RESUMO: O provimento de cargos e empregos públicos, conforme previsto no art. 37, incisos I e II, da Constituição da República Federativa do Brasil exige, como regra, a prévia aprovação em concursos de provas ou de provas e títulos. Em razão da estabilidade, segurança financeira, bons salários e condições de trabalho, milhares de pessoas se submetem a árduas jornadas de dedicação e abdicações para obter a aprovação em certames públicos. Contudo, o simples êxito em todas as etapas não é capaz de gerar direito subjetivo à nomeação. As Cortes Superiores constantemente resolvem conflitos jurídicos entre os candidatos e a Administração, tendo firmado o entendimento de que os aprovados dentro do número de vagas, como regra, têm direito de exigir seu provimento no cargo, mas aqueles que se encontram fora das vagas ofertadas possuem apenas mera expectativa de direito, salvo algumas situações específicas e extraordinárias já reconhecidas pelas Cortes brasileiras.
PALAVRAS-CHAVES: Concurso público. Candidatos aprovados dentre e fora do número de vagas. Direito subjetivo de nomeação. Mera expectativa de direito.
SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Nomeação dos candidatos aprovados dentro do número de vagas oferecidas no edital. 3. Nomeação dos candidatos aprovados fora do número de vagas previstas no edital. 3.1. A tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE n.º 837.311/PI, com repercussão geral reconhecida. 3.2. A desistência de candidatos convocados dentro do prazo de validade do concurso gera direito subjetivo à nomeação dos candidatos subsequentes. 4. Considerações finais. 5. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O art. 37, incisos I e II, da Constituição Federal de 1988, exige a prévia aprovação em concurso de provas ou de provas e títulos para o provimento em cargos e empregos públicos.
Concurso público é conceituado por Carvalho Filho (2011, p. 572) nos seguintes termos:
Concurso público é o procedimento administrativo que tem por fim aferir as aptidões pessoais e selecionar os melhores candidatos ao provimento de cargos e funções públicas. Na aferição pessoal, o Estado verifica a capacidade intelectual, física e psíquica de interessados em ocupar funções públicas e no aspecto seletivo são escolhidos aqueles que ultrapassam as barreiras opostas no procedimento, obedecida sempre a ordem de classificação. Cuida-se, na verdade, do mais idôneo meio de recrutamento de servidores públicos [...]
Para Meirelles (2014, p 505), o concurso traduz-se como um meio técnico empregado para se propiciar a eficiência, o aperfeiçoamento e a moralidade no trato com o serviço público. Veja-se:
[…] O concurso é o meio técnico posto à disposição da Administração Pública para obter-se moralidade, eficiência e aperfeiçoamento do serviço público e, ao mesmo tempo, propiciar igual oportunidade a todos os interessados que atendam aos requisitos da lei, fixados de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, consoante determina o art. 37, II, da CF. [...]
Corroborando com tais entendimentos, Gasparini (2012, p. 231) afirma que o certame público “é o procedimento prático-jurídico posto à disposição da Administração Pública direta, autárquica, fundacional e governamental de qualquer nível de governo, para a seleção do futuro melhor servidor, necessário à execução de serviços sob sua responsabilidade”.
Carvalho Filho (2011, p. 574) instrui que o alcance da exigência do concurso público deve ser o mais amplo possível, de tal forma que qualquer cargo ou emprego estatal não elencado nas exceções constitucionais deverá ser provido obrigatoriamente por cidadãos previamente aprovados em certames públicos.
Nessa linha de intelecção, concorrer aos certames públicos é considerado direito fundamental, sendo uma prerrogativa tanto para o Estado, quanto para o concorrente à vaga. A Administração terá a garantia de ter, em seu quadro de servidores, os candidatos mais bem preparados, concretizando, assim, o princípio da eficiência administrativa. O cidadão, por sua vez, terá a segurança de que o processo seletivo será livre de favorecimentos ou perseguições pessoais, em observância ao princípio da isonomia.
Importante registrar que desde a Constituição de 1967 somente é permitida a realização de concorrências públicas de provas ou de provas e títulos, não sendo legítima a seleção que se baseia somente em títulos. Nestes termos, dispõe Meirelles (2014, p. 506, grifo do autor):
Desde a Constituição/67 para os cargos públicos efetivos e a quase totalidade dos vitalícios os concursos públicos só podem ser de provas ou de provas e títulos, ficando, assim, afastada a possibilidade de seleção com base unicamente em títulos, como ocorria na vigência da Constituição/46, que fazia igual exigência para a primeira investidura em cargos de carreira, silenciando, entretanto, quanto à modalidade do concurso (art. 186; cf. art. 37, II, da atual CF) [...]
A exigência de provas se fundamenta no fato de que se houvessem concursos somente com títulos, a seleção não permitiria uma disputa em igualdade de condições. As provas existem para que se possa medir, de forma segura e objetiva, a qualidade intelectual do candidato. Títulos são somente uma vantagem a mais, uma ideia de que aquele candidato possui conhecimento mais amplo ou mais experiência naquela área de atuação. Carvalho Filho (2011, p. 573), argumenta:
Obviamente, não é esse o escopo do concurso de títulos, integrante do concurso de provas e títulos. A titulação dos candidatos não pode servir como parâmetro para aprovação ou reprovação no concurso público, pena de serem prejudicados seriamente aqueles que, contrariamente a outros candidatos, e às vezes por estarem em início da profissão, ainda não tenham tido oportunidade de obterem esta ou aquela titulação. Entendemos, pois, que os pontos atribuídos à prova de títulos só podem refletir-se na classificação o dos candidatos, e não em sua aprovação ou reprovação. De outro lado, revela-se ilegítima a pontuação desproporcional atribuída a títulos; aqui a Administração deve respeitar o princípio da proporcionalidade, pois que, não agindo dessa maneira, pesarão fundadas suspeitas sobre o propósito de favorecimento de determinados candidatos. Só assim é possível considerar o concurso de provas e títulos compatível com o princípio da impessoalidade inscrito no art. 37 da CF.
