que na história da apropriação territorial essa época ficou conhecida como a “fase áurea do posseiro” (CAVALCANTE, 2005).
Historicamente, as cidades brasileiras, seguindo a tradição dos povos ibéricos, cresceram e se desenvolveram privilegiando as ocupações de topos de morros e margens de rios e lagoas. Tais ocupações visavam facilitar a captação da água para as atividades domésticas e agrícolas, bem como a destinação dos efluentes domésticos (MPF, 2018).
Sendo assim, é possível observar uma concentração notável de assentamentos em áreas de encostas íngreme e em áreas alagáveis, são comunidades sob o risco ambiental. E isso se dá, devido a alternativa em que a população de baixa renda, excluída do processo formal de acesso à terra urbanizada, encontra para ter a possibilidade de moradia (MOREIRA & SOUZA, 2017).
2.1 Ocupações Irregulares na Amazônia
Após a chegada dos portugueses ao porto no litoral do território brasileiro, por direito de conquista da coroa, toda extensão passou a ser considerada terra pública, e foi através das denominadas Capitanias Hereditária, tendo como instrumento jurídico das sesmarias, que eram terrenos abandonados pertencentes a Portugal e entregues para ocupação, primeiro no território português em seguida, na colônia, o Brasil (1530 até 1822), que surgiu a primeira opção de política pública para demarcação de posse, tendo em vista que existia o desafio de colonizar as novas terras, ao tempo que Portugal e toda a Europa buscavam estreitamento das rotas comerciais com as Índias Orientais. Vale lembrar que esse instituto já existia no ordenamento jurídico lusitano desde 1375, por ocasião de necessidade de otimizar o uso das terras da coroa naquele território (LAMBURGINI, 2018).
Mesmo se tendo conhecimento desde o período colonial sobre a origem do posseiro, sua maior representação será no século XVIII. Porém, foi no período do ano de 1822 até 1850, que a posse se tornou a única forma de aquisição de domínio sobre as terras, ainda que apenas de fato, e é por esse motivo que na história da apropriação territorial essa época ficou conhecida como a “fase áurea do posseiro” (CAVALCANTE, 2005).
Historicamente, as cidades brasileiras, seguindo a tradição dos povos ibéricos, cresceram e se desenvolveram privilegiando as ocupações de topos de morros e margens de rios e lagoas. Tais ocupações visavam facilitar a captação da água para as atividades domésticas e agrícolas, bem como a destinação dos efluentes domésticos (MPF, 2018).
Sendo assim, é possível observar uma concentração notável de assentamentos em áreas de encostas íngreme e em áreas alagáveis, são comunidades sob o risco ambiental. E isso se dá, devido a alternativa em que a população de baixa renda, excluída do processo formal de acesso à terra urbanizada, encontra para ter a possibilidade de moradia (MOREIRA & SOUZA, 2017).
3 CONCEITO DE ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE E EXEMPLOS DE OCUPAÇÕES NESSAS ÁREAS
Ao longo do tempo, surgiu no Brasil o Conceito de Área de Preservação permanente, oficializado com a Lei n°.4.771 em 1965, denominado Novo Código Florestal Brasileiro, mas que passou a ser questionado, tendo em vista que o entendimento era de que os espaços territoriais especialmente protegidos seriam apenas aqueles providos de florestas e se aplicava a áreas rurais, sendo omisso quanto às áreas urbanas.
Já por imposição vigente hoje, através da Lei n°12.651, de 25 de maio de 2012, refere-se que as áreas de Preservação Permanente consistem em espaços territoriais legalmente protegidos, ambientalmente frágeis e vulneráveis, podendo ser públicas ou privadas, urbanas ou rurais, cobertas ou não de vegetação nativa (BRASIL, 2012).
Visando garantir a preservação dos recursos hídricos, da estabilidade geológica e da biodiversidade, bem como o bem-estar das populações humanas, a lei determinou que a vegetação das Áreas de Preservação Permanente - APP devem ser mantidas intactas. Sendo assim, o regime de proteção das APP é bastante rígido: a regra é a intocabilidade, admitida excepcionalmente a supressão da vegetação apenas nos casos de utilidade pública ou interesse social (ARAÚJO, 2002).
