ADEMIR GASQUES SANCHES.
(orientador)
RESUMO: A abordagem do presente estudo residiu na análise das prerrogativas da estabilidade aferidas na função pública, e sua relação com a suposta ineficiência no desempenho e produtividade dos serviços públicos prestados pelo Estado. Primeiramente, buscou-se o motivo de seu surgimento e, em sequência, analisou-se uma série de elementos que coabitam com o referido instituto. Ferramentas de eficiência foram contextualizadas como exemplo de práticas alternativas para requalificar o desempenho individual e institucional na prestação de serviços públicos. As normas legais abordadas, para tanto, foram a Constituição Federal de 1988, a Emenda Constitucional nº 19/98 e a recente Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 32/2020, denominada Reforma Administrativa. A metodologia utilizada para construção deste trabalho foi a pesquisa bibliográfica, baseada em estudos doutrinários, artigos científicos, legislações e revistas os quais permitiram a confecção de um estudo do tipo básico, de objetivo exploratório. O intento deste estudo foi valer-se do calor das discussões das ideias, no momento atual, em torno da estabilidade. No entanto, não se pretendeu exaurir o assunto ou propor soluções, mas, simplesmente contribuir para uma reflexão um pouco mais abrangente sobre a atuação do Estado em detrimento a dimensão das políticas públicas abarcadas.
Palavras-chave: Estabilidade. Servidor Público. Eficiência. Serviço Público.
ABSTRACT: The approach of the present study resided in the analysis of the prerogatives of stability measured in the public service, and its relation with the supposed inefficiency in the performance and productivity of public services provided by the State. Firstly, the reason for its appearance was sought and, subsequently, a series of elements that cohabit with the institute was analyzed. Efficiency tools were contextualized as an example of alternative practices to requalify individual and institutional performance in the provision of public services. The legal norms addressed, for that, were the Federal Constitution of 1988, Constitutional Amendment nº 19/98 and the recent Proposed Constitutional Amendment (PEC) nº 32/2020, called Administrative Reform. The methodology used for the construction of this work was bibliographic research, based on doctrinal studies, scientific articles, legislation and magazines which allowed the preparation of a basic type study, with an exploratory objective. The purpose of this study was to make use of the heat of discussions of ideas, at the present moment, around stability. However, it was not intended to exhaust the issue or propose solutions, but simply to contribute to a slightly more comprehensive reflection on the State's performance to the detriment of the dimension of the public policies covered.
Keywords: Stability; Public server; Efficiency; Public service.
O instituto da estabilidade constitui a base deste trabalho. A partir deste contexto serão levantadas as variáveis envolvendo esta temática, tanto no campo sócio-político quanto jurídico, prevalecendo este último como determinante para o seu aprofundamento.
Será objeto de análise, a estabilidade do servidor público nos termos das normativas constitucionais de 1988, perpassando pela Emenda Constitucional n 19, de 5 de junho de 1998, o qual trouxe alterações de grande relevância, chegando à atualidade da questão mediante a propositura da PEC 32/2020 pelo governo vigente. Serão abordadas, também, a sua co-relação com a suposta ineficiência e mau-desempenho atribuído ao funcionalismo público, sua influência na produtividade e qualidade da prestação de serviços públicos e as teorias de sua reversão.
A estabilidade do servidor é vista como precursora da garantia da continuidade dos serviços públicos essenciais, cuja finalidade é resguardar a camada da população mais vulnerável, dependentes do Estado nos atendimentos mais básicos, além de proteger o servidor contra ingerências políticas. Daí a necessidade da presente investigação, haja vista tratar-se de uma questão multifatorial, de interesses fundamentais.
A administração pública foi valorada na Constituição Federal de 1988, o qual trouxe um capítulo inteiro dedicado a ela. Seu artigo 41 trata da estabilidade e dos instrumentos necessários a sua aplicação.
Embora seja um artigo constitucional claro, a estabilidade sempre foi tema de debate social, gerando controvérsias e segmentação entre grupos, principalmente políticos que se valem das mais variadas críticas, direcionadas ao servidor. No senso comum, o acobertamento dos servidores pelo manto da estabilidade, seria uma das principais causas de sua ineficiência. A constante comparação com a ideia de superioridade do setor privado, muitas vezes, serve de fundamentação a essa concepção de um servidor que seria mais eficaz e produtivo se não tivesse tanta proteção.
A pesquisa utilizada neste trabalho foi a básica ou pura, de objetivo exploratório, o qual consistiu no levantamento bibliográfico, consolidada no procedimento ora utilizado. A sua natureza qualitativa forneceu subsídios que ajudaram a definir e tratar as questões ora levantadas. A análise de tópicos, por sua vez, contribuiu para firmar conclusões sob uma variada ótica, abrangendo uma ampla gama de informações.
Neste levantamento bibliográfico, foram detectados outros problemas envolvendo elementos transversais ao tema como a redesignação do papel do Estado na sociedade e a consequente transformação tecnológica e digital.
Dessa forma, seguiu-se um roteiro de trabalho, a partir da análise de fontes bibliográficas: revistas científicas, teses, bibliotecas, publicações de artigos científicos, obras doutrinárias, relatórios de pesquisa e sítios de governos; leitura e seleção do material; retenção das partes essenciais para o desenvolvimento do estudo; elaboração de fichas de resumo de partes relevantes do material; ordenação e análise das anotações, e, por fim, organização e ordenação dos conteúdos.
