No dia 27/08/08, fui ao cinema em Teresópolis, assistir ao filme “BATMAN, O CAVALEIRO DAS TREVAS”.[1] O que era para ser um momento de lazer, virou uma preocupação, tão logo entrei no cinema e vi a quantidade de crianças que fazia sua algazarra de espera. Preparei as reservas de paciência e busquei um lugar. O filme começa e a algazarra encolhe. Logo no início, o filme impacta adultos e congela crianças. Veremos porquê.
Com toda sua gama de efeitos especiais, excepcional direção e atuações persuasivas, trata-se de um bom filme... só que, para adultos! Entretanto, recebeu classificação indicativa para 12 anos, incompatível, a meu ver, com a extrema violência que reproduz. Já a primeira seqüência termina com um personagem com uma granada na boca, que é explodida ao final da cena. Ainda que não seja explicitada a explosão, a edição de som e imagem do filme deixa clara a sua ocorrência. Natural que as crianças tenham “congelado”. Há cenas em que o vilão da história aperta o gume de uma faca sobre a boca dos personagens que oprime, com a montagem indicando que efetuou o corte na face das vítimas. Além das explosões e lutas, com realismo, esmero e exagero habituais em Hollywood, há um clima pesado, sombrio ao extremo. Também aí, minha visão de leigo suspeita tratar-se da oferta de um espetáculo psicologicamente denso demais para crianças.
A classificação etária do filme tem gerado debates em diversos blogs na internet. Também em outros países a faixa recomendada tem sido questionada, havendo sugestões de que fosse indicado somente para maiores de 15 anos.[2] Nos EUA, o filme foi classificado como “PG-13 (Parents Strongly Cautioned)”, o que significa que “parte do material do filme poder ser impróprio para crianças menores de 13 anos, sendo o acompanhamento dos pais ou responsáveis legais seriamente recomendada” (grifei). Como aqui, a classificação não é proibitiva, mas, além de mais severa, exige maior compromisso parental.
Surpreendi-me ao verificar que assistiam à fita diversas crianças que aparentavam idade menor que 08 anos. Ao final da sessão, conversando com a bilheteira e o gerente, acabei sabendo que a ocorrência era comum. Os funcionários disseram, que, embora alertassem aos pais sobre a violência contida no filme, mesmo assim, eles o assistiam com seus filhos. A bilheteira mencionou que crianças de 02 anos já tinha vivido essa situação. Indaguei de uma das mães que saía do cinema com seus quatro filhos, sobre a idade do menor deles. Tinha 07 anos!
O assunto me obrigou à presente reflexão.
Certas violências sofridas por crianças e adolescentes somente farão sentir seus efeitos muitos anos depois, porque nem todas são visíveis, físicas, palpáveis. Não é o corpo, portanto, que as recebe, sequer a razão as traduz. Por isso é que não vale o conforto que se dão pais, exibidores e produtores de programas que propagam violência, quando afirmam que a criança “sabe separar a realidade da ficção”. Ou seja, a criança pode ter recebido orientações, pode haver diálogo, racionalmente pode haver até compreensão e triagem lógica que afaste a possibilidade da conexão entre o programa assistido e o comportamento resultante. O problema é que tal linha de raciocínio esquece que não somos apenas razão. Somos também emoção.
Embora nos tenham chegado por artes da razão, a descoberta do inconsciente, por Freud e depois, do inconsciente coletivo, por Jung, trouxeram fissuras irreversíveis no tão aclamado edifício da razão humana. A realidade não é conhecida por nós apenas com o que podemos elaborar e transformar em palavras. Há formas de percepção que surgem das entrelinhas, há um sentir que adentra compartimentos ocultos da mente. Há fantasmas que se escondem em subterrâneos, de onde saltam quando menos se espera, arrastando suas correntes de neuroses.
O mundo interior de cada ser humano é complexo e, na maioria dos casos, cheio de abismos. Traumas do nascimento se revelam em comportamentos indesejáveis na idade adulta. No parto, o cérebro ainda incompleto, a razão ainda inerte, apenas recebeu o impacto. Este, muitas vezes, deverá ser elaborado através da terapia e da psicanálise. É freqüente que descubramos influências inimagináveis em nossas vidas, que provocaram transtornos psicológicos dos quais tentamos nos livrar.
Essa questão da apreensão não racional de dados e influências em estados de consciência relativa ou inconsciência, se demonstra não só no caso de nascituros ou recém-nascidos, mas também no caso de pessoas em estado comatoso. Tanto numa quanto noutra hipótese, existem recomendações para que se converse com a pessoa em tais estados. Mães cantam para suas barrigas, colocam música para que os fetos ouçam, parentes de pacientes em coma são estimulados a conversar com eles. Não é incomum ocorrerem ao pé do ouvido cânticos, orações e confissões. Há registros da influência de tais atitudes na ativação da consciência.
