RESUMO: Este artigo aborda os direitos coletivos de trabalho em tempos excepcionais, tendo como principal objetivo discutir os efeitos da pandemia do novo coronavírus nas relações de trabalho e nos seus direitos coletivos decorrentes de tais vínculos. O problema central consiste nessa observância legistativa do trabalho em tempos remotos, visto que, em decorrência da maior crise sanitária e humanitária do século, é indiscutível que danos, reflexos e grandes repercussões afetam a todos os envolvidos, à medida que novos acordos e negociações coletivas são necessários para frear os efeitos negativos dessa situação. Justifica-se através da necessidade de se investigar e discutir os rumos do direito coletivo trabalhista no campo da pandemia, uma vez que em épocas excepcionais o mundo jurídico laboral precisa acompanhar as novas mudanças na sociedade até a volta da sua normalidade. A metodologia adotada foi a dedutiva. A técnica de procedimento foi a monográfica. A conclusão obtida foi a de que restou claro os impactos da pandemia nas relações trabalhistas, principalmente quando se trata do direito coletivo quanto às representações grupais, em que algumas medidas foram apresentadas de modo a contornar essa situação excepcional e tentar atualizar o direito coletivo trabalhista durante o curso da pandemia no Brasil.
Palavras-chave: Direitos coletivos de trabalho. Negociações coletivas. Pandemia.
ABSTRACT: This article addresses collective labor rights in exceptional times, with the main objective of discussing the effects of the new coronavirus pandemic on labor relations and on their collective rights arising from such bonds. The central problem is this legal observance of work in remote times, since, as a result of the greatest health and humanitarian crisis of the century, it is indisputable that damage, reflexes and major repercussions affect all those involved, as new agreements and collective bargaining are necessary to curb the negative effects of this situation. It is justified by the need to investigate and discuss the directions of collective labor law in the field of the pandemic, since in exceptional times the legal labor world needs to follow the new changes in society until the return of its normality. The methodology adopted was deductive. The procedure technique was monographic. The conclusion reached was that the impacts of the pandemic on labor relations remained clear, especially when it comes to collective law regarding group representations, in which some measures were presented in order to circumvent this exceptional situation and try to update collective labor law during the course of the pandemic in Brazil.
Keywords: Collective labor rights. Collective negotiations. Pandemic.
INTRODUÇÃO
Os direitos coletivos de trabalho, ao regularem o direito das pessoas nas suas relações laborais em busca de um objetivo comum, torna-se um dos principais institutos na proteção do trabalhador quanto às organizações estabelecidas entre eles e a representatividade coletiva em prol de todos. Seus interesses se relacionam com os vínculos grupais, comuns a todos os trabalhadores, em vista de sintonizar os pensamentos e manifestações de tais classes com os empregadores, dois polos que naturalmente são vistos em conflito, mas que podem ser conciliados em razão de um direito que equilibre os dois lados da balança.
Para uma melhor compreensão do seu objeto de estudo, em geral se estuda sua divisão metodológica, normalmente composta por seus institutos. Nesse viés, cabe a fala de Délio Maranhão (1993) acerca do tema, subdividindo os direitos coletivos do trabalho em:
a) Liberdade de coalizão, que é a ideia fundamental que propiciou o surgimento do direito coletivo de trabalho. Significa a possibilidade jurídica da união dos trabalhadores em defesa de interesses comuns, como o direito de reunião e o direito de greve; b) Associação Profissional, que é a organização permanente de empregados, ou de empregadores, em defesa dos interesses dos seus associados e/ou representados; c) Convenção Coletiva, que tem por objeto a criação de normas sobre condições de trabalho fixadas pelos próprios atores sociais interessados; d) Dissídios Coletivos de Trabalho, que são o reconhecimento, pelo direito, de que os conflitos coletivos decorrentes das relações de trabalho podem ser judicialmente solucionados. (MARANHÃO, 1993, p. 301)
Aqui, a figura dos sindicatos é muito importante nesse processo, uma vez que é a partir deles que se disciplinam as normas e interesses coletivos dos trabalhadores, constituindo direitos e obrigações para os contratos de trabalho, sejam eles individuais ou coletivos. Tal importância histórica resulta em mudanças na visão social dos contratos, sendo que estes, antes vistos como meros instrumentos de formalização dos vínculos empregatícios, agora passam a ser observados como diligências obrigatórias para a efetiva proteção e garantia dos direitos essenciais aos trabalhadores. É a partir do sindicalismo, originado de lutas e reivindicações da classe operária, que a ideia de liberdade sindical e do indivíduo frente ao Estado vem se consolidando, trazendo-lhes maior autonomia na confecção de regras e convenções coletias para o direito coletivo do trabalho.
