FERNANDO QUEIROZ POLETTO[1].
(orientador)
RESUMO: Um dos assuntos mais discutidos atualmente é a respeito dos crimes cibernéticos. Aqueles crimes que são feitos por meio da internet. Oriundo das inovações tecnológicas, a internet tem sido palco de inúmeros crimes e delitos. Dentre esses, encontra-se a Fake News. Esse instituto é um mecanismo que propaga informações falsas ou parcialmente verdadeiras para os mais diversos meios de comunicação. Ao se deparar com essas falsas informações, muitos cidadãos acabam influenciados e com isso agem de maneira criminosa como por exemplo, passando adiante informações falsas que acabam prejudicando terceiros. Diante desse contexto, o presente estudo buscou discutir o uso da Fake News na atualidade e as consequências na área criminal. Tencionou essa pesquisa em discorrer sobre o impacto que a Fake News possui na democracia brasileira. Para realizar esse estudo, teve-se como metodologia a pesquisa bibliográfica, baseada em livros, artigos científicos e na legislação brasileira. Nos resultados, ficou constatado que quando ausente uma lei que regule a Fake News no Brasil, é no Judiciário que ela é combatida e penalizada. Pela jurisprudência, é possível destacar que os magistrados em sua maioria ao se deparar com aspectos que levam ao entendimento de que houve Fake News nos casos concretos e que os efeitos de algum modo prejudicaram terceiros, tem condenando aqueles que praticam tal ato. Isso mostra claramente que o posicionamento jurídico caminha juntamente pelo defendido por esse estudo, o de que a Fake News não é algo benéfico e que deve ser amplamente combatido e penalizado.
Palavras-chave: Fake News. Democracia. Legislação. Consequência jurídica.
THE IMPACT OF FAKE NEWS ON BRAZILIAN DEMOCRACY IN THE 21ST CENTURY
ABSTRACT: One of the most discussed matters today is about cyber crimes. Those crimes that are made through the internet. From technological innovations, the internet has been the scene of numerous crimes and crimes. These include fake news. This institute is a mechanism that propagates false or partially true information for the most diverse media. When faced with this false information, many citizens end up influenced and thereby act criminally such as passing on false information that end up hurting third parties. Given this context, the present study sought to discuss the use of fake news today and the consequences in the criminal area. He intended this research to discuss the impact that Fake News has on Brazilian democracy. To conduct this study, the bibliographic research, based on books, scientific articles and Brazilian legislation, had as its methodology. In the results, it was found that when absent a law that regulates fake news in Brazil, it is in the judiciary that it is fought and penalized. By jurisprudence, it can be highlighted that the magistrates mostly when faced with aspects that lead to the understanding that there were fake news in concrete cases and that the effects in some way harmed third parties, have condemning those who practice such an act. This clearly shows that legal positioning goes along with the defended by this study that fake news is not beneficial and should be widely fought and penalized.
Keywords: Fake news. Democracy. Legislation. Legal consequence.
Sumário: 1. Introdução. 2. Fake News: aspectos gerais. 2.1 Do direito comparado. 3. Direitos Humanos: síntese geral. 3.1 As Fake News frente aos princípios constitucionais. 4. Das consequências jurídicas. 5. Considerações Finais. 6. Referências Bibliográficas.
1. INTRODUÇÃO
Nos últimos anos as redes sociais têm se tornado um dos principais veículos de interação entre os indivíduos. As redes sociais ocupam um grande espaço na forma de se relacionar, a mídia e todo o complexo que envolve o jornalismo têm se adaptado a essa nova realidade. É desse modo, um novo meio de divulgar notícias.
Ocorre que nesse quadro atual, as notícias se tornaram não uma fonte de pesquisa ou de informação, mas também de propagação de fatos mentirosos ou que tenham a sua constituição parcialmente verdadeira. É nesse campo que se adentra a Fake News.
O termo Fake News está relacionado à ideia de vinculação de informações e notícias falsas. É como um boato ou uma notícia que não tem base verdadeira e sólida e que acaba disseminada nas redes sociais ou em outros veículos de comunicação (CASTRO, 2018).
Diante desse fato, o Direito, enquanto ciência social, não pode se ausentar dessa nova forma de distribuição de informações e notícias. A partir do momento em que essas falsas notícias são divulgadas, uma série de consequências ocorre, seja no campo social, individual, político, econômico e principalmente jurídico, haja vista que a Fake News aborda qualquer assunto.
Dessa forma, o Direito não deve estar à mercê desse fato social. Por conta disso, o presente estudo teve como objetivo discorrer a respeito do fenômeno atual da Fake News e o seu impacto na vida social, jurídica e na democracia brasileira.
Portanto, no decorrer desse estudo, procurou-se responder: quais os desafios que os operadores do direito enfrentam ao se deparar com a propagação de Fake News?
Discute-se com esse tema o real sentido de usar a Fake News e como a sua prática trouxe resultados negativos e prejuízos financeiros. Para melhor embasamento do seu impacto, discutiu-se principalmente como a legislação brasileira se posiciona frente a essa situação.
2. FAKE NEWS: ASPECTOS GERAIS
Nos últimos anos a internet tem sido palco para o cometimento de inúmeros crimes, denominados de crimes cibernéticos. Dentre os delitos mais frequentes nos dias atuais é o denominado de Fake News.