Portanto, é preciso compreender que a criança que presencia atos de violência, ainda que virtual, os recepcionará por caminhos e em depósitos que ainda não são por nós totalmente compreendidos.
Diversos estudos têm tratado da relação entre o comportamento humano e a influência da mídia. É um tema complexo, sobre o qual dificilmente se encontrará consenso. Estão envolvidos no debate temas muito caros à democracia, como a liberdade de expressão e interesses muito poderosos, como os do mercado publicitário.
De todo modo, já ficou claro a esta altura que existe, sim, influência da mídia no comportamento de crianças e adolescentes.
Em 09/07/2008 a Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara de Deputados, aprovou o Projeto de Lei nº 5.921/01, de autoria do Deputado Luiz Carlos Hauly. O projeto define uma série de restrições à publicidade de produtos destinados a crianças e adolescentes, vedando também a participação de crianças em peças publicitárias. Essa medida chega até com certo atraso, eis que, na União Européia já fora instituída há tempos.
Sobre programas de TV, cabe realçar o trabalho de Buckingham, no livro Moving Images. Ali se demonstram os resultados de uma pesquisa que alerta para “os perigos de uma abordagem puramente racionalista, na qual os adultos tendem a valorizar as respostas racionais”. Para o autor “tendemos a negligenciar tipos mais emocionais de resposta”. Percebeu que as crianças até eram capazes de fazer julgamentos críticos sofisticados sobre o que assistem mas, como afirma: “ainda assim você pode ser emocionalmente afetado por aquilo”[3].
Um estudo realizado pelo ILANUD, entidade da ONU dedicada a prevenir a violência, analisou os conteúdos de desenhos animados. Chegaram a cifras que montam a 57% de ocorrências de lesão corporal e de 30% de homicídios em tais desenhos. O grave é que todos são marcados pela impunidade. Por conta disto, o responsável pela pesquisa, o sociólogo Túlio Khan, afirmou que existem “sólidas suspeitas de que uma programação violenta reforça atitudes anti-sociais, especialmente em ambientes mais conturbados”.[4]
Sabemos que crianças são influenciáveis. Piaget analisou as diversas fases evolutivas da educação moral da criança e do adolescente. Existe um marco temporal indicativo que sinaliza o período em que é possível o início da construção moral independente, com o senso crítico atuando de forma mais autônoma sobre os valores recebidos do lar e da sociedade. As conclusões de Piaget sugerem que em torno dos 09 anos de idade esta capacidade já estaria ativada. Logo, crianças abaixo de tal faixa, não estariam aptas a “separar o joio do trigo”. Por isso, seria mais penosa a estas a exposição a conteúdos inadequados. E tal marco temporal também não indica que crianças maiores de 09 anos saberiam exercer eficazes juízos de valor. Basta uma infância conduzida de forma irresponsável ou inepta pela família – quando esta existe e comparece – e pela sociedade, para que tenhamos adolescentes com sua capacidade de julgamento desvirtuada pela admissão de valores absolutamente nocivos à boa formação do ser humano.
Essa reflexão se agrava quando vemos os dados publicados pela UNESCO que revelam que “um terço (37%) dos programas violentos apresentam ‘os maus’ que ou nunca são punidos, ou raramente o são em qualquer ponto da história; outros 28% dos programas violentos apresentam ‘maus’ que só são punidos no final da história”.[5]
Sabemos que a formação da criança e do adolescente é feita apenas em parte pela educação familiar. A própria escola não encontra mais o centralismo que já teve nessa formação. A explosão da comunicação eletrônica, modernizando e tornando mais atrativas as diversas modalidades de lazer e entretenimento audiovisual passaram a ocupar o lugar de primazia. Isso ocorre justamente num período em que a própria autoridade familiar é mais questionada. Esperava-se que esta fosse a “vacina” para os danos provocados pela diversão eletrônica. Entretanto, isso não se verificou, com muitos pais preferindo abandonar os filhos às diversas “babás eletrônicas” que surgiram.
Assim, crianças e adolescentes presenciam, sem defesas “psico-imunológicas”, a violência reproduzida continuamente em desenhos, filmes e games. Deve-se registrar que existe, em todo ser humano, o paradoxo da atração pelo que causa, ao mesmo tempo, repulsa. Execuções medievais eram espetáculos públicos, de grande afluência. Michel Foucalt, em “Vigiar e Punir”, descreve em minúcia a crueldade do tormento e o êxtase da multidão. O Circus Maximus, no Império Romano, atraia suas multidões aos espetáculos de brutalidade e covardia. Um campeão de venda e locações – principalmente entre menores de idade! - nos tempos atuais foi a série de vídeos “Faces da Morte”, onde são reproduzidas cenas de mutilações, execuções, suicídios, autópsias e outras morbidades do gênero.
