ROSA DE FÁTIMA TAVARES SOUZA.
(orientadora)
RESUMO: O presente artigo teve por finalidade a análise das consequências do abandono afetivo paterno e esse tema vem provocando um grande debate na doutrina. Na jurisprudência não poderia ser diferente, na medida em que os Tribunais vem sendo provocados com frequência a decidir sobre a possibilidade de indenização proveniente desse tipo de abandono. Duas correntes têm protagonizado esta grande discussão. Uma entende que o afeto é um sentimento espontâneo, não podendo ser imposto por meio de uma decisão judicial, daí a impossibilidade de fixação de indenização. A outra, com base no princípio pilar que é a dignidade da pessoa humana, defende a possibilidade da indenização. Para a elaboração do trabalho, inicialmente, foi desenvolvido um estudo sobre a evolução do conceito de família e do próprio Direito de Família, destacando o afeto como elemento essencial ao seu reconhecimento. Em seguida, foi discutido os tipos de responsabilidade civil, bem como a possível indenização pecuniária. Foi demonstrado o prazo prescricional da ação de indenização por abandono afetivo, prazo esse que prescreve em três anos, o início da contagem desse prazo prescricional deve ocorrer na data em que o autor atingir a maioridade e a possibilidade da retirada do sobrenome do genitor que o abandonou. Conclui-se então que o abandono afetivo tem várias consequências, sendo a mais prejudicial a psicológica.
Palavras-Chaves: Abandono afetivo Paterno; Consequências; Tipos de Responsabilidade civil; Dignidade Humana; Indenização pecuniária;
INTRODUÇÃO
O abandono afetivo é, na atualidade, um dos temas mais intrigantes do Direito de Família e também de alta relevância para a sociedade sob o ponto de vista prático. O tema do presente artigo consiste na possibilidade (ou não) da condenação de um dos pais – ou de ambos – ao pagamento de indenização ao filho por danos morais decorrentes deste abandono. Como é de conhecimento comum, a família constitui elemento fundamental na formação da personalidade de qualquer pessoa. A Psicologia, a Sociologia, o Direito e outros ramos do conhecimento humano destacam que a falta de atenção, de carinho, de afeto por parte dos pais pode acarretar muitas dores, frustrações e fragilidades no ser humano, as quais constituem danos psicológicos de natureza grave e podem contribuir significativamente para a formação do caráter do indivíduo no futuro.
A metodologia adotada foi a dedutiva, onde se busca demonstrar que a partir de uma análise do ordenamento jurídico brasileiro é perfeitamente possível extrair a ilação de que o abandono afetivo constitui um ato ilícito civil passível de indenização.
Acerca do assunto aqui falado, diversas controvérsias residem em torno do tema, a começar pela denominação abandono “afetivo”, porque pelo nome, o que se leva a imaginar em uma primeira leitura é que o afeto é só sentimento, logo seria, portanto, um “abandono sentimental”. A partir desse pressuposto muitos acabam por entender que quando se fala em responsabilidade nessa questão seria como “quantificar” o amor ou o sentimento e muitas perguntas derivam-se desta constatação, como por exemplo: está se condenando indivíduos porque eles não querem amar seus filhos? Um genitor é obrigado a amar seu filho?
Dessa forma, conclui-se que as respostas para tal pressuposto e muitas indagações não são simples na medida que a questão tem um forte cunho subjetivo, e que por muitos anos, ao que parece, pode ter sido negligenciada pelos Tribunais e pelo ordenamento Jurídico.
1. O ABANDONO AFETIVO PATERNO E AS SUAS CONSEQUÊNCIAS
1.1 CONCEITUAÇÃO DO ABANDONO AFETIVO
Conforme o Projeto de Lei do Senado nº. 700/2007 de autoria do Senador Marcelo Crivella, no qual foi aprovado no dia 09 de setembro de 2015, pela Comissão de Direitos Humanos, onde prevê alteração no Estatuto da Criança e do Adolescente, disciplinando abandono afetivo através do artigo 232-A como crime:
Art. 232-A. Deixar, sem justa causa, de prestar assistência moral ao filho menor de dezoito anos, nos termos dos §§ 2º e 3º do art. 4º desta Lei, prejudicando lhe o desenvolvimento psicológico e social. Pena – detenção, de um a seis meses.
Dessa forma, para melhor compreensão do conceito de abandono afetivo, precisa-se antes visualizar o conceito de família, Maria Berenice Dias (2021, p.139/140) traz um conceito bem claro sobre família:
O conceito atual de família é centrado no afeto como elemento agregador, e exige dos pais o dever de criar e educar os filhos sem lhes omitir o carinho necessário para a formação plena de sua personalidade. A enorme evolução das ciências psicossociais escancarou a decisiva influência do contexto familiar para o desenvolvimento sadio de pessoas em formação. Não se pode mais ignorar essa realidade, tanto que se passou a falar em paternidade responsável. Assim, a convivência dos pais com os filhos não é um direito, é um dever. Não há o direito de visitá-lo, há a obrigação de conviver com eles. O distanciamento entre pais e filhos produz consequências de ordem emocional e pode comprometer o seu sadio desenvolvimento. O sentimento de dor e abandono pode deixar reflexos permanentes em sua vida.