Diante disso, transforma-se o papel do Estado no direito trabalho, passando de uma perspectiva individualista para uma figura mais social e coletiva das normas, numa forma de reconhecer, através da ordem jurídica estatal, o poder de organização dos grupos sociais (entre eles, a classe trabalhadora), admitindo um maior pluralismo de ideias na formação dos contratos e convenções trabalhistas, bem como uma maior legitimação da proteção que a autoridade estatal pode oferecer aos trabalhadores. Nessa onda, o direito coletivo do trabalho confere alterações na ordem política e social, tentando igualar interesses e manifestações de todos os grupos, de maneira a se ter um plano de negociação das relações trabalhistas que não afete desproporcionalmente as partes integrantes.
1 NEGOCIAÇÃO COLETIVA DE TRABALHO
A negociação coletiva de trabalho é uma das principais fontes dos direitos coletivos de trabalho, pois é a partir daquela que se conciliam interesses contrapostos entre empregador e empregado. Aqui se busca uma solução pacífica de conflitos, em que as partes envolvidas buscam aproximar seus entendimentos e opiniões sobre as questões trabalhistas. Nessas negociações, os grupos sociais demonstram sua maturidade e desenvolvimento na composição dos litígios, de forma a reduzir a participação do Estado na resolução dessas lides. Ela é a base de formação do direito coletivo de trabalho, estimulando na aproximação de classes sociais normalmente vistas como antagônicas.
Nesse sentido, cabe destacar a fala de Vólia Bonfim (2014) sobre o assunto:
Caracteriza-se como fonte de elaboração de normas positivadas, portanto, como fonte material, as negociações coletivas têm como função a criação, modificação ou supressão de condições de trabalho, isto é, sua função é normativa ou flexibilizadora. Além disso, se destina à composição de conflitos, logo, também tem função pacificadora, servindo de importante instrumento de redução das demandas judiciais e estabilidade social. Não se está negando com isso o caráter obrigacional das normas resultantes da negociação coletiva, mas tão somente apontando as funções jurídicas mais importantes. (BONFIM, 2014, p. 1212).
Outrossim, pode-se dizer que, para além da função jurídica, a negociação coletiva possui função política (diálogo entre grupos com interesses antagônicos, interessando ao Estado a solução pacífica desses conflitos), função econômica (distribuição de riquezas que ordenam a estrutura financeira, com redução de custos e flexibilizações) e função social (participação dos trabalhadores nas decisões empresariais, em busca de um ambiente social harmônico para a criação de novas regras para condições dignas de trabalho). Outras tem um caráter mais complementar, como a função ambiental (preservação da saúde do trabalhador, com normas de higiene, medicina e segurança) e função pedagógica (seu complexo de normas recorrem a especialistas de certas áreas, como filósofos, sociológicos, juristas, cientistas políticos, etc.).
Tais funções evidenciam o efeito equilibrador que as negociações coletivas representam, tendendo a balancear aos dois lados da moeda, seja para a proteção dos direitos trabalhistas, seja para a saúde econômica do empregador. Diferentemente das leis e normas do direito do trabalho, que em regra são mais rígidas, os acordos coletivos são mais elásticos e flexíveis, primando pela adequação de interesses opostos.