Desde a mais tenra infância, mesmo em tempos passados, acostumamo-nos a lidar com tais contradições. Os contos de fadas são repletos de figuras e episódios aterrorizantes, já amplamente estudados pela psicopedagogia. O problema é que, outrora, a um conto em que um caçador invadia uma casa, estripava um lobo e de lá retirava a avozinha de Chapeuzinho Vermelho, seguia-se uma canção materna, uma afago ou uma oração prévia ao sono. Era como se as histórias servissem para preparar a criança para o lado obscuro da vida, mas dosando tal exposição com o controle familiar, inclusive, reforçando o papel deste como abrigo afetivo e porto seguro. A própria história, era contada com as dosagens necessárias de suspense ou tragédia, conforme a idade da criança.
O problema, hoje, é que essa exposição continuada ao que causa terror (e, ao mesmo tempo, fascínio) não sofre qualquer mediação. As crianças ou adolescentes são abandonados a esses envenenamentos da psique, sem qualquer controle.
Em outro trabalho, dissertamos, incidentalmente, sobre as conseqüências da violência banalizada pela mídia.[6] Dentre outras, se destacam as que seguem.
O embrutecimento da consciência, a exigir sempre doses maiores de exposição a violências também maiores para que o mesmo efeito – a descarga de adrenalina provocada pela antecipação do medo e o prazer de sua superação – seja alcançado.
A possibilidade de reprodução do comportamento sugerido, pela qual – principalmente quando ocorre o comportamento violento impune – a criança ou adolescente idealiza aquele comportamento como um padrão para solução de problemas, conflitos ou, mesmo, construção identitária. Até porque hoje a violência criou um padrão estético e transformou-se numa forma cruel de expressão criativa. O 11 de setembro é o exemplo mais alarmante desta nova ciência do espetáculo. Também o são os massacres da Escola de Columbine e da Universidade Virginia Tech.
A outra hipótese é a possibilidade do pânico. Sabemos que um dos maiores alimentadores da violência é o medo. Medo da agressão, medo do castigo, medo do roubo, medo da bala perdida, etc. Com isso, as pessoas tornam-se precavidas. Não raro, reagem ante a mais mínima sombra de ameaça. Muitas vezes reagem, em recuo ou ataque, de maneira desproporcional à agressão ou à sua possibilidade.
Portanto, podemos estar criando crianças que, embrutecidas, precisem cultivar a violência para alcançar satisfação, reproduzindo os comportamentos que aprenderam na mídia, como comportamentos nobres, de heróis. Ou então crianças arredias, que se potencializam como vítimas ideais de bullying e de relações opressivas. Tais comportamentos podem não se manifestar de imediato. Podem permanecer latentes durante a juventude e se configurar em comportamentos indesejáveis na idade adulta. É como se, no subconsciente, deixássemos matilhas de lobos à espreita.
Pode ocorrer também que essa violência cultivada – violência esta que é sempre uma quebra de alguma regra – estimule a hoje tão observada cultura da indisciplina e do desrespeito. Afinal, adolescentes adoram quebrar regras. É natural, parte da construção da identidade e do aprendizado social. Mas, sem saudosismos, reconheçamos, a luta contra o status quo, já produziu frutos melhores. Ingenuamente ou não, jovens já quiseram mudar o mundo, não aprofundar, ainda que involuntariamente, suas mazelas.
Por qualquer viés que se observe a questão, não é razoável imaginar que crianças e adolescentes enfrentarão tamanha carga de exposição a influências negativas sem qualquer dano. É o mesmo que pretender alimentar crianças diariamente com chumbo em pó e pretender que, um dia, não adoeçam. Ou niná-la com milhões de decibéis de heavy metal e pretender que não ensurdeçam.
Ao menos, uma coisa parece já ser consenso entre pesquisadores. As crianças criadas em ambiente inseguro e que não possuam bom relacionamento com pais, escola e colegas, sofrerão mais os efeitos da influência da violência na mídia.[7]
Ora, vivemos num país em que as escolas reclamam da falta de autoridade familiar, em que as famílias se queixam das escolas e em que avolumam-se as ocorrências de bullying. Cresce também o cyber-bullying. Crianças de famílias com menor poder aquisitivo freqüentemente não têm o acompanhamento de pais e mães. Os pais são freqüente ausência, quando não, “inexistência”. As mães, por sua vez, precisam deixar os filhos com a filha mais velha que, por vezes, não inteirou, ainda, 08 anos, porque precisa trabalhar. A repetência e a evasão escolar são alarmantes. Já as famílias, de muitos divórcios, dos Jardins, em São Paulo, do Lago Sul, em Brasília, e da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro, por outro lado, convivem com a erosão de valores e da autoridade da família, que se manifesta em índios queimados, empregadas domésticas espancadas e pit-boys ou gangues neo-nazistas aterrorizando as madrugadas.