Através do referido exame bibliográfico, agrupou-se numa única base de dados todas as informações coletadas. Assim, foi possível obter um panorama mais completo sobre a gestão dos serviços públicos que incluem desde a forma de recrutamento de seus servidores, regime jurídico, avaliação e estabilidade e perda do cargo, dentro de uma análise mais consistente da realidade. Outros panoramas se abriram dentro do tema, como as novas tecnologias, governo digital, direito dos usuários e a desburocratização do serviço público como fator preponderante para alcançar a eficiência, princípio esse com importante abordagem neste tema. Manteve-se, contudo, um posicionamento neutro em relação a temática pesquisada.
O objetivo deste estudo, portanto, é levantar o fundamento da criação do instituto da estabilidade no serviço público, ou seja, seu propósito inicial, e consequentes efeitos posteriores diante dos diagnósticos levantados, dentre eles, a relação da estabilidade com os entraves funcionais e produtivos, e sua flexibilização diante dos mecanismos apresentados pelo Estado na tentativa de transpor as deficiências de sua gestão.
O ponto de partida desta pesquisa foi investigar a origem da estabilidade e as causas de sua introdução no ordenamento brasileiro, dada a ingerência política em torno dos cargos públicos. Na seção seguinte, a estabilidade e demais fatores conexos foram analisados no âmbito da Constituição Federal de 1988. No terceiro tópico, a Emenda Constitucional nº 19/98 foi avaliada apontando o privilégio dispensado à eficiência como eixo principal de transformação administrativa. A eficiência na administração pública ganhou o quarto tópico, onde foi elucidado quais outros caminhos já foram percorridos para alcançá-la. Como último tópico, a recente Proposta de Emenda Constitucional (PEC) nº 32/2020, denominada de Reforma Administrativa, foi analisada de forma transversal, envolvendo a questão da reprise de ideologia de Estado mínimo, de modelo gerencialista, com ênfase na redução dos gastos públicos e propulsão da economia do pais ocorrida na Emenda Constitucional nº 19/98. Mereceu análise meticulosa, portanto, as críticas em torno do respectivo assunto. Finalmente, as considerações finais realçaram um apanhado de todo o conteúdo exposto, demonstrando ser longo o caminho a percorrer para alcançar a efetividade, eficiência e eficácia nas atividades estatais.
O instituto da estabilidade surgiu nos Estados Unidos da América, diante de um poder político recém-independente e antidemocrático. Os partidos republicanos e democratas se alternavam no poder e, a cada gestão, os funcionários públicos tidos como contrários ou desnecessários ao governo, eram extirpados de seus quadros e substituídos por seus partidários. Essa prática causou a descontinuidade dos serviços públicos, afetando consideravelmente sua qualidade e, consequentemente, descrédito ao governo. Diante disso, surgiu o instituto da estabilidade com a finalidade de impor continuação às políticas públicas e proteger o funcionário contra as condutas despóticas de seus governantes.
No Brasil, a estabilidade chegou através desse modelo importado dos Estados Unidos e de tendência mundial, incorporando-se ao sistema jurídico com a edição da Lei 2.924, de 1.915. Posteriormente, foi recepcionada pela Constituição Federal de 1934, e, a partir daí, esteve presente em todas as demais constituições.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 (CF/88), intitulada “Constituição Cidadã”, desabrochada sob o conceito de dignidade da pessoa humana e na atenção ao homem em todas as suas dimensões, significativas ferramentas foram implementadas a partir desta nova concepção. A administração pública foi agraciada com um extenso tratamento. Situação está mantida, mais tarde, pela Emenda Constitucional nº 19/98.
O artigo 41 da constituição ganhou novos contornos, coligando-se a outros institutos de igual importância, como o Regime Jurídico Único e a obrigatoriedade da realização de concurso para acesso aos cargos públicos, firmando, assim, sólida posição de resguardo a uma administração democrática.
O concurso público passou a ser regra obrigatória a todas as admissões ocorridas no âmbito da administração pública, independente do regime jurídico, estatutário ou celetista, prevalecendo essa regra aos servidores da Administração direta, autarquias, empresas públicas, sociedade de economia mista e fundações (ROSSI, 2019, p. 60).
O regime jurídico único para os servidores públicos da administração direta e indireta consolidou-se, e a avaliação de desempenho, passou a constar do texto constitucional como obrigatória.
Após a promulgação da constituição, houve, também, a passagem à estabilidade, denominada de “estabilidade especial”, aos servidores públicos da Administração Pública Direta, suas autarquias e fundações públicas. Esse direito somente se estendeu àqueles que haviam ingressado sem concurso público na Administração, e contavam com mais de cinco anos contínuos no cargo, não abrangendo os cargos, empregos ou funções de confiança ou em comissão.
Com a Emenda Constitucional nº 19/98 (EC 19/98), um novo modelo de administração denominada gerencial, de configuração neoliberal, e ideologia de Estado mínimo, foi implementada, em substituição ao modelo burocrático. Surgiu sob base preeminentemente econômica, refletida na eficiência empresarial e conduzida sob o intento de equilibrar as finanças públicas. Nessas premissas, figuravam o aumento da efetividade e qualidade da prestação dos serviços públicos ofertados à população.