Conceitualmente, a Fake News é o boato, a falsa notícia ou ainda a notícia propagada de “forma parcial (com o intuito de enganar), distribuída intencionalmente através de internet, televisão, rádio ou jornal impresso, como também nas mídias sociais” (CASTRO, 2018, p. 03).
Para Novo (2018, p. 02) Fake News são “notícias falsas que são um tipo de imprensa marrom que consiste na distribuição deliberada de desinformação ou boatos via jornal impresso, televisão, rádio ou internet, como nas mídias sociais”.
De acordo com a autora inglesa Claire Wardle a fake news pode ser identificado por meio de 7 (sete) tipos de notícias:
Sátira ou paródia ("sem intenção de fazer mal, mas tem potencial para enganar");
Falsa conexão ("quando as manchetes, visuais das legendas não dão suporte a conteúdo");
Conteúdo enganoso ("má utilização da informação para moldar um problema ou de um indivíduo");
Contexto falso ("quando o verdadeiro conteúdo é compartilhado com informações falsas contextuais");
Conteúdo impostor ("quando fontes verdadeiras são forjadas" com conteúdo falso);
Conteúdo manipulado ("quando informação genuína ou imagens são manipuladas para enganar", como fotos "adulteradas");
Conteúdo fabricado ("conteúdo novo é 100% falso, projetado para enganar e fazer mal").
(WARDLE, 2017 apud ZANATTA, 2018, p. 01)
Entende-se por fake news como uma criação de histórias falsas e mentirosas, que ao serem vistas como uma notícia jornalística propagada pela mídia dissemina essas notícias com o intuito de influenciar posições políticas ou de outra natureza (CARVALHO; KANFFER, 2018).
Essas notícias falsas são escritas e publicadas com a intenção de enganar, a fim de obter ganhos financeiros ou políticos, muitas vezes com manchetes sensacionalistas, exageradas ou evidentemente falsas para chamar a atenção (NOVO, 2018).
As causas que fizeram surgir e popularizar a Fake News são diversas. Têm-se como exemplos, “o fácil acesso online ao lucro de anúncios online, o aumento da polarização política e da popularidade das mídias sociais, principalmente a linha do tempo do Facebook, têm implicado na propagação de notícias falsas” (NOVO, 2018, p. 03).
Muitos estudos têm apontado de que maneira pode-se identificar que uma notícia seja fake. Nesse ponto, mostram-se abaixo alguns procedimentos que podem facilmente ajudar o indivíduo a detectar que a notícia que esteja lendo seja uma fake news; vejamos:
Considerar a fonte – notícias falsas não são ordinária e propositalmente veiculadas por grandes e conhecidos portais de mídia e, nesse aspecto, o nome do domínio do site;
Ler mais – outras histórias da fonte são igualmente falsas;
Investigar fontes de apoio – a notícia encontra-se isolada em apenas uma fonte;
Apurar se o autor é pessoa desconhecida ou não há indicação do autor;
Analisar a manchete e/ou lead, principalmente se estiverem em desacordo com o conteúdo, ou mesmo dando a entender que trata-se de uma notícia, porém, em realidade, é uma opinião (vício de apresentação). (CARVALHO; KANFFER, 2018, p. 03).
Com esses procedimentos pode-se facilmente identificar uma notícia fake. Mas apesar disso, no cenário atual, esse tipo de notícia tem se espalhado com uma enorme velocidade em vários países, se tornando no contexto atual uma ‘cultura’ entre a sociedade, ou seja, estar-se tornando cada vez mais comum o uso de notícias Fakes para influenciar diversos assuntos e opiniões.
Ao redor do mundo, vários países já vêm se posicionando para evitar e punir os seus criadores. Sobre esse assunto, verifica-se o tópico seguinte.
2.1 DO DIREITO COMPARADO
Conforme expresso no tópico anterior, a Fake News já é uma ação realizada constantemente na sociedade. Em diversas épocas (principalmente no período eleitoral) esse tipo de divulgação de notícias falsas tem sido utilizado como um mecanismo de impacto na opinião pública e nos serviços públicos. Antes de relacionar esse tema ao cenário brasileiro, importante citar algumas influências desse tipo de mídia no mundo, haja vista que antes de se estabelecer no território pátrio, a Fake News já era acentuada por outros países.
Diversos países, principalmente os da Europa e Estados Unidos tem implantado normas e programas que visem o combate de notícias falsas e artigos que trazem a desinformação. Em especial no período eleitoral, esses países procuram um posicionamento cada vez mais combativo frente às diárias divulgações de Fake News.
Inicialmente, cita-se a União Europeia que já demonstrou favorável à criação de regulamentos que tragam sanções para aqueles que praticam o Fake News. Apesar disso, nesses países o foco é mais sobre a conscientização social, respeitando as liberdades e direitos fundamentais. Aqui o que se busca é trazer consciência na sociedade, impedindo a iniciativa de realizar um Fake News.
Na União Europeia cabe citar o Roadmap (“mapas de caminhos”), documento de mais de cem páginas que fora criado por meio de estudantes juntamente ao Departamento de Estudos de Guerra e com a OTAN, cujo objetivo é demonstrar várias nuances sociais, políticas e jurídicas das notícias, com foco no descobrimento da Fake News e na sua conscientização (SIQUEIRA, 2019).
