IGOR DE ANDRADE BARBOSA.[1]
(orientador)
RESUMO: De forma objetiva, busca-se por meio da análise de diversos pontos normativos e teorias doutrinárias que formalizam e concretizam a ideia inicial. A temática destaca-se principalmente por dois motivos principais, de um lado a ideia conservação a uma ideologia constitucional que busca a preservação de direitos outrora ignorados, juntamente com a busca de minimização dos danos causados aos indivíduos submetidos a medidas de segurança. Já do outro lado temos a necessidade de proteção da sociedade em face das atuações destes indivíduos, sem desconsiderar a sua própria segurança em ser mantido em circunstâncias que tem como finalidade principal a proteção. De maneira mais específica, há uma abordagem sobre ao máximo de pena máxima nas hipóteses de aplicação das medidas de segurança e as alterações normativas que impulsionaram novos entendimentos criando a barreira de proteção de uma punição perpétua. Alinhando a isso, apresentará as modificações em nosso ordenamento jurídico advindas pela Lei 13.964, a qual foi denominada Pacote Anticrime, e sua iminente relação com a alteração de anos da pena máxima. Abordando um entendimento do princípio de anterioridade e pena mais gravosa, que são aplicadas para penas impostas, além das hipóteses da utilização de medida de segurança, que em sua exercia, destina-se na preservação do bem comum e da segurança do indivíduo, bem como busca um fim essencialmente de reparação a sua saúde, em outras palavras, uma possível cura.
Palavras-chave: Aplicação de Pena Máxima; Medida de Segurança; Pacote Anticrime;
ABSTRACT: Objectively, it seeks through the analysis of various normative points and doctrinal theories that formalize and concretize the initial idea. The theme stood out mainly for two main reasons, on the one hand, the idea of conservation to a constitutional ideology that seeks to preserve rights that were previously ignored, along with the quest to minimize the data caused to individuals subjected to security measures. On the other hand, we have the need to protect society in the face of the actions of these individuals, without disregarding their own safety in being kept after circumstances whose main purpose is protection. More specifically, there is an approach to the maximum penalty in the cases of application of security measures and the normative changes that boosted new understandings, creating the protection barrier of a perpetual punishment. In line with this, it will present the changes in our legal system arising from Law 13,964, which was called the Anti-Crime Package, and its eminent relationship with the change of years of the maximum penalty. Supporting an understanding of the principle of priority and more severe penalty, which are applied to imposed penalties, in addition to the hypotheses of the use of a security measure, which in its exercise, is intended to preserve the common good and the individual's security, as well as it seeks an end essentially to repair its health, in other words, a possible cure.
Keywords: Maximum Penalty Application; Security measure; Package Anticrime;
SUMÁRIO: Introdução. 1. Circunstâncias para medida de segura; 1.1. A pena e suas características; 1.2. Medida de segurança; 1.3. Da aplicabilidade da medida de segurança. 2. Pacote anticrime. 3. Cenário após as mudanças. Conclusão. Referências.
INTRODUÇÃO
A Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, outrora denominada como Pacote Anticrime, trouxe grandes alterações, como a do artigo 75 do Código Penal Brasileiro, alterando a pena máxima de 30 para 40 anos com base na expectativa de vida atual do povo brasileiro. Tais modificações fazem parte da medida essencial para diminuir a criminalidade em nosso país com medidas mais rigorosas.
Seguindo essa prerrogativa de modificação, com uma mudança significativa da penalidade máxima, novos conflitos surgem e com eles fontes de pesquisas e debates. Em uma breve análise, temos a medida de segurança como forma alternativa para casos peculiares de cometimentos de crimes e as suas razões.
De maneira singela, devido ao princípio da irretroatividade da pena, garantido pela constituição federal, onde a lei que torne a pena mais grave, não recai aos que já estão em cumprimento. Sendo assim aquele que em tratamento mesmo que necessitando a continuidade, após passados o prazo estabelecido pelo artigo 75 do Código Penal Brasileiro, deve-se condicionar a liberdade e se ajuizar ação na esfera civil por parte do ministério público.