A partir desse conceito, nota-se que o afeto soma de forma essencial na concretização de uma família, e é de extrema importância na maneira em que os pais educam seus filhos, para que não sejam falhos e deixem de demonstrar o carinho e cuidado para com os filhos, formando assim, cidadãos seguros de si.
A abordagem do tema Abandono Afetivo Paterno tem sido de grande repercussão e com bastante discussão na atualidade, de certa forma, existe uma divergência entre magistrados de várias regiões no País acerca do assunto, poucos trazem o conceito para então, haver uma pacificação no entendimento do assunto ora tão polêmico.
Nessa linha de raciocínio, Paulo Lôbo (2018, p.224, online) dispõe sobre o princípio da paternidade responsável:
O princípio da paternidade responsável estabelecido no art. 226 da Constituição não se resume ao cumprimento do dever de assistência material. Abrange também a assistência moral, que é dever jurídico cujo descumprimento pode levar à pretensão reparatória. O art. 227 da Constituição confere à criança e ao adolescente os direitos “com absoluta prioridade”, oponíveis à família — inclusive ao pai separado —, à vida, à saúde, à educação, ao lazer, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar, que são direitos de conteúdo moral, integrantes da personalidade, cuja rejeição provoca dano moral. O art. 229 da Constituição estabelece que são deveres jurídicos dos pais assistir, criar e educar os filhos menores. A autoridade parental do pai separado não se esgota com a separação, salvo no que concerne à guarda, permanecendo os deveres de criação, educação e companhia (CC, art. 1.634), que não se subsomem na pensão alimentícia.
Dessa forma, entende-se que a paternidade responsável é um desdobramento do princípio da responsabilidade, uma vez que, sendo pais, deve-se arcar com o ônus e o bônus da criação dos filhos, mesmo que esses filhos tenham sido planejados ou não.
Outro princípio que é de extrema importância e de grande valia é o melhor interesse da criança e do adolescente, de forma expressa prevista no artigo 227 da Constituição Federal, que vem sintetizando, reforçando e complementando todo o conteúdo dos direitos fundamentais dos menores, inclusive como prioridade absoluta:
Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL, 2021, online).
Contudo, chega-se a um conceito de “abandono afetivo”, que nada mais é que o inadimplemento dos deveres jurídicos de paternidade, estabelecidos na Constituição e na legislação ordinária. Seu campo não é somente o da moral, pois o direito o atraiu para si, conferindo-lhe consequências jurídicas que não podem ser descartadas. Melhor seria que fosse denominado “inadimplemento dos deveres parentais”. Quando há inadimplemento de deveres parentais estabelecidos em lei, como os referidos nos artigos 227 e 229 da Constituição, uma das consequências é a reparação civil. (PAULO LÔBO, 2018).
1.2 CONSEQUÊNCIAS DO ABANDONO AFETIVO
É indiscutível que ser abandonado pelo pai ou pela mãe pode causar prejuízos emocionais na vida de um filho. Dói não ser amado, mas dói muito mais ser abandonado. É incontroverso que o apoio da família é de suma importância na vida do indivíduo em formação e que existe um dever jurídico de cuidado por parte dos genitores. No entanto, quais as consequências de se romper tal convívio, cuidado, apoio; entre filho e genitor?
Sabe-se que a família é o alicerce na formação do caráter e da personalidade de um indivíduo. Indivíduo esse que deve ser tratado com carinho, respeito, afeto e atenção. Quando a criação de uma criança é formada com afeto, ela cresce muito mais feliz e aprende a tratar o próximo da forma que foi tratada, com afeto, com amor
Conforme contribuição da ilustre jurista Maria Berenice Dias (2016, p. 138 e 139):
"A falta de convívio dos pais com os filhos, em face do rompimento do elo de afetividade, pode gerar severas sequelas psicológicas e comprometer o seu desenvolvimento saudável. A omissão do genitor em cumprir os encargos decorrentes do poder familiar, deixando de atender ao dever de ter o filho em sua companhia, produz danos emocionais merecedores de reparação. A ausência da figura do pai desestrutura os filhos, que se tornam pessoas inseguras, infelizes. Tal comprovação, facilitada pela interdisciplinaridade, tem levado ao reconhecimento da obrigação indenizatória por dano afetivo. Ainda que a falta de afetividade não seja indenizável, o reconhecimento da existência do dano psicológico deve servir, no mínimo, para gerar o comprometimento do pai com o pleno e sadio desenvolvimento do filho. Não se trata de atribuir um valor ao amor, mas reconhecer que o afeto é um bem que tem valor."
Acerca do dano causado pelo abandono também é interessante mencionar as palavras de Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka (2007, IBDFAM):
"O dano causado pelo abandono afetivo é antes de tudo um dano à personalidade do indivíduo. Macula o ser humano enquanto pessoa, dotada de personalidade, sendo certo que esta personalidade existe e se manifesta por meio do grupo familiar, responsável que é por incutir na criança o sentimento de responsabilidade social, por meio do cumprimento das prescrições, de forma a que ela possa, no futuro, assumir a sua plena capacidade de forma juridicamente aceita e socialmente aprovada."