Na CLT, os dispositivos normativos relativos à convenção coletiva estão dispostos a partir do art. 611, traçando seus principais componentes, objetos e procedimentos. A OIT, por sua vez, considera a negociação coletiva como a melhor forma de composição dos conflitos coletivos, incentivando a sua prática em todos os seus países membros. Exemplo disso é a sua Convenção 163, que reconhece o direito à negociação coletiva como um instrumento amplo e assegurado a todas as regiões e organizações, seja no nível sindical (típico do Brasil), profissional ou empresarial, e também a Convenção 154, declarando que tais acordos devem ser praticados em todos os ramos da atividade econômica.
Ademais, tem-se alguns instrumentos normativos que fazem parte dessa negociação coletiva. Essas espécies de contratação coletiva fazem mais parte do campo doutrinário, porém importantes para distinção de alguns tipos de acordo.
A primeira é a Convenção coletiva de trabalho (CCT), considerada direito social fundamental aos trabalhadores, disposta no art. 7º, inciso XXVI da Constituição Federal e no art. 611 da CLT, definindo-a como um “acordo de caráter normativo pelo qual dois ou mais sindicatos representativos de categorias econômicas e profissionais estipulam condições de trabalho aplicáveis, no âmbito das respectivas representações, às relações individuais de trabalho”. Ela produz efeitos não só para as partes integrantes desse processo, mas também para terceiros. Trata-se de uma contratação coletiva intersindical, permitindo ao empregado a participação na definição das condições de trabalho.
A segunda é o Acordo coletivo de trabalho (ACT), prevista no § 1º do art. 611 da CLT, em que “é facultado aos sindicatos representativos de categorias profissionais celebrar acordos coletivos com uma ou mais empresas da correspondente categoria econômica, que estipulem condições de trabalho, aplicáveis no âmbito da empresa ou das empresas acordantes às respectivas relações de trabalho”. Sua principal distinção com a CCT consiste nos sujeitos (não participa a representação sindical dos empregadores) e na abrangência dos efeitos normativos (considerada menor se comparada com a CCT, pois os efeitos jurídicos do ACT ficam limitados aos contratos de trabalho dos empregados da empresa signatária da avença, logo, não se estende a terceiros).
Por fim, tem-se o Contrato coletivo de trabalho, considerada uma negociação de âmbito nacional e supracategorial, estabelecendo regras básicas para os demais instrumentos normativos. Aqui se estabelece um novo regime sindical, em que se prestigia a autonomia privada coletiva, tendo força de lei nos casos em que esta não se aplicar às questões de ordem pública ou de natureza constitucional.
2 EFEITOS DA CRISE SANITÁRIA DO COVID-19
A pandemia do Novo Coronavírus (COVID-19) alterou significativamente todos os rumos da sociedade, provocando diversas mudanças no modo de vida dos indivíduos. A partir de março de 2020, o Brasil começou a adotar medidas mais restritivas para o controle da doença, o que causou maior instabilidade nos setores econômicos, e, consequentemente, no trabalho das pessoas. Com o discurso de proteção ao direito à vida, outros direitos acabam sendo restringidos, sopesando tais princípios e garantias constitucionais.
Nesse sentido, para que algumas ações sanitárias sejam cumpridas, algumas restrições foram efetivadas, como o fechamento do comércio, isolamento horizontal e definição de serviços considerados essenciais. Em contrapartida, muitos impactos são causados nas relações privadas do direito do trabalho, já que, com a baixa do consumo, há a diminuição da receita e inevitavelmente a demissão de funcionários para o equilíbrio do caixa de funcionários para o equilíbrio do caixa.
Exemplo disso são os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), relatando que, no Brasil, a taxa de desemprego subiu de 11, 2% para 12,2%, entre fevereiro e abril de 2020, representando 12,9 milhões de desempregados. O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) apresentou uma nota técnica descrevendo a atual situação da crise econômica gerada pela pandemia da COVID-19, ressaltando os aspectos devastadores dessa situação sobre o mundo do trabalho.