Por meio da grande fascinação pelo campo de atuação do direito Penal, além da iminente promulgação da lei que por muitos doutrinadores, foi considerada como minirreforma penal. Despertou e adveio a vontade de agir em face dessas novas perspectivas e buscar contribuir com a sociedade, de maneira a atender as expectativas até aqui criadas.
Denominada pacote anti crime, a Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019, modificou vários dispositivos do nosso ordenamento jurídico, sendo fonte de críticas, não somente negativas. Dentre as grandes alterações, temos a do artigo 75 do Código Penal, alterando a pena máxima para uma maior adequação social.
Além disso, temos a aplicação do instituto da medida de segurança como forma de substituição da pena para determinados casos. Essa destina-se aos indivíduos que cometem crimes, influenciados por doenças mentais, que fazem com que não sejam punidos, mas tratados.
Por vezes os tratamentos se perfazem por internações em clínicas de tratamento ou tratamentos ambulatoriais, com medicamentos para o controle das doenças mentais. Com avaliações periódicas a fim de averiguar a capacidade mental, e a possível cura do indivíduo.
O direito penal brasileiro é a ferramenta usada pelo poder Estatal para o uso de seus poderes e atribuições no que chamamos de “jus puniendi” ou como é conhecido popularmente, o direito de punir. É partindo desta prerrogativa que é estabelecido o cumprimento de determinada pena para o indivíduo que venha a contrariar os preceitos estabelecidos nesta esfera. Os requisitos principais para que o Estado exerça esse poder de punição é o enquadramento da ação ou omissão por parte do indivíduo, devendo ser um fato típico: está previsto em lei, ter ilicitude e por fim deve haver culpabilidade.
Para determinar a culpabilidade, o agente deve ter consciência potencial da ilicitude, não tendo essa, torna-se semi-imputável ou ainda inimputável, quando a este só resta a aplicação de medida de segurança para passar por tratamento ambulatorial ou internação.
Recentemente foi editado o pacote anticrime que modificou o código penal em diversos quesitos. Frente a esse contexto, levanta-se um questionamento: como regulamentar a aplicabilidade da pena máxima nas hipóteses de medida de segurança, tendo como referência as conversões ocasionadas pelo Pacote Anticrime?
O objetivo principal é compreender a regulamentação sobre aplicabilidade da pena máxima imposta pelo pacote anticrime para as Medidas de Segurança. Buscando concretizar esse fim, será por meio de objetivos específicos que haverá a identificação das circunstâncias para emprego da medida de segurança.
Além disso, deve-se avaliar as conversões ocasionadas pelo pacote anticrime no nosso ordenamento jurídico e relacionar a aplicação de pena máxima com as mudanças advindas pelo Pacote Anticrime.
É de suma importância a pesquisa científica para qualificar e trazer um melhor desenvolvimento ao acadêmico, sendo através desta, obteremos um amplo conhecimento no campo de atuação. O aprendizado ganha mais riqueza além do incremento de pontos não oportunos em aula, além de agregar temas outrora conhecidos, usando a metodologia como parte integrante e fonte de saber, essencial para a elaboração de forma alinhada de obtenção de atingir os objetivos pretendidos.
Há a utilização do método de pesquisa exploratória com principal finalidade de analisar a atual aplicação da pena máxima frente às mudanças impostas pelo Pacote Anticrime em casos em fase de cumprimento de sentença, com um profundo estudo nas novas jurisprudências e decisões dos tribunais penais.
O estudo terá caráter essencialmente qualitativo, com ênfase na observação e estudo documental, onde será feito a busca por casos onde há indivíduos que ainda necessitam de tratamento, mas que por força de lei não mais podem continuar. É essencial compreender o entendimento majoritário dos doutrinadores com a finalidade de buscar adequação a uma hipótese diferente do objetivado ao se propor o Pacote Anticrime.
Juntamente com essa ideia, será necessário o cruzamento dos levantamentos com toda a pesquisa bibliográfica já feita. Para isso, a pesquisa será baseada em estudos de doutrinadores, bem como juristas atuantes, revisão de literatura, além de um levantamento dos casos concretos onde ocorreram a não aplicabilidade e aumento do tempo máximo de cumprimento de sentença a fim de beneficiar o indivíduo.
