GUSTAVO PASCHOAL TEIXEIRA DE CASTRO OLIVEIRA[1]
(orientador)
RESUMO: O presente artigo cientifico tem como objetivo analisar e demonstrar a inconstitucionalidade material e formal da Nova Lei de Licenciamento Ambiental do Estado do Tocantins (Lei nº 3.804/2021). Deste modo, com base na análise do ordenamento jurídico brasileiro, em conjunto com as pesquisas bibliográficas de doutrinadores constitucionalistas, ambientalistas e processualistas, o trabalho visa demonstrar os pontos e os fundamentos das incompatibilidades da norma supramencionada com a Carta Magna, por violação a competência da União de editar normas gerais sobre licenciamento ambiental, assim como, são analisadas as violações a garantia ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e ao princípio da prevenção. A partir desses fundamentos, este artigo, mediante modelo de revisão bibliográfica, adotando-se o método dedutivo com abordagem qualitativa, demonstra a inconstitucionalidade da lei tocantinense por violar material e formalmente a Constituição Federal. Como produto da presente investigação, concluiu-se que a Lei nº 3.804/2021 padece de vício de inconstitucionalidade.
Palavras-chaves: Inconstitucionalidade. Competência. Licenciamento. Princípios.
ABSTRACT: This scientific article aims to analyze and demonstrate the material and formal unconstitutionality of the New Environmental Licensing Law of the State of Tocantins (Law nº 3.804/2021). Thus, based on the analysis of the Brazilian legal system, together with the bibliographic research of constitutionalist, environmentalist, and procedural scholars, the work aims to demonstrate the points and grounds for the incompatibilities of the aforementioned norm with the Magna Carta, for violating the competence of the Union to edit general rules on environmental licensing, as well as violations of the guarantee of an ecologically balanced environment and the principle of prevention. Based on these foundations, this article, through a bibliographic review model, adopting the deductive method with a qualitative approach, demonstrates the unconstitutionality of the Tocantins law for materially and formally violating the Federal Constitution. As a result of the present investigation, it was concluded that Law nº 3.804/2021 suffers from the vice of unconstitutionality.
Key-words: Unco[2]nstitutionality. Competence. Licensing. Principles
No dia 29 de julho de 2021, foi publicada no Diários Oficial do Estado do Tocantins a lei Estadual nº 3.804/2021, que dispõe acerca do Licenciamento Ambiental no âmbito do Estado do Tocantins, todavia, esta lei tem diversos dispositivos incompatíveis com a Constituição Federal de 1988. Em razão desta dissonância, a ABRAMPA – Associação Brasileira de Membros do Ministério Público de Meio Ambiente, associação civil de âmbito nacional, apresentou representação visando o exame de constitucionalidade da lei Tocantinense.
Sabe-se que o licenciamento ambiental é um dos principais instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, essencial à proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado e à sadia qualidade de vida, e se encontra no centro dos atuais debates legislativos (LIMA; REI, 2017).
Além disso, o licenciamento ambiental é tido como um instrumento para a concretização das políticas públicas ambientais, de modo a regular as condutas humanas e compatibilizar o exercício das atividades econômicas com a manutenção da qualidade ambiental. Este instrumento de proteção ambiental se refere, assim, ao poder de polícia preventivo, a fim de evitar a ocorrência do dano, e sua aplicação é feita mediante processos administrativos (MARIANA; ISABELLA, 2020)
Deste modo, tendo em vista a essencialidade da preservação ambiental, o presente trabalho apresenta uma abordagem acerca da Inconstitucionalidade da nova Lei de Licenciamento Ambiental do Estado do Tocantins (Lei nº 3.804/2021), uma vez que, há diversos dispositivos incompatíveis com a Constituição Federal. Diante disso, de maneira geral, será analisado a Inconstitucionalidade Lei nº 3.804/2021. E de um prisma mais especifico, será explanado acerca da imprescindibilidade do licenciamento ambiental, e a averiguação dos impactos que esta mudança legislativa pode acarretar.
A temática meio ambiente está sempre em pauta nos debates mundiais, isto decorre, por óbvio, da complexidade e das diversas nuanças deste tema. Diante disto, busca-se evidenciar, neste trabalho, a incompatibilidade da Nova Lei de Licenciamento Ambiental do Estado do Tocantins com a Constituição Federal, além disso, demonstrar os possíveis impactos que advirão dessas mudanças.
Assim sendo, a problemática abordada consiste na afronta aos preceitos constitucionais que a norma supramencionada incorre.
Além disso, neste artigo buscou-se responder quais os pontos que vão de encontro aos ditames da Promulgada de 1988, assim como a necessidade do licenciamento ambiental e a verificação dos impactos ambientais que podem advir da edição da Lei nº 3804/2021.
A solução para esta situação é a declaração de inconstitucionalidade da Nova lei de Licenciamento Ambiental do Estado do Tocantins, pois, deste modo os danos ambientais que dela podem decorrer serão evitados.
A metodologia adotada nesta pesquisa foi o método dedutivo, a partir de uma análise qualitativa, partindo de um aspecto geral para um ponto específico sobre a temática aqui abordada, mediante a revisão bibliográfica, de doutrinadores constitucionalistas, ambientalistas e processualistas, assim como a análise da Constituição Federal de 1988 e das legislações específicas da área ambiental.
Em um momento inicial, será abordada a imprescindibilidade do licenciamento ambiental para a manutenção do meio ambiente equilibrado.