Está evidente que todos os danos causados pelo abandono é uma matéria que transcende o direito de modo interdisciplinar, pois para além da compreensão legal há de se destacar os vários aspectos psicológicos e psiquiátricos envolvendo a questão. É incontroverso que cada ser humano é único, tem suas emoções, particularidades e reage de formas imprevisíveis quando expostos a situação de abandono, não é fácil enfrentar todo o dano causado. Junta-se a isto, a questão das diversas culturas, formas de criação e pontos de vista com relação a criação dos filhos. Conforme mencionado outrora, a Constituição da República prevê o planejamento familiar livre conforme decisão do casal, no entanto também deixa claro os deveres impostos a estes enquanto responsáveis pela sua prole.
Dessa forma, embora as funções do genitor possam ser exercidas por outra pessoa, a ausência deste será impossível de preencher, os males que a falta de um dos pais pode causar, gerando a desvalorização de si mesmo e certo distanciamento das outras pessoas. Entende-se, que a ausência da figura paterna, mesmo em caso de falecimento, poderá ser suprida por meio da figura do avô, um tio ou padrasto. No entanto, quando o histórico é de rejeição e abandono, esta lacuna pode influenciar na forma como os filhos se relacionam com as pessoas, incidindo em sua vida adulta, além de poder desencadear quadros de baixa autoestima, ansiedade e falta de confiança.
Contudo, é essencial que a criança receba o suporte familiar necessário. Dessa forma:
À família é delegada uma função fundamental para o desenvolvimento humano que é a de prover cuidado. Esse aspecto é reconhecido independentemente das transformações em diferentes arranjos de família que coexistem em distintas sociedades ao longo do tempo. A importância da família, não obstante, vai além de um valor instrumental no processo de desenvolvimento humano. Ela também representa um valor intrínseco, porque estabelece intensas relações ao combinar intimidade, afetividade mútua, cuidado recíproco, dependência e pertença. Essas qualidades têm valor para as pessoas em seu desenvolvimento e não podem ser encontradas sem contar com uma afiliação familiar. (MACANA, 2014, p. 15).
Portanto, chega-se a um conceito de “abandono afetivo”, que nada mais é que o inadimplemento dos deveres jurídicos de paternidade, estabelecidos na Constituição e na legislação ordinária. Seu campo não é somente o da moral, pois o direito o atraiu para si, conferindo-lhe consequências jurídicas que não podem ser descartadas.
2. A RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA E OBJETIVA
Em análise do critério da conduta do causador do dano, a responsabilidade pode ser considerada subjetiva, quando baseada na culpa em sentido lato (culpa ou dolo), ou objetiva, quando independe de qualquer falha humana (culpa) ou vontade de causar o dano (dolo), em outras palavras, decorre de uma simples relação de causalidade (nexo causal) e/ou de uma situação específica do responsável ou de obrigação que lhe é atribuída. (WALD, 2012, online).
2.1 SUBJETIVA
A responsabilidade subjetiva, também é conhecida como “clássica”, se fundamenta na culpa do agente que comete um ato e gera dano a outrem. O vigente Código Civil brasileiro adotou como regra geral a responsabilidade civil subjetiva (art. 186),3 segundo a qual, baseada na teoria clássica, o ofensor tem o dever de reparar ou de restituir o mal causado desde que comprovado o dano, o nexo causal e a sua culpa.
Neste sentido, o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves nos explica como se dá a responsabilidade subjetiva, dispõe que:
Em face da teoria clássica, a culpa era fundamento da responsabilidade. Esta teoria, também chamada de teoria da culpa, ou “subjetiva”, pressupõe a culpa como fundamento da responsabilidade civil. Em não havendo culpa, não há responsabilidade. Diz-se, pois, ser “subjetiva” a responsabilidade quando se esteia na ideia de culpa. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto necessário do dano indenizável. Dentro desta concepção, a responsabilidade do causador do dano somente se configura se agiu com dolo ou culpa. (GONÇALVES, 2014, p.59).
O dolo refere-se à ação ou omissão voluntária disciplinada no art. 186, CC. Em outros termos, significa dizer que a pessoa viola intencionalmente um dever jurídico na intenção de prejudicar a outrem.
Nas lições de Sérgio Cavalieri Filho, citado por Tartuce, a culpa é caracterizada por três elementos: “a) a conduta voluntária, com resultado involuntário; b) a previsão ou previsibilidade; e c) a falta de cuidado, cautela, diligência e atenção” (Tartuce, 2011, p. 414).
Nesta esteira, conclui-se que enquanto no dolo o agente pratica o ato na intencionalidade de alcançar determinado resultado, isto é, a pessoa deseja a conduta e o resultado; na culpa quer a conduta, porém, não deseja o resultado.
Todavia, entende-se, que caso não seja comprovado que o autor da conduta tenha agido com culpa ou dolo, não haverá para ele o dever de indenizar. Ou seja, a prova de culpa do agente é um pressuposto necessário para que o dano seja indenizável.
2.2 OBJETIVA
A responsabilidade civil objetiva é caracterizada pela ausência de necessidade de a vítima assumir o ônus de comprovar a culpa do agente causador do dano, ou seja, basta que ela apenas demonstre o nexo causal entre a conduta do ofensor e o dano provocado. Conforme se verifica da leitura do Art. 927 do Código Civil, a responsabilidade objetiva ocorre em duas situações: por imposição da lei e pela aplicação da teoria do risco.
