YURI ANDERSON PEREIRA JURUBEBA[1]
(coautor)
Resumo: A escravidão contemporânea não irá deparar com trabalhadores acorrentados, mas com condições desumanas onde os trabalhadores são submetidos as coações morais, psicológicas e/ou físicas, com jornadas extenuantes, condições degradantes de trabalho, independente da forma vil, é repugnante tal mazela. Por isso, este trabalho teve como objetivo demonstrar como se caracteriza um trabalho em condições análogas ao trabalho escravo, bem como, analisar os índices dos casos no Brasil, tanto no meio urbano como no rural. Esse estudo foi realizado no período de janeiro de 2017 à dezembro de 2020, utilizando os dados do portal SmartLab. Além disso abordou a intervenção do Ministério Público do Trabalho para coibir tal ilicitude, e discorrer sobre as condenações penais, de acordo com o Código Penal brasileiro. A metodologia utilizada foi qualitativa, apoiando-se numa pesquisa quantitativa, realizada a partir de uma revisão de fontes primárias, como bibliografias, artigos científicos, de parte da literatura jurídica disponível sobre o tema. O trabalho escravo contemporâneo mesmo com as medidas já tomadas pelo poder público, ainda, é persistente, e merece ser combatido pelo desiderato do Estado Democrático de Direito.
Palavras-chave: Escravidão; Ministério Público do Trabalho; Condenações Penais.
Abstract: Contemporary slavery will not face chained workers, but with inhumane conditions where workers are subjected to moral, psychological, and/or physical coercion, with strenuous working hours, and degrading working conditions, regardless of the vile form, such an illness is repugnant. Therefore, this study aimed to demonstrate how work is characterized in conditions similar to slave labor, as well as to analyze the rates of cases in Brazil, both in urban and rural areas. This study was carried out from January 2017 to December 2020, using data from the SmartLab portal. In addition, it addressed the intervention of the Public Ministry of Labor to curb such illegality and discuss criminal convictions, according to the Brazilian Penal Code. The methodology used was qualitative, supported by quantitative research, carried out from a review of primary sources, such as bibliographies, scientific articles, and part of the legal literature available on the subject. Contemporary slave labor, even with the measures already taken by the public power, is still persistent and deserves to be fought by the desideratum of the Democratic State of Law.
Key-words: Slavery; Public Ministry of Labor; Criminal Convictions.
1 Introdução
A escravidão contemporânea, que assola o Brasil, reduz o trabalhador a um mero objeto na seara produtiva, afastando a própria condição de ser humano, com grave afronta à sua dignidade, que pode ocorrer mediante a utilização da coação moral, psicológica e física, seja com o cerceamento de sua liberdade de locomoção, seja em virtude de servidão por dívidas, condições degradantes de trabalho ou jornadas exaustivas. Representa, portanto, violação direta e brutal ao Princípio da Dignidade da Pessoa Humana, explícito no artigo 1º, inciso III, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), eis que se negam ao sujeito trabalhador os direitos mínimos que o distinguem dos demais seres vivos.
Apesar de lamentável, o trabalho realizado em condições análogas à de escravo, mesmo com as medidas já tomadas pelo poder público, ainda, persiste e retrata cenários de séculos passados. Celeuma perversa, em que pessoas se acham no direito de explorar o outro para poderem enriquecer, tratando suas vítimas como materiais, meramente buscando a produtividade, sem pensar na mínima qualidade de vida dos trabalhadores explorados. Aproveitam-se da vulnerabilidade social e econômica dos obreiros, os quais, por sua vez, impelidos pela necessidade de sobrevivência, sujeitam-se a deploráveis condições de trabalho.
A propósito, a atuação do Ministério Público do Trabalho (MPT), prevista na Constituição, é voltada para a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, conforme reza o artigo 127 da Carta Magna de 1988, impondo sua atuação sempre que estes direitos e interesses sofrerem lesão ou ameaça de lesão. Assim, quando o MPT recebe alguma denúncia a respeito de trabalho análogo ao de escravo, que ocasiona a infringência de diversas normas de viés trabalhista, inclusive constitucionais, justifica-se sua imediata intervenção.
O MPT possui várias frentes para desenvolver sua missão e poder ajudar a sociedade. Atua judicialmente por meio da propositura de Ação Civil Pública (ACP) e extrajudicialmente, na esfera administrativa, através do Termo de Ajuste de Conduta (TAC).
O trabalho em condições análogas à de escravo é tipificado como crime no Código Penal Brasileiro, desde sua primeira edição, em 1940, sendo regulamentado no seu artigo 149, que foi todo alterado pela Lei nº 10.803, de 11.12.2003. Contudo, mesmo sendo tipificada como crime tal conduta, percebe-se no juciário brasileiro uma precarização das condenações penais. Além da crítica doutrinária pela pena culminada em um delito tão algoz, que fere integralmente a dignidade da pessoa humana, e ilidirem a atuação da esfera penal.
Certamente, o estudo deste artigo não irá esgotar todas as temáticas que envolvem a escravidão contemporânea, mas abordará perspectivas fundamentais para mostrar a persistência desta mazela na sociedade. Primeiramente, analisando os índices dos trabalhadores resgatados em condições análogos as de escravos contemporaneamente no Brasil, envolvendo os anos de 2017 até 2020, as legislações sobre a temática, a intervenção do Ministério Público do Trabalho para coibir tal prática, e a ‘tímida’ atuação da esfera penal.
1.1 Como se caracteriza o trabalho em condições análogas à de escravo e os índices de casos de submissão de trabalhadores a condições análogas à de escravo no Brasil (2017/2020).
Falar de trabalho análogo ao de escravo não diz respeito a pessoas acorrentadas, mas a trabalhadores que nem sequer têm água potável para beber, comida de qualidade, um alojamento com as mínimas condições de sobrevivência, na maioria das vezes, nem mesmo um colchão para dormir, alojando-se em “barracas” improvisadas. Os obreiros vitimados, no mais das vezes, saem de suas cidades do interior em busca de uma melhor qualidade de vida, deparando-se com pessoas que prometem um ótimo emprego, normalmente em outros Estados, e os aliciam por meio de falsas promessas. Quando chegam ao local para trabalhar, não raro, são coagidos ou têm sua liberdade de locomoção tolhida, pois não recebem salário em espécie, ficam vinculados ao que se convencionou denominar de “livro de anotação”, onde vão anotando os valores das comidas, materiais fornecidos e demais despesas, e, com isso, o trabalhador nunca recebe o dinheiro, ficando confinado na fazenda ou na empresa, o que se denomina da servidão por dívida.
A escravidão contemporânea que assola o Brasil, não é uma realidade exclusiva do meio rural, eis que também é verificada em grandes centros urbanos, e não é apenas caracterizada pelo trabalho forçado, haja vista que, o trabalho análogo ao de escravo também pode se dar por meio da submissão do trabalhador a jornadas exaustivas, pela servidão por dívida ou em razão das condições degradantes de trabalho, mesmo tendo o obreiro se apresentado espontaneamente ao trabalho. Todas essas circunstâncias merecem ser perscrutadas na espécie, utilizando-se as balizas do art. 149 do Código Penal Brasileiro, pois são formas aviltantes da Dignidade da Pessoa Humana.