O modelo administrativo gerencial surgiu para atender as necessidades decorrentes do crescente avanço tecnológico e da expansão da economia mundial, na busca de um Estado eficiente, célere, produtivo, com princípio da subsidiariedade valorado, voltado a aferição de resultados. Ao Estado, cabia somente àquelas atividades cujo exercício não era compatível ao setor privado. “A contenção de gastos e de desperdícios que outrora eram naturais no seio da Administração passaram a ter tanta atenção quanto a capacitação do servidor” (LEITE, 2001 apud MOTA, 2019, p. 26).
Desse modo, o Estado Mínimo foi concebido nos ideais do liberalismo clássico, com ênfase na mínima intervenção do Estado na economia, em oposição ao domínio do “Estado Forte”, que restringia a “liberdade econômica”.
Na magnitude desta política, o neoliberalismo encontrava-se como:
[...] o modo de existência contemporâneo do capitalismo. O grande objetivo do neoliberalismo é a não participação do Estado em questões econômicas, pregando a expansão do livre mercado. Os ideais do neoliberalismo são Estado Mínimo, privatização, desburocratização, ou seja, leis mais simples no que diz respeito as relações econômicas, livre circulação de capital internacional, entre outros fatores, sempre com o intuito da busca de maior lucratividade (Guezegoch, 2019, p. 26).
Com a Reforma Administrativa (EC nº 19/98), o instituto da estabilidade ganhou nova estrutura.
Santos (2018), elencou, de forma simplificada, as principais alterações promovidas pela EC 19/98, relacionadas à estabilidade.
[...] fim do regime jurídico único (artigo 39, caput); alteração das regras da estabilidade dos servidores públicos (artigo 41, parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º); aumento do período de estágio probatório para servidores públicos (artigo 41, caput); inclusão do princípio da “eficiência”, agora arrolado ao lado dos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade (artigo 37, caput). (SANTOS, 2018, p. 26).
O princípio da Eficiência surge expresso no texto constitucional ao lado dos demais princípios do caput do artigo 37 da Constituição, como o incremento de modernização da estrutura organizacional do Estado.
O regime estatutário passou a coexistir, ao mesmo tempo, com o regime celetista, independente da natureza jurídica da entidade. Após o julgamento da cautelar na ADI 2.135/4, porém, o STF declarou a inconstitucionalidade formal do artigo 39 da Constituição Federal, e o Regime Jurídico Único da União, dos Estados, do Distrito Federal e Municípios foi reestabelecido. Diante desta alteração, a estabilidade passou a ser garantida apenas aos servidores detentores de cargo efetivo, pelo regime estatutário.
O período do estágio probatório foi ampliado de dois para três anos, requisito este, que se tornou necessário para alcançar a estabilidade, nos termos no §4º do art. 41 da CF/88.
O texto constitucional, a partir da EC 19/98, passou a prever também a possibilidade do servidor estável perder o cargo por insuficiência de desempenho, na forma de lei complementar, assegurada ampla defesa (BRASIL, 1988). Esse novo modo de demissão, bem longe de ser uma punição ao servidor, foi mais um alvo para atingir a tão aclamada eficiência.
Outra inclusão constitucional, foi a do artigo 147, que possibilitou a perda do cargo por aquele servidor público estável exercente de atividade exclusiva de Estado.
De acordo com o renomado doutrinador Meirelles (2001, p. 412), estabilidade é:
A garantia constitucional de permanência do serviço público outorgada ao servidor que, nomeado para cargo de provimento efetivo, em virtude de concurso público, tenha transposto o estágio probatório de três anos, após ser submetido a avaliação especial de desempenho por comissão constituída para essa finalidade.
Diniz (1998, v. 4, p. 20) define a estabilidade como “um atributo do cargo público que assegura a continuidade da prestação do serviço público, que é de caráter permanente”. Complementa, ainda, em sua doutrina: “é, portanto, uma propriedade jurídica do elo que ata a pessoa estatal ao servidor titular do cargo público de provimento efetivo”.
Nos ensinamentos de Diniz (apud ROSSI, 2019), a estabilidade pode ser entendida como o instituto tradicional da Constituição a amparar os servidores.
[...] o fato é que ensejou na última década uma crescente resistência pelo governo federal - sem dizer dos estaduais e municipais, que meio à sorrelfa e à socapa quase sempre compactuaram com a ideia federal - àquele privilégio que apenas os servidores públicos detinham, discriminatório do cidadão comum que é instável no emprego. (ROSSI, 2019, p. 810-811).
A estabilidade, desde seu surgimento, jamais configurou um privilégio de servidores. Para Meirelles (2001, p. 415) “A estabilidade é um atributo pessoal do servidor, enquanto a efetividade é uma característica do provimento de certos cargos. Daí, decorre que a estabilidade não é no cargo, mas no serviço público [...]”. Já para Rossi (2019), a estabilidade se dá no cargo.
É o instituto constitucional mais apropriado ao bom servidor que deve ser mantido na administração pública para, com aperfeiçoamento, mediante capacitação, desenvolver serviços de qualidade, de forma impessoal, sem submissão a agentes transitórios.
