SUMÁRIO: 1. Introdução; 2. Da violência doméstica e familiar contra a mulher; 3. Da assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar; 4. Do procedimento policial; 5. Das medidas protetivas; 6. Do procedimento judicial cível ou criminal decorrente da prática de violência doméstica e familiar; 7. Das alterações promovidas no Código de Processo Penal; 8. Das alterações promovidas no Código Penal; 9. Das alterações promovidas na Lei de Execuções penais – LEP (Lei nº 7.210/84); 10. Da conclusão.
1. INTRODUÇÃO.
Sancionada a lei que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher de nº 11.340[1], de 07 de agosto de 2006 (publicada no D.O.U., de 08.08.2006), com uma vacatio legis de 45 dias, ou seja, entrará em pleno vigor no dia 22.09.2006.
Referida Lei foi apelidada pelo Presidente da República de Lei Maria da Penha em homenagem à biofarmacêutica Maria da Penha Maia Fernandes, personagem de uma triste história de violência doméstica ocorrida no Ceará/CE, em 1983, que teve repercussão mundial, em virtude da morosidade da Justiça Cearense no julgamento do homicídio tentado, praticado pelo colombiano naturalizado brasileiro Marco Antonio Heredia Viveros, cônjuge de Maria da Pena[2].
A Lei traz um corpo de 46 artigos, definindo violência doméstica e familiar contra a mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica contra a Mulher, além de estabelecer medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar, promover alterações no Código Penal e Processual Penal, bem como na Lei de Execuções Penais, atuação diferenciada da Autoridade Policial e do Ministério Público, podendo assim ser denominada de “ESTATUTO DA MULHER”, em homenagem ao modismo dos “estatutos”.
O objetivo principal do presente artigo será analisar os aspectos de Direito Penal e Processual Penal, indicando as inovações, visando despertar no leitor o interesse sobre o tema “violência doméstica” que há muito tempo vem sendo objeto de pesquisas e estudos pelos criminalistas do mundo inteiro.
2. DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER
A violência contra a mulher é, basicamente, sinônimo de violência doméstica. É claro que há muitas outras situações de violência enfrentadas pelas mulheres ainda hoje, no Brasil e no resto do mundo, mas a violência doméstica é a mais ampla e a mais preocupante delas.
Como primeira crítica, pode-se dizer que o legislador andou mal quando limitou os dispositivos da Lei Maria da Penha à violência doméstica, que foi definida no art. 5º, como sendo, basicamente, a violência ocorrida no âmbito da unidade doméstica (residência do casal), no âmbito da família ou em qualquer relação íntima de afeto, onde haja convivência do agressor com a ofendida, independentemente de coabitação.
Significa dizer que a violência do tipo lesão corporal, sofrimento físico, tortura (física ou psíquica), ameaça, cárcere privado, dano moral ou patrimonial, crimes sexuais que forem praticados fora das hipóteses indicadas no artigo 5º (violência doméstica), ou seja, em via pública, em estabelecimentos comerciais, em transportes coletivos (ônibus, metrô, avião etc), em penitenciárias, nos órgãos públicos, empresas privadas e etc., não se aplicará a Lei em comento.
Neste diapasão, se todos os crimes praticados contra a mulher, independentemente de serem no âmbito doméstico, fossem abrangidos pela Lei Maria da Penha, certamente teríamos um resultado mais positivo, visto que já existe um tratamento diferenciado na apuração destes crimes que, em regra, é feito pelas Delegacias de Atendimento às Mulheres – DEAM’s, as quais totalizam um número aproximado de 340 em todo o país [3]. Assim, seria mais viável que tais delitos fossem julgados pelos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
A Lei em exame criou a seguinte problemática: o crime de estupro, ou qualquer outro, praticado pelo marido contra a mulher, em ambiente familiar, será julgado pelos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher[4], enquanto o mesmo crime de estupro, ou qualquer outro, praticado contra a mulher por um colega de trabalho, no ambiente de trabalho ou fora dele, será julgado pela Justiça Comum (Juiz criminal ou Juizados Especiais Criminais).