Carlos Roberto Gonçalves nos explica com suas preciosas palavras de como se dá o cabimento da responsabilidade objetiva, dispondo que:
A lei impõe a certas pessoas, em determinadas situações, a reparação de um dano cometido sem culpa. Quando isto acontece, diz-se que a responsabilidade é legal ou “objetiva”, porque prescinde da culpa e se satisfaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Esta teoria, dita objetiva, ou do risco, tem como postulado que todo dano é indenizável, e deve ser reparado por quem a ele se liga por um nexo de causalidade, independentemente de culpa. Nos casos de responsabilidade objetiva, não se exige prova de culpa do agente para que seja obrigado a reparar o dano. Ela é de todo prescindível, porque a responsabilidade se funda no risco. (GONÇALVES, 2014, p.59).
Portanto, conclui-se, que independente da comprovação de culpa do agente causador, haverá para ele o dever de indenizar. Ou seja, todo e qualquer dano deverá ser indenizado e reparado por quem o causou, independente de culpa.
3. ANÁLISE JURÍDICA SOBRE O ABANDONO PATERNO NO BRASIL
Um dos pontos que contribuem para a cultura do abandono paterno é a crença machista de que a mulher já nasce preparada para ser mãe. Mais ainda, que desenvolve um amor puro e de forma natural pelo filho, sem muitos esforços, já o pai, precisa de tempo e convivência para sentir o tão falado amor paterno. Por sua vez, quando o abandono vem do pai, ele é relativizado e até mesmo justificado. Muitas vezes com a culpabilização da figura materna.
O Código Civil de 2002, no artigo 1566, inciso IV, ao relatar os efeitos do casamento, prediz que compete aos pais ter os filhos menores em sua companhia e guarda; sendo que o artigo 1632 alerta que a separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não alteram as relações entre pais e filhos.
O Estatuto da Criança e do Adolescente em seu artigo 4º repete o texto constitucional, enquanto o artigo 19 trata do direito à convivência familiar. Neste diapasão Maria Helena Diniz salienta que:
O Estatuto rege-se pelos princípios do melhor interesse, paternidade responsável e proteção integral, visando a conduzir o menor à maioridade de forma responsável, constituindo-se como sujeito da própria vida, para que possa gozar de forma plena dos seus direitos fundamentais.
É evidente que no ordenamento jurídico brasileiro contemporâneo é composto por princípios que se agrupam exigências de justiça, inclusive alguns que são próprios das relações familiares e que servirão de norte na apreciação do caso concreto aqui falado. Cabe, por ora, relembrar alguns princípios que estão presentes no direito da família bem como no direito da pessoa humana, da solidariedade familiar, da afetividade, da igualdade entre todos os filhos, da igualdade da chefia familiar, do melhor interesse da criança, da igualdade entre os cônjuges e da pluralidade familiar.
Há três princípios que servirão de pilares no nosso destaque para tratativa do tema por abandono afetivo no Brasil. O primeiro princípio é da Dignidade da Pessoa Humana, representado como princípio dos quais se irradiam todos os demais. É carregado de sentimentos e emoções, experimentado no plano dos afetos, sendo que o Estado não tem apenas o dever de privar-se de praticar atos que atentem contra a dignidade, mas promovê-la, garantindo ao ser humano o mínimo existencial para a efetividade deste princípio, sendo direito constitucional do ser humano ser feliz e dar fim àquilo que lhe aflige. Temos no princípio da dignidade humana o corolário dos princípios da paternidade responsável e da afetividade.
O princípio da dignidade da pessoa humana exerce função instrumental integradora e hermenêutica na ordem jurídica como um todo e, especialmente, no direito de família, servindo de parâmetro para aplicação, interpretação e integração de todo o ordenamento jurídico. É a ideia consagrada do princípio dos princípios.
Outro princípio com grande relevância é o da solidariedade familiar, reforçamos Maria Berenice Dias:
Solidariedade é o que cada um deve ao outro. Esse princípio, que tem origem nos vínculos afetivos, dispõe de conteúdo ético, pois contém em suas entranhas o próprio significado da expressão solidariedade, que compreende a fraternidade a reciprocidade. (...) em se tratando de crianças e de adolescentes, é atribuído primeiro à família, depois à sociedade e finalmente ao Estado (CF 227) o dever de garantir com absoluta prioridade os direitos inerentes aos cidadãos em formação (DIAS, Maria Berenice, 2007, p.48).
Por último, e abordando diretamente ao dano moral por abandono afetivo, encontra-se o princípio da afetividade, em que dada a importância do afeto nas relações familiares, pode-se dizer que se trata do princípio norteador das relações familiares e o direito a elas correspondente.