Em momento posterior, será abordado os pontos da nova lei de licenciamento ambiental do estado do Tocantins que contrariam as disposições da Constituição Federal.
Por derradeiro, será exposto os malefícios advindos da Lei nº 3.804/2021.
Deste modo, o presente estudo centra-se em levar a conhecimento a incompatibilidade da norma supracitada com a Carta Magna e os possíveis impactos ambientais.
De acordo com Haonat, Napolitano e Emin o homem é o ser que mais depende do meio ambiente, isto porque, alguns elementos naturais são essenciais para a sobrevivência do homem, como o ar atmosférico, sem o qual este ser não viveria nem mesmo cinco minutos, assim como a água, que compõe 2/3 do organismo humano. (HAONAT, NAPOLITANO, EMIN, 2003, p.102)
Esses autores afirmam ainda que em virtude da necessidade de adaptação do ser humano, o homem atual utiliza da comunidade biótica de acordo com suas necessidades, que, por sinal, são cada vez maiores. Deste modo, quanto mais desenvolvido for o homem, maiores serão suas necessidades de consumo, o que, consequentemente, atingirá o meio ambiente. (HAONAT, NAPOLITANO, EMIN, 2003, p.103)
Em razão desta necessidade de recursos oriundos da natureza é que se torna necessário meios para preservar o meio ambiente.
Um dos grandes problemas da atualidade é a compatibilização do desenvolvimento econômico com a preservação ambiental, nessa esteira, cabe ao Estado promover a proteção ao meio ambiente, sem, contudo, impossibilitar o avanço econômico do país. Para a preservação dos recursos naturais, os entes federativos podem utilizar diversas ferramentas, como a aplicação de penalidades, criação de regulamentos, licenças ambientais e auditórias ambientais.
Sabe-se que a atuação preventiva é notoriamente mais eficiente que a repressiva, deste modo, é patente que um dos principais instrumentos para a preservação do meio ambiente é o licenciamento ambiental, que tem como objetivo impedir que atividades poluidoras ou potencialmente poluidoras degradem o meio ambiente de modo desenfreado. Sendo assim, fez-se necessário, para a manutenção dos recursos naturais, a atuação dos órgãos públicos de forma a impedir a destruição dos recursos ambientais necessários a vida humana.
Terence Trennepohl afirma que o modelo de exploração capitalista, assim como os índices de consumo expõem o ambiente, progressivamente e constantemente, ao risco. (TRENNEPOHL, 2017, p.111)
Aponta também, o autor supramencionado, que o poder público deve fazer valer o principio da precaução, de modo a proteger o direito fundamental ao meio ambiente equilibrado, utilizando-se de medidas antecipatórias aos danos possíveis. (TRENNEPOHL, 2017, p.111).
Ciente da imprescindibilidade do licenciamento ambiental, nos capítulos seguintes será abordado a importância desse instrumento para a preservação do meio ambiente, as inconstitucionalidades da nova lei de licenciamento ambiental do estado do Tocantins (Lei nº 3804/2021), bem como os malefícios que podem ser gerados.
2.1. IMPORTÂCIA DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL
O licenciamento ambiental é um importante instrumento de gestão ambiental, por meio do qual o Estado consente com a utilização de recursos naturais. É por meio deste instrumento que o Poder Público exerce o controle prévio sobre as atividades que tenham potencial de gerar impactos ambientais, buscando, assim, a implementação do desenvolvimento sustentável, em respeito ao princípio da prevenção e da precaução. O licenciamento faz parte, portanto, da tutela administrativa preventiva do meio ambiente, tendo por finalidade precípua preservar os recursos naturais, evitando impactos negativos a natureza ou mitigando-os ao máximo com imposições de condições ao exercício de atividades ou construções. (ROMEU, 2015, p.250).
De acordo com Fabiano Melo, o licenciamento ambiental tem por principal fundamento o princípio da prevenção, que gramaticalmente vem do verbo prevenir, que significa agir antecipadamente. Sendo, de acordo com o citado autor, impensável dissociar as questões ambientais da prevenção e da mitigação dos impactos ambientais, uma vez que os danos ambientais, em regra, são insuscetíveis de reversão. (MELO, 2017, p.220).
O mesmo autor explana ainda que o princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado irradia no âmbito constitucional e infraconstitucional, como norteador de todo o arcabouço ambiental. Para Édis Milaré, é o “princípio transcendental de todo o ordenamento jurídico ambiental, ostentando o status de verdadeira cláusula pétrea”. (MELO, 2017, p.102).
O Constituinte Originária, com o objetivo de garantir maior proteção aos recursos naturais, estampou na Constituição Federal, em seu artigo 225, a previsão de que é direito de todos ter um meio ambiente ecologicamente equilibrado, cabendo ao Estado e a coletividade defender o meio ambiente e preserva-lo para as presentes e futuras gerações. Para assegurar este direito, determina que é incumbência do Poder Público controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem risco para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente.
Buscando dar eficácia as determinações Constitucionais, a União editou a lei nº 6.938/81 que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. O art. 2º, desta lei, preceitua que Política Nacional do Meio Ambiente objetiva a proteção, recuperação por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana.
Percebe-se, facilmente, que o meio ambiente é amparado por diversas disposições normativas, exatamente, por ser essencial a manutenção da vida da humanidade, não podendo, desta forma, ser explorado de maneira desregulada. Diante da necessidade de nortear a atuação das atividades exploradoras do meio ambiente, é que surge o licenciamento ambiental com a finalidade de regular e afastar os atos que degradem a natureza.