Outro problema é que a Lei não dá a solução para os casos de violência doméstica recíproca, em que a mulher também venha agredir o homem. Será que haverá desmembramento do processo? Certamente que não, pois, neste caso, a melhor solução é aplicar as regras do Art. 76 do Código de Processo Penal, que regula a competência pela conexão ou continência, visto que, do contrário, seria necessário instaurar-se dois procedimentos, um inquérito policial para apurar o delito contra a mulher, que seria encaminhado ao Juizado de Violência Doméstica contra a Mulher e outro (Inquérito Policial ou Termo Circunstanciado) para encaminhar ao juiz criminal ou aos Juizados Especiais Criminais, para julgar a violência praticada pela mulher contra o homem.
Como dito anteriormente, a caracterização de violência doméstica e familiar contra a mulher encontra definição no art. 5º da lei sub examinem, sendo que no seu art. 7º, indica, em seus incisos, as formas de tais violências, como sendo:
I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;
II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;
III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;
IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;
V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria. (negrito nosso)
Após definir a violência doméstica e familiar contra a mulher, o legislador dedica os Capítulos I, II e III, do Título III, para tratar das medidas assistenciais, conforme passamos a analisar.
3. DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR
Em virtude do alto índice de criminalidade contra a mulher, especialmente de natureza doméstica, o legislador faz recomendação à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios, que adotem, de forma integrada, medidas de prevenção para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher (art. 8º), entre elas, a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação[5].
Chama a atenção ainda a orientação disposta no inc. V do art. 8º, no que se refere à necessidade da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, promoverem e realizarem campanhas educativas de prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres, bem como a do inc. IX, dispondo sobre o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, à eqüidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher.
Também é interessante a medida assistencial do inc. II, do art. 9º, que dispõe sobre a manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses. Pergunta-se, qual é a responsabilidade do empregador, cuja empregada esteja envolvida em algum tipo de violência familiar, para guardar a vaga (vínculo trabalhista) por um período de seis meses no caso de necessidade de afastamento do seu local de trabalho? Terá o empregador algum subsídio do Estado para manutenção desta vaga? Ele terá que pagar seis meses de trabalho à empregada afastada? Será que tal medida não irá desestimular a contratação de mulheres? Certamente esse dispositivo não agradará a todos, especialmente aqueles empresários que davam prioridade na contratação da mão de obra feminina.
Ainda dentro das Medidas Assistenciais, o Legislador no Capítulo III dispôs sobre o Atendimento pela Autoridade Policial, que deverá adotar algumas providências legais, nas hipóteses da iminência (caráter preventivo) ou da prática (caráter repressivo) de violência doméstica e familiar contra a mulher (art. 10), inclusive quando do descumprimento de medidas protetivas, já implementadas (parágrafo único do art. 10), entendendo-se como tais, as providências indicadas nos incisos do art. 11, conforme abaixo exposto:
I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário;
II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal;
III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida;
IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar;
V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis.
As garantias dos incisos I (proteção policial) e III (fornecimento de transporte à vítima e seus dependentes), são garantias que nem sempre poderão ser implementadas[6], não por descaso das Autoridades Policiais, mas pela falta de pessoal nos quadros das polícias civis ou, no caso do inc. III, a falta de verba ou de viaturas policiais para garantir transporte à ofendida e seus dependentes. As demais garantias são perfeitamente possíveis e viáveis para todas as Delegacias do país.
4. DO PROCEDIMENTO POLICIAL
Na apuração dos crimes com violência doméstica contra a mulher, dispõe o Art. 12 que:
Art. 12. Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:
I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada;
II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias;
III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência;
IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames periciais necessários;
V - ouvir o agressor e as testemunhas;
VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele;
VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público.
§ 1o O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá conter:
I - qualificação da ofendida e do agressor;
II - nome e idade dos dependentes;
III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida.
§ 2o A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1o o boletim de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida.
§ 3o Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde.
