RESUMO: A preocupação básica do presente artigo é demonstrar de que forma o trinômio da necessidade, possibilidade e da proporcionalidade concretiza-se na ação revisional de alimentos. Este artigo tem como objetivo analisar a relação meio-fim (adequação e necessidade) para que haja garantia plena dos direitos do alimentante e alimentando. Realizou-se pesquisas bibliográficas, tendo como referência os materiais de cunho principiológico e do ramo de direito de família, procurando evidenciar a importância da análise de meios para a garantia mínima de dignidade dos polos ativo e passivo na prestação de alimentos, para que o alimentante garanta sua subsistência, sem com isso afetar a plena provisão dos direitos do alimentando e vice-versa.
Palavras-chave: Revisão de Alimentos. Necessidade. Possibilidade Proporcionalidade.
1.INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem como tema a relação existente entre o trinômio da necessidade, possibilidade e da proporcionalidade com a ação revisional de alimentos. Busca-se dessa forma, analisar através de perspectivas diferentes, as questões prejudiciais dos direitos do alimentando e do alimentante.
Nesta perspectiva, construiu-se questões que nortearam este trabalho:
· De que forma a ação revisional de alimentos garante o efetivo exercício do princípio da proporcionalidade?
· Quais medidas devem ser tomadas no âmbito da ação revisional de alimentos para que o alimentando não seja prejudicado em seu sustento no caso de uma possível redução de pensão alimentícia?
· Quais os critérios a serem analisados diante de uma ação que vise revisionar alimentos?
Quando se fala em princípio da proporcionalidade pressupõe-se como uma forma de controle de normas para que não haja excesso do legislador ao criar ou alterar determinada lei, porém há de ressaltar também o mandamento da proporcionalidade na aplicação das normas, de forma que se possa evitar qualquer tipo de arbitrariedade ou injustiça na sanção de penas ou obrigações.
Vários autores conceituam o trinômio como um balanço, onde deve-se resolver cada caso de acordo com suas peculiaridades, onde se avalia a necessidade e a adequação das medidas a serem tomadas em determinadas circunstâncias.
No caso das ações de alimentos em geral, busca-se a aplicação do trinômio da necessidade, da possibilidade e da proporcionalidade, principalmente no que tange ao valor pecuniário a ser aplicado nas devidas parcelas da prestação de caráter alimentar.
O princípio da proporcionalidade é que norteia a fixação dos alimentos, tendo por pressuposto as possibilidades do alimentante e as necessidades do alimentando. Como o encargo decorre do poder familiar, do dever de mútua assistência, dos vínculos de parentesco e da solidariedade familiar dispõe de um componente ético. Não dá para permitir que pessoas que mantêm – ou deviam manter – um vínculo afetivo vivam em situação de flagrante desequilíbrio. (TARTUCE, 2007, on-line).
Neste contexto, o objetivo primordial deste estudo é, pois, investigar como deve se dar a aplicação do trinômio da necessidade, da possibilidade e da proporcionalidade na ação revisional de alimentos, de forma a garantir o direito de todas as partes envolvidas na demanda.
2.DESENVOLVIMENTO
A ação revisional de alimentos é aquela que visa reduzir ou majorar prestação de pensão alimentícia já fixada através de sentença proferida em ação de alimentos anterior. Normalmente a que visa reduzir é instruída pelo alimentante, enquanto a que visa majorar é instruída pelo alimentando.
A revisão de alimentos surge como uma forma de adequar a necessidade das partes à sua realidade financeira e, até mesmo social, visto que a prestação alimentícia não busca proporcionar somente o estritamente necessário a sobrevivência do alimentando, como também abrange a saúde, a educação, a moradia e demais necessidades básicas.
Dessa forma, se o alimentante vier a perceber vantagem salarial que aumente seus ganhos ou mesmo empreenda em nova jornada que de alguma forma melhore no todo ou em parte sua situação econômica, o alimentando pode intentar com a ação revisional de alimentos visando adequar as suas necessidades à nova realidade financeira do provedor da pensão alimentícia.
Assim assevera o professor Carlos Roberto Gonçalves em seu ensinamento a respeito do tema:
As necessidades do alimentando podem servir também de motivo para a majoração da pensão. À medida que os filhos crescem, as necessidades e as despesas aumentam, principalmente quando atingem a puberdade, sendo maiores nessa etapa da vida as exigências femininas. Outras vezes a necessidade de receber maior auxílio tem por causa doença grave de tratamento prolongado e de alto custo ou o ingresso em dispendiosa instituição particular de ensino. (GONÇALVES 2018, p. 731)
Da mesma maneira, caso o alimentante venha a sofrer perda patrimonial significativa, que influencie no todo ou em parte a sua vida financeira e possível subsistência, pode ele ingressar com a ação revisional de alimentos visando reduzir a verba de pensão alimentícia para melhor se adequar a situação pecuniária.