Na mesma linha de raciocínio Maria Berenice (DIAS, Maria Berenice, 2007, p.52) alega que:
O afeto não é somente um laço que envolve os integrantes de uma família. Igualmente tem um viés externo, entre as famílias, pondo humanidade em cada família, compondo, no dizer de Sérgio Resende de Barros, a família humana universal, cujo lar é a aldeia global, cuja base é o globo terrestre, mas cuja origem sempre será, como sempre foi, a família (...). O direito das famílias instalou uma nova ordem jurídica para a família, atribuindo valor jurídico ao afeto. (...) as relações de família, formais ou informais, indígenas ou exóticas, ontem como hoje, por mais complexas que se apresentem, nutrem-se, todas elas, de substâncias triviais e ilimitadamente disponíveis a quem delas queira tomar afeto, perdão, solidariedade, paciência, devotamento, transigência, enfim, tudo aquilo que, de um modo ou de outro, possa ser reconduzido à arte e à virtude do viver em comum. A teoria e a prática das instituições de família dependem, em última análise, de nossa competência de em dar e receber amor.
Dessa forma, é por meio do afeto que se constrói as relações interpessoais formadoras da família, motivo pelo qual tem e merece uma grande atenção jurídica, devendo a base da sociedade ser focada na dignidade da pessoa humana. Assim, o afeto que se tratava de um sentimento, passou a ter valor jurídico na esfera familiar, sendo instrumentalizado por meio do princípio da dignidade da pessoa humana.
3.1 OS EFEITOS JURÍDICOS E PSICOLÓGICOS ORIUNDOS DO ABANDONO AFETIVO PATERNO
As relações e os vínculos familiares são de grande importância quando considerada de fator primordial no desenvolvimento do ser humano. Afinal, é no “seio deste grupo que o indivíduo nasce e se desenvolve, moldando assim, a sua personalidade ao mesmo tempo que se integra ao meio social”.
O sofrimento da criança abandonada pode ocasionar deficiências no seu comportamento mental e social para o resto da vida, a criança pode se isolar do convívio de outras pessoas, apresentar problemas escolares, depressão, tristeza, baixa autoestima, além de problemas de saúde. Essa atitude reduz as oportunidades de trabalho dos filhos, na idade adulta eles também podem ser enganados mais facilmente e ter dificuldades com tarefas simples devido à falta de conhecimento e de desenvolvimento das capacidades cognitivas básicas.
A omissão do genitor em cumprir os encargos decorrentes do poder familiar, deixando de atender ao dever de ter o filho em sua companhia, produz danos emocionais merecedores de reparação. A ausência da figura do pai desestrutura os filhos, que se tornam pessoas inseguras, infelizes.
Nas preciosas lições de Freud (Freud, 1925-1926/1996) revela-se que:
O perigo sentido pela criança, segundo Freud, é o de perder o objeto protetor e de ser abandonado por aquele que a livra da situação de desamparo psíquico e motor. A criança precisa de ajuda do outro para sua própria sobrevivência, pois quando se perde o amor do outro, surge a angústia do abandono.
Tendo em vista que se trata de um assunto em voga atualmente, pois incontáveis crianças brasileiras são vítimas de tal fenômeno, e, recentemente, alguns julgados vêm entendendo que tal negligência por parte dos pais cabe inclusive indenização por dano moral aos filhos, bem como a possível exclusão do sobrenome do pai o ou da mãe que abandonou o filho, resultado das consequências causadas pelo abandono afetivo.
As decisões judiciais buscam reparar com indenizações pecuniárias o abandono sofrido pelo filho, na fase da formação de sua personalidade, diante dos pais que se recusam total ou parcial do contato com seus filhos.
Destaca-se que, a condenação não busca reparar a falta de amor, desamor, ou a preferência de um pai por um ou outro filho, mas sim, procura penalizar a violação dos deveres morais, o qual é direito do filho rejeitado, (MADALENO, 2013).
3.2 A RESPONSABILIDADE CIVIL EM DECORRÊNCIA DE ABANDONO MORAL
É uma área do Direito Civil que busca reparar o dano causado a outrem, e para isso se faz necessário provar a conduta, o dano e o nexo de causalidade ensejador da ação danosa que prejudica o terceiro. É, portanto, uma forma de reparar abstratamente o indivíduo pelo prejuízo causado a ele, por não ter condições de recuperar o estado em que se encontrava antes da conduta humana.
O elemento nexo causal é um dos pressupostos fundamentais para a configuração da responsabilidade civil e do dever de indenizar. Refere-se à relação de causalidade entre o ato ilícito e o dano ou prejuízo sofrido pela vítima. Não sendo o dano sofrido por ato do agente, inexiste a relação de causalidade, conforme ensina Sílvio de Salvo Venosa (2003, pag. 39):
“O conceito de nexo causal, nexo etimológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida”.
O agente precisa ser responsável sobre os danos que, direta ou imediatamente, resultaram de sua ação ou omissão.
O dano ocasionado pelo abandono afetivo é decorre de uma lesão a personalidade do indivíduo. Com isso gera resultados de profunda tristeza na vida social e pessoal do lesado e denegrindo-se como pessoa. A exteriorização do amor é primordial para que não ocorra esse dano.
Entre as decisões favoráveis recentes, pode-se citar a da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a qual estatui ser possível esse tipo de reparação civil.
