FLÁVIA MALACHIAS SANTOS SCHADONG[1]
VALDIRENE CÁSSIA DA SILVA[2]
(orientadoras)
RESUMO: A economia do compartilhamento trouxe centenas de novas formas de trabalho, com isso surgiram novos problemas trabalhistas, principalmente em relação ao enquadramento dos vínculos empregatícios, vez que o não reconhecimento deste leva a precarização dos trabalhadores que se utilizam de aplicativos. Desta forma busca-se analisar a economia do compartilhamento no tocante a precarização das relações de emprego dos entregadores de aplicativo e as recentes decisões dos tribunais em relação ao tema, compreender como as relações de emprego estão se adequando a determinados meios tecnológicos é primordial para mantermos a estabilidade nos meios trabalhistas e manter os Direitos básicos de cada trabalhador garantido. A metodologia do presente estudo é traçada da seguinte forma: Método descritivo, pesquisa de natureza básica, objetivo exploratório e descritivo, procedimento de coleta de dados bibliográfico e documental e abordagem qualitativa. Conclui-se que com a visão individualizada se demonstra enquadrado todos os requisitos trabalhistas necessários para caracterização de emprego, desta forma se torna uma relação empregatícia justa, segura e equilibrada, e que as decisões jurisprudenciais tem forte intuito nesse reconhecimento.
Palavras-chave: Direito trabalhista; Economia do compartilhamento; Precarização; Vínculo empregatício.
ABSTRACT – The sharing economy has brought hundreds of new forms of work, with this new labor problems have arisen, mainly in relation to the framing of employment bonds, since the non-recognition of this leads to the precariousness of workers who use applications. In this way, we seek to analyze the sharing economy with regard to the precariousness of the employment relationships of application handlers and the recent court decisions in relation to the topic, understanding how employment relationships are adapting to certain technological means is essential for us to maintain stability in the labor market and maintain the basic rights of each guaranteed worker. The methodology of the present study is traced as follows: Descriptive method, basic research, exploratory and descriptive objective, bibliographic and documentary data collection procedure and qualitative approach. It is concluded that with the individualized view, all the labor requirements necessary to characterize employment are shown, in this way it becomes a fair, safe and balanced employment relationship, and that the jurisprudential decisions have a strong intention in this recognition.
Key Words – Labor law; Sharing economy; Precariousness; Employment bond.
SUMÁRIO: 1. Introdução – 2. Economia do compartilhamento e os vínculos empregatícios: 2.1 Conceito e surgimento da Economia do Compartilhamento; 2.2. Pilares jurídicos da economia do compartilhamento. 3. Relações de emprego e de trabalho e suas peculiaridades: 3.1 Relação de emprego x Relação de trabalho; 3.2 Princípios trabalhistas e constitucionais; 3.3 Precarização do trabalhador; 3.3.1. Desigualdade lucrativa entre aplicativo e trabalhador. 4. Tribunais Trabalhistas e seu entendimento. 5. Conclusão. 6. Referências.
1 – INTRODUÇÃO
Entre os diversos avanços da tecnologia, surgem várias facilidades para o cotidiano de cada pessoa, facilidades estas que com apenas um clique pode realizar desejos e cumprir obrigações, porém por trás de toda facilidade existem relações jurídicas que podem estar prejudicadas ou até mesmo serem injustas. Neste prisma se pretende estudar de uma maneira mais especifica sobre as complicações que determinadas inovações tecnológicas trazem para quem fornece alguns serviços no meio de uma grande cadeia de trabalho.
Estas facilidades se dão pela era da Economia do Compartilhamento que se expande com uma rapidez significativa em todo o mundo, esta nova modalidade de economia trouxe um formato com plataformas digitais de trabalho, quebrando todo paradigma dos negócios e comércios tradicionais, ocorre que a ideia central da economia se desregulou e vem se tornando um mercado esmagador e extremamente lucrativo. Dentre todas as discussões que pairam a respeito do tema, uma grande questão suscitada é sobre os direitos trabalhistas dos entregadores (delivery) destes aplicativos que surgiram com o mercado digital.
Este fenômeno que está em ligeira ascendência nos últimos tempos é chamado de “Uberização”, que nada mais é do que a consolidação de empresas intermediadoras de serviços delivery, entre os clientes e motoristas, como consequência se consolidam as novas formas de gerenciamento sobre o serviço prestado pelo trabalhador.
Os pilares jurídicos da Economia do Compartilhamento no Brasil ainda se encontram defasados, pois a legislação local não conseguiu acompanhar toda dinâmica e evolução nas relações jurídicas que o mercado tem oferecido, este artigo busca demostrar como tudo isso tem se solidificado no cenário atual e como tem sido entendido pelos tribunais.
Após aprofundando estudo sobre a o surgimento, conceito e os pilares jurídicos da Economia do Compartilhamento busca-se compreender os vínculos empregatícios do trabalhador que se encontra na última cadeia do ciclo, sendo intermediado pelo aplicativo e efetivando a mão de obra final.
Os vínculos empregatícios, especificamente; Relação de trabalho X Relação de emprego, contém diversas peculiaridades, sendo estas peculiaridades minunciosamente examinadas e verificados os requisitos caracterizadores de cada vinculo.
Com isso será exarado todos os princípios trabalhistas e constitucionais sendo desta forma comparado com a realidade do trabalhador de aplicativo, resultando na total precarização do citado trabalhador que está totalmente desamparado pela CLT, pois não é reconhecido nenhum vínculo empregatício entre Aplicativo - Trabalhador/entregador, se tornando muitas vezes um falso “empreendedor”, com o serviço absolutamente precarizado.
O não reconhecimento deste vínculo leva com que os trabalhadores sejam tratados como autônomos, o que indiretamente gera uma enorme desigualdade econômica em razão da discrepância lucrativa entre as duas partes abordadas.
O presente artigo tem como base o problema de pesquisa: Como a nova era da economia do compartilhamento está precarizando as relações de emprego dos entregadores de aplicativo, e quais as recentes decisões dos tribunais em relação ao tema, com o seguinte objetivo geral: Analisar a economia do compartilhamento no tocante a precarização das relações de emprego dos entregadores de aplicativo e as recentes decisões dos tribunais em relação ao tema.
Os objetivos específicos se dão da seguinte forma: Compreender as relações de emprego e as relações de trabalho; Abordar a Economia do Compartilhamento na perspectiva jurídica; Discutir a precarização das relações de emprego dos entregadores de aplicativos com a ideia da Economia do Compartilhamento e detectar as recentes decisões dos tribunais sobre relação de emprego dos entregadores delivery.
Busca-se evidenciar o enquadramento dessas inovações de acordo com requisitos da Consolidação das Leis trabalhistas, bem como, relacioná-las e demonstrar a precarização do trabalhador, desta maneira, tem-se o objetivo de novas contribuições para o meio acadêmico podendo enriquecer a leitura e estudos sobre os citados assuntos.
2 – ECONOMIA DO COMPARTILHAMENTO E OS VÍNCULOS EMPREGATÍCIOS
2.1. Conceito e surgimento da Economia do Compartilhamento
Com o avanço da tecnologia mundial, surgem diversas inovações em todos os setores das nossas vidas, seja ele, econômico, social, pessoal, familiar, muitas destas inovações levam ao consumidor uma forma mais simples, rápida e prática em obter determinado serviço, adquirir alguma mercadoria, se socializar nas redes sociais, ou até mesmo pedir uma refeição.