A Organização Internacional do Trabalho – OIT (2020) estima que, no início de abril de 2020, cerca de 2,7 bilhões de trabalhadores no mundo, ou 81% da força de trabalho mundial, viviam em países que adotaram em algum nível as medidas de isolamento social defendidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como forma de controle do contágio do vírus Sars-CoV-2. Essas políticas de distanciamento social afetam direta e imediatamente a atividade econômica produtiva. A restrição de funcionamento às atividades de comércio submete os estabelecimentos a uma brusca redução da demanda, e a limitação à circulação significa, para muitos trabalhadores, a impossibilidade de realizar seu trabalho, enquanto para outros representa uma mudança na forma de trabalho ou uma redução na jornada (IPEA, 2020, p.7).
Além disso, é destacado que 38% dos trabalhadores do mundo estão empregados nos setores mais fortemente prejudicados pela crise atual, no caso o comércio varejista, os serviços de alimentação e hotelaria e a indústria manufatureira. Como a contração da renda das famílias e da elevação do desemprego se torna algo inevitável, cabe aos governos a adoção de programas e medidas de implementação de políticas que atenuem tal realidade, de modo que, a ação do governo federal é pelo IPEA assim descrita:
No cenário de uma crise tão severa como a ocasionada pela pandemia da Covid-19, que impulsionará vertiginosamente o crescimento da taxa de desemprego, é fundamental que o governo lance mão de políticas ativas de emprego. O objetivo dessas políticas é afetar a demanda por emprego e, assim, influenciar diretamente a taxa de desemprego. A MP n. 936/2020 apresenta um conjunto de medidas com esse objetivo para aqueles que são empregados com carteira assinada do setor privado. A ideia é preservar o vínculo empregatício, ao possibilitar a redução da jornada de trabalho e a suspensão temporária dos contratos de trabalho, bem como, ao mesmo tempo, assegurar a renda do trabalhador, implementando um benefício emergencial. Se, por um lado, este pacote de medidas tem sido elogiado, por contribuir para a manutenção de vínculos empregatícios e de postos de trabalho, por outro lado, a MP no 936/2020 tem sido criticada por não garantir plenamente o salário dos trabalhadores (IPEA, 2020, p.7).
Sob tal ótica, graves consequências surgem com tal pandemia, visto a redução da PIB, a recessão econômica, o desemprego, além do desembolso gritante dos estados afetados em não somente combater a doença, mas também dar um suporte maior às empresas (criadoras de emprego) que estão cada vez mais sujeitas ao processo de falência e aos trabalhadores de todos os ramos, visto a falta de opções para geração de renda e sustento próprio e da família.
Fica claro, portanto, que os efeitos da pandemia nas relações trabalhistas são bem graves, sendo cada vez mais fundamental a participação do Estado na atenuação dessa crise e, principalmente, na intermediação das relações de trabalho, visto a fragilidade de ambos os polos para superar essas etapas, daí o direito coletivo de trabalho ser um objeto mais frutífero para a sobrevivência de direitos considerados indispensáveis a todos os indivíduos e classes sociais.
3 SOLUÇÕES QUANTO AOS EFEITOS DA PANDEMIA NO DIREITO COLETIVO DO TRABALHO
O Direito coletivo em seu sentido estrito são direitos de grupo, categoria ou classe de pessoas, ocorrendo nesse direito a existência da possibilidade de determinar quem são seus titulares, pois existe uma relação jurídica entre as pessoas envolvidas. É indiscutível o enfrentamento de todos os setores de qualquer sociedade diante da pandemia do coronavírus, e consequentemente, não seria diferente em questão ao direto laboral coletivo. Desta forma, é necessária a utilização de instrumentos, formas para amenizar tais impactos.
A priori, vale ressaltar que na Consolidação das Leis Trabalhistas – CLT, em seu art. 8º caput dispõe que: “(...) nenhum interesse de classe ou particular deve prevalecer sobre o interesse público”, o que se faz necessário esclarecer que no momento atual o que se estar estabelecendo certas diretrizes está centrada nos chamados direitos de 3ª dimensão, os chamados transindividuais, como o direito a solidariedade, fraternidade, da tutela coletiva. Logo, é possível estabelecer uma relação da lei em seu sentido formal em mostrar que não haverá prevalência de direitos, no seu plano material em buscar formas que amenizem os impactos da pandemia.