Algumas das disposições do Art. 12 tratam-se de normas repetitivas no ordenamento jurídico brasileiro, pois, com exceção do inc. III, que dispõe sobre a remessa, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, de expediente apartado ao juiz, com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência, as demais providências, encontram-se bem delineadas no Código de Processo Penal.
Uma leitura desatenta do caput do artigo 12 e do seu inc. I, pode levar a interpretação de que todos os crimes envolvendo violência doméstica familiar contra a mulher seria de ação penal pública condicionada à representação, visto que exige da Autoridade Policial tomar a termo a representação da ofendida. Tal interpretação é reforçada pela leitura do art. 16, quando dispõe que: “nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público”. (negritei)
Se assim fosse os crimes de ação penal privada, previstos no Código Penal, tais como injúria, difamação, calúnia, estupro e atentado violento ao pudor nas suas formas simples, passariam a exigir representação, visto que são condutas que se praticadas nas hipóteses previstas no art. 5º (unidade doméstica, âmbito familiar, relação íntima de afeto entre companheiros), se amoldam perfeitamente às formas de violência doméstica e familiar, previstas no art. 7º, da mesma Lei (violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral).
Ocorre essa interpretação não pode vingar, visto que criaria-se uma situação esdrúxula, onde um delito de estupro se praticado nas hipóteses de violência doméstica e familiar, seria de ação penal pública condicionada à representação e o mesmo crime praticado fora dessa hipótese, seria de ação penal privada. Assim, melhor interpretação é aquela que não houve alteração dos tipos penais quanto à ação penal.
Outra observação que se faz, é que o legislador, nos crimes caracterizados como violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena cominada, não serão mais apurados por Termo Circunstanciado, conforme previsto na Lei nº 9.099/95 e sim por inquérito policial, visto que o inciso VII, do art. 12, determina o encaminhamento do inquérito policial, no prazo legal, ao juiz e ao Ministério Público. Significa dizer que ocorrendo um delito contra a mulher, no interior do ambiente familiar (injúria, difamação, ameaça, etc.), mesmo com pena inferior a dois anos, deverá a Autoridade Policial instaurar inquérito policial (mediante portaria ou Auto de Prisão em flagrante), cujo prazo de conclusão será o mesmo previsto no Código de Processo Penal, ou seja, para réu preso, dez dias e para réu solto, trinta dias.
Ressalte-se que o art. 41 proíbe a aplicação da Lei 9.099/95, com a seguinte dicção: “Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995”(negritei). Afastou a Lei a competência dos Juizados Especiais Criminais para julgamento de crimes contra mulher, com pena inferior a dois anos, que forem praticados no ambiente familiar (violência doméstica), sem promover a alteração na própria Lei dos Juizados Especiais Criminais que define o crime de menor potencial ofensivo como sendo as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa (art. 61, com as alteração promovida pela Lei nº 11.313/06).
Assim sendo, chegando à Delegacia a notitia criminis de um delito com pena inferior a dois anos (menor potencial ofensivo), em situação flagrancial, deverá a Autoridade Policial lavrar o Auto de Prisão em Flagrante (e não Termo Circunstanciado) e no prazo de 10 (dez) dias remeter à Justiça e ao Ministério Público. Em se tratando de crime punido com pena de detenção ou prisão simples (só para as contravenções penais) nos termos do art. 322, do Código de Processo Penal, deverá a Autoridade Policial arbitrar a fiança e colocar o autuado em liberdade imediatamente, visto que a Lei não proibiu o instituto da fiança, como fez no Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/2003). Veja que se a intenção do legislador foi a de manter o agressor preso, deveria ter proibido o instituto da fiança na esfera policial para os casos de violência doméstica contra a mulher. Se a Autoridade Policial constatar a necessidade de manutenção da prisão do agressor, deverá representar ao juízo criminal a sua prisão preventiva.
Importante ainda ressaltar que os crimes de lesões corporais leves e lesões culposas, em relação à ação penal, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, passou a ser de ação penal pública incondicionada, voltando à situação antes da Lei nº 9.099/95, que no seu artigo 88, passou a exigir representação[7]. Significa dizer que temos agora os delitos de lesões corporais leves ou culposas com dois tipos de ação penal. Se for com violência doméstica é pública incondicionada de competência dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (ou juiz criminal, enquanto não implementados). Se for fora dos casos de violência doméstica será de ação penal condicionada à representação e de competência dos Juizados Especiais Criminais.