Sendo, pois, o licenciamento ambiental, um instrumento primordial para a manutenção ambiental em qualidades adequadas à humanidade.
Indiscutivelmente o licenciamento ambiental é um instrumento para concretização das políticas públicas ambientais, que tem como objetivo regular e compatibilizar o exercício das atividades econômicas com a manutenção da qualidade ambiental. Sendo assim, o licenciamento ambiental se refere ao poder de polícia preventivo, a fim de evitar danos. (MARIA; FERNANDO, 2017).
Tendo em vista todo o exposto, é perceptível o quão importante é o licenciamento ambiental para a preservação do planeta, e consequentemente, a preservação da vida.
Sirvinskas afirma que a política nacional do meio ambiente objetiva harmonizar o desenvolvimento socioeconômico com a preservação ambiental, de modo que se garanta o desenvolvimento socioeconômico, garantido as condições necessárias ao desenvolvimento da indústria, cem, contudo, se distanciar da proteção ao meio ambiente, a segurança nacional e a dignidade da pessoa humana. (SIRVINSKAS, 2022, p. 85)
Para Celso Antônio é absolutamente necessário que haja uma compatibilização para oferecer segurança jurídica aos empreendedores e proteção ao meio ambiente, que devem ser observados por meio de perspectivas de produção diversas, não sendo estas mutuamente excludentes e assim melhorar será para a sociedade. (FIORILLO, MORITA, FERREIRA, 2019, P. 276).
2.2. INCONSTITUCIONALIDADE DA NOVA LEI DE LICENCIAMENTO AMBIENTAL DO ESTADO DO TOCANTINS (LEI Nº 3.804/2021)
A lei nº 3.804, publicada em julho de 2021, carrega em seu bojo diversos dispositivos que vão de encontro aos ditames constitucionais, e em razão disso, a Associação Brasileira de Membros do Ministério Público de Meio Ambiente - ABRAMPA apresentou representação a Promotoria de Justiça.
Ao analisar a lei percebe-se, de pronto, que há diversos dispositivos que não coadunam com a Carta Magna, tanto incorrendo em Inconstitucionalidade Formal, por usurpação da Competência da União de legislação sobre normas gerais, como também em Inconstitucionalidades materiais.
Pedro Lenza explica que a Inconstitucionalidade formal (Nomodinâmica) verifica-se quando a lei padece de vício na sua forma, isto é, no processo legislativo de elaboração, ou, ainda, em virtude de sua elaboração por autoridade incompetente. (LENZA, 2022, p. 251)
Segundo Canotilho, os vícios formais “... incidem sobre o ato normativo enquanto tal, independentemente do seu conteúdo e tendo em conta apenas a forma da sua exteriorização; na hipótese inconstitucionalidade formal, viciado é o ato, nos seus pressupostos, no seu procedimento de formação, na sua forma final” (CANOTILHO, 1941, p. 959)
Já no que diz respeito a Inconstitucionalidade material (nomoestática), Lenza afirma que este vício diz respeito a matéria, isto é, ao conteúdo do ato normativo. Deste modo, qualquer ato normativo que afronta qualquer preceito ou princípio da Lei Maior deverá ser declarado inconstitucional. (LENZA, 2022, p. 253)
Fernanda Dias Menezes de Almeida explana ainda acerca da divisão das Competências legislativas, tecendo considerações a respeito da autonomia e da inconstitucionalidade por invasão de competência previamente definida pela Constituição Federal de 1998:
O problema nuclear da repartição de competências na Federação reside na partilha da competência legislativa, pois é através dela que se expressa o poder político cerne da autonomia das unidades federativas. De fato, é na capacidade de estabelecer as leis que vão reger as suas próprias atividades, sem subordinação hierárquica e sem a intromissão das demais esferas de poder, que se traduz fundamentalmente a autonomia de cada uma dessas esferas. Autogovernar-se não significa outra coisa senão ditar-se as próprias regras. (...) Está aí bem nítida a ideia que se quer transmitir: só haverá autonomia onde houver a faculdade legislativa desvinculada da ingerência de outro ente autônomo. Assim, guarda a subordinação apenas ao poder soberano no caso o poder constituinte, manifestado através de sua obra, a Constituição -, cada centro de poder autônomo na Federação deverá necessariamente ser dotado da competência de criar o direito aplicável à respectiva órbita. E porque é a Constituição que faz a partilha, tem-se como consequência lógica que a invasão não importa por qual das entidades federadas do campo da competência legislativa de outra resultará sempre na inconstitucionalidade da lei editada pela autoridade incompetente. Isso tanto no caso de usurpação de competência legislativa privativa, como no caso de inobservância dos limites constitucionais postos à atuação de cada entidade no campo da competência legislativa concorrente” (ALMEIDA, 2005, p. 97).