Pode-se citar medidas adotadas pelo Poder Público, dentro do panorama dos empresários, sindicatos profissionais e econômicos, que dentre elas está:
a) Em relação às empresas mais vulneráveis (da aviação, de transporte, pequenas e médias empresas, autônomos, empresários por conta própria, entre outros), o provimento do Estado por meio de bancos públicos ou de sociedades de economia mista operações financeiras, que impliquem no adiamento ou procrastinação de pagamento de taxas e impostos, elastecimento de dividas já realizadas, e sobretudo de novos empréstimos de médio e longo prazo, com taxas civilizadas, para manter tais empresas vivas, tendo como contrapartida a garantia de manutenção dos postos de trabalho de seus empregados;
a) Os sindicatos profissionais e econômicos, representativos de suas respectivas categorias, por meio da negociação coletiva de trabalho, está se podendo celebrar acordos ou convenções coletivas contributivas ao arrefecimento da crise, adotando a flexibilização das relações de trabalho (tempo/horário/remuneração), com o afastamento dos grupos de risco (pessoas com idade superior a 60 anos, com deficiência, doenças degenerativas etc.), banco de horas, trabalho em regime de tempo parcial (art. 58-A da CLT), férias coletivas (art. 139 da CLT), adiantamento do período de férias, flexibilização de horários, e sobretudo o teletrabalho (art. 75-A e ss da CLT) e homeworking, de forma a sempre ter em mente, em primeiro plano, as normas de saúde, segurança e medicina do trabalho (art. 154 e ss. Da CLT). O trabalho em casa, por meio remoto e digital, deverá ser privilegiado, e novas plataformas de trabalho deverão ser desenvolvidas;
b) O Ministério da Economia, por meio dos auditores fiscais do trabalho, está incumbido em fiscalizar os empreendimentos para verificar o cumprimento das determinações estatais, em tempos de crise, de modo a constatar seu real cumprimento. Empresários que desobedecerem as medidas e portarias estatais poderão ter seus estabelecimentos interditados (art. 156 e ss da CLT);
c) Um dos instrumentos que poderá ser utilizado pelos empregadores para manter seu quadro de funcionários, em negociação coletiva de trabalho com os sindicatos representativos, ou até mesmo com o Parquet Laboral, é a suspensão coletiva dos contratos de trabalho, por um período de dois a cinco meses, para participação do empregado em curso virtual ou programa de qualificação profissional oferecido pelo empregador, de acordo com o art. 476-A da CLT.
d) O Ministério Público do Trabalho e a Justiça do Trabalho terão um papel fundamental neste período de crise. O primeiro por ter entre suas atribuições, a função da defesa dos direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos dos trabalhadores, especialmente em situação de vulnerabilidade e de risco social. Possui vários instrumentos jurídicos poderosos para dialogar e obrigar os empregadores a cumprir a legislação trabalhista e a própria Constituição Federal de 1988, entre eles, o Inquérito Civil, o Termo de Ajustamento de Conduta, e em caso de recalcitrância, as ações moleculares (ação civil pública, ação civil coletiva, mandado de segurança coletivo, e demais instrumentos processuais). De sua parte, a Justiça do Trabalho prolatará sentenças coletivas que abrigarão e protegerão direitos fundamentais de multidões de trabalhadores.
Outrossim, vale ressaltar recente iniciativa governamental, por meio da apresentação de um projeto de lei ao Congresso Nacional, no qual se propõe a criação de um "comitê especial", composto por órgãos de Justiça e controle, para solucionar de forma rápida casos relacionados ao coronavírus. O chamado Comitê Nacional de Órgãos de Justiça e Controle concentraria em único colegiado todos os questionamentos judiciais e extrajudiciais que envolvam a pandemia. O direito à vida tem posição destacada na ordem constitucional brasileira, mas com isso não se pode afastar garantias constitucionais da separação dos poderes e da independência de instituições como o Ministério Público e as Defensorias Públicas para permitir que um órgão excepcional julgue certos conflitos, como forma de ultrapassar obstáculos naturais das instâncias ordinárias. Isso representa, como têm sido as reações a esse projeto, “ameaça de devastação constitucional". Mutatis mutandis é o que ocorre com o discurso de negação da garantia constitucional à atuação sindical na crise do coronavírus.