“O regime de cargo foi concebido para garantir maior estabilidade no exercício das funções públicas, protegendo o servidor contra influências partidárias e pressões políticas provocadas pela constante alternância na cúpula diretiva do Estado”. (ROSSI, 2019, p. 811).
Para chegar à estabilidade, o servidor, após seu ingresso na carreira pública, é submetido a um período de três anos de estágio probatório, onde uma comissão específica avaliará sua aptidão, produtividade e eficiência no exercício do cargo. Esta avaliação, no entanto, mesmo sendo de caráter obrigatório, ocorre omissão da Administração Pública, levando à estabilidade, consequentemente, pelo mero decurso do prazo.
Afirma Rossi (2019, p. 812) que “trata-se de imposição voltada para Administração Pública, no sentido de que depende de providência a ser por ela adotada. Se não o fizer, a omissão não poderá prejudicar a aquisição da estabilidade pelo servidor”. Completa dizendo que “o descumprimento dessa norma constitucional de caráter obrigatório responsabiliza tão somente a administração, que poderá vir a sofrer as consequências em âmbito administrativo e judicial pela sua omissão”.
O maior proveito usufruído pelo servidor, ao término do período de estágio probatório, é, sem dúvida, a aquisição da estabilidade. Assim, encerrado o estágio probatório, o servidor público confirmado na carreira, adquire direito à permanência no cargo, ou seja, passa a condição de estável, ficando protegido, deste modo, contra exoneração ad nutum (MAZZA, 2012, p. 460). Caso contrário, não alcançando bom desempenho, o servidor é exonerado do cargo de forma involuntária. Nesse caso, a exoneração não representa punição, pois é diferente da demissão, que é uma saída punitiva.
A estabilidade é garantida somente aos servidores públicos estatutários, que ocupam cargo de provimento efetivo, não alcançando aqueles que exercem exclusivamente cargos em comissão ou função de confiança destituíveis ad nutum.
Não são agasalhadas, também, pela estabilidade, as atividades de caráter temporário descritas no artigo 37, IX, da CF/88.
O caráter da temporariedade é definido pela lei, conforme a atividade desenvolvida que, segundo Queiroz e Santos (2020, p. 8) “se for atividade de caráter permanente do órgão, só se admite a contratação temporária pelo tempo necessário à superação da carência de pessoal, ou para a realização de concurso público”.
Conforme exposto, em hipótese alguma é permitida a contratação temporária para o exercício de funções regulares e permanentes do quadro de servidor. Queiroz e Santos (2020, p. 8) finaliza dizendo que “a contratação temporária deve ficar limitada a situações realmente de excepcional interesse público”.
Na lição de Mazza (2012, p. 442): “os servidores estatutários são aqueles selecionados por concurso público para ocupar cargos públicos, tendo vinculação de natureza estatutária não contratual...”. É o regime que abarca maior vantagem e proteção aos agentes públicos, pois o servidor estável somente perderá seu cargo nas hipóteses previstas no artigo 41, §1º da CF.
A primeira hipótese de perda do cargo decorre da sentença judicial transitada em julgado, no caso de cometimento de crime ou improbidade administrativa pelo agente público, adentrando, nesse caso, na seara do direito penal.
A segunda hipótese é por meio de processo administrativo assegurada ampla defesa. É o chamado “processo administrativo disciplinar” que compõem os estatutos de cada ente político, o qual enseja, ao servidor, responsabilidade civil, penal e administrativa, de forma cumulativa e independente, pelo exercício irregular de suas atribuições.
Os estatutos de cada um dos entes federados apresentam um rol tipificado de condutas que importam em deveres e proibições a serem observados pelo servidor. Dentre as várias penalidades previstas para as infrações funcionais, encontra-se a demissão, que é decorrente de falta grave.
Para a imposição da penalidade ao agente público que cometer infração funcional é indispensável a abertura de processo administrativo e/ou sindicância, com o contraditório e ampla defesa. (ROSSI, 2019, p. 206).
Contudo, tais condutas apresentam-se em conceitos abertos e genéricos, dificultando sua aplicação. Como exemplo, a norma do artigo 117, inc. XV da Lei nº 8.112/90, que descreve “proceder de forma desidiosa”. Para um agir de forma objetiva, como conceituar desídia?
Rossi (2019, p. 210) ainda elucida que os poderes hierárquico e o disciplinar se relacionam, na medida em que cabe ao agente superior emitir ordens ao agente subordinado, cabendo àquele a fiscalização dos atos e comportamentos deste, bem como determinar e avocar funções, para só assim, em caso de descumprimento, ocorrer a possibilidade de aplicação de sanção.
A terceira hipótese, consiste no procedimento de avaliação periódica de desempenho aos servidores estáveis, na forma da lei complementar, assegurada ampla defesa. Rossi (2019, p. 813) lembra que “essa lei complementar, que deve ser de âmbito nacional, ainda não foi promulgada; sendo assim, o dispositivo em tela acaba sendo inútil”.
Para os casos de cargos vitalícios, compreendidos os da magistratura, membros do Ministério Público e do Tribunal de Contas, após a vitaliciedade, a perda do cargo somente se dará por sentença judicial transitada em julgado. Para esses cargos, o período de estágio probatório é de apenas 2 anos. (MAZZA, 2012, p. 443).