Com essa ideia a Economia do Compartilhamento surgiu, nos dias atuais e está presente nos mais diversos meios, se tornando até difícil delimitar seus parâmetros, pois se tornou algo comum no cotidiano da camada da população que faz uso dos meios tecnológicos.
A primeira ideia da economia foi ainda no ano de 1995, sendo mais intensificada em meados de 2008-2010, a principal base da economia do compartilhamento é criar uma forma de consumo sustentável com compartilhamento de bens e troca de serviços (KIRA; PAULA; ZANATTA, 2017).
Pinheiro e Tigre (2019, p. 23) explanam que:
O termo economia do compartilhamento (sharing economy) é usado, entre outros, para descrever o fenômeno desencadeado pela difusão de plataformas tecnológicas de prestação de serviços on-line. Tal acontecimento vem abrindo caminho para inovações baseadas no princípio de compartilhamento, uma forma híbrida entre possuir e usar.
O prisma da citada economia é a cooperação dentre várias pessoas que possam oferecer os mais diversos serviços necessários na vida cotidiana, com troca e acesso a informações, valor acessível e bens compartilhados. Este termo traz atividades genéricas até incapazes de serem totalmente descritas, com enfoque de ajudas simultâneas e não transferências de propriedades.
Ocorre que a ideia principal da economia foi perdida, este ramo se tornou algo extremamente lucrativo, porém, poucos fazem parte da camada que obtém numerosos lucros, o objetivo de ter algo “sustentável” e “utilitário” ficou para trás, hoje se pode falar em empresas milionárias que visam altos lucros.
Vista a partir de outras perspectivas, a Economia do Compartilhamento não é tão diversa quanto parece á primeira vista. Estranhamente, considerando a linguagem de altruísmo e generosidade que com tanta frequência se usa para descrevê-la, a Economia do Compartilhamento é predominantemente formada por organizações comerciais, e não sem fins lucrativos. Dos setenta parceiros da Peers, mais de sessenta são companhias voltadas ao lucro; e as corporações da Califórnia ficaram com mais de 85% do faturamento obtido pelas empresas da economia compartilhada. (SLEE, 2017, p.74).
Sobre como o fenômeno da economia compartilhada vem interagindo no cotidiano a Professora Doutora, Mestre Amanda Flávio de Oliveira aborda no artigo; Economia colaborativa e desafios ao ordenamento jurídico brasileiro (2018, p.4):
O primeiro desafio concernente a essa nova forma de expressão da atividade econômica consiste exatamente em identificá-la por meio de uma terminologia. A atividade consiste, basicamente, em, por meio de uma plataforma digital, uma pessoa oferecer um bem de sua propriedade ou os seus próprios serviços a outra pessoa, disposta a usufruir deles, mediante alguma espécie de contrapartida, quase sempre monetária. Muitas são as expressões que vêm sendo utilizadas para a ela se referir. Entre elas, destacam-se os termos “economia compartilhada”, “economia colaborativa”, “transações entre consumidores (C2C transactions)”, “economia do compartilhamento”, “economia de relacionamento”, “economia de cooperação” e “nova economia”. Essas expressões, no entanto, têm sido criticadas por alguns, que nelas vislumbram uma tentativa de se mascarar o caráter de exploração econômica que a atividade encerra, ao pretender dotar o fato jurídico de uma imagem de mera cooperação entre iguais. (OLIVEIRA, 2018, p.4)
Junto com a economia do compartilhamento esse avanço tecnológico também se modernizou as formas de prestação de serviço, no qual se deu o surgimento das plataformas de trabalho digital, muitas plataformas desse sistema online são web-based, o que significa que dados podem ser disponibilizados simultaneamente para quantas pessoas forem preciso, em qualquer hora e a qualquer lugar, podendo direcionar serviços com especificidades a uma pessoa. Outros meios de serviço digital é a local-based (através da localização) e a app-based (por meio de aplicativo), que suportam serviços de delivery, locomoção e vendas, essas plataformas são responsáveis por distribuir e suportar toda modernidade de trabalho e tecnologia. (BARZOTTO; LANNER, 2019)
Com a expansão deste mercado pelo mundo surgiu-se o fenômeno conhecido como “uberização”, este fenômeno tomou enormes proporções, sendo amplamente debatida por ser considerada uma forma de precarização de trabalho. A “uberização” é um dos fenômenos mais marcantes e importantes para demonstrar como ocorre as novas relações advindas da Economia do Compartilhamento, esta economia vem criando um mercado sem regulamentações e inóspito, a força das companhias se tornaram enormes tornando o prestador de serviço totalmente controlados (SLEE, 2017).
As plataformas de entregas, delivery de alimentos também vem crescendo significativamente sua participação de mercado no segmento de entrega alimentar, as maiores representantes do ramo são: Ifood, Uber Eats e a Rappi. De acordo com dados do sitio virtual da Ifood esta surgiu no ano de 2011, seu aplicativo foi criado e ativo em 2012, obteve rápida popularidade e em meados de 2016 a plataforma já alcançava 3 milhões de pedidos digitais, a empresa conta com mais de 160 mil entregadores, estes números faz com que o aplicativo de entrega seja o mais usado do País. (IFOOD. 2020)
Para se cadastrar na plataforma é necessário reconhecer que o aplicativo é apenas um intermediador e informar os dados pessoais, dados bancários, foto de rosto, informar o meio em que vai ser feito a entrega, anexar foto dos documentos (CNH, RG), e preencher diversos dados.
No mesmo prisma também surge a questão da falta de regulamentação do vínculo empregatício, entre o entregador delivery e o aplicativo de alimentação, essa situação deixa o entregador totalmente desamparado perante as leis trabalhistas, pois até o momento não é enquadrado como uma relação de emprego, considerando apenas como um prestador de serviço, considera-se algo semelhante como a uberização. Frisa-se ainda que esta profissão é de alto risco, o entregador está em contato direto com as mais diversas situações tanto no trânsito, quanto na segurança pessoal e saúde.
Para a plataforma Ifood, esta forma de trabalho não é tratada como um vínculo empregatício, sendo considerada pela plataforma apenas uma relação cível e comercial, o entregador e tratado como um profissional independente. (IFOOD.2020)
Como todo esse novo mercado tem se sustentando juridicamente? quais as bases jurídicas desses vínculos empregatícios? Todo esse cenário está em constante transformação jurisprudencial e doutrinária, porém toda essa evolução deve se basear em princípios, normas e estudos doutrinários.
2.2. Pilares jurídicos da economia do compartilhamento
No que tange a regulamentação, existe uma considerável dificuldade em o âmbito jurídico se adequar com a evolução do citado mercado, com isso pode gerar situações injustas para as partes envolvidas nessa onda da economia, segue o exemplo citado por Celestino (2017, p. 292):
Ressalte-se, por exemplo, a dificuldade diante dessas relações, em identificar os sujeitos tidos como consumidor e fornecedor, já que o Código de Defesa do Consumidor foi pensado inicialmente para relações tradicionais. Ou mesmo, a dificuldade em se caracterizar relação empregatícia entre as plataformas e os prestadores de serviços, podendo ser questionado, por exemplo: se o motorista que foi contactado via Uber é empregado da plataforma ou mero usuário do aplicativo.