Diante da ampla oferta de cargos e empregos públicos nas mais diversas áreas de atuação e atraídos pela segurança financeira, estabilidade, bons salários e condições de trabalho, milhares de cidadãos se submetem a intensas e exaustivas horas de esforço, dedicação e empenho, despendem quantidade considerável de recursos financeiros e abdicam de momentos de lazer para obter êxito nos certames.
Destarte todos os esforços por parte do candidato, o pequeno número de vagas existentes acaba por frustrar o almejado ingresso no funcionalismo público.
Nessa ordem de ideias, diversos conflitos entre candidatos e o Poder Público foram instaurados e a principal controvérsia existente é sobre o direito de nomeação do candidato que é aprovado dentro e fora do número de vagas ofertadas pela Administração.
Nessa perspectiva, o presente artigo tem por objetivo principal a análise dos direitos conferidos aos aprovados em concursos públicos com base na jurisprudência dos Tribunais Superiores.
Utilizou-se, como metodologia, da análise de diversos julgados das Cortes Superiores sobre a matéria. Ademais, também foram estudadas as produções doutrinárias relacionadas com a temática, tendo se utilizado como base, ainda, as disposições legais e constitucionais concernentes à matéria.
2. NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS OFERECIDAS NO EDITAL
O entendimento tradicional da jurisprudência brasileira é no sentido de aqueles que obtiveram êxito em concursos somente teriam expectativa de direito em serem nomeados, ficando submetidos aos critérios de conveniência e oportunidade da Administração Pública. Contudo, diante da acirrada competitividade existente atualmente, que resulta da diminuição na oferta de cargos e no aumento de pessoas interessadas em integrar os quadros de funcionários públicos, bem como em virtude do aumento da litigiosidade judicial, o entendimento dos Órgãos Judiciais mudou drasticamente, existindo algumas hipóteses em que é garantido o direito subjetivo à nomeação e outras em que há mera expectativa.
Nessa conjuntura, em 13 de dezembro de 1963, com a edição do enunciado da Súmula n. 13, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que é garantido o direito à nomeação ao concorrente que tenha sido aprovado no concurso, mas foi prejudicado pela inobservância da ordem de classificação. Nesses termos, transcrevo o referido enunciado: “dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem o direito à nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação”.
Nos casos não abrangidos pela Súmula da Suprema Corte, prevalecia a mera expectativa de nomeação. Di Pietro, Motta e Ferraz (2014, p. 51, grifo do autor) discorrem sobre essa problemática:
A questão que se analisa, a da existência ou não de direito à nomeação, não é meramente semântica ou acadêmica. O entendimento tradicional ofereceu amparo para situações de completo desvirtuamento do instituto do concurso público. Tornou-se relativamente comum a realização de concursos sem que, ao final, se procedesse à nomeação ou contratação dos aprovados.
Nessa conjuntura, o Supremo Tribunal Federal, ciente dos abusos cometidos pela Administração, a qual, prevalecendo-se da jurisprudência tradicional, em diversas ocasiões deixava transcorrer o prazo de validade do certame sem nomear nenhum ou poucos aprovados, mudou o entendimento até então dominante e passou a considerar que o candidato aprovado dentro do número de vagas dispostas no edital tem assegurada a prerrogativa de exigir sua nomeação. Nesses termos, cito trechos da ementa do julgado proferido no RE n.º 598099/MS, sob a sistemática da repercussão geral:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. CONCURSO PÚBLICO. PREVISÃO DE VAGAS EM EDITAL. DIREITO À NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS. I. DIREITO À NOMEAÇÃO. CANDIDATO APROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. Dentro do prazo de validade do concurso, a Administração poderá escolher o momento no qual se realizará a nomeação, mas não poderá dispor sobre a própria nomeação, a qual, de acordo com o edital, passa a constituir um direito do concursando aprovado e, dessa forma, um dever imposto ao poder público. Uma vez publicado o edital do concurso com número específico de vagas, o ato da Administração que declara os candidatos aprovados no certame cria um dever de nomeação para a própria Administração e, portanto, um direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado dentro desse número de vagas. II. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. BOA-FÉ. PROTEÇÃO À CONFIANÇA. O dever de boa-fé da Administração Pública exige o respeito incondicional às regras do edital, inclusive quanto à previsão das vagas do concurso público. Isso igualmente decorre de um necessário e incondicional respeito à segurança jurídica como princípio do Estado de Direito. Tem-se, aqui, o princípio da segurança jurídica como princípio de proteção à confiança. Quando a Administração torna público um edital de concurso, convocando todos os cidadãos a participarem de seleção para o preenchimento de determinadas vagas no serviço público, ela impreterivelmente gera uma expectativa quanto ao seu comportamento segundo as regras previstas nesse edital. Aqueles cidadãos que decidem se inscrever e participar do certame público depositam sua confiança no Estado administrador, que deve atuar de forma responsável quanto às normas do edital e observar o princípio da segurança jurídica como guia de comportamento. Isso quer dizer, em outros termos, que o comportamento da Administração Pública no decorrer do concurso público deve se pautar pela boa-fé, tanto no sentido objetivo quanto no aspecto subjetivo de respeito à confiança nela depositada por todos os cidadãos. (STF - RE: 598099 MS, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 10/08/2011, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe 03/10/2011, REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO, grifo nosso)
Ressalte-se que esse entendimento não é absoluto. De fato, no mesmo julgado, a Corte Suprema elencou hipóteses excepcionalíssimas em que seria possível negar a nomeação do candidato. Veja-se:
[...] III. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. NECESSIDADE DE MOTIVAÇÃO. CONTROLE PELO PODER JUDICIÁRIO. Quando se afirma que a Administração Pública tem a obrigação de nomear os aprovados dentro do número de vagas previsto no edital, deve-se levar em consideração a possibilidade de situações excepcionalíssimas que justifiquem soluções diferenciadas, devidamente motivadas de acordo com o interesse público. Não se pode ignorar que determinadas situações excepcionais podem exigir a recusa da Administração Pública de nomear novos servidores. Para justificar o excepcionalíssimo não cumprimento do dever de nomeação por parte da Administração Pública, é necessário que a situação justificadora seja dotada das seguintes características: a) Superveniência: os eventuais fatos ensejadores de uma situação excepcional devem ser necessariamente posteriores à publicação do edital do certame público; b) Imprevisibilidade: a situação deve ser determinada por circunstâncias extraordinárias, imprevisíveis à época da publicação do edital; c) Gravidade: os acontecimentos extraordinários e imprevisíveis devem ser extremamente graves, implicando onerosidade excessiva, dificuldade ou mesmo impossibilidade de cumprimento efetivo das regras do edital; d) Necessidade: a solução drástica e excepcional de não cumprimento do dever de nomeação deve ser extremamente necessária, de forma que a Administração somente pode adotar tal medida quando absolutamente não existirem outros meios menos gravosos para lidar com a situação excepcional e imprevisível. De toda forma, a recusa de nomear candidato aprovado dentro do número de vagas deve ser devidamente motivada e, dessa forma, passível de controle pelo Poder Judiciário. (STF - RE: 598099 MS, Relator: Min. GILMAR MENDES, Data de Julgamento: 10/08/2011, Tribunal Pleno, Data de Publicação: DJe 03/10/2011, REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO, grifo nosso)
Corroborando com a conclusão do Supremo Tribunal, Carvalho Filho (2014, p. 641) faz uma relevante análise:
[...] deve assegurar-se a todos os aprovados dentro do referido número de vagas direito subjetivo à nomeação. Sendo assim, a falta de nomeação é que deve constituir exceção, cabendo ao órgão público comprovar, de forma fundamentada, a sua omissão. Somente com tal orientação poderá impedir-se o arbítrio da Administração, ao mesmo tempo em que com ela poderá respeitar-se, com impessoalidade, a ordem classificatória advinda do concurso público, obstando-se a que os aprovados fiquem à mercê dos caprichos e humores dos dirigentes administrativos.
Registre-se que as hipóteses extraordinárias elencadas pela Corte Suprema devem ser comprovadas de forma cabal e inequívoca. Assim, simples alegações sobre a pandemia, crise econômica e o alerta da Corte de Contas acerca do chamado limite prudencial para despesas com pessoal não são motivos legítimos para se deixar de nomear os aprovados nas vagas do certame. Nesse sentido, confira-se precedente do Superior Tribunal de Justiça:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO DO ENTE BANDEIRANTE CONTRA A SOLUÇÃO UNIPESSOAL QUE CONCEDEU A SEGURANÇA EM RMS AO CANDIDATO APROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS. ALEGAÇÃO DO PODER PÚBLICO DE QUE HÁ SITUAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA IMPEDITIVA À NOMEAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DA AUTORIDADE DE QUE SE ESTARIA DIANTE DE HIPÓTESE FÁTICA EXCEPCIONAL APONTADA PELA CORTE SUPREMA NO RE 598.099/MS, ATÉ PORQUE A NÃO NOMEAÇÃO DOS LEGITIMAMENTE APROVADOS DEVE SER A ÚLTIMA DAS OPORTUNIDADES (RMS 57.565/SP, REL. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJE 20.08.2018). AGRAVO INTERNO DA FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO NÃO PROVIDO. 1. Não se está a discutir a tese - já muito conhecida e reverenciada - de que a aprovação em concurso público dentro do número de vagas previstas no edital convalida a mera expectativa em direito subjetivo do candidato a ser nomeado para o cargo a que concorreu e foi devidamente habilitado. 2. Discute-se se a espécie comportaria a aplicação das chamadas situações excepcionais elencadas pela Corte Suprema no RE 598.099/MS, alusivas aos critérios de superveniência, imprevisibilidade, gravidade e necessidade, que constituiriam o alicerce para a não nomeação dos aprovados pelo Poder Público. 3. Acerca do tema, esta Corte Superior tem a diretriz de que a recusa à nomeação dos aprovados dentro do número de vagas deve ser a última das oportunidades, quando realmente já não houver saída para a Administração Pública (RMS 57.565/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, Segunda Turma, DJe 20.08.2018). 4. À luz desse julgado, no caso que ora se controverte, muito embora venha a brandir o estado das coisas - pandemia, crise econômica, limite prudencial atingido para despesas com pessoal -, que teria resultado em situação financeira impeditiva às nomeações, o fato é que, em observância ao caderno processual, não se verifica a existência dos reais elementos orçamentários que venham a embasar o não chamamento dos candidatos aprovados dentro do número de vagas. 5. Não se desconhece que, no caso concreto, tenha a autoridade apontada como coatora adotado providências em contingenciamento, no afã de afastar o risco de ultrapassar o limite da Lei de Responsabilidade Fiscal para as despesas com pessoal (fls. 272/275). Há, nos autos, planilhas alusivas à execução orçamentária. Contudo, não há evidências de que o órgão está diante das situações excepcionalíssimas anotadas pelo excelso STF, justificadoras do afastamento das nomeações, não sendo suficiente o alerta da Corte de Contas acerca do chamado limite prudencial. 6. Agravo Interno da Fazenda Bandeirante não provido. (AgInt no RMS 66.316/SP, Rel. Ministro MANOEL ERHARDT (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TRF5), PRIMEIRA TURMA, julgado em 19/10/2021, DJe 17/11/2021, grifos nossos)
Em consonância com a jurisprudência pátria, Di Pietro, Motta e Ferraz (2014, p. 50, grifo do autor) disciplinam:
O concurso materializa-se em sequência, mediante atos interligados e destinados a identificar os mais aptos para ocupar cargos efetivos e empregos públicos. Ao iniciar um procedimento seletivo, a Administração exterioriza a necessidade de prover cargos e empregos. Há nisso uma clara manifestação da intenção de se preencher as posições permanentes em disputa. Tal como afirmado, o concurso não pode ser somente mais uma via para o aumento das receitas públicas, com o que é um contrassenso imaginar-se certame concluído sem que qualquer aprovado seja, ao final, nomeado ou contratado. Tratar-se-ia de um absurdo desperdício de esforços, tempo e dinheiro. Não obstante, situações como essa se reproduzem dia a dia num total desrespeito à confiança depositada pelo candidato e na boa-fé que deve permear os atos da Administração.