Para isso, será necessária uma pesquisa documental somada a uma revisão literária de forma que haja uma análise de documentos jurídicos, normas técnicas de estudo aprofundado em doutrinas e jurisprudências, os quais são fontes primárias para chegarmos ao entendimento da verdadeira forma de aplicação da norma.
Portanto, a pesquisa destina-se no aprendizado de modo exploratório nas ideias de doutrinadores e atuantes no campo jurídico, de forma a obter uma compreensão da magnitude do benefício que pode ser conquistado caso haja a retroatividade. Não de modo geral, mas especificamente para os casos de medidas de segurança que ao atingir a pena máxima, invalida todo um esforço feito anteriormente.
1. CIRCUNSTÂNCIAS PARA MEDIDA DE SEGURANÇA
1.1 A pena e suas características
Para que possamos definir a aplicação de Pena, vale lembrar que (in KUEHNE, citando BETTIOL, 2005, p. 24) afirma que: “Pena é a consequência jurídica do crime, isto é, a sanção estabelecida pela violação de um preceito penal”. Então a aplicação nada mais é que a efetivação da consequência buscando a correção e reparação do mal causado.
Para muitos, a pena é vista como castigo ou penitência pela injusta agressão causada e que a sua finalidade principal é a punição como meio de reparação. Mas não podemos nos prender a esta simples ideia, a muito o que se discutir em relação a aplicação da pena, suas características e as causas que deram origem à sanção.
As penas dividem-se conforme nosso consagrado Código Penal em; penas privativas de liberdade; restritivas de direitos e pecuniárias, que após o devido processo legal e observância do contraditório e a ampla defesa, passa o Estado por meio do seu poder punitivo a aplicar estas penas de forma cumulativa ou não.
Quando da efetiva aplicação, entende que "aplicar-se a cada qual a pena que se ajuste, tanto quanto possível, às circunstâncias subjetivas e objetivas de sua conduta criminosa constitui a realização máxima do ideal de Justiça no particular" (LOPES, 1999, p. 255), isto é, de forma alguma será tratado todas as ocorrências de crimes com a mesma sanção.
Não somente o legislador ao conduzir a produção das normas, baseando se no princípio da proporcionalidade da penal, é dever do juiz criminal em sua atuação ater-se a este princípio para que possa de modo eficaz e justo, conseguir a finalidade da pena. De pouco adianta punir se na mesma proporção não se busca educar e reintegrar o indivíduo na sociedade.
Se a prerrogativa de que a pena vem por meio de sua efetividade reparar o mal causado, é por meio desta também que encontraremos a efetivação da ideia da Medida de Segurança. Ademais falaremos mais sobre este instituto que vem a ser objeto do nosso estudo e que por meio de sua utilização, temos o direito penal agindo de uma forma diferente.
Na teoria da pena, e em sua estruturação, para cada dispositivo normativo disposto em nosso código penal há de forma abstrata estipulado a quantidade, ou seja, o período de penalidade pela não observância do preceito. Em muitos o prazo é de anos, sempre com a quantia mínima e máxima a ser aplicada.
Dessa forma, ao cometer um ato criminal, desrespeitando a norma legal, o indivíduo submetido ao julgamento, terá de responder e terá sua pena imposta com fulcro na pena base estabelecida pelo dispositivo. Mesmo com essa previsão de prazo, é por meio das circunstâncias judiciais que tempo será definido então assim o seu cumprimento será seguido.
Seguindo a Teoria da Pena, quando do cometimento ou descumprimento da norma, o indivíduo será julgado conforme o crime que cometeu. Em outras palavras, se praticou homicídio, responderá por homicídio e suas classificações, se praticou roubo, da mesma forma, terá o crime de roubo imputado a ele.
1.2 Medida de Segurança
Definido a quem se aplicará a medida de segurança, precisamos conceituar e apontar a sua utilização nos diversos casos previstos em lei, os quais serão obra dos nossos estudos. A respeito de ambas, preceitua:
A medida de segurança e a pena privativa de liberdade constituem duas formas semelhantes de controle social e, substancialmente, não apresentam diferenças dignas de nota. Consubstanciam formas de invasão da liberdade do indivíduo pelo Estado, e, por isso, todos os princípios fundamentais (BITTENCOURT, 2003, p. 682).