Por fim, o novel diploma legal trouxe uma outra modalidade de identificação compulsória que não encontra identidade na Lei 10.054/2000, quando no art. 12, inc. VI, dispôs que a Autoridade Policia deverá ordenar a identificação do agressor, independentemente de já encontrar-se identificado civilmente, constituindo-se assim, mais uma hipótese da exceção prevista no Art. 5º, inc. LVIII da Constituição Federal que prevê que “o civilmente identificado não será submetido a identificação criminal, salvo nas hipóteses previstas em lei”.
5. DAS MEDIDAS PROTETIVAS
A lei prevê dois gêneros de medidas protetivas de urgência, relacionadas à pessoa do réu (art. 22) e à pessoa da ofendida (art. 23 e 24), sendo que a concessão de tais medidas, nos termos do § 1º do art. 12, somente será possível se houver pedido da ofendida ou do Ministério Público[8], nos termos do § 1º do art. 12, que será instruído com boletim de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis, admitindo-se como meio de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais ou postos de saúde (§ 2º e 3º do art. 12).
As medidas protetivas de urgência, relacionadas à pessoa do agressor, estão indicadas nos incisos do art. 22 da Lei, conforme abaixo colacionados:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;
c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;
IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
O rol de medidas acima indicado não é taxativo, pois o § 1º do artigo 22, dispõe que: “As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público”.
A medida do inc. I do art. 22, quando se tratar de policial, em determinados casos, será flagrantemente grave, pois, atualmente com os ataques do Primeiro Comando da Capital – PCC, contra policiais do Estado de São Paulo, retirar a sua arma, seria o mesmo que jogá-lo na cova dos leões. Ademais, não é só a defesa do policial que está em jogo, a sociedade também fica prejudicada, pois o Estado lhe confere a autorização para andar armado com vistas a lhe garantir a pronta ação a qualquer hora do dia ou da noite, quando da ocorrência de delitos.
Segundo a Lei de Regência, o Juiz poderá, para implementação das medidas protetivas de urgência, fazer uso da força policial (art. 22, § 3º e 4º), bem como de aplicação das “astreintes” previstas no art. 461, § 5º e 6º do CPC, ou seja, determinar, de ofício ou a requerimento, a imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva.
Por outro lado, as medidas protetivas de urgência, relacionadas à ofendida, estão indicadas no art. 23, que autoriza o juiz a:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento[9];
II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;
III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;
IV - determinar a separação de corpos.
Além dessas medidas, pode ainda o juiz, nos termos do art. 24, determinar liminarmente, entre outras:
I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.
Com o intuito de assegurar os direitos das pessoas de boa-fé ou impedir que pessoas de má-fé, em conluio com o agressor, venham a dilapidar o patrimônio familiar, o legislador dispôs no parágrafo único do art. 24, a necessidade do juiz oficiar aos cartórios competentes, as medidas indicadas nos incisos II e III do art. 22.
6. DO PROCEDIMENTO JUDICIAL CÍVEL OU CRIMINAL DECORRENTE DA PRÁTICA DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER.
A Lei inovou com a figura dos JUIZADOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER, competentes para julgamento de causas cíveis e criminais, decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher (ver art. 14), sendo que a competência jurisdicional será fixada conforme opção da vítima, podendo ser o local de seu domicílio, de sua residência, do lugar do fato em que baseou a demanda ou do domicílio do agressor (art. 15).
Como dito anteriormente, o legislador afastou a competência dos Juizados Especiais Criminais (art. 41) para julgamento dos crimes contra a mulher praticados com violência doméstica e familiar, independentemente da pena prevista. Felizmente, para que tais delitos não ficassem impunes, o legislador estabeleceu no art. 33, nas disposições transitórias, a competência provisória das varas criminais para julgarem causas cíveis e criminais, praticados contra a mulher com violência doméstica, enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
Assim, entrando em vigor a Lei, os crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, serão apurados através de inquérito policial e remetidos às varas criminais, até a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher.