Devido à falta de estabilidade em empregos, as mudanças severas que podem ocorrer no cenário econômico, bem como os constantes reajustes de preços dos produtos no País, pode-se afirmar que não é baixo o número de ações revisionais de alimentos nos diversos Cartórios de Família do Brasil.
Nesse cenário, encontra-se uma regra básica para a análise das ações revisionais de alimentos, nelas deve o magistrado fazer uso do trinômio da necessidade, possibilidade e proporcionalidade, garantindo assim que a decisão proferida não seja lesiva para uma das partes, devendo a medida condizer com a realidade dos jurisdicionados.
Os artigos 1694, § 1º e 1699, ambos do Código Civil, preceituam:
Art. 1694, § 1º. Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.
Art. 1.699. Se, fixados os alimentos, sobrevier mudança na situação financeira de quem os supre, ou na de quem os recebe, poderá o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, exoneração, redução ou majoração do encargo. (BRASIL, 2002, on-line)
Apesar de o Código Civil fazer menção somente a necessidade e a possibilidade, a doutrina moderna e a jurisprudência evoluíram no sentido de adequar essa realidade ao trinômio, passando à inclusão da proporcionalidade no rol de requisitos para averiguação do direito das partes.
Porém, importa ressaltar que o uso do trinômio não é uma simples faculdade do juízo, ele constitui-se como um fator condicionante para que a ação revisional de alimentos exista. Sem ele sequer deve ser verificado o mérito do pedido. A esse respeito, decidiu o Supremo Tribunal de Justiça:
A modificação das condições econômicas de possibilidade ou de necessidade das partes, constitui elemento condicionante da revisão e da exoneração de alimentos, sem o que não há que se adentrar na esfera de análise do pedido, fulcrado no art. 1.699 do CC/02. As necessidades do reclamante e os recursos da pessoa obrigada devem ser sopesados tão-somente após a verificação da necessária ocorrência da mudança na situação financeira das partes, isto é, para que se faça o cotejo do binômio, na esteira do princípio da proporcionalidade, previsto no art. 1.694, § 1º, do CC/02, deve o postulante primeiramente demonstrar de maneira satisfatória os elementos condicionantes da revisional de alimentos, nos termos do art. 1.699 do CC/02. (STJ, 2009, on-line)
A necessidade está relacionada com uma alteração na realidade das partes, daquilo que antes era suficiente e no presente já não é mais, abarcando fatores econômicos e até mesmo socais. “A necessidade é considerada em função de cada caso concreto, necessidades educacionais, culturais, etc., levando-se em conta também o nível social das pessoas envolvidas”. (VENOSA, 2013, p. 402)
A possibilidade está ligada ao devedor e diz respeito às condições econômicas que ele possui para ser provedor dos alimentos demandados, uma vez que não se pode exigir que ele o faça de qualquer maneira, sem antes analisar sua realidade financeira.
A proporcionalidade é definida por Barroso (1999), como uma verificação da relação custo-benefício da medida, isto é, da ponderação entre os danos causados e os resultados a serem obtidos. Pode-se afirmar, que a proporcionalidade é como uma caravela, que guiará as partes a um destino comum, onde ambos irão enfrentar os limites das próprias necessidades.
Na perspectiva da ação revisional que vise reduzir os alimentos, por exemplo, dever-se analisar a proporcionalidade do valor ofertado (meio) com a necessidade do alimentando (fim) e ainda, a possibilidade do alimentante, ou seja, se a sua incapacidade financeira realmente condiz com a redução que ele está pleiteando. Dessa forma, afirma Sílvio Rodrigues, citado por Carlos Roberto Gonçalves (2017, p. 696) “se enormes são as necessidades do alimentário, mas escassos os recursos do alimentante, reduzida será a pensão; por outro lado, se se trata de pessoa de amplos recursos, maior será a contribuição alimentícia”.
Já na ação revisional que vise majorar os alimentos, deve-se levar em consideração a necessidade do alimentando em adquirir o aumento pleiteado e a possibilidade do alimentante de o realizar, sem com isso afetar a sua própria subsistência. Nesse sentido:
Os alimentos estão condicionados às necessidades do alimentando e às possibilidades do alimentante (CC, art. 1.694, § 1º), e podem ser revistos se sobrevier mudança na fortuna de quem os supre, ou na de quem os recebe (CC, art. 1.699), podendo o interessado reclamar ao juiz, conforme as circunstâncias, a exoneração, redução ou majoração do encargo. O parente, cônjuge ou convivente que demanda por alimentos deve provar que não tem meios próprios de sobrevivência, cuja necessidade é presumida quando o credor é menor ou incapaz, ou deve demonstrar que aquilo que produz com seu trabalho não é suficiente para satisfazer as vitais exigências da vida, seja porque seus ganhos são ínfimos ou porque sem culpa sua está desempregado, incapacitado ou enfermo. (MADALENO, 2018, p. 1172)
Ademais, jurisprudencialmente, essa é a análise feita pelos tribunais para a melhor ponderação entre o que se pleiteia e o que será fixado, conforme se extrai da decisão abaixo colacionada:
EMENTA: AÇÃO REVISIONAL DE ALIMENTOS - ALTERAÇÃO DO TRINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE/ PROPORCIONALIDADE - REDUÇÃO - CABIMENTO - NASCIMENTO DE OUTROS FILHOS.