De forma resumida, esse instituto será designado aos que praticam crimes e por motivo de serem portadores de doenças mentais, não serão considerados os responsáveis por tais atos, uma vez que a natureza fática de seus raciocínios é comprometida.
Quando falamos na medida de segurança, temos esta como uma providência do poder Estatal, baseada no jus puniendi, e que será imposta a um indivíduo semi-imputável ou inimputável que venha a realizar fato típico e ilícito. Sendo que o grau de periculosidade é que determinará a medida a ser aplicada.
Medida de segurança é toda a reação criminal, detentiva ou não detentiva, que se liga à prática, pelo agente, de um fato ilícito típico, tem como pressuposto e princípio de medida a sua periculosidade e visa finalidades de defesa social ligadas à prevenção especial, seja sob a forma de segurança, seja sob a forma de ressocialização (LEVORIN, 2003, p. 161).
Outra singularidade é que apesar do cometimento de fato típico ilícito, não devemos considerar a medida de segurança como uma espécie de pena, por que a sua função é a especificamente a busca por tratamento ao autor com a finalidade de curá-lo, ou torná-lo apto a conviver em sociedade.
Estabelecemos então um paralelo entre a pena e a medida de segurança, em um primeiro momento a pena e a sua aplicação tem por finalidade ser retributiva preventiva, ou seja, busca reparar o mal causado. É também proporcional à gravidade do delito o qual foi cometido, em sua análise temos o juízo de culpabilidade e o seu cumprimento é em prazo fixado em sentença.
Diferentemente da pena, que tem caráter punitivo, as medidas de segurança não assumem a feição de castigo. Em razão disso, durante muito tempo entendeu-se que a proibição constitucional às penas de caráter perpétuo não se aplicava às medidas de segurança (GRECO, 2017, p.836).
A principal diferença então está nas características da medida de segurança, uma vez que a mesma busca efetivamente a prevenção de novos atos ilícitos, além de a sua proporcionalidade é fundamentada na periculosidade. Quanto à análise, temos o juízo de periculosidade, que ao invés de julgar as causas de culpa levará em consideração o grau de perigo que esse indivíduo representa a ele mesmo e a sociedade.
Quanto ao cumprimento, temos uma grande peculiaridade, este é indeterminado, respeitando um máximo já definido por lei, então não se sabe ao certo por quanto tempo o inimputável ou o semi-imputável permanecerá sob tratamento. A ideia principal é que seja mantido até que cesse ou desapareça a periculosidade do agente.
A princípio temos duas espécies definidas de medida de segurança, estão dispostas no artigo 96 do nosso Código Penal, com a seguinte redação:
Art. 96. As medidas de segurança são: I - Internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento adequado; II - Sujeição a tratamento ambulatorial. Parágrafo único - Extinta a punibilidade, não se impõe medida de segurança nem subsiste a que tenha sido imposta (BRASIL, 1984).
Tanto na internação hospitalar quanto no tratamento ambulatorial, temos um prazo pré-definido mínimo para a sua efetivação sendo que é indispensável perícia médica a fim de averiguar o estado atual e a cessação ou permanência da periculosidade do agente.
1.3 Da aplicabilidade da Medida de Segurança
Após análise do juízo de periculosidade, não haverá o estabelecimento de um prazo em específico para a liberação do agente, o prazo mínimo de permanência é disposto pelo parágrafo primeiro do artigo 97 do código penal: “§ 1º - A internação, ou tratamento ambulatorial, será por tempo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação de periculosidade. O prazo mínimo deverá ser de 1 (um) a 3 (três) anos” (BRASIL, 1984).
Art. 26 - É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento (BRASIL, 1984).
A duração total dependerá do resultado da perícia médica a ser realizada após passado o prazo mínimo de ano em ano ou sempre que houver determinação judicial do juiz de execução. Havendo a possibilidade de desinternação ou liberação condicional do agente.