Também cabível mencionar a Alemanha, que editou o Ato para Cumprimento da Lei nas Redes Sociais (Netzwerkdurchsetzungsgesetz). Esse documento jurídico entrou em vigor em outubro de 2017 e de acordo com o seu texto, tem-se o prazo de 24 horas, a começar pela reclamação ou pela decisão judicial para que os provedores de redes sociais possam retirar ou bloquear conteúdo ilegal ou falso (CARVALHO; KANFFER, 2018).
Outro país que também tem buscado formas de combater a Fake News é as Filipinas. Em 20 de julho de 2017 foi promulgada uma Lei com enfoque direito no combate à disseminação de notícias falsas, que proibia a sua criação e distribuição. Essa lei fora denominada de “Anti-Fake News Actof 2017”. Esta norma conceitua o que seja uma notícia falsa, além de vedar a sua criação, divulgação e distribuição. Também cria penas (pecuniárias e restritivas de liberdade). (CARVALHO; KANFFER, 2018).
Por fim, cabe citar os Estados Unidos. É nesse país que a Fake News mais se projeta. Por ser a maior economia do planeta e pelo fato de que suas decisões políticas e sociais afetarem grande parte do mundo, os Estados Unidos tem redobrado constantemente os mecanismos de prevenção ao Fake News.
No Estado da Califórnia, por exemplo, existe um projeto de Lei ainda em andamento, de alcunha “Ato Político da Califórnia para Redução de Ciberfraudes” que torna ilegal tais ações. Neste projeto, tem-se a definição dessa ação, que remete a impossibilidade de acesso a informações políticas fidedignas, tornando ilegal, inclusive, que sites da internet que sejam parecidos a outros divulguem dados políticos sejam registrados (SIQUEIRA, 2019, p. 02).
Apesar disso, o grande momento do assunto em destaque no solo americano se deu na corrida presidencial ocorrida em 2016. Os até então candidatos Donald Trump e Hilary Clinton foram vítimas de diversas notícias sobre o seu respeito, tanto na vida privada quanto na vida pública.
Essas eleições se tornaram o exemplo máximo de como a influência de notícias Fakes podem influenciar no voto. Segundo Monnerat; Riga; Ramos (2017, p. 07) o “compartilhamento de Fake News e de textos extremistas, sensacionalistas, conspiratórios e de opinião disfarçados de notícias jornalísticas ganhou força frente a reportagens escritas por profissionais americanos”.
O que ocorreu durante o período eleitoral americano pode ser visto da seguinte forma:
Um levantamento do Projeto de Propaganda Computacional da Universidade Oxford analisou os compartilhamentos feitos por usuários do Twitter no estado de Michigan durante o período eleitoral. Os pesquisadores descobriram que 46,5% de todo o conteúdo apresentado como noticioso sobre política era composto por notícias falsas, documentos não verificados do WikiLeaks e matérias de origem russa. Recentemente, descobriu-se que 126 milhões de internautas dos EUA no Facebook foram expostos ao conteúdo produzido na Rússia sobre a eleição americana (MONNERAT; RIGA; RAMOS, 2017, p. 07).
A fim de descobrir a natureza dessas ações, o Congresso americano realizou audiências a respeito do papel da Rússia no pleito realizado nos EUA. Empresas como Google, Facebook e Twitter, por meio de seus representantes, tiveram que explicar as falhas no sistema pela permissão de divulgação dessas notícias. Ambos representantes, como afirma Siqueira (2019) fizeram um mea culpa.
Os donos desses gigantes da tecnologia admitiram que operadores da Rússia usaram as plataformas online para dividir o país (EUA). Por conta disso, se comprometeram a divulgar, com transparência, quem paga por anúncio nas redes — a iniciativa teria efeito global, inclusive no Brasil.
Nota-se com isso que a Fake News tem impactado fortemente diversos países, trazendo prejuízos de toda ordem e principalmente fazendo surgir a desconfiança da sociedade diante de uma notícia, quebrando assim a confiabilidade e a credibilidade dos veículos de comunicação.
A respeito do impacto desse tipo de ação no Brasil, apresenta-se o tópico seguinte.
3. FAKE NEWS NO BRASIL
Por ser muito utilizado nos tempos recentes, esse fato social tem repercutido intensamente no campo jurídico. Em termos legais, o problema das fake news se dá quando ocorre uma discrepância de direitos. Tais conflitos são produzidos entre a informação transmitida e os direitos fundamentais das pessoas afetadas por dita notícia, principalmente a honra e a intimidade.
Sobre esses desafios na área jurídica, importante mencionar:
[...] o campo do Direito enfrentará cada vez mais as conexões entre a política e a velocidade da comunicação neste novo arranjo tecnológico-digital. Com o padrão informativo sendo engolfado pela invasão das fake news nas redes sociais, o efeito mais imediato será congestionar ainda mais o já exaurido Poder Judiciário. Conflitos sobre a delimitação de fronteiras para a liberdade de expressão, opinião e pensamento, bem como ataques à reputação, como calúnia, difamação e injúria serão cada vez mais frequentes (CARVALHO, 2018, p. 03).
Para o Direito, o que se busca é a punição para esse tipo de delito. Nesse ponto, adquirem especial relevância os denominados “ciborgues de mídias sociais” (social media cyborgs), termo referente para estabelecer aqueles que, isoladamente, gerem muitas contas nas redes sociais, implantando ligações a outrem e que passam a disseminar opiniões sobre as mais variadas temáticas (CARVALHO; KANFFER, 2018).
Essa busca pela punição mais rigorosa daqueles que propagam a Fake News é motivada pelos seus enormes prejuízos que causa, seja nas vítimas, no setor econômico e político e também no ramo jurídico.