Neste mesmo viés Celestino (2017, p. 292), menciona o seguinte raciocínio sobre a adaptação jurídica:
Não há dúvida que a economia compartilhada tem potencial de gerar novas formas de produção, organização e concorrência, bem como alterar ou aprimorar modelos já existentes. Esse novo modelo irá demandar adaptação também no âmbito do direito, uma vez que os institutos jurídicos tradicionais muitas vezes não se adequam a esses novos tipos de transação.
Como dito, diante tal poder de disseminação e expansão da citada economia, se tem enormes dificuldades em regular as atividades exercidas por meio desta, pois a mesma abarca os mais diversos ramos, sendo estes no transporte, na venda mercadorias online, no uso compartilhado de utensílios dentre vários outros serviços cada qual com suas peculiaridades.
Assim, temos hoje uma escassa regulamentação jurídica, visto que as atividades comerciais da economia se desenvolvem com bem mais rapidez do que os entendimentos e interpretações jurídicas.
Neste sentido vejamos, a ideia de Johal e Zon (2015), citado por Mansur (2018, p. 41):
As iniciativas colaborativas conseguem crescer de maneira muito mais rápida do que empresas de economia tradicional, pois a necessidade de infraestrutura e investimento são muito menores. Tal fato implica na existência de uma grande quantidade de características específicas das empresas de Economia Compartilhada e na dificuldade de categorização das mesmas. Esse cenário configura uma das principais dificuldades para se formalizar regulações.
Um dos maiores impasses da citada economia se encontra justamente nas suas relações jurídicas, consoante a isso, vejamos a seguinte fundamentação:
Entre as preocupações que a economia colaborativa conduz encontram-se as complexas relações jurídicas nela envolvidas, a imperiosidade de uma disciplina adequada e necessária do uso de algoritmo pelas plataformas e dos mecanismos utilizados por elas para gerar confiança nas pessoas. De fato, quase todos os estudiosos do tema, independentemente de apresentarem uma posição ideológica mais intervencionista ou mais simpática ao livre mercado, mencionam a reviravolta produzida com os conceitos jurídicos, em especial concernentes aos sujeitos de direito envolvidos, como a principal característica dessa nova relação jurídica. Por consequência, impõe-se um alto impacto nos conceitos tradicionais e nos sistemas de direito, principalmente naqueles que cuidam do direito do trabalho, do direito tributário, do direito concorrencial e do direito do consumidor. (OLIVEIRA, 2018, p.5)
Diante toda escassez de base jurídica surgem grandes desafios jurídicos como: Propriedade Intelectual; Responsabilidade das plataformas; e Responsabilidades Trabalhistas, sendo essa última a de maior discussão e divergências sobre entendimentos doutrinários e jurisprudenciais.
3 - RELAÇÕES DE EMPREGO E DE TRABALHO E SUAS PECULIARIDADES
3.1. Relação de emprego x Relação de trabalho
Preliminarmente é preciso entender como se diferencia as formas de trabalho existentes em nosso ordenamento jurídico, para isso é necessário ser feito uma análise de requisitos que caracterizam o enquadramento da relação em determinada forma de trabalho.
A primeira modalidade na qual vamos discorrer é a relação de trabalho, é importante mencionar que esta representa um gênero, na qual a relação de emprego representa uma espécie, a relação de trabalho é mais abrangente pois inclui outros diversos meios laborativos.
Para melhor compreensão leciona Delgado (2019, p. 365):
Teoria da Relação de Trabalho - A teoria da relação de trabalho parte do princípio de que a vontade - e, desse modo, a liberdade - não cumprem papel significativo e necessário na constituição e desenvolvimento do vínculo de trabalho subordinado. A prestação material dos serviços, a prática de atos de emprego no mundo físico e social é que seriam a fonte das relações jurídicas de trabalho - e não a vontade das partes, em especial do obreiro. Em face dessa suposição - tida como comprovada pela experiência concreta das relações empregatícias -, semelhante teoria afasta a referência ao contrato (ajuste de vontades) como veio explicativo central da relação de emprego.
Pelo exposto se chega à conclusão que “A relação de trabalho é gênero, sendo a relação de emprego uma de suas espécies” (ROMAR, 2018, p. 130).
Neste mesmo sentido, a autora Romar (2018, p. 130) explana:
A diferença entre relação de emprego e relação de trabalho está no fato de a primeira ser específica e a última ser genérica, ou seja, como relação de trabalho podem ser consideradas todas as relações jurídicas fundadas em uma obrigação de fazer consubstanciada no trabalho humano, enquanto somente existirá relação de emprego quando o trabalho humano se desenvolver de forma não eventual e subordinada, sendo prestado com pessoalidade e mediante remuneração.
Delgado (2019, p. 333), frisa a seguinte comparação em sua obra Curso de Direito do Trabalho:
Relação de Trabalho versus Relação de Emprego - A Ciência do Direito enxerga clara distinção entre relação de trabalho e relação de emprego. A primeira expressão tem caráter genérico: refere-se a todas as relações jurídicas caracterizadas por terem sua prestação essencial centrada em uma obrigação de fazer consubstanciada em labor humano. Refere-se, pois, a toda modalidade de contratação de trabalho humano modernamente admissível. A expressão relação de trabalho englobaria, desse modo, a relação de emprego, a relação de trabalho autônomo, a relação de trabalho eventual, de trabalho avulso e outras modalidades de pactuação de prestação de labor (como trabalho de estágio, etc.). Traduz, portanto, o gênero a que se acomodam todas as formas de pactuação de prestação de trabalho existentes no mundo jurídico atual.
No tocante a relação de emprego, Romar afirma (2018, p. 116):
A relação de emprego é uma espécie de relação de trabalho, que se baseia no nexo entre empregador e empregado, caracterizado pela prestação pessoal de serviços, de forma não eventual e subordinada, mediante o pagamento de salário”. Neste caso há um vínculo jurídico entre empregado e empregador, estes regulados pelas normas jurídicas do trabalho, sendo assim uma relação específica na qual possui características próprias que permitem se diferenciar das demais maneiras de prestação de serviço.
Para se ter uma análise satisfatória da relação de emprego, se tem que observar os seguintes parâmetros: pessoalidade, não eventualidade, subordinação hierárquica ou jurídica e onerosidade, para caracterização da relação de emprego, tem que estar presente todos estes requisitos, sob pena não reconhecimento de da citada relação. Diante tal explanação faz-se necessário o detalhamento dos requisitos citados acima.
Pessoalidade: Conforme preconiza o artigo 3°, caput, da Consolidação de Leis Trabalhistas, lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, “Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário” (BRASIL, 1943), desta forma é cristalino que empregado é um trabalhador pessoa física, que presta serviços pessoalmente, isto é, não pode fazer-se substituir por terceiros, via de regra, o empregado é sempre pessoa física, ou seja, intuitu personae (ROMAR, 2018).
Não Eventualidade: O serviço prestado pelo empregado deve acontecer continuamente, desta forma, deve ser constante e habitual. Resende (2020, p. 77), leciona que “trabalhador não eventual é aquele que trabalha de forma repetida, nas atividades permanentes do tomador, e a este fixado juridicamente”.
Com foco no princípio da primazia da realidade, a adequação da não eventualidade se dá pela situação individualizada de cada caso, visto que este requisito é um dos mais controvertidos no Direito do Trabalho, pois existem diversas teorias a respeito, assim necessitando de um olhar interpretativo em cada situação fática (BELTRÃO, 2019).