Já de acordo com Wolfgang e Fensterseifer o programa político-normativo instituído Constituição Federal criou uma vinculação do Estado ao cumprimento dos ditames constitucionais. Esta vinculação impõe aos entes estatais limites, tanto no que tange as tarefas, que deverá se dar de acordo com os preceitos constitucionais, como na ordem normativa fática. (WOLFGANG, FENSTERSEIFER, 2021, p. 427)
Aponta ainda o autor mencionado, que é possível afirmar, de acordo com expressão utilizada pelo Ex-Ministro do STF Carlos Ayres Britto, que a Constituição Federal 1988 criou um verdadeiro “condomínio legislativo federado”. Alega ainda que reforça este entendimento a incidência do princípio da predominância do interesse, posto que, com base na doutrina de José Afonso da Silva, “o princípio geral que norteia a repartição de competência entre as entidades componentes do Estado federal é o da predominância do interesse, segundo o qual à União caberão àquelas matérias e questões de predominante interesse geral, nacional, ao passo que os Estados tocarão as matérias e assuntos de predominante interesse regional, e aos Municípios concernem os assuntos de interesse local” (WOLFGANG, FENSTERSEIFER, 2021, p. 427)
Nessa esteira, dispõe a Constituição Federal em seu artigo 24, caput e inciso VI, compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal dispor concorrente acerca da proteção ao meio ambiente, cabendo a União dispor sobre as normais gerais (art. 24, §1º), e aos Estados e Distrito Federal, de modo suplementar (art. 24, §2ª), ou plena, caso não haja norma Federal acerca do tema (art. 24, §3º).
A União, em cumprimento a determinação Constitucional, dispôs acercada das normas gerais de licenciamento ambiental, que é de observância obrigatória pelos demais entes, nas seguintes leis: a Lei Complementar nº 140/11, a Lei nº 12.651/12 (Código Florestal), a Resolução CONAMA nº 237/97. e a Lei nº 6.938/81 (Política Nacional de Meio Ambiente).
A Lei nº 6.938/81 (Política Nacional de Meio Ambiente) dispõe em seus artigos 9º e 10 a obrigatoriedade do licenciamento prévio para a ampliação e o funcionamento de estabelecimentos utilizadores de recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capaz, de qualquer modo, de gerar degradação ao meio ambiente.
Os artigos 6º, §1º e o art. 8º da mesma lei, atribuíram ao Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA a competência para determinar os critérios e as normas gerias para a realização do licenciamento ambiental de atividades que possam resultar riscos ou danos ao meio ambiente.
É importante ressaltar que o licenciamento ambiental não tem a finalidade de impossibilitar a evolução dos empreendimentos, mas sim buscar angariar maiores possibilidades de implemento dos empreendimentos, sem, contudo, deixar de lado a preservação ambiental, isto é, a menos que fique evidente os riscos de dano quanto aos efeitos decorrentes dos empreendimentos futuro. (GRANZIERA, 2015, p. 426).
Na contramão do que determina a legislação geral, o legislador tocantinense criou uma inversão lógica na legislação ambiental, que determina a submissão de toda atividade potencialmente poluidora ao licenciamento ambiental, já o regramento da nova lei do Tocantins dispõe que cabe ao COEMA editar uma lista de atividades que devem ser submetidas a licenciamento.
Art. 8º O procedimento de licenciamento ambiental será regulamentado por matriz de impactos socioambientais e tipologias de empreendimentos e atividades, considerando critérios de localização, natureza, porte, potencial poluidor e as características do ecossistema.
Parágrafo único. O Conselho Estadual de Meio Ambiente - COEMA estabelecerá a lista de atividades sujeitas ao licenciamento ambiental, a ser adotada pelos órgãos estadual e municipais de meio ambiente, integrantes do Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA.
Sendo, deste modo, criado um maior risco ao meio ambiente, posto que, conforme determina o art. 8º, cabe ao COEMA criar um rol exaustivo de atividades que precisam ser submetidas ao licenciamento ambiental, o que, por óbvio, resultará em vulnerabilidades, já que a obrigatoriedade passa a ser exceção, isto é, a maioria das atividades exploradoras de recursos naturais não serão submetidas ao instrumento supramencionado.
O CONAMA por meio da resolução nº 237/97, dispõe, em seu art. 8º, acerca das hipóteses que podem ser adotadas pela Administração Pública, são três hipóteses de licença de atividade que seja efetiva ou potencialmente poluidora, são elas: Licença Prévia (LP); Licença de Instalação (LI) e Licença de Operação (LO).
Em razão dessas disposições gerais editada pela União, mediante a resolução do CONAMA, caberia ao Estado do Tocantins legislar apenas supletivamente, e não criar novas modalidades de licenciamento ambiental que não encontram nenhuma simetria com as normas federais.
Contrariando a determinação da Carta Magna, a lei estadual criou diversos tipos de licenças, de modo totalmente assimétrico ao que dispõe a legislação federal, como, por exemplo, a Licença Ambiental por Adesão e Compromisso (LAC) e a Licença Ambiental Corretiva (LC), assim como novas modalidades de controle e de ordenamento, como o autodeclaratório:
Art. 3º Para efeitos desta Lei, são adotadas as seguintes definições:
(…)
XX - licença ambiental por adesão e compromisso – LAC: ato administrativo que autoriza a localização, instalação e a operação de atividade ou empreendimento, mediante declaração de adesão e compromisso do empreendedor aos critérios, pré-condições, requisitos e condicionantes ambientais estabelecidos pela autoridade licenciadora;
XXII - licença corretiva - LC: ato administrativo que regulariza atividade ou empreendimento em instalação ou operação, sem a prévia licença ambiental, por meio da fixação de condicionantes que viabilizam sua continuidade em conformidade com as normas ambientais;
Art. 6º O órgão ambiental no âmbito dos processos administrativos trabalhará com as seguintes modalidades de licenciamento, referentes ao ordenamento e controle das atividades:
I - Não exigibilidade de Licenciamento Ambiental;
II - Licenciamento Ambiental Autodeclaratório;
IV - Licenciamento Ambiental por Adesão e Compromisso;
VI - Licenciamento Ambiental Corretivo (…)
O licenciamento previsto no artigo 6º, inciso IV, isto é, Licenciamento Ambiental por Adesão e Compromisso consiste em regulamentação prévia de certas atividades, com o estabelecimento de padrões de medidas preventivas, compensatórias e mitigadoras dos danos, submetendo-se a um processo autodeclaratório com uma única etapa, o que torna demasiadamente complicado a prevenção dos danos ambientais decorrentes das declarações ilegais.