No art. 16, o legislador trouxe o instituto da renúncia para a representação criminal, sendo que nos termos do art. 107, inc. V, do Código Penal, renúncia é causa de extinção de punibilidade, prevista para a queixa crime, ou seja, até então a renúncia somente era possível nos casos de crimes de ação penal privada.
Ressalte-se que desde a Lei nº 9.099/95, o legislador previu a renúncia para os crimes de ação penal condicionada à representação e ação penal privada, nos casos de composição de danos, que se homologada, constitui renúncia ao direito de queixa ou de representação (art. 74 e seu parágrafo único da Lei nº 9.099/95).
A renúncia tratada no art. 16 da lei em estudo, somente poderá ocorrer perante o juiz que marcará audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.
Necessário dizer que quase todos os casos envolvendo crimes contra a mulher, como violência doméstica, as ofendidas, apesar do registro da ocorrência policial, retornavam à Delegacia renunciando expressamente ao direito de queixa, nos casos de crimes de ação penal privada ou retratavam-se da representação, nos casos de crimes de ação penal pública condicionada à representação, o que era encaminhado à Justiça, que arquivava os procedimentos penais.
Com a Lei 11.340/06, mesmo havendo renúncia na delegacia ou retratação da representação (agora a lei fala em renúncia), deverá a Autoridade Policial encaminhá-las ao Judiciário, orientando a vítima que deverá comparecer em juízo (em face do que dispõe o inc. V do art. 11[10]) posteriormente para ratificar o seu desejo, quando então o juiz irá marcar uma audiência para tal finalidade, ou seja, confirmar se realmente é desejo da ofendida ver a impunidade do seu ofensor.
Não havendo interesse da vítima em dar prosseguimento na persecução penal, o Delegado de Polícia poderá deixar de instaurar inquérito policial e apenas encaminhar ao Judiciário as peças já produzidas na Delegacia.
Nas varas criminais, será garantido o direito de preferência, para o processo e o julgamento das causas envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher (parágrafo único do art. 33).
Percebe-se então que os Juizados da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher terão competência bastante abrangente, na medida em que decidirão sobre causas cíveis e criminais.
O Ministério Público também terá um papel muito importante, no combate à violência doméstica e familiar contra a mulher, pois quando não for parte, intervirá nas causas cíveis e criminais decorrentes destas violências, podendo requisitar força policial, serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social e de segurança, fiscalizar estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher, e adotar, de imediato, as medidas administrativas ou judiciais cabíveis, quando da constatação de irregularidades, além de cadastrar os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher (arts. 25 e 26 da Lei).
7. DAS ALTERAÇÕES PROMOVIDAS NO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL
O Art. 42 da Lei nº 11.340/2006, acrescentou no Código de Processo Penal (Decreto-Lei nº 3.689, de outubro de 1941) o inc. IV, no art. 313, dispondo sobre a possibilidade de decretação da prisão preventiva para aquele que praticou crime com violência doméstica e familiar contra a mulher, visando garantir a execução das medidas protetivas de urgência.
Significa dizer que, para se decretar a prisão preventiva do agressor, nas hipóteses de crimes com violência doméstica e familiar, exigem-se dois requisitos, o fumus comissi delicti[11] (ou fumus boni iuris), ou seja, a prova da existência do crime e indício suficiente de autoria (art. 312 do CPP) e o periculum libertatis ( periculum in mora), qual seja, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência, tratadas pela lei.
Sendo que, ainda em relação ao periculum libertatis, indicado na lei (garantir a execução das medidas protetivas de urgência), pode-se decretar a prisão preventiva do agressor, com base em outros requisitos previsto no art. 312 do CPP, quais sejam: garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal.