Além disso, somente ao servidor estável é concedido o direito de reintegração. Instituto esse aplicado diante da demissão indevida do servidor, anulada, posteriormente, por sentença judicial ou por ato administrativo, conforme dicção do §2º, do artigo 41 da CF/88.
Outra garantia do servidor estável, é o direito à disponibilidade, em caso de ter seu cargo extinto ou declarado desnecessário. Em disponibilidade, o servidor fará jus a remuneração proporcional ao tempo de serviço (BRASIL, 1988). Essa garantia, no entanto, não é estendida aos servidores em estágio probatório, que poderão ser exonerados de ofício na ocorrência de idêntica situação.
Sendo assim, o poder discricionário do administrador é totalmente afastado, bem como seu poder arbitrário, impedindo-o de exonerar ou demitir, sem o regular processo legal, o servidor efetivo estável.
Nesse contexto, vê-se, claramente, uma relação jurídico-administrativa estabelecida entre o Estado e o servidor público, disciplinada por normas constitucionais e infraconstitucionais, onde a estabilidade figura como qualidade dessa condição. No entanto, a estabilidade não se faz absoluta. Nas palavras de Queiroz e Santos (2020, p. 16) “uma vez estável, o servidor não pode ser demitido livremente. Segundo a Constituição, porém, ele não é indemissível”.
A administração pública é norteada por princípios que buscam atender o interesse público por intermédio da proteção dos bens comuns, e dentre eles está o princípio da boa administração. Cabe à Administração Pública, dentre os atos discricionários a seu dispor, elegê-los adequadamente com a finalidade de atingir o interesse público. Mello (apud MAZZA, 2012, p. 118-119), menciona que “o princípio da eficiência é um desdobramento do dever maior de boa administração”.
Todavia, o papel da Administração Pública de assegurar o bem comum e elevar a satisfação do interesse social de seus cidadãos há muito tempo foi macerado por atitudes tortuosas de seus administradores que simplesmente ignoram as leis. Leite (2001, p. 11) aponta que “[...] a Administração Pública tornou-se refúgio de práticas inescrupulosas, completamente distanciadas do interesse coletivo e o serviço público passou a se identificar com a ineficiência, a burocracia e a lentidão”, causando, com isso, prejuízo a seus administrados .A cultura de corrupção e do desperdício do dinheiro público constitui uma mancha na reputação da Administração Pública, que influencia diretamente nos resultados esperados.
A Súmula Vinculante nº 13 do STF, conhecida como antinepotismo, foi editada justamente para coibir atos ilícitos de administradores, que nomeavam seus parentes para ocupar cargo em comissão ou função de confiança.
Considerou-se que a referida nomeação de parentes ofende, além dos princípios da moralidade administrativa e da impessoalidade, o princípio da eficiência, haja vista a inapetência daqueles para o trabalho e seu completo despreparo para o exercício das funções que alegadamente exercem. (ROSSI, 2019, p. 92).
Rossi (2019, p. 97), ainda, citando Marcelo Figueiredo, explica que “O princípio da moralidade administrativa sempre foi ameaçado e violado pela corrupção administrativa que tem raízes que se perdem na poeira dos tempos”.
Sobre a eficiência, Esaf (apud MAZZA (2012, p. 105), destaca “o gerenciamento de recursos públicos sem preocupação de obter deles o melhor resultado possível, no atendimento do interesse público, afronta o princípio da eficiência”. A inobservância das metas, diretrizes e planos de governo inviabiliza a prestação de serviços públicos de qualidade.
A eficiência possui valores que robustecem seu objetivo.
Economicidade, redução de desperdícios, qualidade, rapidez, produtividade e rendimento funcional são valores encarecidos pelo princípio da eficiência. É impossível deixar de relacionar o princípio da eficiência com uma lógica da iniciativa privada de como administrar (MAZZA, 2012, p. 105).
Todavia, quando gerido dentro dessa lógica de comparação entre Estado e empresa, o princípio da eficiência não pode ser usado em sua plenitude, pois a administração possui princípios finalísticos diversos. Enquanto o setor público busca o atendimento ao cidadão em suas necessidades mais básicas, o setor privado se volta para uma vertente econômica.
Rossi (2019, p. 107), conjuga a eficiência no binômio produtividade e economia desdobrando-a em diversas outras normas constitucionais e infraconstitucionais, como o artigo 41 da CF; a perda do cargo decorrente do excesso de gasto com pessoal, nos termos do artigo 169, caput, da CF; o “contrato de gestão” conforme aduz o artigo 37, §8º,da CF; escolas de governo para a formação e aperfeiçoamento dos servidores públicos (art. 39, §2º, da CF); e o comando constitucional para aplicação, por todos os entes federados, de recursos orçamentários derivados de sua economia, no desenvolvimento de programas de qualidade e produtividade, treinamento e desenvolvimento, modernização, reaparelhamento e racionalização do serviço público, inclusive sob a forma de adicional ou prêmio de produtividade (art. 39, §7º, da CF).
Outro importante desdobramento do princípio da eficiência e de desburocratização do serviço público é a Lei nº 13.726, de 2018, que trata da “simplificação de formalidades ou exigências desnecessárias ou superpostas”. Esta norma, criou um “selo de desburocratização e simplificação, destinado a reconhecer e a estimular projetos, programas e práticas que simplifiquem o funcionamento da administração pública e melhorem o atendimento aos usuários dos serviços públicos”. (ROSSI, 2019, p. 110).