Art. 30. O Licenciamento por Adesão e Compromisso, será emitido de forma autodeclaratória, em uma única etapa, para as atividades ou empreendimentos enquadrados pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente - COEMA obedecendo aos critérios e pré-condições estabelecidas pelo órgão ambiental licenciador.
Art. 31. O órgão ambiental licenciador deverá disciplinar antecipadamente as medidas preventivas, mitigadoras e compensatórias, bem como as ações de monitoramento ambiental relacionadas à instalação e operação dos empreendimentos ou atividades submetidos a esta modalidade de licenciamento, por meio de publicação de manual técnico por tipologia de atividade.
Art. 32. Para empreendimentos ou atividades que se enquadrem como Licenciamento por Adesão e Compromisso e requeiram atos administrativos que necessitem de análise prévia, os devidos atos autorizativos deverão ser emitidos anteriormente a emissão da licença.
Art. 33. O órgão ambiental licenciador, sempre que possível, estabelecerá controles eletrônicos prévios para atestar a veracidade das declarações prestadas pelo empreendedor no âmbito da Licença por Adesão e Compromisso – LAC e a compatibilidade da sua instalação com planos diretores, zoneamentos, áreas especialmente protegidas ou vedadas pela lei para a instalação de empreendimentos.
O denominado licenciamento autodeclaratório tem a finalidade de regular as atividades que forem classificadas como de impacto ambiental mínimo, de acordo com o que for estabelecido, consistente em cadastro simplificado da atividade no órgão ambiental, o que, na prática, dificultara a atividade de controle, fiscalização e de monitoramento:
Art. 29. São passíveis de licenciamento autodeclaratório, dispensados do procedimento de licenciamento ambiental, as atividades e empreendimentos que, em razão de seu porte e seu potencial poluidor, possam ser classificados como de impacto ambiental mínimo, conforme definido pelo COEMA.
§1º O licenciamento autodeclaratório é realizado por meio de cadastramento simplificado da atividade no órgão ambiental.
§2º Cabe ao órgão ambiental executar o monitoramento, inspeção e fiscalização das atividades autodeclaradas.
§3º A autodeclaração não exime o empreendedor da obtenção de prévia autorização de supressão de vegetação, prévia outorga de uso de recursos hídricos e outras autorizações previstas em lei.
§4º Sempre que possível o órgão ambiental licenciador estabelecerá controles eletrônicos.
Este instrumento autodeclaratório está relacionado com outra inovação jurídica, a autodenúncia, que permitira ao empreendedor que estiver com seu empreendimento em desconformidade as regularizar, inclusive sem a sanção, o que acarretará, naturalmente, um maior estimula a prática de ilícito ambientais:
Art. 45. A autodenúncia efetuada pelo empreendedor, quanto a desconformidades apresentadas no âmbito do empreendimento licenciado, oportunizará a sua regularização conforme diretrizes, parâmetros e critérios aprovados pelo órgão licenciador, podendo, diante das circunstâncias do caso concreto, ser dispensada a aplicação de sanções administrativas, desde que as medidas necessárias à correção sejam adotadas nos prazos e condições estabelecidas em TCA.
Se não bastasse os dispositivos já mencionados, a normal tocantinense traz ainda a previsão de uma modalidade de licenciamento corretivo, que tem o objetivo permitir a regularização das atividades cuja instalação se deu sem prévia licença em data anterior a publicação da lei. além disso, prevê, ainda, a celebração de Termo de Compromisso Ambiental – TCA com as pessoas físicas ou jurídicas responsáveis por construções, instalação, ampliações e funcionamento de atividades ou empreendimento sem ou com licenciamento ambiental, sem, contudo, estabelecer qualquer critério para a celebração destes compromissos:
Art. 41. O licenciamento ambiental corretivo ocorre pela expedição da Licença Corretiva - LC e será adotado para empreendimentos ou atividades em instalação ou operação sem prévia licença ambiental válida, cuja instalação ou operação se iniciou em data anterior à publicação desta Lei.
Parágrafo único. O órgão ambiental licenciador poderá, por meio de programas especiais aplicados a conjunto de empreendimentos ou atividades, adotar política de incentivo à regularização de empreendimentos instalados ou em operação sem a prévia licença.
Art. 42. O órgão ambiental licenciador fica autorizado a celebrar Termo de Compromisso Ambiental – TCA, com força de título executivo extrajudicial, com pessoas físicas ou jurídicas responsáveis por construção, instalação, ampliação e funcionamento de atividades ou empreendimentos sem ou com licença ambiental.
§1º A assinatura do TCA não isenta o empreendedor da responsabilização pelas infrações que tenham sido praticadas antes de sua celebração.
§2º O TCA de que trata o caput deste artigo precede a eventual concessão de LC e outras licenças pertinentes, constituindo em documento hábil de regularização ambiental até que a licença seja expedida, inclusive no que se refere a acesso a crédito e programas de incentivo e financiamento.