Voltando o nosso pensamento a finalidade da medida de segurança, que nada mais é que a busca de obter a cura do indivíduo, é reflexivo a ideia que em certos casos a finalidade não venha a ser cumprida. Será então que o nosso agente do ato ilícito passará o resto de sua vida internado ou passando por tratamento ambulatorial.
A Constituição Federal de 1988 inibe penas e medidas de caráter perpétuo, sendo assim, e tutela esse direito através do princípio da irretroatividade art. 5º, inciso XL, que em uma definição ampla, diz que a lei penal não retroagirá, salvo para benefício do réu.
Com isso, temos hoje o máximo que pode ser imputado ao agente submetido a medida de segurança, é o estabelecido no artigo 75 do Código Penal, que em sua nova redação imposta pelo Pacote Anticrime, Lei N. 13.964/19, passa a ser de 40 anos para casos ocorridos após a sua entrada em vigência (BRASIL, 2019).
2. PACOTE ANTICRIME
A busca pela melhora da segurança pública é alvo de inúmeras políticas públicas e defendida de forma unânime por todos os envolvidos com a administração pública. Não diferente desse modelo, a ideia do Pacote Anticrime nasce com foco principal buscar meios para que haja a diminuição da violência.
De modo geral, trata-se das modificações por meio de alterações em diversos dispositivos normativos, sendo elas nas esferas materiais, formais e também no procedimento processual. Abrange inúmeras ideias já formuladas anteriormente para chegar ao objetivo final, a Lei 13.964/2019 que foi nomeada de Pacote Anticrime.
Muitos doutrinadores e especialistas do campo do direito, sobretudo da esfera penal, defendem as mudanças, o que para muitos foi denominado como uma espécie de minirreforma penal. O estabelecimento de um pensamento no sentido de que as penas privativas de liberdade possuem um determinado limite, e este não pode ser excedido, um dos principais critérios utilizados como base, é que a pena seja inferior à expectativa de vida do país.
É dado como garantia constitucional de que não haverá penas de caráter perpétuo (art. 5º, inciso XLVII, b, da Constituição Federal). Simplificando, a escolha da quantia exata, tem um marco o qual não pode ser excedido, onde a pena máxima é uma escolha política relativamente limitada com base na expectativa de vida brasileira que anteriormente era de 45 anos e agora passa a ser de 75 anos ou mais.
Apesar da enorme reformulação imposta, iremos concentrar nossas ideias no artigo 75 do código penal, que em seu texto expressa o quantitativo de anos que uma condenação transitada em julgado pode ir. A lei em questão alterou a pena máxima anteriormente de 30 anos para um novo marco, 40 anos (BRASIL, 2019).
Em um primeiro momento não parece ser de grande importância a mudança, uma vez que levando em consideração os princípios já citados da anterioridade e da reserva legal, aplica-se apenas para novos casos este prazo atual. Pois bem, falaremos do objeto principal deste estudo.
Por meio de uma análise superficial, a ideia de propor um aumento na pena parece e de fato é uma agravante na lei, mas é preciso definir que quando falamos em medida de segurança, não temos a intenção de penalização, mas de prevenção para que possa haver futuramente a ressocialização.
Ao analisar os indivíduos que são definidos como inimputáveis e semimputáveis, sabemos que são classificados dessa forma quando do cometimento do ato ilícito, a pessoa não tenha a capacidade e nem o entendimento da ilicitude do fato. Nessa prerrogativa o entendimento de:
Em psiquiatria forense se dá o nome de capacidade de imputação jurídica ao estado psicológico que se fundamenta no entendimento que o indivíduo tem sobre o caráter criminoso do fato e na aptidão de determinar-se de acordo com esse entendimento. Em suma, a capacidade de imputação jurídica depende da razão e do livre-arbítrio do agente do crime (PALOMBA, 2003, p.197).
Portanto, não constatando a sua recuperação, o indivíduo permanecerá em tratamento até que possa novamente ser incluído na sociedade. Mas quando nos casos em que não há cura, o agente que iniciou o seu tratamento antes da alteração da pena máxima, permanecerá pelo prazo máximo de 40 anos.