A prisão preventiva tratada pela Lei, além dos requisitos apontados acima, exige-se a instauração de inquérito policial ou instrução criminal (Art. 20), e que seja decretada de ofício pelos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, ou juiz criminal (enquanto não implementado os Juizados) por requerimento do Ministério Público ou mediante representação da Autoridade Policial.
Decretada a prisão preventiva do agressor, esta poderá ser revogada a qualquer tempo, se o juiz constatar que já não subsistem os motivos pelos quais foi decretada, podendo decretá-la novamente, se sobrevierem razões que a justifiquem (parágrafo único do art. 20 da Lei 11.340/06). Ressaltando que a vítima deverá ser notificada de todos os atos processuais relativos ao agressor, em especial da revogação da prisão preventiva ( art. 21).
8. DAS ALTERAÇÕES PROMOVIDAS NO CÓDIGO PENAL
O legislador, certamente, após tomar conhecimento através de estatísticas policiais, e constatar que o crime de lesões corporais é o de maior incidência como violência doméstica e familiar contra a mulher, não pensou duas vezes e, através do art. 44, aumentou a pena do § 9º do art. 129 do Código Penal, tornando-o uma espécie de lesão corporal qualificada, estabelecendo pena, in abstrato, de detenção de 3 (três) meses a 3(três) anos, para a “lesão praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade”. Até então a pena para este delito era de detenção de 6 (seis) meses a 1 (um) ano.
Ora, é sabido que aumentar a pena in abstrato não inibe a prática de crimes. Além disso, o delito continuou sendo punido com pena de detenção, o que o torna afiançável na esfera policial, ou seja, o agressor após ser preso em flagrante delito, será posto em liberdade, mediante o pagamento de fiança.
O mais interessante é que o legislador, através do art. 43 da Lei em exame, acrescentou na alínea “f” do art. 61 do Código Penal, como circunstância agravante, o fato do agressor praticar o crime com violência contra a mulher na forma da lei específica, sendo que em se tratando de lesões corporais, nos termos do § 9º do CP, com a nova redação dada, nenhum efeito surtirá, pois o juiz, ao apreciar um delito qualificado, não poderá agravar sua pena (na segunda fase da dosimetria da pena), utilizando-se da mesma circunstância que o qualificou, sob pena de ferir o princípio do ne bis in idem (uma pessoa não pode ser punida duas vezes pelo mesmo fato).
Por fim, ainda através do art. 44, da lei Maria da Penha, foi acrescentado no Código Penal, o § 11 no art. 129, estabelecendo uma causa de aumento de pena de um terçocontra pessoa portadora de deficiência ocorrer nas hipóteses previstas no § 9º (com sua nova redação), ou seja, contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade. Essa causa de aumento de pena terá influência na terceira fase da dosimetria da pena. se a lesão corporal praticada
9. DAS ALTERAÇÕES PROMOVIDAS NA LEI DE EXECUÇÕES PENAIS – LEP (Lei nº 7.210/84)
E para finalizar, no art. 45, o legislador acrescentou um parágrafo único no art. 152 da Lei de Execuções Penais ( Lei nº 7.210, de 11 de julho de 1984), estabelecendo que nos casos de aplicação de pena restritiva de direitos, na modalidade de limitação de fim de semana, “nos caos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação”. Ressaltando que o juiz aqui é o Juiz das Execuções Penais, exceto nos casos em que a comarca não contar com a pessoa do Juiz das Execuções Penais.
E já que se falou em pena restritiva de direitos, oportuno mencionar que a Lei sub examinem proíbe, no seu art. 17, a aplicação, nos casos de violência domestica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.
Com tal proibição, o legislador agiu em desconformidade com as “REGRAS DE TÓQUIO”, aprovada pelas Nações Unidas em 14 de dezembro de 1990, no 8º Congresso da ONU, que estabeleceu que as nações se comprometeriam à aplicação de Medidas não Privativas de Liberdade, visto que após vários anos de estudos, apurou-se que a pena privativa de liberdade não evita a reincidência.