Subordinação: Para grande parte dos doutrinadores, esse aspecto se torna um dos mais importantes e relevantes para evidenciar a relação empregatícia, há sustentações no sentido de que a subordinação decorre da situação de “dependência” (CLT, art. 3°) do empregado em relação ao empregador, porém o que se torna dependente é o seu trabalho laboral seja ele físico ou mental, este fica em um estado de sujeição ao poder diretivo, regulamentar e disciplinar (LEITE, 2020).
Neste prisma segue a seguinte decisão citada por Leite (2020, p. 186):
CONTRATO DE FRANQUIA. EXISTÊNCIA DE SUBORDINAÇÃO JURÍDICA. RELAÇÃO DE EMPREGO CONFIGURADA. Prevalece no Direito do Trabalho o princípio da primazia da realidade, pelo qual as relações jurídicas são definidas e conceituadas pelo seu conteúdo real, sendo irrelevante a denominação ou a roupagem que lhes foi atribuída pelas partes. Neste norte, oferecida a mão de obra sob fiscalização e controle da reclamada, para prestação de serviços na sua atividade-fim, escorreita a decisão de origem que reconheceu o vínculo de emprego entre as partes. Recurso empresário desprovido ao enfoque (TRT 3a R., RO 0012036-74.2016.5.03.0044, Rel. Des. Julio Bernardo do Carmo, 5a T., DEJT 08.07.2019).
Neste sentido o autor, Resende (2020, p. 81), menciona em sua obra Direito do Trabalho, 8°th edição, a lição de Alice Monteiro de Barros na qual preconiza:
Esse poder de comando do empregador não precisa ser exercido de forma constante, tampouco torna-se necessária a vigilância técnica contínua dos trabalhos efetuados, mesmo porque, em relação aos trabalhadores intelectuais, ela é difícil de ocorrer. O importante é que haja a possibilidade de o empregador dar ordens, comandar, dirigir e fiscalizar a atividade do empregado. Em linhas gerais, o que interessa é a possibilidade que assiste ao empregador de intervir na atividade do empregado. Por isso, nem sempre a subordinação jurídica se manifesta pela submissão a horário ou pelo controle direto do cumprimento de ordens.
De acordo com o entendimento do art.6°, parágrafo único, CLT, é lecionado no sentido de que o trabalho realizado a distância, por meios telemáticos e informatizados de comandos, estes servem como controle e supervisão, no qual se equiparam ao realizado no estabelecimento do empregador, desde que se caracterizem os pressupostos da relação de emprego (ROMAR, 2018).
No que tange a caracterização da subordinação, se torna cada dia mais difícil sua adequação a evolução dos reais meios de trabalho, pois com o desenvolvimento tecnológico surgiram atividades laborativas bem mais dissociadas, originando uma relação com maior independência.
Onerosidade: A execução do serviço não será de forma gratuita, tendo visto que seu objetivo final é a remuneração por determinado serviço prestado.
De acordo com a interpretação feita por Moura (2019, p. 30), dos Artigos 458 e 459 do Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, compreende-se: “A onerosidade, conforme extraido de seu pronome, pressupõe a existência de uma relação onerosa entre as partes, ou seja, a existência de uma contraprestação mediante a prestação de determinados serviços, podendo ser em pecúnia ou, parcialmente, em utilidades por dia, semana ou mês.”
Desta forma nasce uma relação onerosa entre os sujeitos, empregador-empregado, na qual também é necessária a adequação deste requisito para a caracterização da relação de emprego.
3.2. Princípios trabalhistas e constitucionais
As bases norteadoras de qualquer ramo do Direito se advêm dos princípios e bons costumes, tanto constitucionais como específicos, inicialmente cabe descrever os princípios constitucionais basilares do trabalho que surgem a partir da Constituição Federal, são eles: a) princípio da dignidade da pessoa humana; b) princípio da centralidade da pessoa humana na vida socioeconômica e na ordem jurídica; c) princípio da valorização do trabalho e do emprego; d) princípio da inviolabilidade do direito à vida; e) princípio do bem-estar individual e social; f) princípio da justiça social; g) princípio da submissão da propriedade à sua função socioambiental; h) princípio da não discriminação; i) princípio da igualdade, especialmente a igualdade em sentido material; j) princípio da segurança; k) princípio da proporcionalidade e da razoabilidade; l) princípio da vedação do retrocesso social. (DELGADO, 2019, p.227)
O núcleo de toda ordem jurídica está no primeiro princípio elencado, sendo ele a dignidade da pessoa humana (CF, art. 1o, III), este princípio se encaixa acima de tudo nas relações empregatícias, tendo como foco a hierarquia e subordinação exercida pelo empregador, na qual deixa o empregado em uma situação hierarquicamente inferior, junto a esse se tem todo um conjunto de princípios que se ramificam e interligam entre si.
Os princípios constitucionais se desdobram em princípios específicos que são considerados nas mais diversas legislações e jurisprudências trabalhistas, Delgado considera 9 (nove) princípios específicos como principais norteadores do Direito do Trabalho, formando assim um núcleo jus trabalhista no qual possui abrangência e generalidade, além das formuladas fundamentações, o autor Bezerra (2020, p.96) sustenta que estes princípios exercem função tríplice: Normativa, informativa e interpretativa, nas quais oferecem perspectivas de novas idealizações jurídicas.
Como os princípios específicos também são de extrema relevância, se faz necessário uma análise aprofundada sobre suas peculiaridades, o primeiro a ser abordado é: 1) Princípio da proteção, constitui proteção a parte mais vulnerável e hipossuficiente da relação de emprego, visando ter balanceamento hierárquico nas partes envolvidas na relação; 2) Princípio da norma mais favorável, trata-se da aplicação da norma mais benéfica ao trabalhador; 3) Princípio da imperatividade das normas trabalhistas, visa garantir ao trabalhador direitos fundamentais que poderiam ser mitigados dependendo das cláusulas contratuais; 4) Princípio da Indisponibilidade dos Direitos Trabalhistas, “Art. 9º - Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação” (BRASIL, 1943), o objetivo deste princípio é proteger o trabalhador de qualquer coação exercida pelo empregador visando renunciar de algum direito indisponível (PARMEGIANE; SANTOS, 2021); 5) Princípio da condição mais benéfica, “este princípio importa na garantia de preservação, ao longo do contrato, da cláusula contratual mais vantajosa ao trabalhador” (DELGADO, 2019, p.238); 6) Princípio da Inalterabilidade Contratual Lesiva, “Pelo princípio da inalterabilidade contratual lesiva são, em regra, vedadas as alterações do contrato de trabalho que tragam prejuízo ao empregado. Ao contrário, as alterações favoráveis ao empregado são permitidas e inclusive incentivadas pela legislação.” (RESENDE, 2019, n.p), vale ressaltar que existem previsões legais licitas em que se pode haver alterações coletivas, desta forma não se tornando absoluto; 7) Princípio da Intangibilidade Salarial, este princípio é baseado como caráter alimentar, pois através do salário se provem o sustento financeiro, utilidade essencial da humanidade. Como citado por Resende (2019, n.p), o principio garante direitos como: Irredutibilidade salarial, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo, conforme previsto no art. 7º, VI, da CRFB; prazo para pagamento dos salários (art. 459 e 466 da CLT); modo e local para pagamento dos salários (art. 465 da CLT); vedação a descontos indevidos (art. 462 da CLT); impenhorabilidade dos salários como regra (art. 833, IV, do CPC/2015); preferência dos créditos trabalhistas no caso de falência do empregador (Lei nº 11.101/2005); 8) Princípio da Primazia da Realidade sobre a Forma, para Romar (2018, p. 59), transparece tal princípio que os fatos são mais relevantes do que o declarado formalmente, o principio tem relevante importância nas decisões trabalhistas, ainda mais no que se refere a intenção de ocultar um vinculo empregatício e por último mas não menos importante, temos o: 9) Princípio da Continuidade da Relação de Emprego, este instituto está baseado na estabilidade e programação do trabalhador, o principio oferece como regra que o contrato de trabalho seja por tempo indeterminado.