Porém, existem afirmações que discutem que a legislação ambiental federal e a questão urbana são duas conexões mal trabalhadas, uma vez que são apontadas falhas nas leis que contribuem para que se venha ser descumpridos as normas em áreas urbanas (ARAÚJO, 2002).
Figueiredo (2004) destaca que ao abordar sobre as APP, nem o Código Florestal e nem o CONAMA, conseguem combater a situação mais crítica, que é justamente a recuperação das Áreas de Preservação Permanente Urbanas com ocupação consolidada. Diz assim: “Este é o quadro normalmente verificado em áreas urbanas de grande densidade populacional e de inexistência de instabilidade ambiental provocada pela intervenção antrópica no meio ambiente” (VARGAS, 2008).
3.1 Lagoa dos Índios/Macapá
Foi por volta da década de 1950 que teve início o processo de ocupação das áreas de planícies fluviais inundáveis denominadas localmente como “ressacas”, na cidade de Macapá. Porém, segundo Portilho (2010), foi somente a partir da segunda metade da década de 1980 que este processo de ocupação se fortaleceu, fazendo com que a alteração na estrutura dessas áreas acontecesse de forma cada vez mais rápida (MEDEIROS et al, 2018 in apud PORTILHO, 2010).
Um exemplo de ocupação irregular, foi a da ressaca da Lagoa dos Índios, a qual compreende um ecossistema rico e biodiverso, drenado por água doce, ligada ao curso principal d'água, o Igarapé da Fortaleza, e influenciada fortemente pela pluviosidade (MEDEIROS et al, 2018).
Segundo Vargas e Bastos (2013) devido às atividades relacionadas com a expansão urbana desordenada que foram intensificadas nas décadas de 1980 e 1990, as intervenções ao decorrer do tempo passaram a ser quase imperceptíveis a degradação na Lagoa dos Índios o que ocasionou deste modo diversos conflitos socioambientais (MEDEIROS et al, 2018)
Sendo assim, conforme Takiyama (2004) e Takiyama (2012) os primeiros estudos específicos feitos no início da década de 2000 se deram em consequência dos impactos antrópicos em ressacas de Macapá e Santana o qual serviram para a caracterização e diagnóstico dessas áreas. Os diagnósticos apontaram que as principais atividades que causam impactos ambientais nessas localidades são: ocupação desordenada do solo, queimadas intencionais, descarte inadequado de resíduos e pastagem para búfalos. Existem também outras atividades comuns nas áreas de ressacas que são: a extração de argila para olarias, a caça e a pesca de subsistência, a piscicultura, a navegação, a extração vegetal e a recreação (MEDEIROS et al, 2018).
A área que corresponde ao entorno do noroeste da ressaca da Lagoa dos Índios, teve uma significativa modificação na ocupação do solo, tendo em vista que até o ano de 2009 não existiam edificações na mesma. Todavia, com o decorrer do tempo passou a ser ocupada em razão da expansão urbana e em consequência disso a região passou por processo de desmatamento da vegetação nativa dando lugar a bairros hoje existentes (MEDEIROS et al, 2018).
No Município de Macapá, o estudo de caso da Lagoa dos Índios exemplifica os conflitos socioambientais que ocorrem por toda Amazônia, desrespeitando as legislações ambientais e urbanas. Verificou-se escassez de estudos que abordam a quantificação da degradação ambiental e diagnóstico da situação atual das áreas de preservação permanente na Amazônia (MEDEIROS et al, 2018).
3.2 Parque Estadual de Utinga/Pará
O crescimento desordenado da Região Metropolitana de Belém que, em 1883, teve a construção da estrada de ferro Belém - Bragança, traz como consequência o processo de ocupação da área que corresponde ao Parque Estadual de Utinga, tendo em vista que seu trecho inicial encontra-se próximo a bacia hidrográfica do Utinga, onde se tem os principais mananciais de abastecimento de água potável da cidade.