Nesses desdobramentos ao princípio da eficiência, Mazza (2012, p. 106) acrescenta a duração razoável do processo administrativo, nos termos do art. 5º, LXXVIII, CF, as parceria privadas com a Administração Pública, e o direito dos usuários de serviço público a uma prestação com qualidade e rapidez (Lei nº 13.460, de 2017). Ensina, ainda, que a administração pública deve empenhar-se para” buscar os melhores resultados através da aplicação da lei”, no sentido de se acender ao princípio da eficiência (MAZZA, 2012, p. 105).
A implementação da prestação digital dos serviços públicos na forma do Projeto de Lei nº 3443/2019 (Governo Digital), constitui mais uma ferramenta importante na modernização da administração pública direta.
O princípio da continuidade dos serviços públicos, por sua vez, prevê que o serviço público deve ser prestado de forma contínua e ininterrupta.
O serviço público, retratado por Mazza (2012, p. 601), “é aquele prestado pelo Estado, de forma direta ou indireta, em prol da coletividade e representa sempre uma prestação em favor do particular”. Trata-se de um dever do Estado, de essência constitucional (art. 175, CF/88), além de se fazer constar, expressamente, no art. 6º, § 1º, da Lei nº 8.987/95, transcendente a simples vontade da Administração Pública.
No entanto, o princípio da continuidade aplica-se somente no âmbito do Estado prestador não valendo para outros domínios, como o poder de polícia, a atividade econômica, o fomento, as atuações políticas e as funções legislativas e jurisdicionais. (MAZZA, 2012, p. 119).
O Governo Federal, no último dia 04 de setembro de 2020, apresentou ao Congresso Nacional, para análise e votação, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 32/2020, consubstanciada no Plano Mais Brasil. Semelhante à proposta anterior (EC 19/98), está também possui base gerencia lista, ideologia de Estado mínimo, e elege, como regra, a eficiência.
A reforma traz como propósito, segundo Queiroz e Santos (2020, p. 4) “[...] a redução do gasto e da máquina pública, dentro da lógica neoliberal de revisão do papel do Estado na economia e na área social, especialmente no provimento de bens e serviços [...]”.
A ideia de modernização do Estado surge a partir da imposição de uma política de gestão voltada ao servidor público como executor direto do serviços públicos, revestindo-o de adjetivos como agilidade, adaptação a um ambiente de trabalho conectado a práticas eficientes de atuação conceituadas no mundo globalizado, além de elevar esse sujeito para interagir, de forma dinâmica, no relacionamento entre órgão e entidades públicas com a iniciativa privada (BRASIL, 2020).
Trata-se de uma reforma delineada de forma a abarcar com muita protuberância as principais área de atuação do governo, revolvendo toda sua estrutura atual. E, ainda, com metodologia utilizada pelo setor privado.
A crítica a esse modelo, espelhado no setor privado, que faz Queiroz e Santos (2020, p. 5) é a de que:
Esses modelos, baseados na lógica de mercado, não se sustentam na administração pública e geralmente são questionados pelos usuários de serviços públicos, porque adotam a lógica da relação cliente-consumidor, uma relação própria para o setor privado, mas inadequada para o setor público.
Acertadamente infere Queiroz e Santos (2020, p. 4):
Embora proposta em nome da melhoria da eficiência (fazer mais com menos), da eficácia (atingir as metas) e da efetividade (fazer a coisa certa ou atingir objetivos relevantes) das políticas públicas, e até mesmo de uma noção de ampliação do controle social, a partir da participação de organizações externas ao Estado na prestação de serviços públicos, a abordagem desconhece as diferenças entre a gestão privada e a gestão pública.
Queiroz e Santos (2020, p. 4) completa dizendo que o setor público “[...] busca o atendimento de necessidades sociais, a pacificação da ordem social e o atendimento das aspirações dos cidadãos, a satisfação de direitos coletivos”.
A execução do serviço público se abre, por meio de instrumentos de cooperação, a entidades públicas e privadas conforme dita seu art. 37-A, excetuando apenas as atividades de cargos típicos de Estado.
Extirpa o art. 39, §2º, da CF, que trata das escolas de governo para a formação e aperfeiçoamento dos servidores públicos, incluído pela EC 19/98. Nova redação do art. 39, inclui o inciso VI, que prevê a edição de lei complementar federal futura para dispor sobre o desenvolvimento e capacitação dos servidores.
As alterações propostas não abrangerão os atuais servidores que já atuam no serviço público, mas tão somente aqueles que ingressarão, posteriormente à aprovação da PEC.
Dentre os principais eixos da Reforma Administrativa está a flexibilização da estabilidade, do concurso público, do regime jurídico único e nova regulamentação para o período de estágio probatório e a avaliação de desempenho.
Os servidores públicos serão divididos em duas categorias, uma de carreiras típicas do Estado, cuja definição será delineada através de lei complementar federal a ser editada posteriormente, e outra, dos demais servidores, aqueles que sofrerão as mudanças deste instituto.
A expressão “funções públicas” do inciso I, do artigo 37, da CF, passará a vigorar como “vínculos públicos”, forma inédita de provimento de cargos públicos, de proposição aberta e de entendimento dúbio.