Apesar de não disposto em nenhum dispositivo que o tempo máximo para tratamento seja o mesmo que para o cumprimento de pena, adota-se o prazo do artigo 75 do Código Penal com base no entendimento do STF. Além disso, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento ao julgar recurso de que a prescrição da medida de segurança deve ser calculada pelo máximo da pena cominada ao delito cometido pelo agente, ocorrendo o marco interruptivo do prazo pelo início do cumprimento daquela, sendo certo que deve perdurar enquanto não haja cessado a periculosidade do agente, mas limitada a pena máxima prevista.
Após este entendimento, foi editada a súmula do STJ 527 a respeito da duração do cumprimento da Medida de Segurança. Levando em consideração que houve o aumento de mais dez anos, para quem segue em cumprimento de pena é uma lei que impôs uma maior gravidade, logo, não retroagirá. Mas será que de fato o aumento da pena máxima é mais gravoso, não se pode tirar algo de bom desde que seja de forma benéfica a alguém.
Pensamos então no agente que segue em tratamento e ao se passar o prazo hoje tido como máximo, não se obteve a finalidade da medida de segurança, a cura. Esse indivíduo, não mais receberá o tratamento e voltará a sociedade, sem nenhuma perspectiva de melhora, torna-se bem provável que cometa um novo ato típico ilícito. É neste momento que por intermédio do ministério público, será movida uma ação de interdição, pela esfera cível, a fim de preservar e manter os cuidados.
Mesmo submetido a perícia médica e verificando a contínua imputabilidade do agente delituoso, este não mais poderá permanecer em tratamento como uma forma de ato processual penal. Nesse sentido, destaca:
Ao nosso ver, não existe nenhuma incompatibilidade – e muito menos afronta à natureza jurídica da decisão – na colaboração entre juízes e médicos, trabalhando juntos na aplicação e execução da medida de segurança criminal. Haveria assim uma obrigatória natureza jurisdicional administrativa na qual médicos e juízes exerceriam funções coordenadas e decisórias – sempre suscetíveis de recurso – optando pela espécie de medida a ser imposta, seus prazos de duração e melhor forma de cumprimento (FERRARI, 2001, p.79).
Por meio da nova redação imposta pelo Pacote Anticrime ao artigo 75, é necessário muito mais que uma mera contestação de gravidade na lei, para que assim o agente possa permanecer em tratamento (BRASIL, 2019). De forma mais objetiva, é de comum acordo que um indivíduo que ainda não obteve melhora, deve ao certo continuar com seu tratamento.
3. CENÁRIO APÓS AS MUDANÇAS
Frente a tantas mudanças, torna-se necessária que haja uma definição de entendimento para atendermos as expectativas e que seja cumprido o devido fim legal da criação das normas. Antes mesmo que se pensasse sobre a criação da Lei 13.964/2019, o Superior Tribunal de Justiça, após conclusão de inúmeros julgamentos e grande necessidade de definir um prazo máximo para o cumprimento da medida de segurança. A doutrina discorre sobre o assunto alegando que:
Com efeito, a finalidade de tratar o inimputável até justificaria a ausência de prazos máximos, pois o que determina o término do tratamento é a cura. No entanto, tem-se verificado, na prática, situações de injustiça incontestável, já́ que pessoas imputáveis que praticam atos idênticos aos perpetrados por inimputáveis, normalmente, ficam privadas de sua liberdade por prazo muito inferior ao de internação do inimputável (Paschoal, 2015, p. 154).
Sempre com a ideologia de não tornar o ato de tratamento recuperativo, em uma forma analógica de perpetuidade, houve a elaboração do entendimento que posteriormente tornou-se a súmula 527: “O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado” (BRASIL, 2015).
Observa-se a predominância nas jurisprudências adotando essa determinação e fazendo com que a pessoa submetida à medida de segurança permaneça nesta até que se cumpra o prazo de pena definido em cada tipo penal. Ou seja, o prazo máximo para permanência na medida de segurança respeitará o crime e sua respectiva pena.