Eis o que estatui o histórico julgado do STJ:
RECURSO ESPECIAL Nº 1.159.242 - SP (2009/0193701-9). [...] EMENTA.CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. FAMÍLIA. ABANDONO AFETIVO. COMPENSAÇÃO POR DANO MORAL. POSSIBILIDADE. Inexistem restrições legais à aplicação das regras concernentes à responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar no Direito de Família. O cuidado como valor jurídico objetivo está incorporado no ordenamento jurídico brasileiro não com essa expressão, mas com locuções e termos que manifestam suas diversas desinências, como se observa do art. 227 da CF/88. Comprovar que a imposição legal de cuidar da prole foi descumprida implica em se reconhecer a ocorrência de ilicitude civil, sob a forma de omissão. Isso porque o non faceire, que atinge um bem juridicamente tutelado, leia-se, o necessário dever de criação, educação e companhia – de cuidado – importa em vulneração da imposição legal, exsurgindo, daí a possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico. [...], Aqui não se fala ou se discute o amar e, sim, a imposição biológica e legal de cuidar, que é dever jurídico, corolário da liberdade das pessoas de gerarem ou adotarem filhos. [...], ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça. [...] por maioria, dar parcial provimento ao recurso especial nos termos do voto da Sra. Ministra Relatora. [...]. Brasília (DF), 24 de abril de 2012(Data do Julgamento), MINISTRA NANCY ANDRIGHI.
A respeito deste conceito Maria Helena Diniz contribui ao acrescentar que:
A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal. (DINIZ, 2003, p. 35)
No entendimento de Silvio de Salvo Venosa, “a responsabilidade civil é parte integrante ao direito obrigacional, a reparação dos danos sendo algo decorrente da transgressão de uma obrigação, de um dever jurídico ou direito”
3.3 A IMPORTÂNCIA DO CUIDADO PATERNO NA FORMAÇÃO DA PERSONALIDADE
É reconhecido como importante o papel do pai no desenvolvimento da criança e a interação entre pai e filho é um dos fatores decisivos para o desenvolvimento cognitivo e social, pois o caráter de uma pessoa é construído através de hábitos e relações que fazem parte da experiência individual. Ele está intimamente ligado ao modo de pensar, sentir ou reagir de cada indivíduo, ou seja, se reflete nas atitudes e ações tomadas ao longo da vida.
A experiência clínica tem mostrado que, na vida adulta, as representações dessa vivência insurgem nas várias possibilidades de construção psicoafetiva, com repercussão nas relações sociais, facilitando a capacidade de aprendizagem e a integração da criança na comunidade.
É por meio da família que a criança conhece os diferentes grupos sociais, compreende os meios comunicação e interação com a sociedade e vai conseguindo desenvolver sua própria personalidade. Esse convívio é responsável por passar os valores que fazem parte dos princípios da civilidade e do respeito que regem as relações sociais.
Portanto, a figura paterna tem influência direta no desenvolvimento da criança, ao contrário do pensamento popular que se estabeleceu por longos anos e em diversas culturas, a figura paterna e a sua participação em todas as fases do desenvolvimento infantil, desde o nascimento do bebê, é essencial e traz consequências positivas para o indivíduo em toda a sua existência, não somente durante a infância.
AGRAVO DE INSTRUMENTO. REGULAMENTAÇÃO DE VISITAS. CRITÉRIOS. INTERESSE DOS MENORES. PREVALÊNCIA. CONVIVÊNCIA PATERNA. IMPORTÂNCIA FUNDAMENTAL. 1. Com amparo na proteção do bem-estar e do bom desenvolvimento do menor, o direito de visitas deve ser sempre regulamentado com lastro na solidariedade familiar, nas obrigações resultantes do pátrio-poder e, notadamente, em face dos interesses do menor, a fim de lhe propiciar um melhor desenvolvimento moral e psicológico. 2. Há que se enaltecer a importância da convivência tanto materna e quanto paterna, ao passo em que o direito do menor de conviver com seu genitor mostra-se de fundamental relevância para o desenvolvimento e formação da criança, desde que não haja qualquer motivo que não recomende a convivência familiar. 3. Agravo parcialmente provido para autorizar que o genitor possa visitar seus filhos, além de nos finais de semana alternados, todas as quartas-feiras, buscando-os na escola e devolvendo-os na quinta-feira diretamente na escola, bem como tê-los em sua companhia em feriados alternados, dia dos pais e aniversário do genitor. (TJ-DF XXXXX - Segredo de Justiça XXXXX-16.2013.8.07.0000, Relator: FLAVIO ROSTIROLA, Data de Julgamento: 26/09/2013, 1ª Turma Cível, Data de Publicação: Publicado no DJE: 08/10/2013. Pág.: 100).
Conclui-se que é de grande importância o papel do pai no desenvolvimento da criança. Uma vez que hoje a interação entre pai e filho é vista como um dos fatores decisivos para o desenvolvimento cognitivo e social, facilitando a capacidade de aprendizagem e a integração da criança na comunidade.
4. A POSSIBILIDADE DE INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA
Os princípios constitucionais vieram para trazer um amparo legal e de suma importância para o Direito de família, amparo este, que foi desejado por vários anos. Neste sentido, o princípio da dignidade da pessoa humana é, sem sombra de dúvida, o princípio fundamental do ordenamento jurídico brasileiro.
É de grande relevância ressaltar este princípio, tendo em vista que sua importância é clara ao se tratar de abandono afetivo paterno. A Constituição Federal de 88, em seu artigo 1º, III, deixa claro sua importância. Observe:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III - a dignidade da pessoa humana (BRASIL, 1988, art. 1º).