Nesse interim, vale destacar a observação do site Repórter Brasil:
Não é apenas a ausência de liberdade que faz um trabalhador escravo, mas sim de dignidade. Todo ser humano nasce igual em direito à mesma dignidade. E, portanto, nascemos todos com os mesmos direitos fundamentais que, quando violados, nos arrancam dessa condição e nos transformam em coisas, instrumentos descartáveis de trabalho. Quando um trabalhador mantém sua liberdade, mas é excluído de condições mínimas de dignidade, temos também caracterizado trabalho escravo.
Gonçalves, por sua vez, discorre sobre os mecanismos de sujeição do trabalhador:
Existem três formas coercitivas que podem ser impostas ao trabalhador, quais sejam: a) moral, onde o empregador atrai o trabalhador de forma fraudulenta; b) psicológica, onde há constante ameaça do explorador de violência contra o trabalhador e c) física, sofrendo castigos ou até assassinatos para que os mesmos não fujam. O trabalho em condições análogas ao de escravo, por sua vez, é caracterizado por restringir a liberdade do trabalhador deixando de observar as condições necessárias para que o ser humano possa trabalhar dignamente, respeitando os seus direitos e garantias fundamentais (GONÇALVES, 2018).
Conforme abordado no artigo 149 do Código Penal e segundo o Instituto Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo (InPACTO), entende-se por trabalho forçado, quando o trabalhador é submetido a condições de trabalho sem a possibilidade de deixar o local, por conta de dívidas, isolamento geográfico, ameaças e violências físicas e/ou psicológicas; por condições degradantes, quando a pessoa é exposta a um conjunto de irregularidades que configuram a precarização do trabalho, colocando em risco a sua saúde e sua vida, e que atentam contra a sua dignidade; por jornada exaustiva, quando o trabalhador é submetido a esforços físicos ou sobrecargas de trabalho, que colocam em risco a sua integridade física; e por servidão por dívida, quando a pessoa é forçada a contrair ilegalmente uma dívida que a obriga a trabalhar para pagá-la e que são cobradas de forma abusiva. Sobre as modalidades de exploração de mão de obra escrava na contemporaneidade, Cortez afirma que:
O trabalho em condição análoga à de escravo é caracterizado não só pela violência (coação física, moral e psicológica) contra a liberdade do trabalhador no exercício de sua atividade laboral, mas também em situações, menos explícitas de violação da liberdade, que maculam o seu direito de livre escolha e aceitação do trabalho e suas características, como ocorre na obrigação de se ativar em jornadas exaustivas e/ou locais com péssimas condições de trabalho e onde imperam condições degradantes ao meio ambiente de trabalho, com abuso e desrespeito ao bem maior do ser humano que é a sua dignidade.
De acordo com a Convenção n. 29 da OIT, trabalho forçado ou obrigatório é todo trabalho ou serviço exigido de um indivíduo sob ameaça de sanção e para o qual não se tenha oferecido espontaneamente. O trabalho escravo compreende não apenas o trabalho forçado, atrelado à restrição da liberdade, mas também o trabalho degradante, com restrições à autodeterminação do trabalhador (CORTEZ, 2015, p. 18).
Segundo Garcia (2014), o trabalho degradante caracteriza-se, na atualidade, pelas condições precárias encontradas no labor, sem aferir o mínimo das normas de segurança, higiene e saúde do trabalho, afrontando diretamente à dignidade humana.
Cartilha divulgada pelo MPT põe em relevo algumas características inerentes ao trabalho escravo: vigilância constante no local do trabalho, impedindo o trabalhador de se locomover livremente; reter salários, documentos e objetos pessoais do trabalhador; submeter o trabalhador a trabalho forçado, obrigando o cumprimento de tarefas contra a vontade do trabalhador, por meio de violência física ou ameaças; submeter o trabalhador a jornadas exaustivas que impliquem sofrimento físico ou mental; condições degradantes de trabalho, sem respeitar as normas de saúde, higiene, segurança e proteção do trabalhador; e servidão por dívida, quando exigi que o trabalhador sempre compre mercadorias em um só local, com preços altos, obrigando-o a fazer dívidas. Aborda essa temática Viana:
A primeira categoria de condições degradantes se relaciona com o próprio trabalho escravo stricto sensu. Pressupõe, portanto, a falta explícita de liberdade. Mesmo nesse caso, porém, a ideia de constrição deve ser relativizada. Não é preciso que haja um fiscal armado ou outra ameaça de violência. Como veremos melhor adiante, a simples existência de uma dívida crescente e impagável pode ser suficiente para tolhera liberdade. A submissão do trabalhador à lógica do fiscal não o torna menos fiscalizado.
A segunda categoria se liga com o trabalho. Nesse contexto entram não só a própria jornada exaustiva de que nos fala o CP - seja ela extensa ou intensa- como o poder diretivo exacerbado, o assédio moral e situações análogas. Note-se que, embora também o operário de fábrica possa sofrer essas mesmas violações, as circunstâncias que cercam o trabalho escravo - como a falta de opções, o clima opressivo e o grau de ignorância dos trabalhadores - tornam- nas mais graves ainda.
A terceira categoria se relaciona com o salário. Se este não for pelo menos o mínimo, ou se sofrer descontos não previstos na lei, já se justifica a inserção na lista.
A quarta categoria se liga à saúde do trabalhador que vive no acampamento da empresa - seja ele dentro ou fora da fazenda. Como exemplos de condições degradantes teríamos a água insalubre, a barraca de plástico, a falta de colchões ou lençóis, a comida estragada ou insuficiente.
Mas mesmo quando o trabalhador é deslocado para uma periferia qualquer, e de lá transportado todos os dias para o local de trabalho, parece-nos que a solução não deverá ser diferente. Basta que a empresa repita os caminhos da escravidão, desenraizando o trabalhador e não lhe dando outra opção que a de viver daquela maneira. Esta seria a quinta categoria de condições degradantes (VIANA, 2006, p. 200).