A atual súmula tem sua base a atenção aos princípios da isonomia, proporcionalidade e razoabilidade, estabelecendo como limite para sua duração o máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado, não se podendo conferir tratamento mais severo e desigual ao inimputável, uma vez que ao imputável, a legislação estabelece expressamente o respectivo limite de atuação do Estado.
Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal afirma entendimento diverso, onde busca analisar a periculosidade, sem deixar de respeitar a previsão legal da constituição de medidas de caráter perpétuo. É possível verificar esse entendimento em várias decisões julgadas por este órgão e suas jurisprudências.
Assim, o STF sedimentou o seu posicionamento, fixando o tempo máximo para cumprimento da medida de segurança, seguindo o prazo estabelecido no artigo 75 do Código Penal, sem levar em consideração o crime praticado ou a vida pregressa do agente, exigindo-se apenas a periculosidade como fator determinante para sua manutenção.
Exemplo da atuação do STF, onde ocorre a contestação da periculosidade como fator para definir a permanência, temos o Recurso do Habeas Corpus nº 100383, no qual o recorrente incorreu na prática do crime tipificado de lesão corporal de natureza grave, permanecendo por 23 anos em um Instituto Psiquiátrico. Porém para o referido crime a pena máxima prevista é de 05 anos de reclusão.
Sem dúvidas, segue-se o entendimento de que seja no cumprimento de pena, ou na recuperação e tratamento por meio de medidas de segurança, o prazo máximo deve ser respeitado de forma crucial. Com a mudança proporcionada pela Lei 19.964/2019, alterou-se o prazo máximo do cumprimento de pena tendo em vista o aumento também da expectativa de vida do povo brasileiro.
Como atualmente o prazo atual de pena máxima estabelecido pelo artigo 75 do Código Penal é de 40 anos, após a mudança ocasionada pelo pacote anticrime, para os novos casos a partir da lei em diante, estão submetidos ao cumprimento máximo seguindo a atualização da lei vigente. Já para quem está realizando o tratamento antes da promulgação da lei, o tempo é de 30 anos seguindo o princípio da irretroatividade.
É preciso pontuar que após atingido o cumprimento do prazo máximo, caso não haja a recuperação da saúde mental do indivíduo e permanecendo a periculosidade, este não deixará de ser assistido e nem o seu direito ao tratamento descartado. Isso porque o cumprimento do prazo é para a esfera penal. Sendo possível e necessário que tramite a ação de interdição, a qual é movida como parte legítima da ação do Ministério Público, como representante do indivíduo.
CONCLUSÃO
A partir da análise das principais modificações previstas pela Lei 19.964 de 2019, é perceptível as mudanças ocorridas, principalmente no Código Penal, no que diz respeito ao aumento da pena máxima. Tendo em vista a previsão do princípio da anterioridade, tem-se que o dispositivo que disponha de punição mais gravosa, não deve retroagir aos já considerados em trânsito em julgado.
Por sua vez, a medida de segurança em suas aplicações tem uma característica peculiar, sua essência não é punitiva, mas sim uma forma de tratamento a que deve ser submetido o autor de crime com o fim de curá-lo ou torná-lo apto a conviver em sociedade. Assim, permitir que o tratamento seja prorrogado, desconsiderando o atrelamento analógico à pena máxima, é de fato benéfico não somente ao indivíduo, mas para a sociedade também.
Porém, observa-se que existem controvérsias quanto aos procedimentos adotados, principalmente no que tange ao enunciado do Superior Tribunal de Justiça, em sua Súmula 527, que estipula que para as medidas de segurança deve se adotar o prazo de tempo de duração conforme o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado.
Já o Supremo Tribunal Federal, em seu enunciado diz que o prazo é a pena máxima disposto no artigo 75 do Código Penal Brasileiro, sendo assim necessária adequação do enunciado para que seja verificado o lado do indivíduo.
Como apresentado, no que se refere a essa questão, profissionais da área defendem que haja uma melhor assistência para esses indivíduos, de forma a analisar não somente o tempo de permanência, mas o grau de perigo ainda existente, além de uma possível exposição desse em uma sociedade despreparada. Aliado a essa questão, tem-se a opinião de diversos membros da área da saúde, principalmente da saúde mental que afirmam que nos casos em que a hipótese de cura é praticamente nula.