O Decreto Legislativo nº 6/2020 por meio do reconhecimento da calamidade pública, exigiu a urgência de ações governamentais, das empresas e da atuação dos sindicatos, com procedimentos simplificados para se garantir a eficácia das medidas de interesse público. Na própria MP n. 936 constam regras para facilitar os trâmites das negociações coletivas. Assim, diz o art. 17 que durante o estado de calamidade pública (II) poderão ser utilizados meios eletrônicos para atendimento dos requisitos formais previstos na CLT, inclusive para convocação, deliberação, decisão, formalização e publicidade de convenção ou de acordo coletivo de trabalho e que (III) os prazos previstos na CLT ficam reduzidos pela metade. Portanto, a despeito das divergências motivadas pela MP n. 936, que restringiu o papel negocial dos sindicatos durante a crise do coronavírus, e da decisão liminar do E. STF na ADI n. 6.363, buscando, num difícil exercício de equilíbrio, não afastar os efeitos da norma governamental, mas, por outro lado, não anular por completo a atuação sindical, que se torna, via de regra até melhor e mais segura forma de negociação na crise do coronavírus. Com isso se tenta evitar eventuais arguições de nulidade de ajustes entre empregados e empregadores, pelo não chamamento dos sindicatos, e eventuais passivos trabalhistas.
Vale ressaltar ainda, a Lei nº 14.020/2020 que consolidou a redução de salário e jornada proporcionais, bem como a suspensão do contrato de trabalho, tudo em virtude do estado de calamidade pública decorrente da pandemia da Covid-19.
Cabe destacar que as medidas previstas em lei possuem validade mediante a negociação individual com os empregados, bem como a possibilidade de intervenção sindical que provoque a instauração de negociação coletiva.
Inicialmente, tratando-se da redução de salário e jornada proporcionais, o legislador trouxe a possibilidade de que a redução se dê de forma setorial, departamental, parcial ou na totalidade dos postos de trabalho:
Art. 7º Durante o estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º desta Lei, o empregador poderá acordar a redução proporcional de jornada de trabalho e de salário de seus empregados, de forma setorial, departamental, parcial ou na totalidade dos postos de trabalho, por até 90 (noventa) dias, prorrogáveis por prazo determinado em ato do Poder Executivo, observados os seguintes requisitos
Esclarece o inciso II do referido artigo que a redução pode se dar mediante negociação coletiva ou acordo individual com os empregados:
II- pactuação, conforme o disposto nos arts. 11 e 12 desta Lei, por convenção coletiva de trabalho, acordo coletivo de trabalho ou acordo individual escrito entre empregador e empregado;
Cabe destacar que na negociação individual com os empregados, os percentuais permitidos para redução de salário e jornada são pré-definidos em lei:
III- na hipótese de pactuação por acordo individual escrito, encaminhamento da proposta de acordo ao empregado com antecedência de, no mínimo, 2 (dois) dias corridos, e redução da jornada de trabalho e do salário exclusivamente nos seguintes percentuais:
a) 25% (vinte e cinco por cento);
b) 50% (cinquenta por cento);
c) 70% (setenta por cento).
Quanto à negociação coletiva, por contar com a participação do ente sindical que represente a categoria, podem ser fixados outros percentuais de redução:
Art. 11. As medidas de redução proporcional de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho de que trata esta Lei poderão ser celebradas por meio de negociação coletiva, observado o disposto nos arts. 7º e 8º desta Lei e no § 1º deste artigo.
§ 1º A convenção coletiva ou o acordo coletivo de trabalho poderão estabelecer redução de jornada de trabalho e de salário em percentuais diversos dos previstos no inciso III do caput do art. 7º desta Lei.