O inciso II do artigo 37 comportará o termo “emprego público” para a administração direta, atualmente em atuação somente na administração indireta.
Novas modalidades de vínculos jurídicos no serviço público foram apresentadas. O regime jurídico de pessoal foi desdobrado em vínculo de experiência, vínculo por prazo determinado, vínculo por prazo indeterminado, cargo típico de Estado e cargo de liderança e assessoramento.
Art. 39-A. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios instituirão, no âmbito de sua competência, regime jurídico de pessoal, que compreenderá: I - vínculo de experiência, como etapa de concurso público; II - vínculo por prazo determinado; III - cargo com vínculo por prazo indeterminado; IV - cargo típico de Estado; e V - cargo de liderança e assessoramento (BRASIL, 2020, n.p.).
O caput do artigo 39-A remete ao entendimento que caberá a cada ente do governo instituir seu próprio regime jurídico de pessoal dispondo suas próprias regras, deixando, com isso, aberto para cada administrador legislar de acordo com seu interesse.
O concurso público fluirá por etapas para a investidura em cargos típicos de Estado. Após a etapa de provas ou de provas e títulos, o candidato deverá cumprir um “período de experiência”, de, no mínimo, dois anos, onde deverá obter, como requisito para próxima etapa, avaliação satisfatória. Em sequência, serão cumpridos mais um período de, no mínimo, 1 ano, de efetivo exercício e “avaliação satisfatória”. Serão classificados, após esse último período, os mais bem avaliados dentro do quantitativo de vagas do edital de concurso, com direito a posse no cargo efetivo. São os únicos que serão abrangidos pela estabilidade.
Art. 37, II-B - a investidura em cargo típico de Estado depende, na forma da lei, de aprovação em concurso público com as seguintes etapas: a) provas ou provas e títulos; b) cumprimento de período de, no mínimo, dois anos em vínculo de experiência com desempenho satisfatório [...]. Art. 41. Adquire a estabilidade o servidor que, após o término do vínculo de experiência, permanecer por um ano em efetivo exercício em cargo típico de Estado, com desempenho satisfatório, na forma da lei (BRASIL, 2020, n.p.).
Portanto, o vínculo de experiência é mais uma etapa consecutiva do concurso público que abrange somente aqueles mais bem avaliados, e não contará para fins de aquisição da estabilidade, pois não se trata de uma nomeação, mas sim, apenas de um vínculo temporário. Ele vem em substituição ao estágio probatório, não conferindo, portanto, direito automático ao cargo.
A investidura em cargo com vínculo por prazo indeterminado também ocorrerá por meio de aprovação em concurso público, a ser executado por etapas, da mesma forma do cargo típico de Estado. Porém, neste o “período de experiência” será de, no mínimo 1 ano. Ao final desta etapa, serão classificados os mais bens avaliados (com desempenho satisfatório), dentro do quantitativo do edital do concurso público.
A contratação de servidores públicos, de vínculo temporário, é direcionado ao atendimento das necessidades temporárias ou sazonais. O ingresso previsto é através de processo seletivo simplificado. Neste tipo de vínculo, ocorreu uma significativa ampliação do seu alcance, comportando outras finalidades de contratação, além das necessidades de excepcional interesse público previstas no inc. IX do art. 37, da CF.
O cargo de liderança e assessoramento ganhou nova nomenclatura, deixando de lado as “funções”. Outras posições de posto de trabalho, foram propostas, de atribuições estratégicas, gerenciais ou técnicas.
reforma, ainda, introduz o artigo 41-A no texto constitucional o qual observa que lei futura deverá ser editada a fim de dispor sobre gestão de desempenho, condições de perda do vínculo e do cargo, vedando o desligamento do servidor por motivo político-partidário.
Art. 41-A. A lei disporá sobre: I - a gestão de desempenho; e II - as condições de perda, no decorrer de todo o período de atividade, dos vínculos e dos cargos previstos: a) no art. 39-A, caput, incisos I a III; e b) no art. 39-A, caput, inciso IV, enquanto o servidor não houver adquirido estabilidade. Parágrafo único. É vedado o desligamento dos servidores de que trata o art. 39-A, caput, incisos I a IV, por motivação político-partidária (BRASIL, 2020, n.p.).
As hipóteses de desligamento do servidor estável ocupante de cargo típico de Estado por insuficiência de desempenho, serão regulamentadas através de lei ordinária e não mais por lei complementar. Na dispensa por sentença judicial, não será mais necessário aguardar o trânsito em julgado, prevalecendo a decisão emitida por órgão colegiado. Quanto a avaliação periódica de desempenho, com a revogação do §4º do art. 41, o órgão colegiado não será mais necessário.
A reintegração do servidor que retorna ao quadro administrativo por determinação judicial, passará a ser “independentemente da existência de vaga”, em contraste ao texto atual que remete a existência de vaga prévia nos termos do § 2º, art. 41, CF.
Dentre os fundamentos para uma estrutura de governança congruente e um desempenho institucional de qualidade no setor público, em contraponto à reforma, Cardoso Jr. e Pires (2020, p. 11) destaca a estabilidade na ocupação como aquela: “idealmente conquistada por critérios meritocráticos em ambiente geral de homogeneidade econômica, republicanismo político e democracia social, visando a proteção contra arbitrariedades - inclusive político-partidárias - cometidas pelo Estado-empregador”.