Com a sua criação em 1993, o objetivo principal do Parque foi assegurar a vida útil dos lagos Bolonha e Água, que por sua vez são responsáveis pelo abastecimento de água potável da capital, tendo grande importância neste sentido. No entanto, a ocupação desordenada no âmbito urbano em torno do mesmo e as dificuldades pertinentes aos aspectos jurídicos e operacionais da gestão ambiental estabelecem uma discussão sobre as diferentes estratégias de uso do parque na região a partir da sobreposição de territórios e os impactos na paisagem (SOUZA, 2020).
Neste cenário surge a Área de Proteção Ambiental dos Mananciais de Abastecimento de Água de Belém (também chamado de APA Belém²), cuja criação derivou da necessidade, conforme discrimina o Decreto Estadual nº1551/93, de proteção dos reservatórios de água dos lagos Bolonha e Água Preta, responsáveis pelo abastecimento de 65% da população da região metropolitana de Belém (SECTAM, 2003). A APA Belém possui uma extensão de 7500 hectares e envolve os municípios de Belém e Ananindeua (SOUZA, 2020).
O processo de criação da APA Belém gerou desencontros entre os ocupantes da área do Utinga com o poder público pela forma como foi conduzida a implantação da UC. Durante o período entre os anos de 1993 e 2003 o processo de implantação aconteceu de forma arbitrária por desconsiderar a presença dos moradores residentes a pelo menos 30 anos. Além disso, a ausência de gestão ambiental consistente possibilitou que o crescimento da ocupação irregular continuasse no entorno da UC, inclusive invadindo os limites previstos pelo Decreto Estadual 1.551 de 3 de maio de 1993 (SOUZA 2020).
Portanto, o município de Belém, assim como muitas outras cidades brasileiras, não planejou o seu crescimento urbano e os impactos ambientais têm afetado direta e indiretamente a preservação dessas áreas. No caso do PEUT, também tem a questão do espaço de recreação para os moradores, bem como possibilitar o desenvolvimento de atividades científicas, culturais, educativas e turísticas. De acordo com Araújo et al (2012) o êxito da gestão dos mananciais passa pela apropriação da questão da sustentabilidade, que por sua vez depende da concretização dos objetivos imperfeitos pela Lei Federal 9.985/00 (SNUC) (SOUZA, 2020).
4 FATORES QUE INFLUENCIAM NO CRESCIMENTO DESORDENADO EM ASSENTAMENTOS CLANDESTINOS
O modelo econômico aplicado no Brasil pós-1964 que visava a substituição das importações foi implementado por meio de políticas públicas que tinham como objetivos centrais autossustentação e independência do país em relação ao mercado externo. Esse modelo desenvolvimentista, fundamentalmente na década de 1960, provocou uma intensificação no movimento rural-urbano. O êxodo rural foi um dos fatores que provocou o crescimento acelerado e desordenado das cidades, principalmente as da região Sudeste, cujo processo de industrialização se manifestou de forma preponderante. Assim, surgiram nesses locais um aumento gradual da pobreza, violência interpessoal, criminalidade e insalubridade, deficiência dos serviços de infraestrutura, além das situações de risco das moradias e degradação ambiental – configurando um quadro de urbanismo de risco (PEGORETTI et al, 2004).
Com isso, uma opção que a população de baixa renda, excluída do processo formal de acesso à terra urbanizada encontra é fixar moradia em áreas de fragilidade ambiental, desvalorizadas pelo processo formal de urbanização devido a problemas de ocupação impostas pelas características ambientais do sítio, ou dificuldades provocadas por restrições jurídico-fundiárias definidas pelo poder público em leis de proteção ambiental (MOREIRA & SOUZA, 2017).
Sendo assim, os assentamentos urbanos clandestinos instalados sobre áreas de preservação permanente defrontam-se com a ameaça de esgotamento dos recursos hídricos e representam um conflito socioambiental que envolve a preservação do ambiente, a exploração econômica da propriedade privada e o direito à moradia, e tudo isso se dá devido à falta de planejamento e de políticas públicas, destinadas a proporcionar moradia digna a todas as pessoas, assim como a ausência de uma estrutura administrativa eficiente de fiscalização permitem a ocupação das margens de rios e lagoas. (VARGAS, 2008).