De acordo com o Supremo Tribunal Federal (STF), o entendimento contemporâneo da redução a condição análoga à de escravo prescinde do cerceamento da liberdade de ir e vir:
EMENTA PENAL. REDUÇÃO A CONDIÇÃO ANÁLOGA A DE ESCRAVO. ESCRAVIDÃO MODERNA. DESNECESSIDADE DE COAÇÃO DIRETA CONTRA A LIBERDADE DE IR E VIR. DENÚNCIA RECEBIDA. Para configuração do crime do art. 149 do Código Penal, não é necessário que se prove a coação física da liberdade de ir e vir ou mesmo o cerceamento da liberdade de locomoção, bastando a submissão da vítima a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva ou a condições degradantes de trabalho, condutas alternativas previstas no tipo penal. A escravidão moderna é mais sutil do que a do século XIX e o cerceamento da liberdade pode decorrer de diversos constrangimentos econômicos e não necessariamente físicos. Priva-se alguém de sua liberdade e de sua dignidade tratando-o como coisa e não como pessoa humana, o que pode ser feito não só mediante coação, mas também pela violação intensa e persistente de seus direitos básicos, inclusive do direito ao trabalho digno. A violação do direito ao trabalho digno impacta a capacidade da vítima de realizar escolhas segundo a sua livre determinação. Isso também significa reduzir alguém a condição análoga à de escravo. Não é qualquer violação dos direitos trabalhistas que configura trabalho escravo. Se a violação aos direitos do trabalho é intensa e persistente, se atinge níveis gritantes e se os trabalhadores são submetidos a trabalhos forçados, jornadas exaustivas ou a condições degradantes de trabalho, é possível, em tese, o enquadramento no crime do art. 149 do Código Penal, pois os trabalhadores estão recebendo o tratamento análogo ao de escravos, sendo privados de sua liberdade e de sua dignidade. Denúncia recebida pela presença dos requisitos legais.(STF - Inq: 3412 AL, Relator: Min. MARCO AURÉLIO, Data de Julgamento: 29/03/2012, Tribunal Pleno, Data de Publicação: ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-222 DIVULG 09-11-2012 PUBLIC 12-11-2012)
A escravidão contemporânea, segundo Paixão e Cavalcanti, ocorre sempre que um empregador imprudente expõe em risco a vida e a integridade física dos trabalhadores ou, ainda, quando os diminui e humilha enquanto pessoas, obrigando-os a se submeterem a situações degradantes. Quando o empregador decide explorar o trabalho de alguém em alguma atividade econômica, particularmente em um contexto no qual o trabalhador é deslocado para longe de sua residência para desenvolver a atividade, precisa ter assegurado as mínimas condições de alimentação, alojamento e trabalho, por parte do empregador. Tais obrigações derivam diretamente dos princípios constitucionais que têm a dignidade da pessoa humana como um dos valores fundamentais da República, que proclamam a função social da propriedade e proíbem o “tratamento desumano e degradante”. Os doutrinadores explicam:
Muitas vezes, quando um trabalhador sobe na carroceria do caminhão que irá leva-lo para o interior, ele não está totalmente ciente das condições de trabalho que irá encontrar. Não raro, ele é ludibriado pelos ‘gatos’, gerentes ou pelos próprios empregadores; a maioria desses trabalhadores não é capaz sequer de ler. São pessoas e não coisas. O fato de se encontrarem em uma posição vulnerável não os priva automaticamente de sua autonomia. Mas a tática dos que se envolvem na exploração de trabalho em condições análogas à escravidão vai além de recrutar pessoas vulneráveis. Ela se apoia na maximização da vulnerabilidade desses trabalhadores, ao adicionar diferentes componentes à já instável relação de trabalho: jornadas exaustivas, comida estragada ou insuficiente, água não potável, condições de vida e habitação humilhantes, falta de proteção de riscos ocupacionais, a ameaça silenciosa – ou nem tão silenciosa – dos ‘gatos’, o peso moral da dívida e, ainda, o deslocamento do trabalhador de sua local de origem (PAIXÃO; CAVALCANTI, 2017, p. 177 e 178).
Quanto à jornada exaustiva, o trabalho análogo ao de escravo não se caracteriza em toda e qualquer situação de jornada extraordinária. Além do excesso de horas, a ocorrência dos fatos se dá em um ambiente de trabalho hostil, em que falta o mínimo necessário para o desempenho das atividades, atinge a dignidade humana do trabalhador, pois o empregado não tem condições de demonstrar seu pensamento e vontade, sendo cobrado constantemente pela produção, condições que comprometem sua saúde física e mental. É oportuno frisar que a Declaração Universal dos Direitos do Homem prevê como garantia ao trabalhador a limitação razoável das horas de trabalho.
Segundo CORTEZ (2015, p. 22), jornada de trabalho exaustiva é a que “ultrapassa os limites normais da duração do trabalho estabelecida em lei, sendo prejudicial à saúde física e mental do trabalhador e imposta sem o seu livre consentimento”. Gonçalves complementa:
Cabe ressaltar que não é apenas a extensão das horas de trabalho que caracteriza uma jornada exaustiva, mas também com o ritmo e produtividade que é obrigado a realizar o labor. O dano existencial ocorre quando uma conduta do empregador é capaz de impedir ou prejudicar que o trabalhador realize atividades importantes para o seu bem-estar, deixando de descansar físico e emocionalmente (GONÇALVES, 2018).
Já nos casos de trabalho análoga ao de escravo, que envolvem a servidão por dívida, além do trabalhador ser submetido as condições supramencionadas, ele, para poder trabalhar, fica refém de comprar seus mantimentos e materiais do próprio empregador. Os obreiros não possuem acesso ao valor da compra, sabendo apenas que o patrão irá anotá-la para o futuro desconto em seu salário. Outro fato que cabe destacar, é o pagamento indevido pelo material que necessitam para trabalhar, já que é de responsabilidade do empregador fornecê-lo. Com todos esses descontos salariais, no final do mês os trabalhadores acabam por nada receber ou, quando muito, recebem um valor irrisório. Assim, ficam dependentes e presos à propriedade. Conforme explica Alves:
Há situações em que o trabalhador não é impedido de deixar o seu trabalho, por exemplo, pela presença ostensiva e intimidadora de sujeitos armados, mas encontra-se impedido, em razão da existência de uma suposta dívida que contraiu junto ao seu empregador e que o seu senso de honradez lhe impede de cessar a prestação de serviços sem que haja a quitação desse débito (ALVES, 2009, p. 19).
O levantamento dos casos de trabalhadores submetidos a condição análoga à de escravos tem como objetivo demonstrar que, essa mazela, ainda, persiste da sociedade contemporaneamente. De acordo com o Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas, um dos eixos da Plataforma SmartLab, fruto de parceria entre o Ministério Público do Trabalho (MPT) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT), foram resgatados, no período de 2003 a 2018, 45.028 trabalhadores em situação análoga à de escravo, aí incluídas as vítimas que não receberam seguro-desemprego (fonte: Ministério da Economia – Secretaria Especial de Previdência e Trabalho). Nessa esteira, a média de resgatados por ano, de 2003 a 2018, é de 2.814,3.
Como o objetivo deste artigo é fazer um levantamento da escravidão contemporânea, no Brasil, particularmente entre os anos de 2017 e 2020, a tabela abaixo demonstra o número de resgates ocorridos nos anos mencionados, como também em 2003, 2007, 2011 e 2015, atestando a persistência dessa vicissitude no país:
Ano |
Trabalhadores Resgatados de Trabalho Forçado |
2003 |
5.223 |
2007 |
5.999 |
2011 |
2.445 |
2015 |
869 |
2017 |
639 |
2018 2019 2020 |
915 971 861 |
Fonte: SmartLab (https://smartlabbr.org/trabalhoescravo/localidade/0?dimensao=prevalencia)
Ainda segundo o Observatório, entre 2017 e 2020, os Estados com maior prevalência de resgastes foram: 1. Minas Gerais /MG, 1.199; 2. Pará/PA, 364; 3. Goiás/GO, 305; 4. São Paulo/SP, 284 e 5. Piauí/PI, 186. Essa divisão por Estados é fundamental para definir as áreas prioritárias e relevantes às quais devem ser direcionados os recursos e esforços no combate ao trabalho escravo, não apenas pela perspectiva tradicional, a repressiva, por meio das operações de resgate, mas, também e principalmente, sob a ótica a preventiva, visando à elevação dos padrões de vida para romper o ciclo de vulnerabilidade.