Portanto, todo ato, conduta ou atitude que classifique ou objetifique a pessoa, que a equipare a uma coisa disponível, ou a um objeto qualquer, estará claramente violando o princípio da dignidade da pessoa humana.
4.1 OS EFEITOS DA INDENIZAÇÃO PECUNIÁRIA
A indenização pecuniária tem uma função punitiva e educativa, pois, já que não se pode valorar pecuniariamente o afeto, essa forma de punição servirá para demonstrar ao genitor que ao negar e desprezar seu filho, agiu de forma equivocada e incoerente com o seu dever e indo contra a moral e ao ordenamento jurídico.
Essa responsabilização civil, além de ter uma finalidade reparatória, é também educativa, visando à conscientização do genitor de que sua conduta é reprovável. Serve também como um desestímulo, para evitar que outros pais abandonem e desprezem os seus filhos.
No Rio Grande do Sul em 2003, o juiz Mario Romano Maggioni ao proferir sua sentença, processo nº 141/1.03.001232-0 da Comarca de Capão da Canoa/RS, condenou um pai em primeira instância a pagar uma indenização fixada em R$ 48 mil reais (200 salários da época), isto abriu precedente favorável ao pagamento da indenização, fundamentando que conforme a legislação brasileira, a educação abrange a convivência familiar, onde é inerente o amor, o afeto, o respeito e a dignidade indispensáveis ao desenvolvimento da criança.
Nesse sentido cabe citar parte da decisão do juiz Maggioni:
Vistos. I- D.J.A ajuizou ação de indenização por danos morais contra D.V.A inicialmente qualificados. Referiu, em suma, que é filha do demandado. Desde o nascimento da autora o pai abandonou-a material (alimentos) e psicologicamente (afeto, carinho, amor). Houve ação de alimentos e diversas execuções. Em ação revisional o demandado avençou pagar R$ 720,00 mensais e assumir o papel de pai. Novamente não honrou com o avençado, não demonstrando qualquer amor pela filha. Tal abandono tem trazido graves prejuízos à moral da autora. Requereu pagamento de R$ 48.000,00 (quarenta e oito mil reais) a título de indenização por danos morais. Citado (fl. 27), o demandado restou silente. O Ministério Público manifestou-se pela extinção (fls. 29-33). Vieram os autos conclusos. Relatados. Decido. II- A questão comporta o julgamento do processo no estado em que se encontra. Trata-se de revelia (art. 330, II, do Código de Processo Civil). Citado, o requerido não contestou a ação. Presumem-se, assim, verdadeiros os fatos afirmados pela autora (art. 319, Código de Processo Civil). De se salientar que aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos (art. 22, da Lei n.o. 8.069/90). A educação abrange não somente a escolaridade, mas também a convivência familiar, o afeto, amor, carinho, ir ao parque, jogar futebol, brincar, passear, visitar, estabelecer paradigmas, criar condições para que a criança se auto-afirme. Desnecessário discorrer acerca da importância da presença do pai no desenvolvimento da criança.
Diante disso, são muitas as ações com o caráter indenizatório que estão debatidas no judiciário brasileiro, como forma de gerar responsabilidade civil indenizatória pelo abandono afetivo.
4.2 PRAZO PRESCRICIONAL
No tocante ao prazo prescricional da ação de indenização por abandono afetivo, o Código Civil Brasileiro determina em seu art. 206, §3º, V, que:
“Prescreve em três anos a pretensão de reparação civil”. E por se tratar de indenização por abandono afetivo, o início da contagem do prazo prescricional deve ocorrer na data em que o autor atingir a maioridade, pois de acordo com o art. 197, II, do mesmo Código: “Não corre a prescrição entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar”.
Foi demonstrado o prazo prescricional da ação de indenização por abandono afetivo, prazo esse que prescreve em três anos, o início da contagem desse prazo prescricional deve ocorrer na data em que o autor atingir a maioridade, fazendo, então, o reconhecimento da paternidade e logo após, ao dever de indenizar, pois não há que se falar em abandono afetivo antes do reconhecimento da paternidade, pois é somente a partir deste, que se fazem presentes os deveres inerentes ao poder familiar
5. RETIRADA DO SOBRENOME DO GENITOR QUE O ABANDONOU
De fato, é possível retirar o nome do genitor do registro, mas esse procedimento não é tão simples. Uma vez que, a exclusão depende de autorização judicial, pois o solicitante deve comprovar o abandono ou mesmo o constrangimento gerado por manter a filiação nos documentos do requerente.
Isso porque nome e sobrenome são entendidos pela legislação brasileira como direito de personalidade e são protegidos para que não sejam alterados simplesmente por vontade de seu detentor, sendo necessária uma ordem do Poder Judiciário para que se faça as mudanças cabíveis.
Recurso especial. Direito civil. Registro civil. Nome. Alteração. Suspensão do patronímico paterno. Abandono pelo pai na infância.