Como se vê, não se pode pretender que seja o Brasil de hoje um local onde impere o “bom relacionamento” com as referências de autoridade, ou o “ambiente seguro”, seja lá em que classe social for.
Quanto à influência direta, não devemos subestimar as conclusões de, por exemplo, diversas organizações americanas, que concluíram que “o entretenimento violento gera comportamento violento”, dentre as quais, podemos citar: Associação Americana de Psiquiatria da Infância e Adolescência, Associação Americana de Pediatria, Associação Médica Americana, Associação Americana de Psiquiatria, Associação Americana de Psicologia, Centros para Controle e Prevenção de Doenças, Instituto Nacional de Saúde Mental e o equivalente ao nosso Ministério da Saúde, o Gabinete de Saúde Pública (Surgeon General).[8]
No trabalho “O Impacto da Mídia”, a Faculdade de Medicina da UFRGS, divulga um estudo longitudinal de 22 anos de pesquisadores da Universidade de Michigan, que relatou uma correlação direta entre a quantidade de entretenimento violento, visto pelas crianças de classe média, e o subseqüente comportamento agressivo anti-social. Digno de nota é que os pesquisadores descobriram que mesmo uma criança, que não era agressiva até aos 08 anos de idade, porém assistia uma quantidade substancial de programas violentos, tornou-se, aos 19 anos, mais agressiva do que outras da mesma idade, que não haviam assistido a programação violenta de televisão.[9]
Por isso, foi uma vitória o surgimento, no Brasil, de uma tentativa de conscientização da sociedade e das famílias para essa realidade, através da classificação indicativa de produtos audiovisuais.
A classificação indicativa, já adotada em diversos países ocidentais, pretende cumprir o papel do Estado, sem inibir a iniciativa familiar. A idéia é que haja co-responsabilidade. O órgão classificador funcionaria em auxílio dos pais conscientes.
Daí, surgem problemas. Em primeiro lugar, pais já formados dentro duma cultura de violência, mas ainda em contextos familiares mais sólidos, tendem a ser tolerantes com aquilo que, para eles, faz parte da cultura juvenil. Ingenuamente não percebem a mudança de circunstância.
Não há mais a mediação familiar. O espaço das novas mídias eletrônicas se ampliou. A violência se tornou um padrão estético desejável. É como na história das guerras. Passamos, no final do século XX, no campo da comunicação, das lutas de sabres, lanças e espadas, para as bombas de destruição em massa e para a guerra bacteriológica. A sofisticação da maldade chegou a níveis inimagináveis, de bombas de nêutrons, e a estamos enfrentando com machados de pedra.
Sempre repito que não podemos legislar para o homem imaginário, incomum, com padrão moral e cultural acima da média. A lei é feita para o cidadão médio. E este, criado em cultura de violência, aprendeu a “levar vantagem em tudo”, viveu a “cultura do jeitinho”. Nesse contexto, afrontar uma regra de autoridade é sempre prazeroso. Assim, se o Ministério classifica um filme como adequado para maiores de 16 anos, sempre haverá aquele genitor, vaidoso de suas próprias qualidades familiares – que, freqüentemente, não passam de excesso de confiança injustificada e frouxidão moral – que achará que seu filho de 12 anos já é maduro o suficiente para acessar aquele divertimento. Afinal, ele acha que sabe mais da própria família. Ele acha que “o filho tem cabeça boa”. São estes, os mesmos que permitem a cervejinha precoce ao filho de 13 anos ou menos.
Não se pode esquecer, ainda, a ocorrência dos programas familiares em que, muitas vezes, a criança despreparada para aquele lazer, a ele é levada apenas porque “não se tem com quem deixá-la” e os pais ou os irmãos mais velhos não querem perder o programa.
Outro fator que diz diretamente ao caso do filme atual do Batman é a memória afetiva de muitos pais, criados assistindo ao seriado infanto-juvenil ingênuo e inofensivo, dos anos 60, aquele cheio de onomatopéias gráficas. Mesmo os que o conheceram dos gibis, talvez não tenham notado a revolução das grafic novels trazida por Frank Miller, justamente com “O Cavaleiro das Trevas”. O raciocínio de muitos talvez não alcance que, manteve-se o nome e a máscara, mas o herói não é o mesmo.