§3º Poderão ser previstas cláusulas de compensação de danos ambientais praticados durante o período em que o empreendimento se instalou ou entrou em operação sem licença.
É cristalino que essa possibilidade de convalidação das irregularidades e ilícitos é um grande estímulo para a prática de ilegalidades. Tal dispositivo contraria, também, o disposto no Código Florestal (lei nº 12.651/12), que estabelece formas e critérios próprios para a correção, punição e fiscalização de desmatamento, uso, sistematização e proteção da vegetação.
Além disso, o Termo de Compromisso Ambiental – TCA, vilipendia o artigo 14 da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei nº 6.938/81), posto que esta apresente um rol taxativo de hipóteses de medidas de preservação e correção de atividades poluidoras, sem prejuízo das penalidades aplicáveis. Não cabendo ao Estado flexibilizar a legislação federal, mas, apenas, criar novas hipóteses mais rigorosas.
Com o intuito de simplificar mais ainda o processo de licenciamento ambiental, a lei nº 3.804/2021 dispensou a determinados empreendimentos de serem acompanhados por responsáveis técnicos devidamente habilitados, detentores de Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, o que gera maiores riscos de insegurança:
Art. 40. Os estudos, informações, projetos e o acompanhamento da instalação e operação dos empreendimentos devem ser confiados a responsáveis técnicos, devidamente habilitados, detentores de Anotação de Responsabilidade Técnica – ART para a fase de projeto e para a fase de sua execução e que possuam registro regular em seu conselho de classe.
(...)
§2º Em casos específicos de baixo impacto ambiental, poderá o órgão licenciador dispensar o acompanhamento do empreendimento por responsável técnico habilitado.
Esta determinação, contraria o que dispôs o CONAMA no art. 11, da resolução nº 237/97, que determina que os estudos necessários ao licenciamento devem ser realizados por profissionais habilitados, cabendo ao empreendedor as expensas.
Por derradeiro, a legislação ainda permitiu que o licenciamento ambiental seja realizado por conjunto, o que destoa da legislação federal, haja vista que esta permite que a presente modalidade seja realizada apenas de modo excepcional, haja vista a necessidade de averiguação das condições ambientais especificas de cada projeto. A nova lei permite ainda o fracionamento de licenciamento, isto é, autoriza que a atividade principal e atividade de apoio sejam licenciadas separadamente, o que, por óbvio, dificultara a análise e a compreensão o dos verdadeiros impactos advindos do empreendimento:
Art. 7º O licenciamento ambiental poderá ser feito
II – por conjunto de empreendimentos ou atividades similares, vizinhos, integrantes de polos industriais, agrícolas, turísticos, entre outros ou ainda por segmento produtivo ou recorte territorial.
Art. 20. No licenciamento de um empreendimento deverá ser definida a Atividade Principal e as Atividades de Apoio, quando houver.
§1º O estudo ambiental, exigido para fins de licenciamento ambiental, deverá ser de acordo com a atividade que requeira o estudo ambiental de maior complexidade, contemplando o diagnóstico, prognóstico e medidas de controle específicas para cada atividade.
§2º O requerente poderá solicitar o licenciamento para todas as atividades, seja principal ou de apoio, em um único requerimento ou mais, de acordo com a definição do órgão
É patente a inconstitucionalidade formal do artigo suprarreferido, uma vez que possibilita de forma ampla o licenciamento coletivo, conquanto a legislação federal o restringe aos pequenos empreendimentos.
O STF ao analisar a Ação Direta De Inconstitucionalidade 6.650 de Santa Catarina, decidiu pela inconstitucionalidade da dispensa e simplificação do licenciamento ambiental para atividades de lavra a céu aberto por violar a competência da União para legislar sobre normais gerais.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. AMBIENTAL. §§ 1º, 2º E 3º DO ART. 29 DA LEI N. 14.675, DE 13.4.2009, ALTERADA PELA LEI N. 17.893, DE 23.1.2020, DE SANTA CATARINA. DISPENSA E SIMPLIFICAÇÃO DO LICENCIAMENTO AMBIENTAL PARA ATIVIDADES DE LAVRA A CÉU ABERTO. OFENSA À COMPETÊNCIA DA UNIÃO PARA EDITAR NORMAS GERAIS SOBRE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE. DESOBEDIÊNCIA AO PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO E DO DEVER DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO (ART. 225 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA). AÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
Na Ação Direta De Inconstitucionalidade – ADI citada o STF decidiu que não compete aos Estados legislar acerca de dispensa e simplificação de licenciamento ambiental por violar a previsão Constitucional de que compete a União dispor sobre normas gerais, e, apenas se assim não fizer, cabe ao Estado atuar supletivamente. Sendo assim, a Nova lei de Licenciamento Ambiental do Estado do Tocantins é formalmente inconstitucional, posto que muitos dispositivos desta lei amoldam-se perfeitamente a decisão do STF, uma vez que, assim como no caso supramencionado, há aqui uma violação a norma geral da União, haja vista que compete e esta criar normas gerais, como é a dispensa e simplificação do licenciamento ambiental.