De acordo com Leite (2020, p.112):
Há diversas situações em que o princípio em tela pode ser aplicado, como na hipótese de dúvida acerca da manifestação das partes quanto à duração do contrato. Aplicando-se o princípio em questão, há de se interpretar que o con-trato fora firmado por tempo indeterminado. No caso de alegação patronal de abandono do emprego, cabe ao empregador o ônus de provar o animus abando-nandi do empregado.
Todos os princípios exarados neste capitulo desempenham relevante papel na interpretação, manutenção e evolução da justiça do trabalho, estes são um dos principais norteadores do ramo jurídico, são diretrizes que balizam as normas e decisões, qualquer relação trabalhista que extrapole os limites ditados pelos conceitos citados, está de total desacordo, jurídico, jurisprudencial, teórico e doutrinário.
Para se entender como o Direito do trabalho é construído e baseado se faz necessário largo estudo principiológico e jurídico, para submeter toda essa base com as relações que a evolução humana e tecnológica vem trazido para os vínculos empregatícios, e como toda essa evolução se desalinha das bases tradicionais do Direito do Trabalho.
3.3. Precarização do trabalhador
De início cabe-se ressaltar que o Direito do Trabalho preza pela proteção do empregado, diante a pressão do capitalismo, se torna evidente o uso da força trabalhadora para alavancar riquezas e garantir o funcionamento de todo ciclo capitalista.
Com o adiantar do tempo a forma e os modelos de trabalho evoluíram e mudaram, com isso vem se tornando um sistema capitalista globalizado que gera e explora oportunidades de negócios a todo instante, neste contexto se torna evidente as precarizações e complicações que podem surgir com as relações trabalhistas. (SOLIMANI e SIMÃO, 2017, p.582)
Como ideia inicial se teve que os trabalhadores das novas formas de trabalho são “microempreendedores”, porém não é necessário adentrar muito ao assunto para entender a tão rápida e intensa precarização dos trabalhadores que estão submetidos a nova onda da economia do compartilhamento.
Na realidade o que vem sendo criado é uma classe invisível de trabalho, que oferece comodidade para os usuários mas pelo outro lado se precariza como trabalhador, essa classe de trabalho é tratada como prestadores de serviços, em que na maioria das vezes estão neste segmento pela falta de oportunidade. (RIBEIRO, 2016, p.16)
Os trabalhadores que estão atuando neste meio, estão sendo cada dia mais controlados, com políticas e regras rígidas, podendo inclusive ser caracterizado como uma subordinação jurídica, Moreira (2019, p.67) descreve diversas ferramentas de controle do aplicativo Uber, dentre elas: o monitoramento de motoristas via GPS, inclusive para puni-los, em caso de aproximação de locais onde acontece manifestação, para evitar confronto com taxistas; a manipulação do preço a ser pago pelas corridas, através da chamada tarifa-dinâmica; a discriminação de candidatos à motoristas em razão de antecedentes criminais; o bloqueio de motoristas por inatividade; a suspensão de motoristas por recusa à corridas; atribuição de nota aos motoristas; controle de tempo online e da quantidade de pedidos atendidos; política de incentivo aos motoristas que ficassem online em certos eventos, sendo remunerado pela quantidade de horas que estivesse ativo, e não apenas pelas corridas realizadas.
Como exemplo pode-se demonstrar a empresa de serviços delivery Rappi, os termos e condições de uso de plataforma virtual rappi, submetem o trabalhador a determinado controle, sendo totalmente mascarado pela prestação de serviço como é tratado:
“I. A OPERADORA, em virtude destes termos e condições, mantenha em seu banco de dados, informações do ENTREGADOR tais como: Nome, Sobrenome, E-mail, Telefone, Endereço, Fotografias, informações bancárias e demais informações necessárias para sua inscrição e prestação de serviço aos CONSUMIDORRES. Tais informações poderão ser armazenadas pela OPERADORA com a finalidade de comunicar aos CONSUMIDORES para a prestação adequada do serviço e para comunicar ao ENTREGADOR sobre informação comercial, publicitária e de mercado relacionada com sua atividade comercial.
II. As informações obtidas, de igual modo, podem ser utilizadas para fins de objeto de análise para a estratégia de negócios do portal web e da PLATAFORMA, apoiada em ferramentas de inteligência de negócios e descrição de dados, que permitam adquirir conhecimentos prospectivos para fins de previsão, classificação e segmentação do ENTREGADOR.
[...]
IV. Que a OPERADORA utilize tecnologias comuns de internet para acompanhar as eventuais interações do ENTREGADOR com o FORNECEDOR, CLIENTE ou com a PLATAFORMA, inclusive com coleta e armazenamento de endereço de IP (Internet Protocol), página solicitada, tempo de duração do acesso, tipo de aparelho ou terminal, navegador, a operadora de telefonia celular, provedor de acesso à internet ou quaisquer outras formas legítimas de interação.
Com isso pode ser analisado todas as características da rota em que o entregador faz, com velocidade, ruas, quantas vezes ele sai do aplicativo, quantas entregas são rejeitadas, dessa forma é simulado o valor da entrega.
Quem se responsabiliza pela administração e direcionamento dos percursos é o próprio aplicativo, sendo direcionada pela rota mais lucrativa para a empresa (aplicativo), se tornando irrelevante a viabilidade para o entregador, além de penalidades caso o entregador recuse uma determinada quantidade de entregas, no caso do aplicativo Ifood, o entregador pode ser punido por 24 hrs de bloqueio e caso não tenha boa avaliação também pode se enquadrar em alguma punição.
Carlos Cosentino afirma que:
Os softwares de computador monitoram cada passo dos usuários dos sistemas, propiciando absoluto controle do capital sobre o trabalho. Como se vê, as novas modalidades de trabalho desencadeiam ainda mais controle e o trabalhador sofre ainda mais cobranças, através da sua chefia e da própria máquina. (COSENTINO, 2017, p.299)
Em conjunto com a subordinação jurídica surge-se a pessoalidade, o cadastro e conta do entregador é intransferível, o que significa que somente pode operar na conta, o detentor do CPF daquele cadastro, não podendo o serviço ser prestado por outra pessoa sem ser o do cadastro em uso.
Somente é possível laborar no aplicativo depois do cadastro completo com dados pessoais, reconhecimento facial, além disso se faz possível com que o próprio cliente faça o reconhecimento do proprietário da conta e do entregador que presta o serviço, visto que pode haver a comparação de dados e personalidade disponibilizados pelo aplicativo, sendo reconhecida alguma distorção ou não conformidade com os dados do aplicativo e o entregador, pode ser feita uma denúncia e averiguação da situação podendo a conta em analise ser suspensa e bloqueada.