O levantamento supramencionado é para demonstrar, fatidicamente, o quanto ainda permanece hodiernamente pessoas submetidas as condições análogas à de escravo, pois a redução dos resgatados de um ano para o outro é ínfima. O quantitativo é apenas para enfatizar a problemática, conforme relata Camilla de Vilhena Bemergui Rys (2011, p. 5), “na realidade, quando se trata de redução de alguém à condição análoga a de escravo, os números importam para mostrar em qual dimensão a escravidão persiste, para conferir dados estatísticos”.
Vale destacar que, todo o esforço do poder público no combate ainda seria justificável, mesmo que os relatos divulgados fossem de números inferiores, pois além de ser uma prática criminosa, a redução de outrem à condição análoga à de escravo fere qualquer princípio humano básico.
1.2 Legislação sobre o trabalho escravo
O trabalho análogo ao de escravo é tratado nos seguintes diplomas normativos: Declaração Universal dos Direitos dos Homens; Convenções n.º 29 e n.º 105 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que tratam da abolição do trabalho forçado; Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto São José da Costa); Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB), de 1988 (artigos 5º, incisos XIII, XLVII, alínea “c”, 6º, 7º, 109, inciso VI, 227 e 243, caput); Código Penal (CP) (artigos 149 - que tipifica o crime de redução a condição análoga à de escravo - 149-A, 203 e 207).
Aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, a Declaração Universal dos Direitos dos Homens, de que é signatário o Brasil, é um paradigma dos direitos fundamentais. Segundo Cortez, 2015, essa Declaração, apesar de não possuir forma de tratado ratificável, constitui uma fonte de máxima hierarquia no mundo do Direito, pois enuncia princípios que devem guiar a elaboração e a aplicação das normas jurídicas.
Para a Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), instituição judicial autônoma que interpreta as disposições da Convenção Americana, a escravidão contemporânea caracteriza-se a partir da presença dos seguintes elementos:
a) restrição ou controle da autonomia individual; b) perda ou restrição da liberdade de movimento de uma pessoa; c) obtenção de um benefício por parte do perpetrador; d) ausência de consentimento ou livre arbítrio da vítima; impossibilidade ou irrelevância devido à ameaça de uso da violência ou outras formas de coerção; medo de violência, fraude ou falsas promessas; e) uso de violência física ou psicológica; f) posição de vulnerabilidade da vítima; g) detenção ou cativeiro; e i) exploração (CONATRAE, 2017, p. 22).
A propósito, é emblemática a condenação do Brasil, em 2016, pela CIDH, no caso da Fazenda Brasil Verde, localizada no Pará. A Corte proferiu sentença no caso, declarando o Estado brasileiro internacionalmente responsável pela violação: I) do direito a não ser submetido a escravidão e tráfico de pessoas, estabelecido no artigo 6.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, como também nos artigos 1.1, 3, 5, 11, 19 e 22; II) das garantias judiciais de devida diligência e de prazo razoável, previstas no artigo 8.1 do instrumento mencionado. Cristiano Paixão e Tiago Cavalcanti assim descrevem o caso:
A condenação internacional do Estado Brasileiro e os fundamentos trazidos no bojo da decisão trazem à tona: i) a ineficácia das medidas adotadas até então para a erradicação do trabalho escravo no Brasil; ii) o contexto social atual de involução no que se refere ao enfrentamento à escravidão (PAIXÃO; CAVALCANTI, 2017, p. 108).
Outrossim, o Caso Fazenda Brasil Verde é considerado um marco histórico pois foi a primeira vez que a proibição da escravidão foi aplicada no julgamento de um caso concreto no Continente Americano, além de que foram estabelecidos, pela Corte, parâmetros para a interpretação e alcance do conceito trazido pelo artigo 6º da Convenção Americana, bem como a responsabilidade dos Estados no enfrentamento à escravidão, de natureza vinculante (PAIXÃO; CAVALCANTI, 2017, p. 109).
Além disso, a Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB) de 1988, no artigo 1º, inciso III, faz referência à dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos da República; no artigo 4º, inciso II, aponta como um dos princípios que regem as relações internacionais a prevalência dos direitos humanos; no artigo 5º, § 2º, chancela os direitos e as garantias decorrentes dos tratados internacionais firmados pelo Estado brasileiro; no § 4o do mesmo artigo, menciona a submissão do Brasil à jurisdição do Tribunal Penal Internacional. Todas essas disposições, dentre outras, demonstram o comprometimento do Estado brasileiro com os direitos humanos. Nesse sentido, ensina Beltramelli Neto:
A preocupação da Constituição Federal de 1988 com a proteção dos direitos humanos não se limitou à declaração de direitos fundamentais e à sua proteção pela via da cláusula pétrea. Em sintonia com a aceleração do movimento global de afirmação dos direitos humanos, o texto constitucional orienta o Estado brasileiro a alinhar-se, no plano internacional, com a salvaguarda dos direitos humanos. Esta postura decorre da eleição do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana como núcleo axiológico da Constituição (BELTRAMELLI NETO, 2017, p. 268).
Na CRFB, a relação de emprego é socialmente protegida, prevista no artigo 7º, inciso I, sendo um direito fundamental assentado no Princípio da Justiça Social, além do caput do artigo igualar os direitos dos trabalhadores urbanos e rurais. Dentre os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, previstos no artigo 3º, incisos I e III, da Carta Política, estão o de “construir uma sociedade justa e solidária” e de “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais”. Tais objetivos estão atrelados à finalidade da ordem econômica, que, segundo a Constituição, “tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social”, observados, dentre outros princípios, a “função social da propriedade” e “a busca do pleno emprego” (art. 170, III, VIII).
Para tentar coibir a insistente prática do trabalho escravo a Constituição Federal, em seu artigo 243, trata da possibilidade de desapropriação de terras nas quais se constate essa mazela, alteração inserida por meio da Emenda Constitucional n.º 81, de 2014.
De acordo com o artigo 149, do CP, são elementos que caracterizam o trabalho análogo ao de escravo: condições degradantes de trabalho (incompatíveis com a dignidade humana, caracterizadas pela violação de direitos fundamentais que coloquem em risco a saúde e a vida do trabalhador), jornada exaustiva (em que o trabalhador é submetido a esforço excessivo ou sobrecarga de trabalho, acarretando danos à sua saúde ou risco de vida), trabalho forçado (manter a pessoa no serviço através de fraudes, isolamento geográfico, ameaças e violências físicas e psicológicas) e servidão por dívida (fazer o trabalhador contrair ilegalmente um débito e prendê-lo a ele). Os elementos podem existir isoladamente ou de maneira concorrente. Conforme aponta Camilla de Vilhena Bemergui Rys:
A questão é acerca da necessidade ou não da restrição à liberdade de locomoção ou mesmo de distrato do contrato de trabalho. A localização do artigo 149 no capítulo relacionado aos crimes contra a liberdade pessoal leva a entender, numa análise apriorística, a necessidade da restrição da liberdade física do trabalhador. Algumas de suas condutas tipificadas trazem implícita essa necessidade, quando falamos em trabalho escravo, falamos de um crime que cerceia a liberdade dos trabalhadores. No Brasil, essa falta de liberdade ocorre por meio de quatro fatores: apreensão de documentos; presença de guardas armados e gatos de comportamento ameaçador; dívidas ilegalmente impostas e características geográficas do local que impedem a fuga (RYS, 2011, p. 20).