Sobre esse ponto, cita-se:
Em climas sociais inflados pela radicalização, em que a informação foi substituída pela propaganda enganosa, os prejuízos irreparáveis para a política e os inúmeros desafios para o campo jurídico são evidentes. Sem mencionar a mídia tradicional, envolvida atualmente em inúmeras iniciativas para demonstrar o que é “fato” e o que é “fake” (CARVALHO, 2018, p. 02).
De todo modo, a desinformação causada pelas fake news pode ser um problema social, mas leva-se em conta as ferramentas que o ordenamento tem para proteger a liberdade de expressão e de informação, não convém enfatizar a importância em se ter uma maior regulamentação para esse fato, a fim de trazer a segurança jurídica necessária.
No Brasil pode-se afirmar que o assunto relacionado ao Fake News, para a grande massa populacional se deu através do campo político. Nos últimos anos foram divulgadas diversas notícias sobre determinado político (a), trazendo notícias de toda natureza: pessoal e íntima, criminal, social, de opinião, etc.
Nas últimas eleições presidenciais, especialmente as realizadas em 2018 e 2022, o assunto referente ao Fake News ganhou enorme destaque nas principais mídias do País. Isso se deu pelo fato de que os candidatos a vários cargos públicos desse pleito tiveram que enfrentar não apenas a opinião pública, mas as constantes explicações sobre as notícias falsas divulgadas diariamente sobre a sua candidatura.
De acordo com o estudo realizado pelo Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação (Gpppai), da Universidade de São Paulo (USP), mostrou que cerca de 12 milhões de pessoas compartilharam Fake News no Brasil em 2017. Ainda nessa pesquisa, que monitorou 500 páginas digitais de conteúdo político falso ou distorcido, indicou que “tais notícias têm potencial para alcançar grande parte da população brasileira se considerada a média de 200 seguidores por usuário” (MONNERAT; RIGA; RAMOS, 2017, p. 08).
Em dado mais recente, em um levantamento feito pela Poynter Institute, escola de jornalismo e organização de pesquisas americana que fez uma pesquisa em 2022 com esse tema no Brasil, mostrou que quatro em cada 10 pessoas afirmam receber notícias falsas diariamente. Dentre os que compartilharam acidentalmente informações erradas em algum momento, 43% dos brasileiros afirmaram já ter enviado um post, vídeo, imagem ou notícia e só mais tarde terem percebido que se tratava de Fake News (GUIMARÃES; RODRIGUES, 2022).
A Fake News no Brasil é mais vista em campo político. É nesse cenário que esses atos de falsas informações possuem maior adesão e que são corriqueiramente encontradas. Isso demonstra um atentado claro à democracia brasileira.
No Brasil, como bem demonstrou as últimas eleições presidenciais, o impacto das notícias falsas sobre o voto foi decisivo. Isso explica porque o uso da Fake News já é implantado antes mesmo do início das eleições. Como bem enfatiza Siqueira (2019, p. 02) já existe notícia falsa hoje em dia em um “cenário fora da campanha eleitoral. A probabilidade é 1.000% de notícias falsas permeando as campanhas de presidente e de governadores antes mesmo de começar”.
O fato é que a Fake News em período eleitoral é altamente perigosa, vide o fato de que seu intuito é tumultuar o pleito, fazendo com que as pessoas recebam as informações sobre questões de interesse público com efeitos de intensidade imprevisível. Como bem aponta Carvalho (2018, p. 02) “a unidade básica da tomada de decisão é a informação. Se você está mal informado, você tomará más decisões”.
Nas últimas eleições brasileiras, o meio de comunicação mais utilizado para propagar as fakes news foi o WhatsApp (SUPPLE, 2019).
A eleição de 2018 no Brasil teve significativo impacto do envio maciço de mensagens, por meio de empresas fornecedoras. Isso se deu por meio do WhatsApp. Por ser um instrumento de fácil acesso e de alcance populacional bastante amplo, o uso do WhatsApp foi determinante para a disseminação de notícias falsas entre os opositores da eleição. Diversos candidatos divulgavam notícias e vídeos dos concorrentes de forma negativa.
Desse modo, correntes, memes e vídeos, por exemplo, descontextualizam informações e amplificam esse problema. Cabe destacar que boatos e notícias falsas sempre existiram. O problema é maneira como elas estão sendo cada vez mais divulgadas de forma maciça e sem filtro.
O uso do WhatsApp como veículo de divulgação de Fake News foi tão forte durante a corrida eleitoral de 2018 no Brasil, que os próprios representantes do aplicativo de mensagens afirmaram que houve grupos responsáveis pelos envios ilegais das mensagens sensacionalistas e que tinham a intenção de manipular uma audiência específica (CURY, 2019).
Sobre essa questão, apresenta-se o seguinte recorte jornalístico que traz os detalhes dessa confissão:
[...] Durante a sétima edição evento de jornalismo do Festival Gabo, na Colômbia, o WhatsApp confirmou que terceiros utilizaram o aplicativo para disparar mensagens falsas ou verdadeiras relacionadas com as eleições presidenciais de 2018 no Brasil. Em outubro de 2018, foi descoberto que grupos de empresários estavam disparando uma série de mensagens com teor político e anti-petista por meio do WhatsApp. Entre as empresas listadas como financiadoras dos pacotes de mensagens, cujo preço chegava a até 12 milhões de reais, estava a companhia de varejo Havan - cujo dono chegou a ser multado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) por ter impulsionado publicações sobre Jair Bolsonaro que, até então, era candidato para a presidência da República (CURY, 2019, p. 02).