Compreende-se que se torna extremamente necessário a natureza personalíssima, tanto para a parte do aplicativo como para o cliente, pois é necessário ter a segurança e confirmação de quem está prestando o serviço.
O requisito da não eventualidade se faz subjetivo com conexão ao princípio da primazia da realidade, onde se faz necessário a análise do caso concreto em que o trabalhador esta submetido.
Beltrão explana que é primordial individualizar a situação e fazer uma analogia especifica, pois o tema é um dos mais controvertidos no direito do trabalho.
De acordo com uma pesquisa realizada na cidade de Recife, a grande maioria dos entregadores trabalham todos os dias da semana, e em maioria até 12 horas por dia. (ARAUJO,2019,p.17)
A situação do grande número de desemprego demonstra como cada vez mais os prestadores de serviço se mantem habitualmente nos aplicativos, utilizando de forma integral como meio para o sustento do lar.
Rodrigo Carelli realizou uma pesquisa com 40 motoristas com o objetivo de examinar perfis e dados de quem trabalha por meio do aplicativo uber, sobre a jornada de trabalho chegou as seguintes conclusões:
Quanto ao tempo de trabalho, verifica-se que, apesar de 15 entrevistados, ou seja, 37,5% dos motoristas terem informado que detêm outra fonte de renda, somente 7,5% trabalham na Uber até 25 horas, que é o limite do trabalho a tempo parcial na legislação brasileira (art. 58-A, Consolidação das Leis do Trabalho). Isto é, 92,5% realizam quantidade de horas semanais que os colocariam na posição de trabalhadores a tempo integral, e não “part-time” ou a tempo parcial. Além disso, verifica-se que 70% dos trabalhadores ultrapassam a duração semanal normal de trabalho de 44 horas. Mais de um terço dos trabalhadores (35%) realizam módulos de trabalho exaustivos de mais de 61 horas semanais, podendo até ultrapassar 90 horas. (CARELLI, 2017, p.132)
É admissível que a prestação de serviço não precisa ser continua como observado no contrato intermitente em que pode haver tempos de não atividade, ainda resta explanado na CLT, art. 443, §3°, que independe de quem queira determinar a não atividade, podendo ser o empregador ou o empregado. (BELTRÃO, 2019)
A contraprestação financeira é calculada pela quantidade de entregas e por critérios específicos do aplicativo, sendo este valor transferido para a conta cadastrada no citado perfil do entregador, tal situação enquadra-se perfeitamente no quesito onerosidade, pois o entregador realiza a atividade com o objetivo de receber sua quantia financeira.
Diante toda situação apresentada se tem um resultado de insegurança trabalhista nesta nova camada do mercado, pois estes trabalhadores estão totalmente desamparados pelo aplicativo, por não receberem nenhum suporte caso haja algum acidente de trabalho, afastamento por problemas de saúde dentre outros problemas, e por não ser configurado como uma relação de emprego o entregador não tem nenhum amparo trabalhista, não tem registro na CTPS (Carteira de Trabalho e Previdência Social), não possui direito a férias remunerada no qual preconiza o art. 134 da CLT, não é assegurado pela continuidade das necessidades financeiras com o seguro-desemprego até que encontre um novo trabalho (art. 7, II, CF), seguridade social do trabalhador, funciona como uma poupança sendo possível o saque do valor depositado caso em algumas situações, conhecido como Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), garantido na CF, art 7, III. Em caso de doença, afastamento por problemas de saúde, incapacidade temporária ou permanente para o trabalho e idade avançada, o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) visa garantir a manutenção a manutenção da renda do trabalhador (art. 201, CF), também é garantido ao trabalhador com carteira assinada o Descanso semanal remunerado (DSR), que concede um dia de folga remunerada por semana (art.7, XV, CF).(BRASIL, 1988)
Dentre todos os benefícios acima listados os trabalhadores da nova era da economia do compartilhamento não são beneficiados por nenhuma garantia listada, com isso não possuem nenhuma segurança trabalhista, financeira e social, as novas formas de trabalho estão obrigando a classe trabalhadora a se auto precarizar, e aceitar todos os termos e condições impostos pelos aplicativos.
Vale ressaltar que essa camada mesmo trabalhando em média 8 horas por dia, possui muitas vezes renda inferior a um salário mínimo, e todas as despesas com a entrega, meio de transporte, manutenção do transporte e instrumentos de trabalho são custeados pelo próprio entregador que está em uma situação desvantajosa e economicamente fragilizado, ainda surge uma grande preocupação com essa situação que é o índice de acidentes de trânsito, quando sofrem algum acidente ficam totalmente sem renda e desamparados. (ARAUJO, 2019, p.19)
Ainda existe uma grande preocupação que é como tudo isso que está acontecendo agora irá se refletir no nosso futuro, como estará os trabalhadores da economia do compartilhamento daqui 20, 30 anos? Trabalharam boa parte da sua vida da forma em que não garantiu e preveniu seus direitos a um futuro estabilizado e seguro, provavelmente essa camada “prestadora de serviços”, ficara extremamente prejudicada com esse “micro empreendedorismo” sem visão de futuro.
É na atual Divisão Internacional do Trabalho, reforçada pela ampla inserção da tecnologia no mercado, que se evidenciam as precarizações herdadas da época colonial. O desemprego estrutural dos países periféricos é o perfeito encaixe para a lógica de constante ampliação do lucro. O mercado de trabalho está inserido em um contexto capitalista que se utiliza da lógica do desemprego estrutural para a manutenção da pouca oferta de postos de trabalho em detrimento da demanda, o que gera uma desvalorização do trabalhador ao ter que se submeter a quaisquer condições de trabalho por estar sempre rodeado pela ameaça do desemprego. Nesse sentido, além de disciplinador das forças de trabalho, uma vez que é constante o risco de substituição, o desemprego também faz a divisão entre os que estão incluídos e os que estão excluídos do mercado de trabalho formal. Os excluídos, as empresas transnacionais tratam de incorporar ao seu contingente de mão-de-obra disponível para desempenhar o que Abílio (2020) entende por “trabalho amador”, um trabalho sem identidade profissional e permanentemente tratado como uma “oportunidade de complementação de renda”. (GONÇALVES, 2020, p.65)
Toda essa onda da economia do compartilhamento nos leva a um grande retrocesso trabalhista, pois estamos abrindo mão de direitos que foram conquistados historicamente, visando garantia e condições de trabalho para a classe trabalhadora, que muitas vezes é hipossuficiente.
3.3.1. Desigualdade lucrativa entre aplicativo e trabalhador.
As novas demandas de trabalho mascaram um extremo desequilíbrio lucrativo entre aplicativo-entregador, a definição de valores e disponibilidade de pagamento é feito pelo aplicativo, desta forma quem manipula toda remuneração é a empresa tecnológica, a forma de remuneração do aplicativo uber é da seguinte maneira:
A empresa reclamada define, de forma exclusiva, toda a política e intermediação do pagamento do serviço prestado, desde o preço pela corrida às formas de pagamento. Nesse ponto, vale mencionar o sistema de tarifa dinâmica utilizado pela Uber, modalidade que leva em consideração a demanda atual para os ajustes do preço. A Uber que remunera seus motoristas, semanalmente, conforme as corridas que realizaram no período. Para tanto, retira seu percentual (entre 20 a 25 %) e repassa o restante do valor ao trabalhador. A tarifa é fixada exclusivamente pela Uber, sem qualquer possibilidade do motorista e do passageiro negociarem um valor maior. (OHOFUGI, 2019, p.36)
Significativa porcentagem do valor fica para o aplicativo responsável por esse “intermédio” de trabalho, sendo que todos os custos logísticos é de total responsabilidade do entregador, resumidamente o entregador arca com todas as despesas, fica com uma desfavorável parcela do valor e não tem nenhuma segurança jurídica. Isso faz com que o entregador perdure por longas horas para poder ter um rendimento ao menos um pouco significativo.