Como se pode notar, tanto o tipo penal de redução a condição análoga à de escravo como as normas garantidoras do trabalho digno não são recentes nem desconhecidas, o que torna ainda mais fatídica e deplorável a agrura da escravidão contemporânea. E não é só, a maior parte dos empregadores que incorrem nessa prática abominável é instruída, advém de uma classe de notável saber e privilegiada, como também conta com um assessoramento jurídico e contábil para driblar a legislação, em prol da ganância. Vale destacar também, segundo Cristiano Paixão e Tiago Cavalcanti, a longa demora na tramitação das ações judiciais, aliada à modesta pena cominada ao crime previsto no artigo 149 do Código Penal, o que contribui para a permanência da exposição dos trabalhadores as condições extremamente precárias. Em consultas feitas nas decisões dos tribunais, não se vê a condenação pelo tipo penal de reduzir algum a condição análoga à de escravo, conforme explícito no Código penal. Nas palavras de Maria da Conceição Maia Pereira:
A alteração do artigo 149 do Código Penal ampliou o espectro de consideração do bem jurídico tutelado, porque, sem olvidar da liberdade, levou em conta um atributo maior do ser humano, que é a sua dignidade, eleita como um dos fundamentos da República, conforme inciso III do artigo 1º da Carta Magna de 1988 (PEREIRA, 2015, p. 283).
Ainda acerca dos crimes previstos no Código Penal brasileiro, cabe destacar o artigo 203, que caracteriza a servidão por dívida, em que o trabalhador é obrigado a comprar mercadorias absurdamente caras do estabelecimento de propriedade de seu algoz, podendo, ainda, contrair dívidas em virtude da necessidade de manter sua vida (transporte, moradia e alimentação) ou ter seus documentos pessoais apreendidos. Desta forma, o trabalhador fica impossibilitado de se desligar do serviço em virtude de dívida. O artigo 203, do CP é abordado por Rejane de Barros Meirelles Alves:
O artigo 203 do Código Penal tipifica o crime de frustração de direito assegurado por lei trabalhista. A conduta descrita no caput é classificada doutrinariamente como norma penal em branco, pois contém descrição típica incompleta, sendo a legislação trabalhista o complemento da norma penal, os direitos assegurados ao empregado e ao empregador.
Observe-se que a conduta tipificada no §2º, inciso I, do artigo 203 do Código Penal Brasileiro é o truck system, também vedado pela legislação trabalhista. A lei procura coibir que empregadores obriguem os trabalhadores a comprar mercadorias, geralmente a prazo, em seus próprios estabelecimentos ou de terceiro e a altos preços, ficando os mesmos, no final dos meses, com saldo negativo, isto é, dívida, o que os impossibilitaria de deixar o emprego. Deve ficar caracterizada a intenção de impossibilitar o desligamento do serviço em virtude da dívida. Na hipótese do inciso II do mesmo parágrafo, a lei pune quem, mediante retenção de documentos pessoais ou contratuais, tais como carteira de identidade, carteira de trabalho e previdência social, ou, ainda que sem a retenção desses papéis, empregue violência física ou moral, para impedir o trabalhador de desligar-se do serviço. Aqui, compreende-se o uso ostensivo de armas, por prepostos do empregador, de modo que o delito estará consumado no momento em que o trabalhador, em face dos meios executórios empregados pelo sujeito é impedido de desligar-se do serviço (ALVES, 2009, p. 70).
Cabe destacar o artigo 207, do CP, pois trata da punição do aliciamento dos trabalhadores de um local para outro dentro do território nacional, no país. Conforme destaca Alves (2009), é admitido qualquer meio de execução, para o aliciamento, seja através das falsas promessas de salários e trabalho ou a fraude, consumando-se o delito no momento em que o sujeito por meio da conversa consegue atrair, convencer, e seduz o trabalhador a sair de uma localidade em direção a outra, não levando em consideração, em momento algum, se fica perto ou longe de sua moradia.
Conforme esclarece Scaff (2010, p. 11), o Brasil ratificou vários tratados internacionais a exemplo as Convenções nº 29 e nº 105 no âmbito da OIT, além de reconhecer outros documentos como os Pactos de Direitos Humanos e a Declaração Universal. Mesmo com a participação ativa do Brasil na luta contra o trabalho forçado no âmbito internacional, essa atitude ainda é constante na sociedade brasileira tanto nos centros urbanos como os bolivianos em São Paulo, quanto nas regiões mais afastadas como a servidão por dívida no norte do país.
O MPT, busca, no exercício das suas atribuições legais e constitucionais, a defesa da ordem jurídica justa, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, bem como de promoção da dignidade da pessoa humana, da valorização social do trabalho e da justiça social. A instituição atua na prevenção, na repressão e na erradicação do trabalho escravo, em todas as regiões do país. Como ponderam Paixão e Cavalcanti:
Não é possível permanecer o trabalhador subjugado ao patrão. Diminuído, humilhado e impossibilitado de exercer seu direito de homem livre, digno e igual. É preciso devolver-lhe seu direito e ir e vir, resgatar seu direito de contratar, de sair de um emprego e ir para outro. É imperativo garantir um trabalho digno, com dignas condições de exercer suas funções acima de tudo. O Ministério Público do Trabalho tem sido uma das mais importantes instituições na busca deste mister, seja atuando extrajudicialmente, ou manejando com eficiência e ousadia na Justiça do Trabalho as ações coletivas legalmente previstas (PAIXÃO; CAVALCANTI, 2017, p. 59).
Por ser o órgão responsável por zelar pelo respeito aos interesses sociais dos trabalhadores, coletivamente considerados, o MPT, para apoiar e aprofundar a atuação institucional no combate à escravidão contemporânea, instituiu, no ano de 2002, por meio da Portaria 231/2002 a Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (CONAETE). A respeito desse fato histórico, esclarece sobre o assunto Zuben e Carvalho:
A CONAETE coordena e articula a ação dos membros, propondo projetos estratégicos de âmbito nacional, o incremento da responsabilização dos que exploram mão de obra análoga à de escravo, a interação com outras instituições e entidades, a implementação de políticas públicas, entre outras atividades. Além de fornecer subsídios técnico-jurídicos aos Procuradores do Trabalho de todo País para aprimorar a atuação ministerial em face dos beneficiários pela escravidão contemporânea, a CONAETE desempenha o importante papel de coordenar a participação dos membros do Ministério Público do Trabalho nas forças-tarefas promovidas pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel, vinculado à Secretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) e com caráter eminentemente interinstitucional, cuja finalidade é potencializar o enfrentamento repressivo ao trabalho escravo contemporâneo (ZUBEN; CARVALHO, 2018, p.3).