Lidando com tal realidade, acho que deveriam, os autores da classificação indicativa, ser mais ciosos, econômicos em liberalidades, numa fase de necessária transição pedagógica. É sempre prejudicial a saída de um período de restrição completa para um período de liberação total. Da forma que a regra hoje está colocada, nada impede que um pai leve a um filme indicado para 16 anos, uma criança de 05 anos. Claro que isso ocorrerá, muito mais, no caso da mesma criança ser levada ao filme indicado para 10 anos. Aqui, a desculpa é linear e o raciocínio, um silogismo simplório: “O filme é liberado para 10 anos, logo, para crianças. Meu filho de 05 anos é criança. Logo, pode assistir o filme”.
Por isso, o primeiro passo para inibir o abuso, seria ter clareza dessa realidade, sendo, a repartição classificadora, ainda que transitoriamente, mais severa na classificação, ou buscando acrescer um alerta mais consistente quanto às restrições existentes no produto.
No “caso Batman”, o Ministério da Justiça, por seu Departamento de Justiça, Classificação, Títulos e Qualificação da Secretaria Nacional de Justiça – DEJUS/MJ, parece ter tido uma visão pouco rigorosa dos parâmetros estabelecidos no próprio Manual de Classificação Indicativa instituído por aquele órgão de governo. Vejamos alguns itens destacados do referido manual (disponível no sítio do Ministério na internet).
Em dada altura se diz:
A idéia central desses critérios de análise é valorizar as programações que tragam comportamentos constitucionalmente desejáveis. Ou seja, programas que ressaltem atitudes que contribuam para transformar crianças e adolescentes em indivíduos mais harmônicos com o restante da sociedade e respeitadores dos direitos humanos.
Batman mostra-se um justiceiro que se sobrepõe à legalidade, com métodos violentos e vingativos. É óbvio que essa postura, além de não contribuir para a formação do comportamento constitucionalmente desejado, nem para a harmonia do indivíduo com a sociedade, muito menos ainda, para a compreensão dos direitos humanos, não parece ajudar a psique de crianças de 08, 06 ou 02 (!!) anos, a desenvolver outro parâmetro importante visado pela classificação, qual seja, conforme a expressão que consta do Manual:
Batman não é um exemplo de resolução pacífica de conflitos. Parece que o Ministério se intimidou frente ao “vingador mascarado” também no cumprimento dos itens que seguem:
Formas de análise e interpretação que podem REDUZIR a gradação das tendências Conteúdos Violentos:
• Apresentação de formas alternativas de resolução de conflitos;
• Apresentação das conseqüências da violência para as vítimas de forma não sensacionalista, ou seja, a cena deixa claro o fato de que ser vítima de violência implica seqüelas (físicas, emocionais, financeiras, sociais etc), entretanto, o faz sem amplificar a exposição destas mesmas conseqüências, sem apelar para a exploração das condições em que se encontram as vítimas;
• Há condenação à violência;
• A violência é apresentada dentro de um contexto de fantasia onde fica clara a sua não correspondência com a realidade;
• A apresentação de fundo musical minimiza o conteúdo violento;
• A apresentação de sonoplastia minimiza o conteúdo violento;
• O enquadramento da imagem minimiza o conteúdo violento;
Formas de análise e interpretação que podem ELEVAR a gradação das tendências Conteúdos Violentos e envolvendo Drogas:
• Apresentação de violência como a única forma ou a forma predominante de resolução de conflitos;
• Apresentação de realização de justiça com as próprias mãos;
• Presença de violência do tipo “mocinhos batem em bandidos”;
• Perpetração de violência por personagens de imagem valorizada (os mais bonitos, os mais sadios, os mais inteligentes, os heróis);
• Apresentação de cenas de vítimas em estado de agonia;
No filme, a justiça é feita pelas próprias mãos do “mocinho“. O filme é realista. Não há fantasia. Por isso é tão assustador que o Coringa seja tão crível (e, em muitos casos, sabemos, existente, atuante e ativo). Vítimas são mostradas em estado de agonia e deformidades horríveis são mostradas como seqüelas. Trilha sonora, sonoplastia e edição valorizam o conteúdo violento. A violência não é condenada, na verdade vencida pela violência maior. Logo, é admitida como ferramenta redentora da caótica “Gotham City”.
Em meu entendimento, data venia, caberia revisão da classificação indicativa para faixa superior. Entretanto, isso não impediria a desatenção ou negligência parental, já que a portaria só institui vedação absoluta na faixa de 18 anos. Nesta, mesma acompanhados, menores não podem entrar. Em todas as demais, apenas acompanhado do responsável ou por este autorizado, o jovem ou criança pode ter acesso à obra indicada para idade superior à sua.