De acordo com O Estadão:
Hoje esses empregados de plataformas como Uber e iFood representam, apenas no Brasil, quase 4 milhões de pessoas, maioria dessas que obtém como principal fonte de renda os aplicativos Isso faz dos aplicativos o maior empregador do Brasil, (Gavras, ESTADÃO, 2019)
De acordo com dados levantados em uma pesquisa feita no estado de São Paulo, os entregadores ciclistas de aplicativo que trabalham todos os dias da semana de 9 a 10 horas por dia, tem um ganho médio de apenas R$ 992,00 por mês. (ALIANCABIKE,2020)
A realidade é que as empresas definem os preços, as entregas, a oferta e a demanda, ao organizar a distribuição dos trabalhadores pela cidade, e externalizam todos os custos ao trabalhador (responsabilidade pela jornada de trabalho e ferramentas de trabalho), remunerando-o somente por aquilo que ele produz. As jornadas de trabalho são extensas e há uma dissolução entre a linha que separa o que é ou não trabalho, vez que o trabalhador se encontra permanentemente à disposição para quando for “acionado” pelo aplicativo que passa a “moldar sua vida toda à demanda (ou possibilidade de encontrá-la) por seus serviços” (ANTUNES; FILGUEIRAS, 2020, p. 36 apud GONÇALVES, 2020, p.66).
Como já indicamos, as baixas remunerações são condição essencial para a submissão dos trabalhadores a longas jornadas. Há várias evidências de que isso procede de maneira dramática, como ilustra o print acima, em que o entregador trabalhou sete dias seguidos, ficou on-line por mais de 61 horas, e recebeu apenas 212 reais. Em São Paulo, trabalhando 09h24min por dia, os entregadores ganham R$ 936,00 por mês (PERFIL, 2019); se fosse uma jornada legal de 44 horas, eles receberiam R$762,66 por mês. Em Salvador, um/a entregador/a recebe, em média R$ 1.100,00 por mês; mas, quando se restringem a uma jornada de 44 horas, conseguem apenas R$780,64 mensais. Em ambos os casos, a renda média da jornada regular é muito inferior ao salário mínimo. (ANTUNES; FILGUEIRAS, 2020, p. 36)
O que tem acontecido é um falso desenvolvimento e uma mascarada oportunidade de crescimento aqueles que necessitam de uma renda em curto prazo, isso faz com que cada vez mais o ciclo de trabalhadores de aplicativo aumente e suas rendas fiquem cada vez mais reduzidas, além de se tornar um prestador de serviços entendido até o momento por alguns tribunais nenhum vínculo empregatício com os aplicativos.
4 - Tribunais Trabalhistas e seu entendimento
Os tribunais estão com decisões divergentes em relação ao tema. Uma recente decisão dos julgadores da 11ª Turma do TRT-MG, reconheceu vínculo empregatício de um motorista de aplicativo com a Uber, foi concluído pela turma que essas demandas exigem uma análise diferente das demais pois trata de novas formas de trabalho, neste caso ficou evidente que o motorista realizou serviços em favor da reclamada, por preencher todos os requisitos de um vinculo empregatício: Cadastro individualizado na plataforma, sendo vedado a utilização do cadastro para outras pessoas; Remuneração, com os repasses feitos do aplicativo para o motorista, com fixação do valor pelo aplicativo e ainda pagamento de prêmios aos que se destacarem; Continuidade na prestação de serviços é demonstrado pelo histórico de viagens demonstrando a não eventualidade; Subordinação através da tecnologia/algorítmico, controle de viagens, avaliações, controle de taxa de cancelamento, desta forma restou comprovado o vínculo empregatício de acordo com os requisitos previstos nos artigos 2º e 3º da CLT.
Depreende-se que no presente caso de uberização do trabalho foi reconhecido o vínculo empregatício, visto que todos os requisitos da relação de emprego foram enquadrados por analogia ao caso especifico. Decisão essa que conservou a proteção da justiça, com fundamento constitucional.
Neste julgado ainda pode-se perceber no evidente caso concreto a tentativa do aplicativo em mascarar a relação de emprego e ainda pode-se perceber artimanhas com intuito de celebrar acordo dependendo da distribuição dos processos em segundo grau.
O que ocorre é que as vésperas das sessões de julgamento os aplicativos oferecem acordos ensejando a retirada de pauta dos processos, porém é defendido pelo relator, que as vésperas de sessão de julgamento não se pode afastar a análise da questão, ainda mais no que se refere a garantia de direitos.
O Ministerio Publico do Trabalho emitiu o seguinte parecer:
“O que está a ocorrer é que a empresa estava manipulando o resultado da distribuição de processos em segundo grau, ou seja, dependendo do entendimento jurídico predominante que era anteriormente conhecido por todos, através dos acórdãos anteriores, assim a empresa tenta impedir o julgamento através de celebrações de acordos”.
No presente caso ficou claramente demonstrado a intenção do aplicativo em se esquivar do julgamento, visto o entendimento da corte ser no sentindo do justo reconhecimento do vínculo empregatício.
Neste mesmo sentido a decisão dos Julgadores da Primeira Turma do TRT-MG, no processo sob n°. 0010761-96.2019.5.03.0008, Relatora. Des. Maria Cecília Alves Pinto:
Julgadores da Primeira Turma do TRT-MG reformaram decisão do primeiro grau para reconhecer a relação de emprego entre um motoboy entregador e a empresa iFood.com Agência de Restaurantes Online S.A., conforme voto da desembargadora Maria Cecília Alves Pinto, relatora do processo. Apesar do esforço da iFood em mascarar os traços característicos da relação subordinada de trabalho, o que se convencionou chamar de "uberização das relações de emprego", foram provados os pressupostos dos artigos 2º e 3º da CLT.
Segundo a magistrada, as disposições contidas no manual do entregador da iFood, que previam a "inexistência de vínculo empregatício", não determinam a regularidade da relação jurídica estabelecida entre as partes, em face do princípio da verdade real e da primazia da realidade sobre a forma. A relatora destacou, ainda, a existência de fraude, conforme o artigo 9º da CLT, e reconheceu o vínculo de emprego no caso. O processo foi encaminhado ao juízo de origem para apreciação do pedido de rescisão indireta. (TRT3-MG, 1° turma. 2020)
A relatora além de enquadrar todos os requisitos do vínculo trabalhista ainda concluiu que:
A relatora destacou que a iFood tem por objeto social, entre outros, "a agência de restaurantes, bares, padarias e quaisquer outros estabelecimentos comerciais, por meio de plataformas digitais que poderão ser acessadas por sites na internet ou aplicativos para celulares desenvolvidos pela Companhia", e "a promoção de vendas e o planejamento de campanhas". No entanto, constatou que a atividade principal da empresa é o agenciamento e intermediação entre estabelecimentos parceiros e clientes finais, sendo imprescindível o trabalho dos entregadores, que executam, em última análise, o objeto social da iFood. Havia também o controle do labor prestado pelo entregador, que, inclusive, poderia sofrer punições no caso de reclamações dos clientes (restaurantes e consumidores finais). (TRT3-MG, 1° turma. 2020)
Ficou diagnosticado pela relatora a fraude trabalhista, pois mesmo constando no manual do entregador que inexiste vínculo empregatício não restou provado a eficácia da relação jurídica entre o aplicativo-entregador, houve a conclusão que deve-se aplicar o que preconiza no artigo 9º da CLT, pois restou evidenciado fraude na situação. (TRT3-MG, 1° turma. 2020)
O Tribunal Regional do Trabalho da 10° região, 22ª vara do trabalho de Brasília-DF, decidiu no mesmo sentido dos julgados acima:
“Aliás, a situação dos motociclistas prestadores de serviços em entregas rápidas, tais como a gerenciada pela segunda ré (IFOOD), já é conhecida desta Justiça Especializada.