Ainda durante o período eleitoral em destaque, “cada mensagem individual custava entre 0,08 e 0,40 centavos, e os pacotes mais caros – como o que foi adquirido pela Havan – enviava centenas de milhões de mensagens por vez” (CURY, 2019, p. 02). As mensagens tinham como destino os grupos políticos, onde continham milhares de pessoas, e também para indivíduos que são considerados alvos fáceis para o envio de desinformação.
Frente a esse caso, o presente aplicativo ainda não trouxe uma solução interna para a resolução desse problema, o que faz com que o WhatsApp ainda seja a melhor ferramenta para a disseminação de fake news. Apesar disso, os seus representantes têm afirmado que o mesmo está iniciando o bloqueio de contas que divulguem Fake News.
3.1 AS FAKES NEWS FRENTE AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS
Um dos aspectos mais complexos quando se discute sobre a Fake News no Brasil é em relação aos seus efeitos frente aos princípios constitucionais. Isso é compreensível devido ao fato de que na Constituição vigente do país, existem princípios que de certa forma possibilitam a propagação de Fake News. De mesmo modo, a hermenêutica constitucional possui ferramentas eficientes de solucionar os casos concretos (TAVARES, 2012).
Nesse sentido, cabe a sociedade, por meio de instituições estabelecidas, buscarem a repressão e a punição para a criação e divulgação de Fake News. Todavia, deve-se sempre preservar as garantias da liberdade de imprensa e livre manifestação do pensamento.
Importante destacar que mesmo as normas constitucionais terem valor igual, verifica-se que determinados princípios possuem um status mais “importante” que outros, onde se denota uma relevância maior dentro do aparato normativo constitucional e para todo o ordenamento jurídico (TAVARES, 2012).
Dentre esses princípios, destacam-se as garantias asseguradas à liberdade de manifestação do pensamento (art. 5.º IV e V, CF), à liberdade de comunicação (art. 5.º, IX e X, CF) e a liberdade de informação (art. 5.º, XIV e XXXIII, CF). Além destas, tem-se ainda:
[...] a também relevante a norma constitucional que revela não poder ser objeto de qualquer restrição à manifestação de pensamento, a criação, a expressão e a informação, destacando-se que nenhuma lei poderá constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social, vedando-se expressamente qualquer censura de natureza política, ideológica e artística – art. 220, caput, §1.º e §2.º, CF (CARVALHO; KANFFER, 2018, p. 05).
Sabe-se que os direitos e garantias não são absolutos, e por conta disso, importante destacar que dentro do complexo de normas e princípios existentes no ordenamento jurídico brasileiro, aliado aos instrumentos processuais da tutela de urgência, “soluciona os abusos realizados nos institutos da liberdade de imprensa e manifestação do pensamento, através da vedação constitucional ao anonimato (art. 5.º, IV, CF) e pela preservação do direito de resposta e indenizações (art. 5.º, V, CF)”. (CARVALHO; KANFFER, 2018, p. 05).
O impacto de uma Fake News ainda se amplia no próprio exercício da profissão jornalística. Como bem acentua Felix (2019, p. 01) “desmascarar uma notícia falsa pode manchar a reputação de um jornalista e do veículo em questão”.
O mesmo autor ainda afirma que a ética jornalística deve sempre prevalecer sobre qualquer circunstância. Desse modo, mesmo “que o sensacionalismo traga muitos cliques, o resultado a longo prazo referente a uma notícia falsa pode acabar coma reputação de um jornalista, e fechar veículos de comunicação” (FELIX, 2019, p. 01).
No campo prático, trazendo esse cenário para o meio político, o choque entre a ação de implantar uma Fake News e os princípios constitucionais deve ser visto de forma subjetiva, analisando cada caso conforme a sua intenção.
Nesse sentido, por exemplo, se for detectado que a proliferação de notícias inverídicas, com o manifesto intuito de prejudicar os candidatos e distorcer a opinião pública, pode ser caracterizada como crimes contra a honra – calúnia, injúria e difamação (SAJ ADV, 2019).
Nesse sentido, cabe ilustrar o seguinte julgado:
ELEIÇÕES 2018. REPRESENTAÇÃO ELEITORAL. PROPAGANDA ELEITORAL. INTERNET. BLOG. CONTEÚDO INVERÍDICO. FAKE NEWS. EXTRAPOLAÇÃO DA LIVRE MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. PEDIDO LIMINAR. DEFERIDO. PROCEDÊNCIA DO PEDIDO. 1. Divulgação de notícia falsa na internet, que excede o direito de liberdade de expressão. 2. Conteúdo veiculado em 2018, que datam às eleições 2014. Fake News, inexistência do processo judicial ou investigação destinada a apurá-las. 3. Liberdade de expressão se vê limitada por restrições necessárias, em uma sociedade democrática, de proteger a reputação e os direitos de outras pessoas, não se estendendo à divulgação de notícias inverídicas ou ofensivas à honra de terceiros. 4. Provimento da Representação. Manutenção da Medida Liminar, para referendo do Pleno. (TRE-PE-RP: 06037894 RECIFE-PE, Relator: STÊNIO JOSÉ DE SOUSA NEIVA CÔELHO, Data do Julgamento: 01/10/2018, Data de Publicação: PSESS – Publicado em Sessão, Data 01/10/2018). (grifo do autor)
Portanto, fica claro observar que o garantismo da liberdade de manifestação de pensamento, da liberdade de comunicação e da liberdade de informação não deve ser confundido com a intenção de distorcer ou manipular a opinião pública. Quando configurado que houve a criação e disseminação de uma Fake News, os seus agentes devem ser penalizados, não cabendo nesse cenário o recorrer dos princípios acima demonstrados.
4. DAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS
Até aqui ficou claro constatar que a Fake News traz em seu bojo efeitos danosos para a sociedade e para a Política, o que consequentemente também prejudica a democracia. Devido ao fato de que nos últimos anos tem-se encontrado diariamente diversas notícias falsas sobre diversos assuntos, mas que no geral é focada explicitamente em fakes políticos, a legislação brasileira tem ao longo das últimas décadas trazendo ao seu ordenamento algumas leis que buscam penalizar aqueles que criam e divulgam Fake News.
Primeiramente, bem antes do momento atual, a legislação brasileira já tomara a iniciativa de combater à veiculação e disseminação de notícias falsas. Isso ocorreu por meio da Lei de Imprensa (Lei n.º 5.250/67) onde precisamente em seu art. 16 criminalizava a conduta de:
Art. 16. Publicar ou divulgar notícias falsas ou fatos verdadeiros truncados ou deturpados, que provoquem:
I - Perturbação da ordem pública ou alarma social;
II - Desconfiança no sistema bancário ou abalo de crédito de instituição financeira ou de qualquer empresa, pessoa física ou jurídica;
III - Prejuízo ao crédito da União, do Estado, do Distrito Federal ou do Município;
IV - Sensível perturbação na cotação das mercadorias e dos títulos imobiliários no mercado financeiro.
Pena: De 1 (um) a 6 (seis) meses de detenção, quando se tratar do autor do escrito ou transmissão incriminada, e multa de 5 (cinco) a 10 (dez) salários-mínimos da região.
Parágrafo único. Nos casos dos incisos I e II, se o crime é culposo:
Pena: Detenção, de 1 (um) a (três) meses, ou multa de 1 (um) a 10 (dez) salários-mínimos da região.
(BRASIL, 1967)
Paralelo a essa norma supra descrita, em 2014 adentrou na legislação brasileira o Marco Civil da Internet (Lei n.º 12.965/14). Na presente norma trouxe a consagração de princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da Internet no Brasil. Em relação ao tema desse estudo, cabe mencionar o art. 19 que traz importante norma referente ao combate e à disseminação de informações falsas; a saber:
Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.
§ 1º A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material.
§ 2º A aplicação do disposto neste artigo para infrações a direitos de autor ou a direitos conexos depende de previsão legal específica, que deverá respeitar a liberdade de expressão e demais garantias previstas no art. 5º da Constituição Federal.
§ 3º As causas que versem sobre ressarcimento por danos decorrentes de conteúdos disponibilizados na internet relacionados à honra, à reputação ou a direitos de personalidade, bem como sobre a indisponibilização desses conteúdos por provedores de aplicações de internet, poderão ser apresentadas perante os juizados especiais.
§ 4º O juiz, inclusive no procedimento previsto no § 3º, poderá antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, existindo prova inequívoca do fato e considerado o interesse da coletividade na disponibilização do conteúdo na internet, desde que presentes os requisitos de verossimilhança da alegação do autor e de fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação.
(BRASIL, 2014)
Muito se discutiu sobre a constitucionalidade ou não do artigo acima mencionado. Em razão disso, o Supremo Tribunal Federal se posicionou no sentido de reconhecer esse artigo com base nos arts. 5º, incs. II, IV, IX, XIV e XXXVI, e 220, caput, §§1º e 2º, da Carta Magna.[2]
Dando prosseguimento ao tema, em relação ao cenário político (eleitoral), necessário se faz mencionar as iniciativas feitas pelas leis que implementaram minirreformas em 2015 (Lei nº 13.165/2015) e em 2017 (Leis nº 13.487/2017 e nº 13.488/2017), modificando a Lei Eleitoral (Lei n.º 9.504/97).
A lei de 2015 renovou o conceito de propaganda eleitoral ao retirar a menção à candidatura de determinada pessoa e a exaltação das qualidades pessoais dos pré-candidatos (BRASIL, 2015). Já a Lei de 2017 alterou o art. 57-B da Lei Eleitoral ao estipular que a propaganda eleitoral possa ser feita através de blogs, redes sociais, sítios de mensagens instantâneas e aplicações de Internet, desde que o conteúdo seja editado pelos próprios candidatos, partidos, coligações ou pessoa natural (BRASIL, 2017).
No campo legislativo também se deve mencionar o Projeto de Lei do Senado 473/2017 de autoria de Ciro Nogueira (PP/PI) onde acrescenta ao Código Penal vigente o art. 287-A com a seguinte redação:
Divulgação de notícia falsa
Art. 287-A - Divulgar notícia que sabe ser falsa e que possa distorcer, alterar ou corromper a verdade sobre informações relacionadas à saúde, à segurança pública, à economia nacional, ao processo eleitoral ou que afetem interesse público relevante.
Pena – detenção, de seis meses a dois anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave.
§ 1º Se o agente pratica a conduta prevista no caput valendo-se da internet ou de outro meio que facilite a divulgação da notícia falsa:
Pena – reclusão, de um a três anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave.