Nota-se, facilmente, que há diversas disposições que vão de encontro com os ditames postos pelo Constituinte Originário Revolucionário de 1988, como a previsão de Licenciamento Ambiental Corretivo o que viola, também, materialmente a Carta Magna, haja vista que não cabe ao Estado permitir que os particulares atuem degradando o meio ambiente desenfreadamente. A nova lei de licenciamento, atuando em sentido contrário a evolução da proteção ao meio ambiente, prevê a modalidade de licenciamento corretivo. Esta modalidade permite que o empreendedor regularize seu empreendimento e atividades cuja instalação ocorreu sem prévia licença válida, permitindo, ainda, a celebração de Termo de Compromisso ambiental, com o empreendedor, sem, contudo, estabelecer quaisquer critérios objetivos a respeito deste compromisso.
É notório que as previsões supracitadas acabam por resultar em mais estímulos à prática de ilícitos, haja vista que dissociam o licenciamento ambiental de outros atos públicos de autorização que deveriam ocorrer de forma integrada.
Ainda com o intuito de simplificar o processo de licenciamento, o legislador tocantinense dispensou o acompanhamento por responsável técnico habilitado em alguns empreendimentos, o que acabará por resultar em maior insegurança. Na mesma esteira de mitigação da proteção ambiental, a lei 3.804/2021 ainda prevê prazos longos, não prevendo prazo máximo, o que passou a ficar a critério do órgão ambiental, não obedecendo, deste modo, o padrão estabelecido pela legislação em vigor
É necessário que a legislação de licenciamento esteja simétrica aos preceitos constitucionais, Ney de Barros Bello Filho afirma a denominação Constituição Ambiental é um conjunto formado por normas-princípios e normas que dispõem acerca da proteção ao meio ambiente. Para o citado autor, as normas-princípios são as regras abertas ou axiológicas. É por meio desta que o direito ao meio ambiente equilibrado transparece, e as normas-regras formam os instrumentos jurídicos aptos a dar concretude as normas-princípios. (TALDEN, 2015)
Deste modo, considerando todas as inconstitucionalidades demonstradas no presente trabalho, nota-se, primordialmente, a inconstitucionalidade forma da legislação tocantinense, haja vista que esta versa acerca de normas gerais e contrárias a legislação federal atinente a temática ambiental, ferindo, desta forma, a competência da União de legislar de modo geral sobre este tema, consoante determina a Constituição Federal. Nesse sentido já decidiu o Supremo Tribunal Federal -STF.
EMENTA: AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. INC. IV E § 7º DO ART. 12 DA LEI COMPLEMENTAR N. 5/1994 DO AMAPÁ, ALTERADA PELA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL N. 70/2012. LICENÇA AMBIENTAL ÚNICA. DISPENSA DE OBTENÇÃO DAS LICENÇAS PRÉVIAS, DE INSTALAÇÃO E DE OPERAÇÃO, ESTABELECIDAS PELO CONAMA (INC. I DO ART. 8º DA LEI N. 6.938/1981). OFENSA À COMPETÊNCIA DA UNIÃO PARA EDITAR NORMAS GERAIS SOBRE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE. DESOBEDIÊNCIA AO PRINCÍPIO DA PREVENÇÃO E DO DEVER DE PROTEÇÃO DO MEIO AMBIENTE ECOLOGICAMENTE EQUILIBRADO (ART. 225 DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA). AÇÃO JULGADA PROCEDENTE PARA DECLARAR A INCONSTITUCIONALIDADE DO INC. IV E DO § 7º DO ART. 12 DA LEI COMPLEMENTAR N. 5/1994 DO AMAPÁ, ALTERADA PELA LEI COMPLEMENTAR ESTADUAL N. 70/2012.
(ADI 5475, Relator(a): CÁRMEN LÚCIA, Tribunal Pleno, julgado em 20/04/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-137 DIVULG 02-06-2020 PUBLIC 03-06-2020)
Consoante apresentado no julgamento acima, constitui flagrante inconstitucionalidade por vício formal a edição de normal geral pelos Estados, por ofender a determinação Constitucional de que compete a União editar normas gerais sobre proteção ao meio ambiente.
Os vícios da Lei nº 3.804/21 não estão adstritos ao âmbito formal, vão além, violam, também, materialmente a Carga de 1988. Ao flexibilizar os procedimentos de licenciamento, a lei promove a fragilização do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, o que vai de encontro aos ditames do 225 da Constituição Federal.
A Constituição Federal determina que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, sendo um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, cabendo ao Poder Público em conjunto com a coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
A nova lei de Licenciamento do Estado do Tocantins, indo na contramão dos ditames da Constituição, fragilizou a proteção ambiental, o que, resulta em violação aos princípios da prevenção, precaução e de vedação ao retrocesso socioambiental.
Considerando todo o exposto, não resta outra alternativa que não seja a declaração de inconstitucionalidade da lei tocantinense, por violação formal e material da Constituição Federal de 1988.
2.3 MALEFICIOS AMBIENTAIS DA ALTERAÇÃO LEGISLATIVA
Sirvinskas afirma que a qualidade de vida é o objetivo perquirido pelo Poder Público com a união da felicidade do cidadão ao bem comum. Buscando a construção de uma sociedade livre, justa e solidária. Assim, o meio ambiente e a qualidade de vida decorrem do direito à vida, cabendo ao estado e a coletividade pretegê-la. (SIRVINSKAS, 2022, p. 63).
Ao estado compete, em conjunto com a população, proteger a natureza para a preservação da qualidade de vida dos seres humanos, e conforme já mencionado, um dos meios mais eficaz de defende-lo é com a atuação preventiva. Todavia, o Estado do Tocantins ao editar leis que vão na contramão desses ditames, atua, na verdade, prejudicando a qualidade de vida de toda a população, primordialmente, da população tocantinense.