[...]
Do mesmo modo ocorre em situação análoga, delineada pela doutrina e jurisprudência como processo de “Uberização” das relações laborais, definidor de um novo padrão de organização do trabalho a partir dos avanços da tecnologia... Dessa forma, evidente a presença dos pressupostos fático-jurídicos caracterizadores do vínculo empregatício entre as partes, previstos no arts. 2º e 3º da CLT, quais sejam: pessoalidade, não-eventualidade, onerosidade e subordinação jurídica.”
No âmbito do Superior tribunal de justiça, no ano de 2019 houve manifestação sobre o crítico caso da vinculação empregatícia, além do conflito de competência arguido sob nesses casos, segue caso concreto:
CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. INCIDENTE MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C.C. REPARAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS AJUIZADA POR MOTORISTA DE APLICATIVO UBER. RELAÇÃO DE TRABALHO NÃO CARACTERIZADA. SHARING ECONOMY. NATUREZA CÍVEL. COMPETÊNCIA DO JUÍZO ESTADUAL.
[...]
4. Compete a Justiça Comum Estadual julgar ação de obrigação de fazer c.c. reparação de danos materiais e morais ajuizada por motorista de aplicativo pretendendo a reativação de sua conta UBER para que possa voltar a usar o aplicativo e realizar seus serviços. (STJ. CONFLITO DE COMPETÊNCIA Nº 164.544 - MG (2019/0079952-0). Relator: Ministro MOURA RIBEIRO – Julgado em: 28/08/2019, S2 - SEGUNDA SEÇÃO DJe 04/09/2019: RSTJ vol. 257 p. 141)
Vale ressaltar que existem inúmeros processos sobre o pedido de reconhecimento de vínculo empregatício entre aplicativo-entregador, esse direito tem sido pleiteado em todo território nacional, e a maioria deles se encontram no TRT da 3ª Região (MG), com 310 casos, dentre as julgadas, os entregadores perderam em 104, foram parcialmente aceitas 24 ações e em 62 dos casos foram fechados acordos. São Paulo é o segundo Estado em ações. Os tribunais de Campinas (TRT-15) e o da capital (TRT-2) adotam entendimentos diferentes. Em Campinas, há 167 ações, dentre as julgadas, os entregadores perderam em dois casos, 12 pedidos foram concedidos parcialmente e um terminou em acordo. Já no TRT de São Paulo, são 159 ações sobre o tema. Em 30, os entregadores perderam, oito tiveram os pedidos concedidos parcialmente, 18 ações terminaram em acordo e em apenas uma houve vitória do trabalhador. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) ainda não decidiu o tema para os entregadores, mas já se mostrou favorável às empresas de apps de transporte, em um processo envolvendo motorista.(GROSSI,2020)
Contudo ainda não se há uma uniformização nas decisões visto que cada tribunal tem entendido de maneiras distintas, o que se pode perceber é que os aplicativos procuram fazer o maior número de acordos possíveis visto a heterogeneidade das decisões, com isso o aplicativo não tem exatidão e pode chegar a pagar todas as verbas trabalhistas caso o entregador tenha tido situação favorável no processo.
Apesar das divergências, as decisões que reconhecem o vínculo empregatício, nos garantem segurança e equilíbrio socioeconômico, o grande desafio da justiça trabalhista brasileira é tornar essa situação equânime e formalizar toda essa classe trabalhadora, desta forma mesmo com a globalização tecnológica deve-se defender relações trabalhistas justas e protetivas.
5 – CONCLUSÃO
No presente artigo pretendeu-se demonstrar como as inovações tecnológicas trazidas pela economia do compartilhamento mudaram a realidade trabalhista e como tudo isso afeta a vida do trabalhador de aplicativo, diante todo estudo foi demonstrado os quesitos e princípios constitucionais e trabalhistas que norteiam todo entendimento e enquadramento do direito do trabalho.
Para isso foi considerado todas características e fundamentos trabalhistas nos quais se encaixaram perfeitamente na descrição e analise de todo contexto e realidade dos trabalhadores via aplicativo.
Pois bem, o maior objetivo deste artigo é demonstrar a tamanha precarização dos trabalhadores e suas escassas condições de trabalho, impacto atual e futuro em sua vida econômica e escassa ou nenhuma segurança financeira-social.
Por se tratar de uma situação de diferentes entendimentos, a justiça brasileira busca adequar e uniformizar as decisões com base em uma justiça equilibrada e responsável, com base no equilíbrio e reconhecimento de toda defesa histórico trabalhista que foi conquistado, o falta de analogia ao caso concreto leva com que a parte hipossuficiente da relação se torne absolutamente prejudicada e sem nenhuma voz ativa.
Com base nos estudos jurisprudências se pode concluir que muitas decisões no sentido de reconhecimento do vínculo empregatício, pois todos os requisitos da relação de emprego são totalmente preenchidos, sem dúvidas o entendimento contrário ao reconhecimento do vínculo empregatício nos leva a uma exploração de mão de obra sem qualquer segurança, vínculo empregatício e desigualdade financeira, sendo mascarado pelo capitalismo e por grandes potências financeiras e investidores das plataformas digitais.
Ocorre que até a uniformização de tais decisões muitos trabalhadores serão prejudicados, e continuarão a laborar sem qualquer segurança trabalhista, na ilusão de ser um micro empreendedor como é tratado pelas empresas virtuais, isso gera grave prejuízo não só a essa classe trabalhadora mas sim a toda população, pois traz insegurança jurídica e retrocesso trabalhista.
6 - REFERÊNCIAS
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[1] Mestranda em Direito Constitucional Econômico. Especialista em Direito Previdenciário, Direito e Processo do Trabalho. Professora de Direito do Centro Universitário Católica do Tocantins. Advogada. E-mail: [email protected].
[2] Doutora e Mestre em Educação (UFBA). Professora do Centro Universitário Católica do Tocantins. Membro do Programa de Pós-graduação em Ensino de Ciências e Saúde, da Universidade Federal do Tocantins-Brasil. E-mail: [email protected]
Graduando Curso de Direito pelo Centro Universitário Católica do Tocantins.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: NETO, Roberto Danglard Jucá. Economia do compartilhamento e a inobservância dos direitos trabalhistas de entregadores de aplicativo: relação de trabalho x relação de emprego Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 jun 2021, 04:21. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56656/economia-do-compartilhamento-e-a-inobservncia-dos-direitos-trabalhistas-de-entregadores-de-aplicativo-relao-de-trabalho-x-relao-de-emprego. Acesso em: 22 nov 2024.
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