A dificuldade do Poder Público em atender simultaneamente os direitos à moradia e ao meio ambiente não se resume à escassez de recursos. Trata-se de questões estreitamente imbricadas, só podendo ser compreendidas quando se considera o processo de produção do espaço urbano numa perspectiva social e política, e não meramente jurídica (formalista). Com efeito, a degradação ambiental é tributária da insuficiente oferta de moradias populares pelo mercado imobiliário formal, incluindo-se aí tanto o Poder Público como a iniciativa privada. Essa situação, de imediato, leva à ocupação de áreas impróprias para fins residenciais, especialmente as áreas de preservação ambiental. Ao invés de culpabilizar a população de baixa renda, há de se reconhecer o papel decisivo desempenhado pelos agentes e instituições que controlam a terra urbana e asseguram o seu uso para beneficiar apenas interesses individualistas ou mesmo especulativos, em franca oposição ao princípio da função social da propriedade (Gondim, 2012).
5 INSTRUMENTOS LEGAIS DE PREVENÇÃO DO MEIO AMBIENTE
O Código Florestal Brasileiro foi criado em 1934 e reeditado em 1965 (Lei n.º 4.771) e 2012 (Lei n.º 12.651), definindo os princípios necessários para proteger o meio ambiente e garantir o bem-estar da população. Segundo Garcia (2012), o Código Florestal trata das duas principais fontes de proteção ambiental – previstas através de situações de preservação e conservação – que são as Áreas de Preservação Permanente (APP) e a Reserva Legal (RL) (MEDEIROS et al, 2018).
O Código Florestal de 1934 (Decreto nº 23.793/1934) expressamente tratou da proteção da vegetação de margens dos rios, sem, contudo, fazer qualquer previsão de larguras mínimas, como ocorreu a partir de 1966 (MPF, 2018). Foi através deste que tivemos uma ideia de proteção do território brasileiro, mais especificamente das áreas representativas dos ecossistemas naturais de um determinado ambiente. Este código, por sua vez apresentava algumas características preservacionistas, estabelecendo o uso da propriedade em função do tipo florestal existente, definindo as categorias de florestas protetoras, remanescentes, modelo e rendimento. As florestas protetoras apresentavam, para a época, um indício do que seria o instituto das florestas de preservação permanente, instituído pelo Código Florestal de 1965. Mesmo assim, a ideia e, ou, o espírito do Código Florestal de 1934 já era bastante conservacionista (BORGES et al, 2011).
Coube ao Código Florestal de 1965 (Lei Federal nº 4.771/1965) a disciplina sobre o tema e a definição de limites visando à proteção da vegetação ciliar. Desde a primeira legislação sobre o tema (o Código Florestal de 1934), já se tinha a ideia de conservação perene das florestas protetoras e remanescentes, sendo que o Código Florestal de 1965 passou a utilizar a nomenclatura “áreas de preservação permanente” (MPF, 2018).
Diante do problema social decorrente da enorme quantidade de construções irregulares situadas nas APPs urbanas, já em 2006, o Conama, por meio da Resolução n°369/2006, em seu art. 9°, inovou no ordenamento jurídico, permitindo a regularização das construções em áreas de baixa renda predominantemente residenciais e nas áreas situadas em Zonas de Especial Interesse Social (Zeis), desde que inseridas em áreas urbanas consolidadas até 10 de julho de 2001 (MPF, 2018).
Porém, conforme o art. 9°, IV, da Resolução n° 369/2006 do Conama, somente eram passíveis de regularização as construções situadas em alguns tipos de APP, quais sejam, ao longo das margens de curso d’água (respeitando-se uma faixa mínima de 15 m ou 50 m, a depender da largura do rio), em topos de morro (respeitadas as áreas de recarga de aquíferos) e em restingas (respeitada a faixa mínima de 150 m traçada a partir da linha de preamar máxima), foram vedadas regularizações em áreas de risco (art. 9°, § 2°, da referida resolução) (MPF, 2018).
Em 2012, foi editado o Novo Código Florestal (Lei Federal n° 12.651/2012), que manteve a conceituação finalística de área preservação permanente, definindo-a como área protegida, coberta ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica e a biodiversidade, facilitar o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas. (art. 3º, II da Lei Federal n° 12.651/2012) (MPF, 2018).