Novas vertentes, portanto, são lançadas como exemplos de modernização da gestão pública, em contraste com a posição atual da reforma, como o modelo, dominante do cenário internacional, trazido por Cardoso Jr. e Pires (2020, p. 19) relacionado ao desempenho individual e institucional. Diferente do modelo gerencial, onde o desempenho é definido para o alcance somente de resultados, não computando a capacidade das organizações e de seus agentes, o autor informa que, nesse novo modelo, sob perspectiva de “desempenho como sustentabilidade”:
O desempenho é concebido como atenção tanto à qualidade das ações como à qualidade dos resultados, isto é, aquela que procura iluminar em uma organização a sua capacidade reflexiva para desempenhar e sua habilidade em converter tal capacidade em resultados (produtos e impactos) sustentáveis ao longo do tempo, chamando atenção para possíveis resultados disfuncionais. (CARDOSO JR; PIRES, 2020, p. 19).
Esse modelo, sim, atenderia a necessidade de transformação do modelo atual inoperante, cuja ideia de desempenho não ficaria restrito apenas a capacidade, produtividade e eficiência, mas se voltaria para a produção de soluções e impactos capazes de incidir positivamente nos mais variados contextos e, ainda, por fim, imperaria a capacidade de perdurar no tempo, isto é, de conferir sustentabilidade.
O conhecimento de que a ocupação de cargos e funções públicas no Brasil, iniciou-se sob forte influência política e por critérios meramente pessoais, mostrou que a estabilidade foi a barreira implantada para coibir perseguições políticas, e, assim, garantir a continuidade dos serviços públicos em prol da sociedade. Por muito tempo, a estabilidade não foi exclusiva de servidores públicos detentores de cargo efetivo. Mesmo àqueles não-concursados, eram contemplados com essa garantia ao cumprirem determinado tempo de efetivo exercício no cargo. A estabilidade, portanto, não foi criada para privilegiar servidores e sim, para lhes proporcionar uma atuação livre, impessoal e dentro dos preceitos morais.
Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, os institutos da Administração Pública ganharam riqueza de detalhes, minimizou interpretações extirpadas e pôs fim aos excessos pretéritos. O instituto da estabilidade, em consonância com o concurso público, que passou a ser de caráter obrigatório, estabilizou-se como um importante via de democratização da gestão pública. Entretanto, apesar de haver toda uma arquitetura constitucional em torno desta matéria, ela pouco se desenvolveu na prática, haja vista a ausência do legislador em sua regulamentação. As formas de avaliação de desempenho, aprimoradas pela EC 19/98, não atingiram seu resultado esperado. Tanto a avaliação de desempenho para aquisição da estabilidade, quanto o sistema de avaliação periódica para servidores estáveis foram mergulhados por uma extensa onda de omissão por parte do poder público.
Todos esses fatores, e demais deficiências do sistema público, contribuíram para incutir no pensamento da população de que a estabilidade é a causa maior da ineficiência do servidor e, consequentemente, da precariedade dos serviços públicos.
A constituição passou a ser olhada como uma limitadora para o deslinde da eficiência na administração pública, corroborando, deste modo, para o surgimento de uma nova Reforma Administrativa apresentada pela EC 19/98, com foco voltado para a eficiência, produtividade e qualidade do serviço público.
No entanto, após duas décadas e pouca efetividade na consecução desta última reforma aprovada (EC 19/98), surge a necessidade de nova Reforma Administrativa, o qual fora apresentada pelo governo atual como a PEC 32/2020. Sob o mesmo enfoque básico da reforma anterior, ou seja, pautada na necessidade de readequar os gastos com pessoal - e enxugar a máquina estatal, equilibrar as finanças públicas e trazer desenvolvimento econômico para o país, esta proposta traz alterações radicais para o modelo atual de administração pública. Em evidência, dois pontos de maior impacto merecem destaque: a estabilidade, praticamente extirpada da administração pública, fica restrita apenas aos cargos típicos de Estado, e o estágio probatório cede parte de seu período para o denominado “período de experiência”.
E, diante de inúmeras críticas a PEC 32/2020, várias teses despontaram trazendo modelos alternativos para a reformulação das políticas públicas, e para modernização do Estado.
Em tempos de globalização e, consequentemente, de grandes transformações tecnológicas e digitais, este estudo ilustra a preocupação na busca por políticas de implantação e sustentação de novos mecanismos que atendam as demandas contemporâneas. Contudo, o servidor ainda é o responsável pelas execuções diretas dos serviços públicos e pelas respostas às crescentes demandas do Estado em seus múltiplos aspectos. E, nessa condição, a pesquisa aponta que, só haverá mudanças qualitativas e quantitativas se, aliadas a tais inovações (tecnológicas, digitais e de modernização) houver, também, políticas de valorização do servidor.
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Bacharelanda em Direito pela Universidade Brasil - Campus Fernandópolis.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LANSONI, Sueli Rosa. A ameaça à estabilidade do servidor público Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 18 jun 2021, 04:24. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/56805/a-ameaa-estabilidade-do-servidor-pblico. Acesso em: 26 dez 2024.
Por: Benigno Núñez Novo
Por: Francisco de Salles Almeida Mafra Filho
Por: BRUNO SERAFIM DE SOUZA
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