Da mesma forma, a suspensão dos contratos de trabalho pode ser negociada por via individual ou negociação coletiva:
Art. 8º Durante o estado de calamidade pública a que se refere o art. 1º desta Lei, o empregador poderá acordar a suspensão temporária do contrato de trabalho de seus empregados, de forma setorial, departamental, parcial ou na totalidade dos postos de trabalho, pelo prazo máximo de 60 (sessenta) dias, fracionável em 2 (dois) períodos de até 30 (trinta) dias, podendo ser prorrogado por prazo determinado em ato do Poder Executivo.
§ 1º A suspensão temporária do contrato de trabalho será pactuada, conforme o disposto nos arts. 11 e 12 desta Lei, por convenção coletiva de trabalho, acordo coletivo de trabalho ou acordo individual escrito entre empregador e empregado, devendo a proposta de acordo, nesta última hipótese, ser encaminhada ao empregado com antecedência de, no mínimo, 2 (dois) dias corridos.
Verifica-se, ademais, o cuidado do legislador no trato do Direito Coletivo do Trabalho, ao prever as condições de validade do acordo individual e a superveniência de negociação coletiva, como tratado nos parágrafos 4º e 5º, do artigo 12, da Lei nº 14.020/20:
§ 4º Os acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho, pactuados nos termos desta Lei, deverão ser comunicados pelos empregadores ao respectivo sindicato da categoria profissional, no prazo de até 10 (dez) dias corridos, contado da data de sua celebração.
§ 5º Se, após a pactuação de acordo individual na forma deste artigo, houver a celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho com cláusulas conflitantes com as do acordo individual, deverão ser observadas as seguintes regras:
- a aplicação das condições estabelecidas no acordo individual em relação ao período anterior ao da negociação coletiva;
- a partir da entrada em vigor da convenção coletiva ou do acordo coletivo de trabalho, a prevalência das condições estipuladas na negociação coletiva, naquilo em que conflitarem com as condições estipuladas no acordo individual.
§ 6º Quando as condições do acordo individual forem mais favoráveis ao trabalhador, prevalecerão sobre a negociação coletiva.
É de se notar que o legislador adota a validade de acordo individual, dada à excepcionalidade da situação que, em muitos casos, tem impedido o regular funcionamento de sindicatos, mas, ainda assim, assegura que as medidas possam ser tratadas por negociação coletiva, devendo, ainda, ser comunicado o ente sindical da negociação feita de forma individual.
Outro ponto a se destacar é a previsão da condição mais benéfica ao empregado (artigo 12, §6º), que vai de encontro aos princípios basilares e norteadores do Direito do Trabalho.
CONCLUSÃO
É notório os impactos da pandemia nas relações trabalhistas, em especial se tratando do direito coletivo quanto às representações dos agentes laborais, como os Sindicatos, por meio das Convenções e Acordos Coletivos. Medidas precisaram ser tomadas para que pudessem amenizar a situação vivenciada. Diante disso, foi apresentado algumas soluções adotadas pelo Poder Público, em especial a partir do Decreto Legislativo n. 6/2020 em que se estabeleceu no nosso país a situação da calamidade pública em decorrência do novo coronavírus.
Diante das diretrizes, mister se faz esclarecer a importância da harmonia entre os poderes republicanos, ramos do direito e, consequentemente, em se tratando no direito laboral em enfoque ao direito coletivo, mostra-se a pertinência de tal ramo, em especial quanto ao setor Sindicalista, por meio de suas funções políticas – em dirimir as intenções antagônicas dos mais diversos ramos laborais, econômicas – na distribuição de capitais necessários na aplicabilidade nos mais diversos setores e por fim social – por meio da participação de toda coletividade na busca de solução e harmonização das classes, categorias e ramos trabalhistas.
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Graduando em Direito pela Universidade Estadual do Maranhão - UEMA.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: LOPES, Adriano França. Os direitos coletivos de trabalho em tempos excepcionais: Efeitos nos acordos de trabalho sob as normas no curso da pandemia Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 15 nov 2022, 04:33. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/60009/os-direitos-coletivos-de-trabalho-em-tempos-excepcionais-efeitos-nos-acordos-de-trabalho-sob-as-normas-no-curso-da-pandemia. Acesso em: 22 nov 2024.
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