Por sua vez, Carvalho Filho (2014, p. 641, grifo do autor) afirma que “se o edital do concurso previu determinado número de vagas, a Administração fica vinculada a seu provimento, em virtude da presumida necessidade para o desempenho das respectivas funções”.
Em síntese, o direito subjetivo de nomeação dos candidatos aprovados no número de vagas previstos no instrumento convocatório é a regra geral, podendo ser afastado somente em hipóteses excepcionalíssimas, devidamente comprovadas.
Por outro lado, no tocante àqueles classificados fora do número de vagas, diversas situações peculiares foram submetidas à apreciação pelo Tribunais pátrios, sendo que o direito subjetivo ou a mera expectativa de nomeação varia de acordo com as particularidades de cada situação.
3. NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL
Conforme entendimento majoritário, os concorrentes que obtiveram êxito na aprovação, mas ficaram classificados fora do número de vagas ofertadas, têm mera expectativa de serem nomeados. Neste sentido, veja-se trechos de julgados recentes do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE FISCAL FEDERAL AGROPECUÁRIO - MÉDICO VETERINÁRIO. CANDIDATO APROVADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTO NO EDITAL. ALEGAÇÃO DE SURGIMENTO DE VAGA DURANTE O PERÍODO DE VALIDADE DO CONCURSO, BASEADO EM PEDIDO ORÇAMENTÁRIO DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO PARA A REALIZAÇÃO DE NOVO CONCURSO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO NÃO CONFIGURADO. SEGURANÇA DENEGADA, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. 1. Não é lícito à Administração, no prazo de validade do concurso público, omitir-se de praticar atos de nomeação dos aprovados dentro do limite das vagas ofertadas, em respeito às suas legítimas expectativas quanto à assunção do cargo público. Contudo, em relação aos candidatos classificados nas vagas remanescentes, o Poder Público pode se utilizar do juízo de conveniência e oportunidade [...] (STJ 1ª Seção - MS 21410 DF MANDADO DE SEGURANÇA 2014/0313722-7, Relator: Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 22/04/2015, Data de Publicação: DJe 05/05/2015, grifo nosso)
CONCURSO PÚBLICO. NOVAS VAGAS. NOMEAÇÃO. JUÍZO DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO. [...] Com efeito, esta Corte, ao julgar o RE 598.099-RG, sob a relatoria do Ministro Gilmar Mendes, assentou existir direito subjetivo à nomeação apenas para os candidatos aprovados em concurso público dentro do número de vagas previsto no edital. Não é disso que tratam os autos. Na ocasião, a fim de definir as balizas para a interpretação constitucional do princípio do concurso público, o relator consignou que “não se tem admitido é a obrigação da Administração Pública de nomear candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital, simplesmente pelo surgimento de vaga, seja por nova lei, seja em decorrência de vacância. Com efeito, proceder desse forma seria engessar a Administração Pública, que perderia sua discricionariedade quanto a melhor alocação das vagas, inclusive quanto a eventual necessidade de transformação ou extinção dos cargos vagos” (trecho do Informativo 636/STF). O Ministro relator ressaltou, ainda, que “o dever da Administração e, em consequência, o direito dos aprovados, não se estende a todas as vagas existentes, nem sequer àquelas surgidas posteriormente, mas apenas àquelas expressamente previstas no edital de concurso. Nesse contexto, apenas ao candidato aprovado dentro do número de vagas previsto no edital do certame é garantido o direito subjetivo à nomeação. Por outro lado, admite-se exceção a tal direito, desde que a situação especial seja explicitada e motivada pela Administração. Quanto aos demais classificados, ou seja, aqueles que foram aprovados em classificação além do número previsto no edital, a Administração Pública não estaria compelida a nomeá-los. Nesses casos, persiste nesta Corte o entendimento de que o preenchimento das vagas, inclusive as que surgirem ou forem criadas no decorrer do prazo de validade do certame, está inserido no âmbito de discricionariedade da Administração, desde que não fique caracterizada preterição do candidato. Na hipótese, todos os recorrentes foram aprovados fora do número de vagas previstas no edital e não há notícia de que foram preteridos, seja por desrespeito à ordem de classificação ou por preenchimento das vagas por contratações com vínculos precários. Assim, na linha da jurisprudência, o surgimento ou criação de novas vagas não gera direito à nomeação dos recorrentes. Diante do exposto, com base no art. 557, caput , do CPC e no art. 21, § 1º, do RI/STF, nego seguimento ao recurso extraordinário. Publique-se. Brasília, 25 de outubro de 2013 (STF - RE: 607590 PR, Relator: Min. ROBERTO BARROSO, Data de Julgamento: 25/10/2013, Data de Publicação: DJe 04/11/2013, grifo nosso)
No entanto, existem hipóteses em que, mesmo não tendo sido aprovado nas vagas ofertadas, o candidato poderá exigir sua nomeação, conforme será explanado no decorrer deste trabalho.