Houve uma portaria anterior do Ministério da Justiça, a de nº 1.597, que chegou a ser mais rigorosa, admitindo o acesso em faixa de classificação superior das crianças ou adolescentes com idade enquadrável na faixa imediatamente anterior (crianças de 10 e 11 anos poderiam entrar, acompanhadas ou autorizadas, em filmes classificados para 12 anos, mas não o fariam nas classificações para idades superiores e assim sucessivamente). Como essa ferramenta não existe mais, resta apelar à consciência dos pais.
O mecanismo atual produz um absurdo. É impossível a um pai permitir o ingresso de seu filho de 17 anos em um filme classificado para 18 anos. Mas o mesmo pai pode levar seu filho de 05 anos ao filme classificado para 16 anos! Ora, em qual situação mais se violenta o direito da criança e do adolescente?
Em Teresópolis, considerando a violência apresentada na película, o assunto foi tratado com base na Portaria nº 03/06, da Vara da Infância, da Juventude e do Idoso daquela Comarca, baixada pela MMª Inês Joaquina Sant’Ana Santos Coutinho[10] que, num dos seus artigos determina a proibição, a crianças e adolescentes, de produtos que estimulem a violência, como se vê:
Art. 18. PRODUTOS PROIBIDOS A MENORES - É proibido o fornecimento, a venda ou locação a crianças e adolescentes de:
(...)
II – quaisquer produtos eróticos, que contenham ilustração ou mensagem obscena ou pornográfica, estimulem a violência (Lei Estadual nº 2.918, de 20/04/1998) ou façam apologia ao uso de drogas, de bebidas alcoólicas ou de quaisquer outras substâncias que possam causar dependência física ou psíquica a crianças e adolescentes, inclusive jornais, revistas, livros, fitas de vídeo, CD-ROM, DVD, disquetes, programas de computador, cartuchos de jogos eletrônicos e similares.
Entretanto, a proibição é relativizada pela possibilidade da interferência parental na decisão sobre o fornecimento/exibição do produto. Isso porque o parágrafo 4º do mesmo artigo reporta-se à Portaria 1.100 do Ministério da Justiça.
Parágrafo quarto. Os cinemas, as locadoras, lan-houses e as empresas que efetuem exibição, venda ou locação de produtos sujeitos à classificação indicativa do Ministério da Justiça deverão cumprir as determinações de alerta aos pais, constantes da Portaria 1.100 do Ministério, mediante placas, cartazes e catálogos informativos, bem como manter nos produtos a marca da classificação determinada, obedecendo, na inexistência de ordem conflitante da autoridade judiciária, à coleta de autorização formal dos responsáveis legais do adolescente, em caso de se proceder à cessão, exibição, venda ou locação de produtos de faixa etária superior, mantendo-as em arquivo próprio no estabelecimento para fiscalização do Conselho Tutelar, do Ministério Público, e do Comissariado de Justiça.
A Portaria Ministerial referida traz no rol de consideranda, os seguintes parâmetros:
- a responsabilidade dos pais no exercício do poder familiar, de acordo com os arts. 1.630 e seguintes da Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002 – Código Civil;
- a co-responsabilidade da família, da sociedade e do Estado na garantia à criança e ao adolescente do direito à educação, ao lazer, à cultura e à dignidade, de acordo art. 227 da Constituição Federal;
Logo, se é que não podemos, a esta altura, interferir na classificação indicada pelo Ministério da Justiça, e presente a realidade de estarem as salas de exibição repletas de crianças ainda em primeira infância, o que é absolutamente inadequado, cabe-nos ativar os dispositivos legais que instrumentalizam a orientação e advertência aos pais, para que melhor decidam.
Diversos artigos da Portaria do Ministério da Justiça, dizem respeito ao caso, todos exigindo ampla divulgação da indicação etária e das características do produto audiovisual, como forma de alerta aos pais. Seguem os artigos, com os grifos que achei mais relevantes:
Art. 13. Sob pena de constituir infração tipificada nos arts. 252 e 253 do Estatuto da Criança e Adolescente, compete aos produtores, distribuidores, exibidores ou responsáveis por diversões públicas, anunciar e afixar, em lugar visível e de fácil acesso, à entrada do estabelecimento, informação destacada sobre a natureza da diversão e sobre a faixa etária para a qual não se recomende.
Parágrafo único. As informações de que trata o caput deste artigo deverão ser produzidas, fornecidas e veiculadas de acordo com os parâmetros estabelecidos no Manual de Classificação Indicativa.