- Recai sobre o autor da ação revisional de alimentos o ônus de demonstrar a redução de sua capacidade financeira de pagar os alimentos ou da necessidade do alimentando, para obter a alteração de seu valor.
- Cabendo ao alimentante contribuir para o sustento de outros filhos, cujo nascimento altera as condições inicialmente consideradas na fixação dos alimentos, deve ser reduzida a pensão para montante que viabilize a subsistência digna das cinco crianças sem onerar excessivamente o genitor.
- Recurso provido em parte. (TJMG, 2013, on-line)
Assim, afirma Dias (2006), evita-se que sejam beneficiados pela justiça aqueles que agem com possível má-fé processual, onde intentem por um direito ou benefício que na realidade não se faz jus, principalmente em uma ação tão delicada e preciosa que diz respeito a necessidade alimentar, portando direito à vida.
3.CONCLUSÃO
Diante do exposto, concluiu-se que é basilar que se faça uma relação entre o trinômio da necessidade, possibilidade e proporcionalidade para a eficácia da ação revisional de alimentos, de forma que se tornam totalmente convergentes entre si, pois sem essa análise há um grande risco de se cometer injustiças, principalmente pelo fato de as ações que versam sobre alimentos dizerem respeito a direitos indisponíveis.
Entende-se também que diversos fatores influenciam para que ocorram as ações revisionais de alimentos, sendo elas ligadas as necessidades do alimentando, bem como as possibilidades do alimentante. Ademais, o próprio mercado e a economia do país podem transformar a realidade financeira das partes, uma vez que vivemos sob um sistema econômico variável, o que acarreta um número maior de ações judiciais que versem sobre esse tema.
O juiz, enquanto ponderador do direito das partes, deve analisar o pedido de forma criteriosa, verificando o contexto fático e principalmente probatório, pois é ele que irá demonstrar a exitência ou não da necessidade de ocorrer a revisão pleiteada.
Nesse ínterim, cabe ao julgador zelar pela verdade dos fatos, vedando toda e qualquer possibilidade de má-fé processual que venha a beneficiar àquele que não faz jus ao direito ora postulado, fazendo uso dos critérios da necessidade, da possibilidade e da proporcionalidade, que devem estar fartamente demonstradas nos autos processuais através de provas precisas de sua existência, garantindo assim a dignidade e a plena subsistência das partes.
4.REFERÊNCIAS
TARTUCE, Flávio. Dois pesos e duas medidas para preservar a ética: irrepetibilidade e retroatividade do encargo alimentar. Disponível em: http://professorflaviotartuce.blogspot.com/2007/04/novo-artigo-de-maria-berenice-dias.html. Acesso em 08 mar. 2020.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 6: direito de família. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2017.
BRASIL, Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União, Brasília, 10 de jan. 2002. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10406.htm >. Acesso em 28 fev. 2020.
STJ. RECURSO ESPECIAL: REsp 1046296/MG. Relatora: Ministra Nancy Andrighi. DJ: 17/03/2009. JusBrasil. Disponível em: < https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/4299651/recurso-especial-resp-1046296-mg-2008-0073558-8/inteiro-teor-12207795?ref=serp>. Acesso em 09 out. 2020.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: direito de família / Sílvio de Salvo Venosa. - 13. ed. São Paulo: Atlas, 2013.
BARROSO, Luís Roberto. Interpretação e aplicação da constituição - fundamentos de uma dogmática constitucional transformadora. 3 ed. Rio de janeiro: saraiva, 1999.
MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. APELAÇÃO CÍVEL: Ap. 1.0701.11.006970-8/002. Relatora: Desembargadora Heloísa Combat. DJ: 07/02/2013. JusBrasil. Disponível em: < https://tjmg.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/114665239/apelacao-civel-ac-10701110069708002-mg?ref=serp >. Acesso em 08 mar. 2018.
MADALENO, Rolf. Direito de família. 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2018.
DIAS, Maria Berenice. Princípio da proporcionalidade para além da coisa julgada. Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/33147/principio-da-proporcionalidade-para-alem-da-coisa-julgada>. Acesso em 01 de mar. 2018.
Graduanda em Direito pelo Centro Universitário Luterano de Manaus - CEULM/ULBRA. Estagiária no Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas - TJAM e estagiária no Ministério Público Federal - MPF.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RIBEIRO, Fabiana da Silva. A convergência da ação revisional de alimentos com trinômio da necessidade, possibilidade e proporcionalidade Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 mar 2021, 04:50. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56304/a-convergncia-da-ao-revisional-de-alimentos-com-trinmio-da-necessidade-possibilidade-e-proporcionalidade. Acesso em: 22 nov 2024.
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