§ 2º A pena aumenta-se de um a dois terços, se o agente divulga a notícia falsa visando a obtenção de vantagem para si ou para outrem.
(BRASIL, 2017)
Ao explicar a causa de se criar esse artigo, o presente autor afirmara que em algumas situações, onde não se encontra um crime contra a honra, não será amparada pela lei penalista, em razão disso, deve-se criminalizar a conduta de divulgação de notícia falsa em que a vítima é a sociedade como um todo, “agravando-se a pena justamente nas hipóteses em que a divulgação é feita via internet (pela potencialidade lesiva) e quando o agente vise a obtenção de vantagem” (NOGUEIRA, 2017 apud BRASIL, 2017).
Outro Projeto de Lei que vem nesse mesmo caminho é a PL 2630/2020 apresentado pelo senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE). Em seu texto, institui a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet. O texto cria medidas de combate à disseminação de conteúdo falso nas redes sociais, como Facebook e Twitter, e nos serviços de mensagens privadas, como WhatsApp e Telegram, excluindo-se serviços de uso corporativo e e-mail (BRASIL, 2020).
Este projeto, assim como os demais dessa natureza, vem em meio a polêmicas. De um lado encontra-se políticos e parte de setores da sociedade que acreditam que essas leis são necessárias para combater e impedir o financiamento de notícias falas, principalmente no período eleitoreiro. Para esse grupo, conforme explanam Machado, Durigan e Pereira (2022) a lei deve prever em seu ordenamento normas que combatam à Fake News, uma vez que já se provou que elas promovem um atentado à democracia brasileira.
Por outro lado, há os que entendem que que as medidas previstas nos Projetos de Lei sobre esta matéria, poderia levar à censura. Criticam ainda a possibilidade que tem de se criar sanções penais. Nesse entendimento, Coelho (2022) ao debater sobre essa questão, menciona que o retro Projeto de Lei faz a exigência de que se exponha informações detalhadas a respeito de como os sistemas funcionam, como por exemplo, os detalhes sobre a base de treinamentos de sistemas e métodos utilizados para melhorar os serviços.
Para o autor, esse tipo de dado não é a solução mais viável no combate às Fake News; isto porque certamente oferecerá a agentes mal-intencionados um “guia” sobre como contornar as proteções dos sistemas, trazendo prejuízos para a qualidade e segurança dos resultados de busca. Com isso, eles poderiam manipular essas informações para conseguir obter uma melhor posição no nosso ranking de pesquisas, prejudicando ao longo do processo aqueles que produzem conteúdo confiável e relevante (COELHO, 2022).
De todo modo, esse estudo caminha no sentido de ser necessário, e não apenas o ideal, que o Direito brasileiro busque medidas cada vez mais sérias e urgentes no combate às Fake News. Apoiá-las seria como permitir que notícias falsas possam desrespeitar a democracia.
A par desses regulamentos, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) em 2017 criou o Conselho Consultivo sobre Internet e Eleições (Portaria TSE n.º 949, de 07/12/2017) que tem como atribuição a criação de pesquisas e estudos a respeito das normas eleitoreiras e o impacto da Internet no período eleitoral, principalmente no que concerne ao uso de Fake News e a utilização de robôs como forma de propagar as informações. Além disso, esse Conselho pode sugerir ações e metas focadas no aperfeiçoamento das leis (BRASIL, 2017).
Outro exemplo a ser citado é a expressão retirada de mensagens enviadas em grupos restritos de participantes (WhatsApp, por exemplo) das normas de propaganda eleitoral (§2.º, art. 28, da Resolução 23.551).
A jurisprudência brasileira ao acompanhar o avanço legislativos vem nos últimos anos, principalmente durante o período eleitoral condenando aqueles que se utilizam de Fake News para disseminar notícias falsas que denigrem ou prejudiquem terceiros.
A jurisprudência brasileira, frente a ausência de uma lei específica para esse caso, já vem ao seu turno julgando casos onde a Fake News serviu como base para o cometimento de crimes. A título de exemplo, cita-se o seguinte julgado:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRELIMINAR DE IRREGULARIDADE PROCESSUAL REJEITADA. MATÉRIAS JORNALÍSTICAS. INCLUSÃO DE PARLAMENTAR EM INQUÉRITO POLICIAL. SUPOSTA PRÁTICA DE CRIME PREVIDENCIÁRIO. NOTÍCIA FALSA (FAKE NEWS). AÇÃO DE DIREITO DE RESPOSTA E DE REPARAÇÃO DE DANOS. FACULDADE DO OFENDIDO. AUSENCIA DE RETRATAÇÃO OU DE ESCLARECIMENTOS SOBRE O EVENTO CONTROVERTIDO. ATO ILÍCITO PRATICADO. VIOLAÇÃO A IMAGEM E HONRA. DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA MANTIDA. 1. [...]. 2. [...]. 3. [...]. 3.1. A publicação de conteúdo ofensivo à honra e à imagem de quem quer que seja, à toda evidência, não está amparada pelo direito constitucional à liberdade de informação, uma vez que a própria Constituição resguarda, como igualmente fundamentais, os direitos à honra, imagem e a vida privada. 3.2. [...]. 3.3. Tais bases mostram-se cada vez mais necessárias em um contexto global onde a incidência de fake news (notícias falsas) vem assumindo lamentável destaque, sendo demasiadamente imprescindível um compromisso de toda a sociedade - em especial de todos os veículos de comunicação - para combatê-las, já que, em situações extremas, a propagação de notícias falsas tem a aptidão de comprometer a própria democracia. 4. Compete à vítima da ofensa ou da informação falsa a faculdade de requerer ou não direito de resposta, não sendo esta conduta condicionante para o exercício de eventual ação de reparação de danos. Inteligência do art. 12, §1º, da Lei 13.188/2015. 5. [...]. 5. [...]. 5.1. [...]. 6. Recursos de apelação conhecidos, mas desprovidos. (07053497020208070001 - (0705349-70.2020.8.07.0001 - Res. 65 CNJ). TJDFT. 7º Turma Cível. Relatora: GISLENE PINHEIRO. Data de Julgamento: 01/03/2023. Publicado no DJE: 09/03/2023). (grifo do autor)
No caso acima, verificou-se que três das rés veicularam e mantiveram a disposição de seus leitores uma notícia falsa (Fake News) referente a suposta participação do autor - Deputado Federal - em crimes previdenciários, quando já era de conhecimento público que o investigado no inquérito policial noticiado era apenas um homônimo já falecido. O relator do caso entendeu que ao deixar de informar devidamente os seus leitores sobre as circunstâncias do fato noticiado, as empresas em questão praticaram ato ilícito, ensejando o direito do autor de ser reparado pelos danos suportados.