A atuação do MPT em relação ao trabalho preventivo se dá por meio de audiências públicas, feitas em locais de maiores ocorrências do trabalho escravo, divulgações de campanhas para instruir a sociedade, através das notificações recomendatórias etc. Na forma repressiva, por meio das fiscalizações, da celebração do Termo de Ajuste de Conduta – TAC (instrumento extrajudicial de resolução de conflitos, que abarca obrigações de fazer, não fazer e/ou pagamento de indenização por dano moral, com a previsão de sanção pecuniária para o caso de descumprimento da avença) e da propositura de Ação Civil Pública – ACP. A respeito do Termo de Ajuste de Conduta, a doutrina ensina que:
Um importante instrumento ganha relevo nesse cenário, qual seja, o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que é um instrumento extrajudicial de resolução de conflitos envolvendo os direitos difusos e coletivos, que celebra obrigações de fazer e não fazer e/ou gerar indenizações por danos ao meio ambiente que não podem mais voltar ao seu estado natural e multas diárias em caso de não cumprimento da celebração.
Desta feita, o TAC é um importante instrumento do Ministério Público do Trabalho no combate à erradicação do trabalho escravo, pois é a forma mais simples e barata de se corrigir uma irregularidade, já que tanto o MPT quanto o infrator reconhecem a prática da infração, reconhecem a importância do restabelecimento da regularidade e acordam as medidas que precisam ser adotadas para se chegar a esse fim desejado pelas normas constitucionais e legais e pela sociedade, e buscado pelo MPT (OLIVEIRA, 2019).
O termo de ajuste de conduta dar-se-á no inquérito civil público, já que é de exclusividade do Ministério Público, art. 129, III, da CR, artigos 8º, 9º e 10º da Lei n. 7.347/85, e fixará multa (astreintes) por descumprimento de obrigações de fazer ou de não fazer, diante das condutas praticadas que caracterizam o trabalho em condições análogas às de escravo, bem como a obedecer, doravante, a legislação trabalhista (GARCIA, 2014).
A atuação pela via administrativa não cessa com a assinatura do TAC, pois o Órgão Ministerial continua acompanhando seu integral cumprimento, para assegurar sua efetividade, seja por meio de requisição de informações ao compromissário, seja por meio da realização de inspeção, diretamente ou por outros órgãos, a exemplo da Superintendência Regional do Trabalho – SRTb. Visto que o TAC, em regra, tem vigência por tempo indeterminado, mesmo que o procedimento administrativo venha a ser arquivado é possível que, a qualquer momento, na hipótese de nova denúncia ou caso se constate o descumprimento do ajustado, através das fiscalizações, ele será desarquivado, ocasionando a incidência de multa, com o consequente firmamento de Termo Aditivo ou execução do TAC descumprido, sendo possível, ainda, o ajuizamento de ação civil pública:
Se o TAC for integralmente cumprido, os autos do inquérito serão arquivados. Porém, se o TAC não for cumprido integralmente, o MPT deverá ajuizar as ações cabíveis, pois já se esgotaram as medidas disponíveis no âmbito administrativo/extrajudicial. Ou, se a empresa não quiser firmar o TAC, cabe a Ação Civil Pública (OLIVEIRA, 2019).
A outra maneira de atuação repressiva do MPT, ocorre através a Ação Civil Pública – ACP, prevista no artigo 83, III, da Lei Orgânica do Ministério Público da União (LOMPU) - Lei Complementar n.º 75, de 1993, que operasse na via judicial, sendo um instrumento de defesa dos direitos coletivos e difusos no campo das relações de trabalho. A ACP é utilizada quando a denúncia recebida pelo MPT não consegue ser resolvida administrativamente, ou mesmo quando ocorre a assinatura do TAC, e a empresa acaba por descumpri-lo e não arca com as multas decorrentes dele. A maneira do MPT conseguir executar a multa decorrente do TAC e através da ACP. Nesse ínterim, discorre Camilla de Vilhena Bemergui Rys:
A ação civil pública é o instrumento pertinente para a defesa de direitos metaindividuais pelo Ministério Público. Segundo a lei 7347/85, a ação civil pública tem por objeto a condenação em dinheiro ou o cumprimento de obrigação de fazer e não fazer (artigo 3º). Em cotejo com o artigo 83, III da Lei Complementar 75, houve certa polêmica haja vista que a interpretação literal dos dois dispositivos fazia com que se entendesse pela alternatividade dos pedidos (condenação em dinheiro ou obrigação de fazer), de acordo com a infração praticada (RYS, 2011, p. 26).
A ACP, também, é uma maneira do MPT tentar garantir a reparação aos trabalhadores e a sociedade, das lesões sejam físicas, morais ou psicológicas sofridas e dos direitos que lhes são ceifados, já que, muitas vezes os infratores saem impunes na esfera criminal, aliado a demora do julgamento. Assim, o dano moral recebido através da ACP é uma via de tentar amenizar a lesão causada a vítima, já que a autonomia entre a esfera criminal e trabalhista. Schwarz, enfatiza:
As ações civis públicas ajuizadas pelo Ministério Público do Trabalho têm se demonstrado valiosos instrumentos de garantia de direitos coletivos e, no que diz respeito à escravidão contemporânea, diante da impunidade dos infratores na esfera penal, as condenações pecuniárias decorrentes das decisões da Justiça do Trabalho têm se demonstrado a mais efetiva e eficiente forma de garantia judiciária dos direitos sociais dos trabalhadores submetidos à escravidão no Brasil. A combinação das multas aplicadas pelo Ministério do Trabalho e Emprego e das indenizações trabalhistas, pagas durante as operações dos grupos móveis de fiscalização ou por força de decisões da Justiça do Trabalho, a título de verbas trabalhistas e indenizações por dano moral, individual ou coletivo, são, atualmente, as punições mais efetivas e eficazes, se não efetivamente as únicas, no plano institucional, que são impostas aos fazendeiros que reduzem trabalhadores a condição análoga à de escravos (SCHWARZ, 2008, p. 168).