6 REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA
É de conhecimento da maior parte da população que a construção das cidades brasileiras ocorre através de assentamentos informais e precários, como as favelas, invasões, loteamentos clandestinos etc. Formada em sua maioria por pessoas marginalizadas socialmente. Como resultado, o déficit habitacional do país é grande, seja do ponto de vista quantitativo ou qualitativo. Isso, na verdade, é o resultado de um longo processo histórico de exclusão social e de falta de planejamento urbano, que tornou a moradia, e o próprio direito à cidade, um artigo de luxo. E, é aí que se percebe a importância de se discutir sobre a regularização fundiária como um mecanismo de aproximação entre a cidade real e a cidade legalmente constituída (CORREIA et al, 2015).
A regularização fundiária em seu sentido mais literal, consiste no conjunto de medidas jurídicas, urbanísticas, ambientais e sociais que visam à regularização de assentamentos irregulares e à titulação de seus ocupantes, de modo a garantir o direito social à moradia o pleno desenvolvimento das funções sociais da propriedade urbana e o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. (BRASIL, 2009).
Nessa seara diversas foram as tentativas realizadas. Para Jones (2003), a Regularização Fundiária busca formas de “[...] conter e combater a ocupação ilegítima e, sobretudo, especulativa, de grandes áreas de terras públicas. É neste sentido que todas as diversas normas reguladoras do acesso e legitimação de posses e propriedades foram propostas”. Mais uma vez a oposição da oligarquia fundiária, especuladores e grandes posseiros barraram estas tentativas. No ano de 1964 é publicada a Lei n°. 4.504, (BRASIL, 1964), conhecida também como Estatuto da Terra (LAMBURGINI, 2018).
É de grande importância mencionar que, em concordância com o previsto nos artigos 51 a 53 da Lei Federal n°.11.977/2009, a regularização fundiária deverá estabelecer certos pontos em seu projeto, quais sejam: definir quais as áreas ou lotes a serem regularizados, indicar as vias de circulação existentes e outras áreas destinadas ao uso público, estipular as condições para a promoção de segurança da população em situação de risco, deliberar sobre as medidas de infraestrutura básica devidas e as demais, necessárias à promoção de sustentabilidade urbanística, social e ambiental da área ocupada, incluindo também as compensações urbanísticas e ambientais previstas no ordenamento jurídico (CORREIA et al, 2015).
Com isso, a aprovação de um projeto de regularização fundiária pode corresponder à própria concessão pelo poder público municipal, sendo que neste caso só será possível a autorização advinda deste ente, se estiver dotado de órgão ambiental capacitado e de conselho de meio ambiente, caso contrário, poderá ser feito pelo Estado. A possibilidade de fazer intervenções em Área de Preservação permanente só se dará devido ao interesse social e observados os requisitos no parágrafo 2° do artigo 54 da Lei n°.11.977/2009, isso tudo porque de alguma forma esse procedimento poderá causar degradação ao meio ambiente, ou no mínimo se utilizará dos recursos ambientais (CORREIA et al, 2015).
7 DIREITO FUNDAMENTAL AO MEIO AMBIENTE
De acordo com a Resolução Conama 306/2002, “Meio ambiente é o conjunto de condições, leis, influência e interações de ordem física, química, biológica, social, cultural e urbanística, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas”. (CONAMA, 2002).
Antes de tudo, vale destacar a importância de que no último século, o Planeta vem sofrendo inúmeras alterações devido ao avanço da ciência e da tecnologia. Tudo isso Permitiu ao homem usufruir de maior conforto e melhores condições de vida. No entanto, em decorrência desse avanço tecnológico, surge, impactos ambientais negativos, como por exemplo; poluição das águas, dos solos e do ar; esgotamento dos recursos naturais, que estão a levar o planeta a um avançado e preocupante estado de degradação (BEZERRA et al, 2014).