Art. 15. A produtora, exibidora, distribuidora, locadora e congêneres, ao realizar a exibição ou comercialização de diversão pública regulada por esta Portaria, fornecerá e veiculará a informação e o símbolo identificador a ela atribuído na Classificação Indicativa, nos termos do Manual de Classificação Indicativa.
Parágrafo único. O símbolo e informação de que trata o caput deste artigo deverá ser veiculado de acordo com o seguinte exemplo: NÃO RECOMENDADO PARA MENORES DE XX ANOS, e ainda, com a descrição objetiva das inadequações de conteúdo e do tema.
Art. 16. O responsável pelo estabelecimento de exibição, locação e revenda de diversões públicas reguladas por esta Portaria, deverá afixar em local de fácil leitura, a seguinte informação: "O Ministério da Justiça recomenda: Srs. Pais ou Responsáveis, observem a classificação indicativa atribuída a cada diversão pública. Conversem com as crianças e adolescentes sobre as inadequações indicadas antes de exibir conteúdo impróprio à sua faixa etária".
Art. 18. A informação detalhada sobre o conteúdo da diversão pública e sua respectiva faixa etária é meramente indicativa aos pais e responsáveis que, no regular exercício de sua responsabilidade, podem decidir sobre o acesso de seus filhos, tutelados ou curatelados a obras ou espetáculos cuja classificação indicativa seja superior a sua faixa etária.
Parágrafo único. O acesso de que trata o caput deste artigo está condicionado ao conhecimento da informação sobre a classificação indicativa atribuída à diversão pública em específico.
Parece-me que os alertas tanto no cinema de Teresópolis, quanto em muitos outros, não têm observado os cuidados devidos, nem quanto à forma, nem quanto ao conteúdo e muito menos no que concerne à ênfase necessária. Note-se que há um padrão de cartaz de alerta determinado pelo Ministério da Justiça na Portaria 1.100, que muitos exibidores não observam.
Quanto à possível infração administrativa, ela ocorreria, como prevê a portaria ministerial, por descumprimento dos artigos que seguem anotados:
Art. 252. Deixar o responsável por diversão ou espetáculo público de afixar, em lugar visível e de fácil acesso, à entrada do local de exibição, informação destacada sobre a natureza da diversão ou espetáculo e a faixa etária especificada no certificado de classificação: Pena - multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência.
Art. 253. Anunciar peças teatrais, filmes ou quaisquer representações ou espetáculos, sem indicar os limites de idade a que não se recomendem: Pena - multa de três a vinte salários de referência, duplicada em caso de reincidência, aplicável, separadamente, à casa de espetáculo e aos órgãos de divulgação ou publicidade.
Na Comarca de Teresópolis a gerência do cinema foi intimada para cumprimento da Portaria do Juízo (que remete à Portaria Ministerial), afixando os avisos devidos e efetuando os alertas aos pais com maior rigor.CONCLUSÃO
Esperamos ter demonstrado que houve, no mínimo, imprudência na atribuição da faixa classificatória, pelo Ministério da Justiça, a um filme tão violento. Por isso a conclusão é a de que “O Cavaleiro das Trevas explodiu a classificação indicativa”. Esperemos que não tenham falado mais alto os interesses econômicos. Até porque José Mojica Marins, cujo mais recente filme, “Encarnação do demônio”, foi classificado pelo Ministério da Justiça como adequado para maiores de 18 anos, protestou dizendo: “Para os gringos [filmes estrangeiros] eles dão uma classificação bem menor. O 'Batman [O Cavaleiro das Trevas]' teve classificação de apenas 12 anos e é um filme bem violento!".[11]
Sabemos que o protesto de Zé do Caixão não é infundado. Em tese, quanto maior a restrição etária, menor a bilheteria. Por isso as major americanas lutam tanto para fazer prevalecer a classificação etária que permita o acesso de seu maior consumidor, o público infanto-juvenil.
Não valeria a pena me alongar sobre as incoerências da classificação e suas motivações. Entretanto, um último registro. No sábado, dia 30/08/08, no canal MGM, assisti às 04 horas do filme Caravaggio, produção da RAI, a estatal italiana de televisão. Sabemos que aquele fabuloso pintor era também bissexual, inclusive já tendo o cineasta inglês Derek Jarman produzido versão bem explícita de sua biografia que realçava esse aspecto. Entretanto, a produção italiana, além de ter cuidado de mostrar mais os relacionamentos heterossexuais do pintor, é muito econômica nas cenas de sexo ou de violência, privilegiando o lado aventuresco e os conflitos artísticos do gênio. Pois bem, sabem qual a classificação do filme, de conteúdo, até certo ponto, pueril? 14 anos! Ou seja, as agruras do pintor quinhentista foram consideradas mais gravosas do que as aventuras sombrias do Cavaleiro das Trevas.