3.1. A tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE n.º 837.311/PI, com repercussão geral reconhecida
No julgamento do RE n.º 837.311/PI, a Corte Suprema firmou a compreensão de que a simples publicação de novo edital de concurso público ou o surgimento de novas vagas durante a validade de outro certame anteriormente realizado não obriga o provimento dos cargos. Para que haja direito subjetivo à nomeação, exige-se que o concurso ainda esteja vigente e que ocorra a preterição de candidatos aprovados fora das vagas sem motivação idônea e de forma arbitrária por parte da Administração, sendo necessária prova cabal e inequívoca desses requisitos. A propósito:
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. TEMA 784 DO PLENÁRIO VIRTUAL. CONTROVÉRSIA SOBRE O DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO DE CANDIDATOS APROVADOS ALÉM DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL DE CONCURSO PÚBLICO NO CASO DE SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS DURANTE O PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. MERA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. IN CASU, A ABERTURA DE NOVO CONCURSO PÚBLICO FOI ACOMPANHADA DA DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DA NECESSIDADE PREMENTE E INADIÁVEL DE PROVIMENTO DOS CARGOS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 37, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988. ARBÍTRIO. PRETERIÇÃO. CONVOLAÇÃO EXCEPCIONAL DA MERA EXPECTATIVA EM DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRINCÍPIOS DA EFICIÊNCIA, BOA-FÉ, MORALIDADE, IMPESSOALIDADE E DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA. FORÇA NORMATIVA DO CONCURSO PÚBLICO. INTERESSE DA SOCIEDADE. RESPEITO À ORDEM DE APROVAÇÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM A TESE ORA DELIMITADA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. 1. O postulado do concurso público traduz-se na necessidade essencial de o Estado conferir efetividade a diversos princípios constitucionais, corolários do merit system, dentre eles o de que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza (CRFB/88, art. 5º, caput). 2. O edital do concurso com número específico de vagas, uma vez publicado, faz exsurgir um dever de nomeação para a própria Administração e um direito à nomeação titularizado pelo candidato aprovado dentro desse número de vagas. Precedente do Plenário: RE 598.099 - RG, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, DJe 03-10-2011. 3. O Estado Democrático de Direito republicano impõe à Administração Pública que exerça sua discricionariedade entrincheirada não, apenas, pela sua avaliação unilateral a respeito da conveniência e oportunidade de um ato, mas, sobretudo, pelos direitos fundamentais e demais normas constitucionais em um ambiente de perene diálogo com a sociedade. 4. O Poder Judiciário não deve atuar como “Administrador Positivo”, de modo a aniquilar o espaço decisório de titularidade do administrador para decidir sobre o que é melhor para a Administração: se a convocação dos últimos colocados de concurso público na validade ou a dos primeiros aprovados em um novo concurso. Essa escolha é legítima e, ressalvadas as hipóteses de abuso, não encontra obstáculo em qualquer preceito constitucional. 5. Consectariamente, é cediço que a Administração Pública possui discricionariedade para, observadas as normas constitucionais, prover as vagas da maneira que melhor convier para o interesse da coletividade, como verbi gratia, ocorre quando, em função de razões orçamentárias, os cargos vagos só possam ser providos em um futuro distante, ou, até mesmo, que sejam extintos, na hipótese de restar caracterizado que não mais serão necessários. 6. A publicação de novo edital de concurso público ou o surgimento de novas vagas durante a validade de outro anteriormente realizado não caracteriza, por si só, a necessidade de provimento imediato dos cargos. É que, a despeito da vacância dos cargos e da publicação do novo edital durante a validade do concurso, podem surgir circunstâncias e legítimas razões de interesse público que justifiquem a inocorrência da nomeação no curto prazo, de modo a obstaculizar eventual pretensão de reconhecimento do direito subjetivo à nomeação dos aprovados em colocação além do número de vagas. Nesse contexto, a Administração Pública detém a prerrogativa de realizar a escolha entre a prorrogação de um concurso público que esteja na validade ou a realização de novo certame. 7. A tese objetiva assentada em sede desta repercussão geral é a de que o surgimento de novas vagas ou a abertura de novo concurso para o mesmo cargo, durante o prazo de validade do certame anterior, não gera automaticamente o direito à nomeação dos candidatos aprovados fora das vagas previstas no edital, ressalvadas as hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por parte da administração, caracterizadas por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a inequívoca necessidade de nomeação do aprovado durante o período de validade do certame, a ser demonstrada de forma cabal pelo candidato. Assim, a discricionariedade da Administração quanto à convocação de aprovados em concurso público fica reduzida ao patamar zero (Ermessensreduzierung auf Null), fazendo exsurgir o direito subjetivo à nomeação, verbi gratia, nas seguintes hipóteses excepcionais: i) Quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas dentro do edital (RE 598.099); ii) Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação (Súmula 15 do STF); iii) Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos aprovados fora das vagas de forma arbitrária e imotivada por parte da administração nos termos acima. 8. In casu, reconhece-se, excepcionalmente, o direito subjetivo à nomeação aos candidatos devidamente aprovados no concurso público, pois houve, dentro da validade do processo seletivo e, também, logo após expirado o referido prazo, manifestações inequívocas da Administração piauiense acerca da existência de vagas e, sobretudo, da necessidade de chamamento de novos Defensores Públicos para o Estado. 9. Recurso Extraordinário a que se nega provimento. (RE 837311, Relator(a): LUIZ FUX, Tribunal Pleno, julgado em 09/12/2015, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-072 DIVULG 15-04-2016 PUBLIC 18-04-2016, grifos nossos)
Aplicando essa tese, a 1ª Turma do Supremo, negou provimento ao Recurso em Mandado de Segurança n. 31.478/DF (Rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Edson Fachin, julgado em 9/8/2016), sob o fundamento de que o candidato tinha sido aprovado fora do número de vagas, o prazo de validade do seu certame tinha expirado e, em que pese tenha surgido vaga durante o período de validade do concurso público, não houve a comprovação de que havia disponibilidade orçamentária para que este cargo fosse imediatamente provido.