Cristiano Paixão e Tiago Muniz Cavalcanti (2017; p. 69), relatam que os primeiros pedidos pleiteados pelo Ministério Público do Trabalho tendo como fundamento a indenização por dano moral coletivo foram, estrategicamente, fixados em modestias quantias, sendo os valores gradativamente elevados a depender da gravidade da conduta e reincidência do requerido. “O objetivo do Parquet, neste caso, era a construção de uma jurisprudência sólida e favorável à condenação por dano moral em todos os casos de trabalho escravo”. Para destacar, segue um caso de ACP proposta pelo MPT, de uma empresa reincidente na exploração de mão de obra escrava e condenada por dano moral coletivo:
ACÓRDÃO TRT 1ª TURMA-RO 01780-2003-117-08-00-02
RECORRENTES: Lima Araújo Agropecuária Ltda; Construtora Lima Araújo Ltda; P. H. Engenharia Ltda; Jefferson de Lima Araújo Filho; Fernando Lyra Carvalho. EMENTA: TRABALHO EM CONDIÇÕES SUBUMANAS. DANO MORAL COLETIVO PROVADO. INDENIZAÇÃO DEVIDA. [...] CONCLUSÃO: ACORDAM OS DESEMBARGADORES DA PRIMEIRA TURMA DO EGRÉGIO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA OITAVA REGIÃO, UNANIMENTE, EM CONHECER DO RECURSO DE AMBAS AS PARTES, BEM COMO DAS CONTRARRAZÕES DOS RÉUS, REJEITANDO A PRELIMINAR DE NÃO CONHECIMENTO NELAS SUSCITADAS; REJEITAR AS PRELIMINARES DE ILEGITIMIDADE ATIVA, DE INÉPCIA DA INICIAL, DE NULIDADE DA DECISÃO POR CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA, DE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL E DE IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO PEDIDO E DA CAUSA DE PEDIR, DEDUZIDAS PELOS RECORRENTES, POR FALTA DE AMPARO FÁTICO-LEGAL E, NO MÉRITO, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DOS RÉUS E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO DO MNISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO PARA, REFORMANDO PARCIALMENTE A DECISÃO A QUO, MAJORAR A INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL COLETIVO PARA R$ 5.000.000,00 (CINCO MILHÕES DE REAIS), MANTENDO A DECISÃO EM SEUS DEMAIS TERMOS (PAIXÃO; CAVALCANTI, 2017, p. 70 e 71).
Vale destacar a parte preventiva, realizada pelo MPT, uma das campanhas feitas em parceria com a ONG Repórter Brasil, denominada de Escravo Nem Pensar, realizada no Estado do Maranhão e no Tocantins, ambos em 2018. Ela teve uma grande repercussão e serve de exemplo de como se pode conscientizar, por meio da educação, a respeito do combate a essa mazela, que teve como objetivo geral diminuir o número de trabalhadores aliciados e submetidos a condições análogas a de escravos nas zonas rural e urbana do território do Maranhão e do Tocantins.
Outra iniciativa do MPT foi a criação, em parceria com a OIT, da Plataforma SmartLab, que alberga o Observatório da Erradicação do Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas para fomentar, de forma eficiente, as políticas públicas, programas e projetos de prevenção e de erradicação do trabalho escravo:
O Observatório Digital de Trabalho Escravo e do Tráfico de Pessoas busca fomentar a gestão eficiente e transparente de políticas públicas, de programas e de projetos de prevenção e de erradicação do trabalho escravo, de modo que essas ações sejam cada vez mais orientadas por resultados e baseadas em evidências. Busca-se, além disso, fomentar o aprimoramento dos sistemas de coleta de informações e a padronização (com integração) dos bancos de dados existentes, de diferentes fontes, relevantes para a causa. Com isso, os diagnósticos e o conhecimento produzidos sobre o tema serão cada vez mais precisos (SmartLab).
Conforme notícia extraídado site da PGT, a unidade de Uruguaiana do Ministério Público do Trabalho no Rio Grande do Sul (MPT-RS) obteve, por meio de tutela cautelar antecedente proposta na Justiça do Trabalho, bloqueio de bens dos proprietários das granjas Maragato e Marquezan, no interior de São Borja, até o limite de R$ 1.141.648,85 (um milhão cento e quarenta e um mil seiscentos e quarenta e oito reais e oitenta e cinco centavos) e R$ 1.737.736,08 (um milhão setecetnos e trinta e sete mil setecentos e trinta eseis reais e oito centavos), respectivamente, para pagamento de verbas e indenização por danos morais a trabalhadores mantidos em condições degradantes nas duas propriedades. A ação é de responsabilidade do Procurador do MPT-RS em Uruguaiana, Hermano Martins Domingues.
1.4 As punições na esfera penal de acordo com o Código Penal Brasileiro
O trabalho análogo ao de escravo no Brasil é persistente, mesmo possuindo uma legislação penal específica, que visa ao seu combate, como exemplo o art. 149 do Código Penal, a realidade que se depara, no âmbito do Poder Judiciário, especificamente na esfera penal, é de um número bastante reduzido das condenações dos respectivos infratores.
Na doutrina percebe-se a crítica pela pena culminada no artigo 149, do CP, qual seja, reclusão de dois a oito anos e multa, levando em consideração a gravidade do tipo penal trazido à baile, que fere explicitamente direitos fundamentais estabelecidos na CRFB/88. Mais que isso, está as manobras dos Tribunais para não penalisar os casos fáticos ou mesmo minorar as penas, como no julgado:
PENAL. PROCESSO PENAL. ART. 149 DO CÓDIGO PENAL. REDUÇÃO À CONDIÇÃO ANÁLOGA DE ESCRAVO. CONDIÇÕES DEGRADANTES DE TRABALHO. NULIDADE DO IPL. NÃO VERIFICAÇÃO DE PREJUÍZO. AUTORIA, MATERIALIDAE E DOLO CONFIGURADOS. CONDENAÇÃO CONFIRMADA. PENA MANTIDA. OMISSÃO DE INFORMAÇÕES NA CTPS. CP, ART. 297, § 4º. AUSÊNCIA DE DOLO EM FRAUDAR A PREVIDÊNCIA. ABSOLVIÇÃO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. [...] 6. Embora os autos tragam documental apta a comprovar a materialidade delitiva e autoria do crime do art. 297, § 4º do Código Penal, não se vislumbra a presença do especial fim de agir, necessário para a condenação pelo crime em questão. Precedentes. 7. Aplicadas penas substitutivas aos réus e fixado regime aberto. 8. Apelação da defesa parcialmente provida somente para absolver os réus do crime do art. 297, § 4º do CP. (grifo nosso)
(TRF-1 - AC: 00003455620144013606, Relator: JUIZ FEDERAL MARLLON SOUSA, Data de Julgamento: 11/09/2019, TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: 20/09/2019)
Pelo exposto e analisado, percebe-se que o judiciário tem flexibilizado as punições dos infratores no crime de reduzir alguém as condições análogas à de escravo. Com isso, tem se deparado nos tribunais, como exemplo, a substituição da pena privativa de liberdade por outra restritiva de direito, como pena alternativa, conforme esclarece Nonnato Santos:
A maioria das sentenças condenatórias converte a aplicação da pena privativa de liberdade em alguma medida alternativa, desta forma, imunizando um determinado grupo de criminosos do encarceramento, ainda que tal medida se dê contra o que determina a legislação sendo fundamentada numa concepção de que aviltar a dignidade humana das vítimas do trabalho escravo contemporâneo pode ocorre sem que violência, ou seja, no âmbito da criminalização secundária quando não é possível imunizar da punição imuniza-se do encarceramento, signo-símbolo do estigma do criminoso/bandido, ou seja do inimigo do Direito Penal (SANTOS, 2017, p. 102).