Diante desses atos jurídicos, fica evidente notar que no Brasil devido à frequente ocorrência de Fake News surgindo a todo o momento, tem-se buscado medidas que visem prevenir e penalizar a sua prática. As medidas legislativas e o julgado exposto não deixam dúvidas que ajudarão na diminuição da criação e propagação da Fake News. Do mesmo modo, essas medidas irão dar base fundamental para que o Poder Legislativo possa gerar mecanismos legais para tornar eficaz ao máximo o combate à desinformação.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os Fakes News são um dos temas que mais se discute nos últimos anos. Grande parte dessa discussão se deu pelos últimos períodos eleitorais brasileiro, onde foram diariamente expostas notícias de todo tipo contra (e a favor) dos candidatos.
Caracterizada como um mecanismo de divulgação de fatos, notícias ou boatos falsos, a Fake News se encontra efetivada em vários veículos de comunicação, seja por um jornal impresso, pela televisão, rádio ou principalmente pela internet, através das redes sociais.
Tais notícias falsas são escritas e publicadas com a intenção de enganar, a fim de obter ganhos financeiros ou políticos, muitas vezes com manchetes sensacionalistas, exageradas ou evidentemente falsas para chamar a atenção. O conteúdo intencionalmente enganoso e falso é diferente da sátira ou paródia. Estas muitas vezes, empregam manchetes atraentes ou inteiramente fabricadas para aumentar o número de leitores, compartilhamento e taxas de clique na Internet.
Por conta desse fato, a discussão desse tema já se torna relevante. Nessa pesquisa foi discutida como se dá o processo de criação de Fake News e principalmente o seu impacto no meio social e em outras áreas, como o Direito.
Desse modo, o Direito não pode se ausentar dessa realidade, devendo editar normas e medidas jurídicas de combate ao Fake News. Por essa razão citou-se como exemplo o Projeto de Lei do Senado 473/2017 de autoria de Ciro Nogueira (PP/PI) onde acrescenta ao Código Penal vigente o art. 287-A que traz a pena de detenção, de seis meses a dois anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave, nas situações em que houve a divulgação de notícia falsa. Além deste, citou-se também o Projeto de Lei 2630/2020 que também penalizar tal prática, além de trazer eventuais sanções a empresas e cidadãos que a praticam.
Também ficou claro que o garantismo da liberdade de manifestação de pensamento, da liberdade de comunicação e da liberdade de informação não deve ser confundido com a intenção de distorcer ou manipular a opinião pública, conforme exposto na jurisprudência pátria.
Quando são rompidos os parâmetros de civilidade, que diferenciam a sociedade civilizada de uma alcateia, cabe ao Poder Judiciário, por natureza uma conquista e uma garantia contínua do processo civilizacional, impedir que o homem seja o lobo do próprio homem (Lupus est homo homini lupus). Fake news é uma forma de violação dos padrões de civilidade.
Nesse ponto, quando ausente uma lei que regule a Fake News no Brasil, é no Judiciário que ela é combatida e penalizada. Pela jurisprudência, é possível destacar que os magistrados em sua maioria ao se deparar com aspectos que levam ao entendimento de que houve Fake News nos casos concretos e que os efeitos de algum modo prejudicaram terceiros, tem condenando aqueles que praticam tal ato.
Isso mostra claramente que o posicionamento jurídico caminha juntamente pelo defendido por esse estudo, o de que a fake news não é algo benéfico e que deve ser amplamente combatido e penalizado
6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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[1] Docente do Curso de Direito da Universidade de Gurupi – UnirG. E-mail: @unirg.edu.br.
[2] Tema 987, RE 1.037.396, relator o Eminente Ministro Dias Toffoli.
Bacharelanda em Direito pela Universidade de Gurupi – UnirG .
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: SANTOS, Livya Lucena dos. O impacto das fake news na democracia brasileira no século XXI Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 08 maio 2023, 04:27. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/61412/o-impacto-das-fake-news-na-democracia-brasileira-no-sculo-xxi. Acesso em: 22 nov 2024.
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