3.2. A desistência de candidatos convocados dentro do prazo de validade do concurso gera direito subjetivo à nomeação dos candidatos subsequentes
O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça já reconheceram o direito de provimento ao cargo de concorrente aprovado fora das vagas quando aqueles que estão dentro delas apresentam desistência ou são desclassificados. Nesse caso, a compreensão é de que esse lugar passa a ser ocupado pelo candidato imediatamente subsequente na ordem de classificação. Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO APROVADO DENTRO DAS VAGAS PREVISTAS NO EDITAL, CONSIDERADA A DESISTÊNCIA DE CANDIDATOS MELHOR CLASSIFICADOS NO CERTAME. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. I. Em consonância com o entendimento emanado do Supremo Tribunal Federal (STF, RE 598099/MS, Rel. Ministro GILMAR MENDES, TRIBUNAL PLENO, DJe de 30/09/2011), a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta-se no sentido de que o candidato aprovado em concurso público, dentro das vagas previstas no edital, tem direito subjetivo à nomeação. II. Na forma da jurisprudência do STJ, "a desistência dos candidatos convocados, ou mesmo a sua desclassificação em razão do não preenchimento de determinados requisitos, gera para os seguintes na ordem de classificação direito subjetivo à nomeação, observada a quantidade das novas vagas disponibilizadas. Precedentes: RMS 34.990/BA, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 14/02/2012; AgRg no REsp 1.239.016/PB, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 20/05/2011; RMS 32.105/DF, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 30/08/2010" (STJ, AgRg no REsp 1347487/BA, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, DJe de 05/03/2013). III. Agravo Regimental improvido. (STJ - AgRg no RMS: 30776 RO 2009/0209170-6, Relator: Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, Data de Julgamento: 17/09/2013, T6 - SEXTA TURMA, Data de Publicação: DJe 11/10/2013, grifo nosso)
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. Candidata aprovada, inicialmente, fora das vagas do edital. Desistência dos candidatos mais bem classificados. Direito a ser nomeada para ocupar a única vaga prevista no edital de convocação. Precedentes. 1. O Tribunal de origem assentou que, com a desistência dos dois candidatos mais bem classificados para o preenchimento da única vaga prevista no instrumento convocatório, a ora agravada, classificada inicialmente em 3º lugar, tornava-se a primeira, na ordem classificatória, tendo, assim, assegurado o seu direito de ser convocada para assumir a referida vaga. 2. Não se tratando de surgimento de vaga, seja por lei nova ou vacância, mas de vaga já prevista no edital do certame, aplica-se ao caso o que decidido pelo Plenário da Corte, o qual, ao apreciar o mérito do RE nº 598.099/MS-RG, Relator o Ministro Gilmar Mendes, concluiu que o candidato aprovado em concurso público dentro do número de vagas previstas no edital tem direito subjetivo à nomeação. 3. Agravo regimental não provido. (STF - ARE: 661760 PB , Relator: Min. DIAS TOFFOLI, Data de Julgamento: 03/09/2013, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe 29/10/2013, grifo nosso)
Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO QUE PASSA A FIGURAR DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. DESISTÊNCIA DE CANDIDATO CLASSIFICADO EM COLOCAÇÃO SUPERIOR. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. AGRAVO IMPROVIDO. I – O Plenário desta Corte, no julgamento do RE 598.099/MS, Rel. Min. Gilmar Mendes, firmou entendimento no sentido de que possui direito subjetivo à nomeação o candidato aprovado dentro do número de vagas previstas no edital de concurso público. II - O direito à nomeação também se estende ao candidato aprovado fora do número de vagas previstas no edital, mas que passe a figurar entre as vagas em decorrência da desistência de candidatos classificados em colocação superior. Precedentes. III – Agravo regimental improvido. (RE 643674 AgR, Relator(a): RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, julgado em 13/08/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-168 DIVULG 27-08-2013 PUBLIC 28-08-2013, grifo nosso)
Consigne-se, contudo, que não haverá direito subjetivo de nomeação se a desistência ocorreu após o prazo de validade do certame. A propósito:
PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO CLASSIFICADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. MERA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO. PRETERIÇÃO NÃO DEMONSTRADA. DESISTÊNCIA DE CANDIDATO MELHOR CLASSIFICADO APÓS O TRANSCURSO DO PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. 1. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é assente no sentido de que os candidatos aprovados fora do número de vagas previstas no edital não possuem direito líquido e certo à nomeação, salvo nas hipóteses de preterição arbitrária e imotivada por parte da Administração. 2. É também pacífico o entendimento que a expectativa de direito se transforma em direito subjetivo à nomeação nas situações em que o candidato, aprovado fora do número de vagas, passe a figurar, devido à desistência de aprovados classificados em colocação superior, dentro do quantitativo ofertado no edital do concurso. 