Mesquita (apud SANTOS, 2017, p. 67) cita uma pesquisa na qual relata que houverão 84 processos encaminhados à 2ª instância de julgamento (Tribunal Regional Federal da 1ª Região). E que até julho de 2015 haviam sido julgados 38 (trinta e oito) desses processos, dos quais 5 (cinco) tiveram decisões condenatórias; 2 (dois) foram extintos sem análise de mérito, em razão da prescrição da pretensão punitiva dos réus; 13 (treze) tiveram decisões reduzindo a pena dos réus e 18 (dezoito) acórdãos absolutórios. Em continuação Mesquita assevera que:
Em que pese o TRF-1 ter reformado as sentenças de 1º grau e condenado os respectivos réus pelo crime previsto no artigo 149 do Código Penal Brasileiro, as penas fixadas pela Corte Recursal foram diminutas, variando de 2 anos e 6 meses a 3 anos e 9 meses de reclusão e, ainda, no regime inicial aberto. Além disso, como se não bastasse, as mesmas ainda foram substituídas para duas penas restritivas de direito. Dos 13 (treze) acórdãos contendo decisões que diminuíram as penas dos réus, muito embora o TRF-1 tenha ratificado a autoria e a materialidade do crime reconhecida pelo juízo a quo, a referida Corte reduziu as penas finais de todos os réus condenados, sob a alegação de que as respectivas penas-base haviam sido fixadas em patamar muito elevado, visto que todos eram primários, com bons antecedentes criminais, bem como, não existia nenhuma informação nos autos processuais que denegrissem a conduta social e a personalidade dos mesmos (MESQUITA, 2016, p. 201).
Notícia publicada no site do Consultor Jurídico, em 22 de janeiro de 2020, relata da condenação em 1º grau pela Justiça Federal no Ceará de três acusados pelos crimes de redução de pessoa a condição análoga à de escravo, com base no artigo 149 do Código Penal, é uma sentença que causa espanto, o que é lastimável, devido as poucas condenações penais que já ocorreram no Brasil, relacionadas a este tema. Conforme discorre Alves, apesar de ter a ocorrência de condenações em casos de redução do trabalhador à condição análoga à de escravo, ainda é ínfima a repressão penal. Nesse ínterim, Alves destaca:
Não obstante, observa-se que a força penal, baseada nos princípios da vigilância e da punição, tem se mostrado pouco eficiente, quando comparada a administração deste conflito no âmbito criminal com outros sistemas normativos não penais, tal qual, a atuação da Secretaria de Inspeção do Trabalho do Ministério do Trabalho e Emprego, por exemplo. E, principalmente se considerarmos, que hoje, no Brasil, não há condenações em número expressivo pela prática do crime de redução a condição análoga à de escravo, se comparado com o número de casos oficialmente relatados de vítimas do trabalho escravo, isto é, há uma desproporção significativa entre essas variáveis decorrentes do mesmo fato. Outra forma de compensar e prevenir a prática do trabalho escravo, que tem se mostrado efetiva é a condenação por dano moral coletivo e individual (ALVES, 2009, p. 72). (destaque nosso)
Conforme se assevera na explicação de Nonnato Santos:
Considerando o conjunto de sentenças proferidas em processos criminais envolvendo a prática de trabalho escravo, pode-se afirmar que há uma tendência a minimizar a violência dessa prática criminosa, demonstrando continuidade do período em que tal forma de violência era legal. [...] É um malabarismo jurídico a justificar a legitimação de um modelo econômico predatório baseado no genocídio. É a “justiça injusta da impunidade punidora”, ou seja, os aparelhos do Poder Judiciário ao utilizar-se de mecanismos descriminalizadores, despenalizadores e desencarceradores em relação aos fazendeiros escravocratas, retro alimenta um subsistema de dominação penal a que os peões estão submetidos nas fazendas nas relações (autoritárias e violentas) de trabalho (SANTOS, 2017, p. 103 e 106) (grifos acrescidos).
Para reforçar o exposto, o site Conjur (2021) relata:
No período de 2008 a 2019, 2.679 réus foram denunciados pela prática do crime descrito no artigo 149 do Código Penal, por reduzir alguém a condição análoga à de escravo. Destes, 112 experimentaram condenação definitiva, o que corresponde a 4,2% de todos os acusados e 6,3% do número de pessoas levadas a julgamento.
Para a Clínica de Trabalho Escravo e Tráfico de Pessoas (CTETP) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), existe uma inexplicável desproporção entre os achados por parte da fiscalização e os resultados gerados pelo sistema de justiça.
Na esteira deste raciocínio, fica constatada as manobras do judiciário brasileiro para tolher o cumprimento das legislações aplicadas aos acusados pelo crime da escravidão contemporânea. Com isso, o crime continua ocorrendo, e os trabalhadores permanecem relegados e submetidos a situações tão deploráveis. E o princípio da punição que é basilar do direito penal, fica sem eficácia.
2 Conclusão
E notório que, comparando os anos mais recentes, 2017 à 2020, com 2003 e 2007, nota-se uma redução do número de trabalhadores resgatados e dos casos encontrados, mas a escravidão contemporânea ainda é persistente. Combater tal mazela é um desafio para a sociedade, pois envolve crime com grandes fazendeiros, empresários que conseguem pressionar as autoridades ou manipulá-las, pessoas com grande poder aquisitivo e influência social.
O combate à escravidão hodierna é, sem dúvida, uma prioridade para o MPT, visto que, os Procuradores junto com a CONAETE buscam, veementemente, realizar ações repressivas e preventivas, como as fiscalizações, assinaturas de TACs, propositura das ACPs etc. Não menos importante são as destinações feitas para amparar os trabalhadores resgatados, quando ganham as condenações morais e outras verbas decorrentes das ações.
Pela análise deste artigo, nota-se que a pouca repressão penal tem sido compesada pela atuação adminitrativa do MPT e da justiça trabalhista, porém não são suficientes para inibir de forma satisfatória a ocorrência de novos casos. Por isso, o Estado não pode ser omisso e deixar impune a prática deste crime, ou mesmo atenuar as penas culminadas. Sendo de suma importância a repressão penal, para que os empregadores escravagistas, tenham medo da condenação que possam sofrer e as consequências de uma condenação. Pois, mesmo que o judiciário não resolva totalmente essa vicissitude, é uma peça fundamental no processo, pois não tendo uma resposta do âmbito penal, o uso da mão de obra escravocrata permanecerá na sociedade.
Nesse diapasão, precisa buscar, também, uma maior celeridade processual nos julgamentos deste crime e oferecer maiores sanções, para evitar que as persecuções penais relativas ao crime de trabalho análogo ao de escravo fiquem sem a aplicação justa da pena, visando impelir as mesmas atitudes.
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[1] Doutorando em Direito pela PUC-Rio. Mestre em Prestação Jurisdicional e Direitos Humanos pela Universidade Federal do Tocantins (UFT). Professor da Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS). Assessor Jurídico de Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins.
Bacharelanda do Curso de Direito da Universidade Estadual do Tocantins (UNITINS)/Palmas – TO, Brasil.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, NICOLE BARROS DOS. Escravidão contemporânea no Brasil: condenações criminais e a atuação do ministério público do trabalho no combate Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 29 set 2022, 04:08. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/59307/escravido-contempornea-no-brasil-condenaes-criminais-e-a-atuao-do-ministrio-pblico-do-trabalho-no-combate. Acesso em: 22 nov 2024.
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