Por outro lado, é imprescindível destacar que ao acompanhar a onda pró-verde no decorrer do século XX, os dispositivos normativos no âmbito nacional, teve como referência de mudança de mentalidade, até o momento em divulgação, a promulgação da Constituição Federal da República do Brasil de 1988 que incorporou um tratamento sistematizado ao tema “meio ambiente”. A perspectiva diferente desta Carta Magna sobre o assunto, ora em pauta, teve por objetivo final a proteção do homem, por meio do uso racional do meio ambiente, bem como integrante da ordem econômica e indispensável para a sobrevivência do ser humano, tendo em vista que os Textos Fundamentais que antecederam ao de 1988 enxergavam os recursos naturais apenas como parte de uma cadeia de produção de bens, sendo assim, necessária para a infraestrutura do país, e consequentemente impulsionando a economia nacional (JUNIOR, 2012).
À luz da Constituição Federal, se tem o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado previsto no caput do artigo 225, o qual prevê: “Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida impondo-se ao Poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações” (BRASIL, 2012).
8 DIREITO A MORADIA
O Direito à moradia, não é somente fundamental, mas também é um direito natural do indivíduo, sendo principalmente indispensável à proteção da vida, da saúde, da liberdade, por este motivo desde os primórdios o homem procurou em qualquer parte construir o seu abrigo, sendo ele em uma caverna, na copa de uma árvore, nos buracos das penhas e até mesmo no gelo, procurando sempre resguardar-se dos maus tempos e dos predadores (VIANA, 2000).
É imperioso destacar que, com a corrente inclusão do direito à moradia na Constituição Federal de 1988, declaradamente em seu enunciado no artigo 6°, e não sendo impeditivo a percepção de que a nossa ordem jurídica, de certa forma já reconhecia e protegia a moradia mesmo na vertente constitucional, não há como discordar que a questão da moradia, agora evidentemente guinada à exigência de direito fundamental, atribui-se pela ótica da ordem jurídica feições novas, requerendo, imprescindivelmente, especial atenção por parte dos que se ocupam do tema, seja pela razão apontada, seja, dentre outras razões, pelo aumento gritante da exclusão social no nosso país, bem como consequente agravamento do antigo, porém lamentavelmente cada vez mais atual problema do acesso a uma moradia digna para grandes parcelas da nossa população (SARLET, 2003).
Todavia, se analisarmos o direito fundamental à moradia pela ótica de reconhecimento expresso na ordem jurídica positiva, tendo em vista o plano internacional, poderemos concluir que foi através da Declaração Universal dos Direitos Humanos da ONU, em 1948, que se teve pela primeira vez o reconhecimento, dos denominados direitos econômicos, sociais e culturais, que por sua vez está o direito à moradia (SARLET, 2003).
Ainda que o texto constitucional consagre a dignidade humana como princípio estruturante de nosso sistema jurídico, poucos habitantes de nossa cidade desfrutam do direito à vida segura e vivem em habitações dignas. Vale aduzir que a habitação digna é uma das prioridades que a União definiu para a realização de programas e políticas de desenvolvimento urbano (MPE DO PARÁ, 2010).
A Carta Magna também define como competência de todos os entes da Federação a promoção de programas de construção de moradias e de melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico (CF, art. 23, IX).
9 EXIGÊNCIAS LEGAIS PARA VIABILIZAR A REGULARIZAÇÃO EM ÁREAS FRÁGEIS AMBIENTALMENTE – MORADIA E MEIO AMBIENTE
O art. 65 do Código Florestal veda a regularização de áreas de preservação permanente identificadas como áreas de risco. Todavia, essa disposição, constante do caput do art. 65 da Lei Federal nº 12.651/2012, deve ser compreendida à luz da Lei Federal n° 13.465/2017, que permite a regularização fundiária em áreas de risco, mediante a realização de estudos técnicos, desde que haja a possibilidade de eliminação, correção ou administração de riscos na parcela por eles afetada (art. 39 Lei Federal n° 13.465/2017) (MPF, 2018).
Seguindo a mesma linha de raciocínio a Lei n. 11.977/2009 faculta a possibilidade de se promover, por decisão fundamentada, regularização fundiária em Áreas de Preservação Permanente – APPs, assim definidas no referido Código Florestal (CORREIA et al, 2015).