Com isso, conclui-se que a lei 19.934 possibilitou maior dilatação da pena máxima, possibilitando que novos casos possam ser tratados em tempo maior. Porém, ressalva-se que é necessário maior aprofundamento nas hipóteses de retroatividade de forma benéfica, a fim de alcançar o indivíduo que ainda necessita de cuidados especiais e ainda não é apto para o convívio em sociedade.
REFERÊNCIAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal Vol. I – Parte Geral. 8. Ed. São Paulo: Saraiva, 2003.
BRASIL. Decreto-Lei 13.964, de 24 de dezembro de 2019. Pacote Anti-Crime. Diário Oficial da União, Brasília, 24 de dezembro de 2019. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/_ato2019-2022/2019/lei/L13964.htm>. Acesso em: 15 out. 2021.
BRASIL. Decreto-Lei 7.209, de 11 de julho de 1984. Alterações Código Penal. Diário Oficial da União, Brasília, 11 de julho de 1984. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/1980-1988/L7209.htm>. Acesso em: 20 out. 2021.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Súmula nº 527. [2015]. Disponível em: <https://scon.stj.jus.br/SCON/sumulas/doc.jsp?livre=@num=%27527%27>. Acesso em: 19 ago. 2021.
BRASIL. Supremo tribunal federal. Primeira Turma. Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 82.924-4/SP. Relator: Ministro Sepúlveda Pertence. Decisão unânime. Brasília, [2003]. DJU de 05.09.2003. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=102880>. Acesso em: mai. 2013. Acesso em: 10 out. 2021.
Disponível em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/presos/ parte910.htm>. Acesso em: 10 out. 2021.
FERRARI, Eduardo Reale. Medidas de Segurança e Direito Penal no Estado Democrático de Direito. 1ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral, Vol. I / Rogério Greco. – 19. ed. – Niterói, RJ: Impetus, 2017, p.836-842.
KUEHNE, Maurício. Teoria e Prática da Aplicação da Pena. 5ª Ed. Curitiba: Juruá Editora, 2005.
LEVORIN, Marco Polo. Princípio da Legalidade na Medida de Segurança. 1ª Ed. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2003.
LOPES, Jair Leonardo. Curso de direito penal. São Paulo: RT, 1999
MARQUES, João Benedicto de Azevedo. Medida de segurança. Disponível em: <http://www.pge.sp.gov.br/centrodeestudos/bibliotecavirtual/presos/cartilha.htm> Acesso em: 10 out. 2021.
PASCHOAL, Janaina Conceição. Direito penal: Parte Geral. 2ª ed. Barueri, São Paulo: Manole, 2015.
[1] Mestre em Direito Econômico e Desenvolvimento pelo Programa de Mestrado em Direito da Universidade Candido Mendes - UCAM. Especialista em Direito nas Relações de Consumo - UCAM. Especialista em Direito da Concorrência e Propriedade Industrial- UCAM. Diretor e Membro do Conselho Editorial da Revista Tribuna da Advocacia da Escola Superior de Advocacia da Ordem dos Advogados do Brasil do Tocantins. Professor e orientador da graduação (bacharelado) do curso de Direito da Universidade Candido Mendes - Ipanema (licenciado). Professor da graduação e da pós-graduação do
curso do Centro Universitário Católica do Tocantins – UBEC.
Bacharelando em Direito pelo Centro Universitário Católica do Tocantins - UNICATÓLICA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SA, GABRIEL PEREIRA DE. A adequação da aplicação de pena máxima frente ao pacote anticrime nas circunstâncias da medida de segurança Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 nov 2021, 04:26. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/57669/a-adequao-da-aplicao-de-pena-mxima-frente-ao-pacote-anticrime-nas-circunstncias-da-medida-de-segurana. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: LEONARDO DE SOUZA MARTINS
Por: Willian Douglas de Faria
Por: BRUNA RAPOSO JORGE
Por: IGOR DANIEL BORDINI MARTINENA
Por: PAULO BARBOSA DE ALBUQUERQUE MARANHÃO
Precisa estar logado para fazer comentários.