3. Inexiste direito líquido e certo à nomeação no caso dos autos, porque, conforme a Corte a quo, "o prazo de validade do concurso findou em 30/06/2019. Nesse passo, verifica-se que as desistências dos dois candidatos mais bem classificados se operaram após o prazo de validade do concurso, visto que ambos foram nomeados em 29/06/2019, e os atos de nomeação foram tornados sem efeito apenas agosto e setembro de 2019". 4. Ocorre que, in casu, a desistência dos candidatos aprovados em melhores posições se deu após o prazo de validade do certame, o que não garante ao recorrente a vaga. Precedentes: RMS 59.655/RS, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe 27/03/2019; AgRg no RMS 46.535/DF, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Rel. p/ acórdão Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, DJe 29/4/2019; AgInt no RMS 52.660/ES, Rel. Min. Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe 18/6/2018; AgRg no RMS 42.244/ MS, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 26/4/2016; RMS 36.916/SP, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 08/10/2012. 5. Agravo Interno não provido. (AgInt no RMS 63.676/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/03/2021, DJe 05/04/2021, grifo nosso)
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Verifica-se que o concurso público é o meio utilizado pela administração pública para garantir a observância dos princípios da impessoalidade e eficiência, sendo garantida a todos os cidadãos, caso preencham os requisitos constantes do edital, a possibilidade de prestar o certame e, com a aprovação, integrar os quadros de servidores públicos.
A jurisprudência tradicional era firmada no sentido de que a aprovação no concurso não garantia a nomeação, mas a mera expectativa de provimento no cargo. Contudo, recentemente o entendimento dos Tribunais Superiores evoluiu, tendo sido fixada a tese de que, como regra, os aprovados dentro no número de vagas ofertadas no instrumento convocatório têm, como regra, o direito subjetivo de serem nomeados, salvo se presentes hipóteses excepcionalíssimas, supervenientes, imprevisíveis, e de extrema gravidade, devidamente justificadas.
Os candidatos aprovados fora do número de vagas, contudo, não possuem a mesma garantia. A eles é reconhecida, em regra, a mera expectativa de direito, podendo a Administração, com base em critérios de conveniência e oportunidade, deixar de nomeá-los. No entanto, em algumas circunstâncias peculiares, as Cortes Superiores já reconheceram a obrigatoriedade da nomeação de candidatos enquadrados nessa situação, como na hipótese em que há a desistência de algum candidato aprovado dentro das vagas e o certame ainda esteja em vigor, bem como quando há a comprovação cabal e inequívoca do surgimento de novas vagas durante o prazo de validade do concurso público, a necessidade de provimento e a arbitrária e imotivada preterição dos candidatos.
5. REFERÊNCIAS
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 1988.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. CONCURSO PÚBLICO. PREVISÃO DE VAGAS EM EDITAL. DIREITO À NOMEAÇÃO DOS CANDIDATOS APROVADOS. RE 598099/MS. Relator GILMAR MENDES. Data de Julgamento: 10/08/2011. Tribunal Pleno. Data de Publicação: DJe 03/10/2011. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur199510/false>. Acesso em: 12 fevereiro 2022.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONCURSO PÚBLICO. APROVADOS FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. PRETERIÇÃO NÃO CONFIGURADA. AUSÊNCIA DE DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRORROGAÇÃO DE CONCURSO PÚBLICO. ATO DISCRICIONÁRIO DA ADMINISTRAÇÃO. PRECEDENTES. RE 607590 AgR. Relator ROBERTO BARROSO. Data de Julgamento: 11/03/2014. Primeira Turma. Data de Publicação: DJe 09-04-2014. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur260442/false>. Acesso em: 12 fevereiro 2022.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. TEMA 784 DO PLENÁRIO VIRTUAL. CONTROVÉRSIA SOBRE O DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO DE CANDIDATOS APROVADOS ALÉM DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL DE CONCURSO PÚBLICO NO CASO DE SURGIMENTO DE NOVAS VAGAS DURANTE O PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. MERA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO. ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. SITUAÇÕES EXCEPCIONAIS. IN CASU, A ABERTURA DE NOVO CONCURSO PÚBLICO FOI ACOMPANHADA DA DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA DA NECESSIDADE PREMENTE E INADIÁVEL DE PROVIMENTO DOS CARGOS. INTERPRETAÇÃO DO ART. 37, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DE 1988. ARBÍTRIO. PRETERIÇÃO. CONVOLAÇÃO EXCEPCIONAL DA MERA EXPECTATIVA EM DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRINCÍPIOS DA EFICIÊNCIA, BOA-FÉ, MORALIDADE, IMPESSOALIDADE E DA PROTEÇÃO DA CONFIANÇA. FORÇA NORMATIVA DO CONCURSO PÚBLICO. INTERESSE DA SOCIEDADE. RESPEITO À ORDEM DE APROVAÇÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM SINTONIA COM A TESE ORA DELIMITADA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO A QUE SE NEGA PROVIMENTO. RE 837311. Relator LUIZ FUX. Data de Julgamento: 09/12/2015. Tribunal Pleno. Data de Publicação: DJe 18-04-2016. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur345602/false>. Acesso em: 12 fevereiro 2022.