Nesse aspecto também, a Lei 10.257 de 10 de julho de 2001 – o Estatuto da Cidade – garante o direito a cidades sustentáveis, como verificado no art. 2º, inciso I, que assegura, para as presentes e futuras gerações, o direito à terra urbana, à moradia, ao saneamento ambiental, à infraestrutura urbana, ao transporte, aos serviços públicos, ao trabalho e ao lazer. Conforme o seu art. 2º, a regularização fundiária e a urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda devem ser feitas com base no estabelecimento de normas especiais de urbanização, uso e ocupação do solo e edificação, considerando a situação socioeconômica da população e as normas ambientais (ALMEIDA et al, 2017).
Como já mencionado, o acesso à moradia digna está previsto na Constituição Federal de 88, mais especificamente no caput do artigo 6°, garantido como direito fundamental do ser humano, figurado desta forma também desde 1948 através da Declaração Universal dos Direitos Humanos, o qual dispõe sobre os direitos humanos universais, aceito e aplicável no mundo todo, porém foi só com a Emenda Constitucional n° 26 de 14 de fevereiro de 2000, que a moradia passou a ser reconhecida como direito social, ou seja, após 12 anos da aprovação da Carta Magna (ALMEIDA, et al, 2017).
Ao mesmo tempo, o artigo 225 da CF/88, discorre a respeito do meio ambiente e assegura que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, e que é dever do poder Público e da coletividade defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações, tendo em vista que é garantido como bem de uso comum, sendo primordial a uma qualidade de vida saudável (ALMEIDA et al, 2017).
Em relação aos Direitos Fundamentais que ocorreram através do tempo. Na primeira dimensão o indivíduo era o centro, o detentor do direito, já a partir da segunda dimensão o direito se tornou coletivo, e, por fim nas últimas dimensões, a preocupação com a humanidade vem se tornando um tópico a mais. Através da análise das dimensões, fica claro como os Direitos Fundamentais acompanham o desenvolvimento e as necessidades da sociedade que sofre mudanças com o decorrer do tempo.
Perante ambos os direitos alhures mencionados, tem-se a ideia de os conflitos pela regularização fundiária em APP baseiam-se na primazia de um direito em detrimento de outro, além é claro, da questão que envolve à dignidade das moradias, abrangendo as condições de vida sadia e segurança, tendo uma localização adequada e não passível de possíveis desastres naturais (ALMEIDA et al, 2017).
De acordo com Santini (1993, p.34), o espaço é natural, modificado pelo homem, torna-se uma apreciação cultural; e as maneiras como é organizado variam enormemente em função das complexidades e das solicitações tecnológicas do grupo que nele se instala. Os princípios fundamentais para essa organização espacial estão baseados em dois fatores: a Postura e a Estrutura do ser humano. Assim como a experiência de seu corpo, o homem organiza seu espaço, adequando-o às suas necessidades biopsicossociais.
10 CONCLUSÃO
Na maioria das vezes o direito fundamental à moradia e ao meio ambiente ecologicamente equilibrado são considerados como opostos um do outro, embora ambos sejam de extrema importância para a vida humana, pois uma é essencial para a dignidade e sobrevivência e outro para a saúde e o bem-estar.
Pode-se perceber então, que em uma visão legalista é provável que se garanta os dois direitos constitucionalmente previstos. Porém ainda é necessário que se crie uma combinação, na prática, para que ambas se tornem aliadas, sendo necessário que a legislação ambiental incorpore nas suas problemáticas as barreiras sociais, que nesse caso é o acesso à moradia, uma vez que é possível com o uso controlado do meio ambiente, que se obtenha desenvolvimento humano e econômico, e um dos fatores principais para impedir o acesso à moradia digna é justamente o fator econômico.
REFERÊNCIAS
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Graduanda do Curso de Direito do Centro Universitário CEUNI-FAMETRO.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PEREIRA, Larice Bruce. Regularização fundiária em área de preservação permanente Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 04 dez 2020, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/55808/regularizao-fundiria-em-rea-de-preservao-permanente. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: gabriel de moraes sousa
Por: Thaina Santos de Jesus
Por: Magalice Cruz de Oliveira
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