Concluindo, permito-me a petulância de sugerir maior rigor aos classificadores. Devem ter presente que, num país de tradição autoritária como o Brasil, a chancela estatal raramente é contestada. A transferência de poder decisório aos pais, por isso, deve ser prudente. Eles tenderão a abdicar de seus próprios juízos de valor, já que alguém já ‘pensou por eles’. Também os exibidores deveriam exercer maior divulgação das restrições que levaram à classificação. Os Juízes da Infância e da Juventude podem, também, contribuir fiscalizando os estabelecimentos por seus Comissários, o que também pode fazer o Conselho Tutelar. Devemos todos lembrar que a diretriz da proteção integral a crianças e adolescentes, conforme o art. 227 da Constituição Federal, exige a aplicação do princípio da precaução, conforme estipulado no art. 70 do ECA.
CF/88 - “Art. 227 (caput). É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.”
ECA - “Art. 70. É dever de todos prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e do adolescente.”
Crianças e adolescentes são seres em fase especial de formação da personalidade. Não podem ser expostos a violência de qualquer ordem, ainda que virtual. Cabe a todos efetuar essa proteção.
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Teresópolis, 02 de setembro de 2008.
[1] “The Dark Knight”, produção de 2008, da Warner Brothers, com direção de Christopher Nolan, tendo Cristian Bale no papel principal e Heath Ledger como o vilão “Coringa”.
[2] Conforme consta em “Classificação do último 'Batman' não é unânime” de Luiz Felipe Rodrigues, no Diário de Noticias de Lisboa, edição on-line de 10/08/08: “(...) Esta questão não tem sido levantada pela imprensa portuguesa, mas nos meios de comunicação anglo-americanos muitos comentadores criticam a classificação atribuída ao filme. O deputado britânico Keith Vaz declarou também que o filme não é recomendável para crianças, pois mostra facas, algo que não pode ocorrer num objecto classificado como 12A. No Reino Unido, para receber esta classificação, um filme não pode "cingir-se à violência", nem "colocar ênfase na lesão ou na representação de sangue". A British Board of Film Classification (BBFC) não pretende, porém, alterar a classificação do filme (12A). No entanto, em declarações à BBC, um porta-voz do comité admitiu que chegaram a equacionar classificá-lo com o rótulo "15". (...)”
[3] Conforme reportagem “Violência na TV não provoca comportamento violento da criança”, na internet no endereço: http://www.comciencia.br/reportagens/violencia/vio07.htm.
[4] Conforme o artigo “Sobre a mídia, a infância e a adolescência”, dos psicólogos Fernando Falabella Tavares de Lima e Eliane Scherb no sítio
http://www.netpsi.com.br/artigos/98_midia_infancia.htm.
[5] Conforme consta em:
http://www.saudela.com/edicoes/2003/abril/principal.asp?send=pedagogia.htm.
[6] “Redução da Maioridade Penal – Uma questão ética”, disponível em alguns sítios na Internet.
[7] Conforme a investigadora Cecília Von Feilitzen, no texto “Crianças e Tv: perigos de uma coexistência desregrada” constante no endereço
www.saudelar.com/edicoes/2003/abril/principal.asp?send=pedagogia.htm
[8] Em http//www.ufrgs.br/psiq/vio_impa.html
[9] Idem.
[10] Portaria baixada nos autos 2006.061.006391-2, em procedimento com respeito ao contraditório e à ampla defesa, nos termos da Resolução 30/06 do Conselho da Magistratura do TJ-RJ. Sobre o tema, estão publicados na internet os seguintes trabalhos deste autor: “O Edifício da Proteção Integral Precisa de Portaria – sobre a edição de portarias normativas pelo Juiz da Infância e da Juventude” (http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9632), “É possível a edição de portarias normativas pelo Juiz da Infância e da Juventude” (http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.19733) e “Roteiro Básico para Edição de Portaria Normativa Pelo Juiz da Infância e da Juventude com base na Resolução 30/06 do Conselho da Magistratura do Rio de Janeiro” (http://www.clubjus.com.br/cbjur.php?artigos&ver=2.20086&hl=no).
[11] Folha online de 12/08/08. Declarações ao jornalista Miguel Arcanjo Prado.
Serventuário de Justiça do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, http://denilson_araujo.blog.uol.com.br/
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: DENILSON CARDOSO DE ARAúJO, . Cavaleiro das Trevas Explode a Classificação Indicativa Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 set 2008, 22:10. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/14773/cavaleiro-das-trevas-explode-a-classificacao-indicativa. Acesso em: 26 dez 2024.
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