Eis um julgado do STJ:
Justo motivo. Retificação do assento de nascimento. Interpretação dos artigos 56 e 57 da lei nº 6.015/73. Precedentes. 1. O princípio da imutabilidade do nome não é absoluto no sistema jurídico brasileiro. 2. O nome civil, conforme as regras dos artigos 56 e 57 da Lei de Registros Públicos, pode ser alterado no primeiro ano após atingida a maioridade, desde que não prejudique os apelidos de família, ou, ultrapassado esse prazo, por justo motivo, mediante apreciação judicial e após ouvido o Ministério Público. 3. Caso concreto no qual se identifica justo motivo no pleito do recorrente de supressão do patronímico paterno do seu nome, pois, abandonado pelo pai desde tenra idade, foi criado exclusivamente pela mãe e pela avó materna. 4. Precedentes específicos do STJ, inclusive da Corte Especial. 5. Recurso especial provido.”
(Resp 1304718/SP, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/12/2014, DJe 05/02/2015).
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
E presente artigo cientifico teve como objetivo realizar uma análise sobre uma situação ainda polêmica no judiciário, no qual trata-se do abandono paterno no brasil, sua responsabilidade civil e dever de indenizar pelo sofrimento dos filhos diante da falta de afeto.
Conforme entendimento jurisprudencial de mais de um tribunal, os quais passaram a impor ao pai o dever de pagar indenização a título de danos morais, é o que sustenta Dias (2007, p. 406.): “Independe do pagamento de pensão alimentícia, o abandono afetivo gera a obrigação de indenização pela falta de convívio”
Da exposição feita, notou-se que o afeto ganha um papel relevante no ordenamento jurídico e se constitui como pilar de diversos institutos presentes na Constituição Federal e no Código Civil. Com isso, constitui-se como justificativa válida para a reparação na responsabilidade civil e psicológico decorrentes do abandono afetivo parental.
Ademais, a família é o elemento principal na construção do desenvolvimento saudável das crianças e adolescentes, razão pela qual cabe aos pais proteger e auxiliar seus filhos na longa caminhada rumo à formação integral, direito este fundamental e garantido pela Constituição Federal de 1988.
Conclui-se, que, diante de tantos casos de abandono afetivo, os pais acabam se esquecendo de seus deveres e suas responsabilidades, razão pela qual cabe ao judiciário muitas vezes lembrá-los de suas obrigações através da punição diante da falta de afeto proporcionado aos filhos, devendo o magistrado analisar cada caso individualmente, para que o valor da indenização possa amenizar a dor sofrida.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
HIRONAKA, Giselda Maria Fernandes Novaes. Pressuposto, elementos e limites do dever de indenizar por abandono afetivo. 2007. Disponível em: https://www.ibdfam.org.br/artigos/288/Pressuposto%2C+elementos+e+limites+do+dever+de+indenizar+por+abandono+afetivo acesso em 28/09/2022.
DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. / Maria Berenice Dias - 14. ed. rev. ampl. e atual. — Salvador: Editora JusPodivm, 2021.
DIAS, Maria Berenice. Manual de direito das famílias. 4º ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.
LÔBO, Paulo Direito civil: volume 5: famílias / Paulo Lôbo. – 8. ed. – São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro: responsabilidade civil. V. 7. 28ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014.
MACANA, Esmeralda Correa. O papel da família no desenvolvimento humano: o cuidado da primeira infância e a formação de habilidades cognitivas e socioemocionais. Tese (Doutorado em Economia). Programa de Pós-Graduação em Economia, Faculdade de Ciências Econômicas, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2014. Disponível em: https://lume.ufrgs.br/handle/10183/109267 Acesso em: 28/09/2022.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil / Carlos Roberto Gonçalves. - 1 5. ed. - São Paulo: Saraiva, 2014.
WALD, Arnoldo. Direito civil: responsabilidade civil, vol. 7 / Arnoldo Wald, Brunno Pandori Giancoli. – 2. ed. – São Paulo: Saraiva, 2012
TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil: volume único / Flávio Tartuce. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2011.
Freud, S. (1996 a). Publicações pré-psicanalíticas e esboços inéditos. In: ______. Obras completas (v. I p. 335-396). Rio de Janeiro: Imago. (Trabalho original publicado em 1886-1889).
BRASIL, Senado Federal. Projeto de Lei do Senado Nº 700, de 2007. Modifica a Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990 (“Estatuto da Criança e do Adolescente”) para caracterizar o abandono moral como ilícito civil e penal, e dá outras providências. Disponível em: http://tmp.mpce.mp.br/orgaos/CAOCC/dirFamila/projetolei/PL_700-2007.PDF acesso em: 28/09/2022
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal. – 22ª ed. – São Paulo: Editora Reidel, 2016.
MADALENO, Rolf. Curso de Direito de Família. Rio de Janeiro: Forense, 2013.
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Responsabilidade Civil. Vol.4. 3°ed. São Paulo: Atlas S.A., 2003
Graduanda do Curso de Direito do Instituto de Ensino Superior do Sul do Maranhão.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BARROS, RAFAELA PEREIRA. Abandono afetivo paterno: Análise Jurídica Sobre o Abandono Paterno no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 03 nov 2022, 04:05. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/59792/abandono-afetivo-paterno-anlise-jurdica-sobre-o-abandono-paterno-no-brasil. Acesso em: 22 nov 2024.
Por: Maria Laura de Sousa Silva
Por: Franklin Ribeiro
Por: Marcele Tavares Mathias Lopes Nogueira
Por: Jaqueline Lopes Ribeiro
Precisa estar logado para fazer comentários.