José Rubens e Patryck apontam que o agravamento da crise ecológica, em razão das mudanças climática, justifica a necessidade de revolução do direito, que permite a superutilização dos recursos naturais. (Leite, Ayala, 2020, p. 7)
Nesse sentido, é cristalino a essencialidade de instrumentos jurídicos que mitiguem a utilização demasiada de recursos naturais, de modo a mantê-los sempre preservados, sem, no entanto, se distanciar a da necessidade industrial. Sendo, pois imprescindível uma ponderação de modo a preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado e a permitir o avanço industrial para o progresso da humanidade.
A licença ambiental, que tem por objetivo permitir o uso dos recursos naturais de modo adequado, é concedida pelo Poder Público para aquele que pretenda exercer uma atividade potencialmente nociva ao meio ambiente. De tal modo, todo aquele que pretender construir, instalar, ampliar e colocar em funcionamento estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores, deverá requerer a licença ambiental, obrigatoriamente, ao órgão público competente (MILARÉ).
Sendo assim, a concessão indevida de licenças ambientais resulta, claramente, em maiores possibilidades de danos ao meio ambiente, exatamente em razão disso que se faz necessário maiores rigores nas concessões de licenças ambientais.
De acordo com Romeu Thomé Os recursos ambientais são bens de uso comum do povo e essenciais à sadia qualidade de vida, dependendo a sua utilização de prévio consentimento do Poder Público. O meio ambiente é bem público de uso coletivo, diante disto, deve ser protegido e assegurado, sendo assim, inexiste direito subjetivo à sua livre utilização (ROMEU, 2015, p. 250).
Como bem explanado pelo Romeu, o meio ambiente é bem público de uso coletivo, nesse sentido, é que cabe tanto ao Estado como aos cidadãos protege-lo contra qualquer ato atentatório a sua integridade. Deste modo, a degradação ambiental fere um direito de todos os cidadãos a uma qualidade de vida plena.
Para Granziera (2014), o licenciamento possui natureza técnica e forma um processo administrativo, submetido ao regime jurídico público. Para Rei Cibim (2011), o licenciamento consiste em um instrumento preventivo que tem o objetivo proteger o meio ambiente, por meio da análise da conformidade de projetos, obras e atividades à legislação vigente, aos padrões de qualidade ambiental, à melhor tecnologia de forma a minimizar e mitigar os impactos por ele causados. (MARIA; FERNANDO, 2017).
Deste modo, é patente que as mudanças oriundas da nova legislação trarão diversos malefícios ao meio ambiente e a sociedade como um todo, posto que, ao simplificar a concessão de licenças, tornará o meio ambiente mais vulnerável a degradação por atividades poluidoras.
A presente pesquisa teve como objetivo analisar a Inconstitucionalidade da Nova Lei de Licenciamento Ambiental do Estado do Tocantins Lei nº 3.804/2021, demonstrando os pontos que vão de encontro a Constituição Federal e a explicitação a imprescindibilidade de um licenciamento ambiental adequado.
Considerando toda a pesquisa bibliográfica aqui exposta, torna-se cristalino a incorreção da norma tocantinense, por violar material e formalmente a Constituição Federal de 1988.
De acordo com a Constituição, a União detém a competência para legislar sobre licenciamento ambiental de forma geral, cabendo aos Estados apenas se aterem aos pontos específicos, salvo se não houver norma geral da União. Todavia, na contramão aos ditames constitucionais, a lei nº 3.804/2021 inovou no ordenamento jurídico, criando previsões totalmente alheias as dispostas nas normas gerais editadas pela União.
Além disso, a norma aqui analisada segue caminho diverso daquele determinado pelo Constituinte Originário, uma vez que, desconsidera, ao facilitar a regularização de atividades poluidoras, como ao determinar que cabe ao COEMA editar uma lista de atividades que devem ser submetidas a licenciamento, o que, resulta, claramente, em vulneração dos recursos naturais, violando, deste modo, o direito da sociedade a um meio ambiente ecologicamente equilibrado.
Portanto, é patente a inconstitucionalidade material e formal da Nova Lei de Licenciamento Ambiental do Estado do Tocantins (Lei nº 3.804/2021).
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BRASIL. Lei complementar nº 140, de 8 de dezembro de 2011. Fixa normas, nos termos dos incisos III, VI e VII do caput e do parágrafo único do art. 23 da Constituição Federal, para a cooperação entre a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios nas ações administrativas decorrentes do exercício da competência comum relativas à proteção das paisagens naturais notáveis, à proteção do meio ambiente, ao combate à poluição em qualquer de suas formas e à preservação das florestas, da fauna e da flora; e altera a Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981. In: Diário Oficial da República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 08 dez. 2011. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/lcp140.htm. Acesso em: 03 abr. 2022.
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[1] Doutor em Direito das Relações Internacionais pelo Centro Universitário de Brasília – UniCeub. Professor de Direito da Universidade Federal do Tocantins. Advogado. E-mail: [email protected].
Bacharelando do curso de Direito na Universidade Federal do Tocantins (UFT)
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SOUSA, Diogo Gomes de. A inconstitucionalidade da nova lei de licenciamento ambiental do Estado do Tocantins Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 22 jun 2022, 04:03. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/58727/a-inconstitucionalidade-da-nova-lei-de-licenciamento-ambiental-do-estado-do-tocantins. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: gabriel de moraes sousa
Por: Thaina Santos de Jesus
Por: Magalice Cruz de Oliveira
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