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATA APROVADA, INICIALMENTE, FORA DAS VAGAS DO EDITAL. DESISTÊNCIA DOS CANDIDATOS MAIS BEM CLASSIFICADOS. DIREITO A SER NOMEADA PARA OCUPAR A ÚNICA VAGA PREVISTA NO EDITAL DE CONVOCAÇÃO. PRECEDENTES. ARE 661760 AgR. Relator DIAS TOFFOLI. Data de Julgamento: 03/09/2013. Primeira Turma. Data de Publicação: DJe 29-10-2013. Disponível em: <https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur246638/false>. Acesso em: 12 fevereiro 2022.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO QUE PASSA A FIGURAR DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. DESISTÊNCIA DE CANDIDATO CLASSIFICADO EM COLOCAÇÃO SUPERIOR. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. AGRAVO IMPROVIDO. RE 643674 AgR. Relator RICARDO LEWANDOWSKI. Data de Julgamento: 13/08/2013. Primeira Turma. Data de Publicação: DJe 28-08-2013. Disponível em: < https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur239908/false>. Acesso em: 12 fevereiro 2022.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO DO ENTE BANDEIRANTE CONTRA A SOLUÇÃO UNIPESSOAL QUE CONCEDEU A SEGURANÇA EM RMS AO CANDIDATO APROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS. ALEGAÇÃO DO PODER PÚBLICO DE QUE HÁ SITUAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA IMPEDITIVA À NOMEAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DA AUTORIDADE DE QUE SE ESTARIA DIANTE DE HIPÓTESE FÁTICA EXCEPCIONAL APONTADA PELA CORTE SUPREMA NO RE 598.099/MS, ATÉ PORQUE A NÃO NOMEAÇÃO DOS LEGITIMAMENTE APROVADOS DEVE SER A ÚLTIMA DAS OPORTUNIDADES (RMS 57.565/SP, REL. MINISTRO MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, DJE 20.08.2018). AGRAVO INTERNO DA FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO NÃO PROVIDO. AGINT NO RMS 66.316/SP. Relator Ministro MANOEL ERHARDT. Data de Julgamento: 19/10/2021. PRIMEIRA TURMA. Data de Publicação: DJe 17/11/2021. Disponível em: <https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?src=1.1.3&aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&num_registro=202101238626>. Acesso em: 12 fevereiro 2022.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO PARA O CARGO DE FISCAL FEDERAL AGROPECUÁRIO - MÉDICO VETERINÁRIO. CANDIDATO APROVADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTO NO EDITAL. ALEGAÇÃO DE SURGIMENTO DE VAGA DURANTE O PERÍODO DE VALIDADE DO CONCURSO, BASEADO EM PEDIDO ORÇAMENTÁRIO DO MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO PARA A REALIZAÇÃO DE NOVO CONCURSO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO À NOMEAÇÃO NÃO CONFIGURADO. SEGURANÇA DENEGADA, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL. MS 21.410/DF. Relator Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO. Data de Julgamento: 22/04/2015. PRIMEIRA SEÇÃO. Data de Publicação: DJe 05/05/2015. Disponível em: < https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?src=1.1.3&aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&num_registro=201403137227>. Acesso em: 12 fevereiro 2022.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO APROVADO DENTRO DAS VAGAS PREVISTAS NO EDITAL, CONSIDERADA A DESISTÊNCIA DE CANDIDATOS MELHOR CLASSIFICADOS NO CERTAME. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO. AgRg no RMS 30.776/RO. Relatora Ministra ASSUSETE MAGALHÃES. Data de Julgamento: 17/09/2013. SEXTA TURMA. Data de Publicação: DJe 11/10/2013. Disponível em: <https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?src=1.1.3&aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&num_registro=200902091706>. Acesso em: 12 fevereiro 2022.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO CLASSIFICADO FORA DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. MERA EXPECTATIVA DE DIREITO À NOMEAÇÃO. PRETERIÇÃO NÃO DEMONSTRADA. DESISTÊNCIA DE CANDIDATO MELHOR CLASSIFICADO APÓS O TRANSCURSO DO PRAZO DE VALIDADE DO CERTAME. AgInt no RMS 63.676/RS. Relator Ministro HERMAN BENJAMIN. Data de Julgamento: 22/03/2021. SEGUNDA TURMA. Data de Publicação: DJe 05/04/2021. Disponível em: <https://processo.stj.jus.br/processo/pesquisa/?src=1.1.3&aplicacao=processos.ea&tipoPesquisa=tipoPesquisaGenerica&num_registro=202001364487>. Acesso em: 12 fevereiro 2022.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 27. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 24. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella; MOTTA, Fabrício; FERRAZ, Luciano de Araújo. Servidores Públicos na Constituição de 1988. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2014.
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MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 40. ed. São Paulo: Malheiros, 2014.
Servidor Público Federal, Bacharel em direito na Universidade de Fortaleza (UNIFOR), pós-graduado em Direito Administrativo.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: PIRES, Lucas Maia. O direito à nomeação dos candidatos aprovados em concurso público com base na jurisprudência dos tribunais superiores Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 21 fev 2022, 04:32. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58094/o-direito-nomeao-dos-candidatos-aprovados-em-concurso-pblico-com-base-na-jurisprudncia-dos-tribunais-superiores. Acesso em: 22 nov 2024.
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