Significa dizer que as penas restritivas de direitos que poderão substituir a pena de prisão, no caso de condenação por crime com violência doméstica e familiar contra a mulher ficam limitadas às penas de prestação de serviço à comunidade ou entidade pública (art. 46 do CP), a de limitação de fim de semana (art. 48 do CP) e a interdição temporária de direitos na modalidade de proibição de freqüentar determinados lugares ( art. 47, inc. IV, do CP), pois as demais penas restritivas de direitos previstas no Código Penal, ou possuem natureza pecuniária, como é o caso do pagamento de cesta básica (no Código Penal se insere entre prestação pecuniária de outra natureza – inominada), perda de bens e valores e a multa substitutiva ou são incompatíveis com os crimes praticados com violência doméstica, como por exemplo as interdições temporárias de direito, previstos no art. 47, inc. I, II e III (proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo; proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público; e, suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo).
10. DA CONCLUSÃO
Ante o que foi exposto, pode-se afirmar que o legislador quis dar maior proteção à mulher, criando uma justiça especial para julgar os delitos praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, criando medidas protetivas de urgência, algumas contra o agressor outras relacionadas com a pessoa da ofendida e seus dependentes, como é o caso das Casas-Abrigo e Centros de Atendimento Integral e Multidisciplinar, entretanto, em relação às questões de natureza penal e processual penal, deixou a desejar, pelos seguintes fatos:
a) Ao vedar a aplicação da Lei nº 9.099/95, aos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena cominada, o legislador vem determinar a instauração de Inquérito Policial e não Termo Circunstanciado retirando a celeridade da persecução criminal, fato que gerará prejuízo à vítima, bem como impedindo a aplicação dos institutos da composição dos danos, transação penal ou suspensão condicional do processo, institutos que evitam a prisão de pessoas que praticaram crimes de menor potencial ofensivo.
b) A vedação de aplicação da Lei nº 9.099/95 tornou os delitos de lesões corporais leves ou lesões culposas de ação pública incondicionada quando praticados contra a mulher em situação de violência doméstica e familiar, criou-se assim, uma situação esdrúxula, pois tais crimes, se praticados sem violência domestica contra a mulher, serão de ação penal pública condicionada à representação e de competência dos Juizados Especiais Criminais.
c) Nos casos de prisão em flagrante, como não há nenhuma limitação ou impedimento de concessão de fiança, os delitos praticados no âmbito familiar, em regra: lesões corporais (art. 129, § 9 do CP); ameaça (art. 147, do CP); crimes contra a honra (calúnia, difamação e injúria, art. 138, 139 e 140 do CP), por serem punidos com pena de detenção, permite a concessão de fiança na Delegacia de Policia, pela Autoridade Policial. O mesmo ocorrendo com a contravenção de vias de fato (art. 21 do Decreto-Lei 3688/41), ou seja, se a intenção do legislador foi a manter o agressor preso, “o tiro saiu pela culatra”, visto que não lembrou do art. 322 do Código de Processo Penal. A saída para manutenção do autuado preso, será a Autoridade Policial representar pela prisão preventiva.
Nos demais crimes como o estupro (art. 213 do CP), atentado violento ao pudor (art. 214 do CP), cárcere privado (art. 148), tortura (Lei 9.455/97), praticados contra a mulher com violência doméstica e familiar, será possível manter o agressor preso, visto que não admitem fiança na Delegacia, pois são punidos com pena de reclusão, sendo afiançável somente no judiciário.
d) A Lei não definiu sobre a competência jurisdicional quando se tratar de agressões recíprocas fazendo-se necessário utilizar o do critério da competência por conexão, prevista no art. 76 do CPP, evitando-se que a Autoridade Policial tenha que instaurar procedimentos apartados, para apurar as lesões praticadas pelo homem e as praticadas pela mulher, bem como que tais procedimentos sejam julgados por juizes diferentes.
e) a prisão preventiva do agressor, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, poderá ser decretada de ofício, ou a pedido do Ministério Público ou da Autoridade Policial, ressaltando-se a exigência dos requisitos fumus comissi delicti e periculum libertatis, previstos no Código de Processo Penal, trazendo a lei um requisito especial: garantir a execução das medidas protetivas de urgência.
f) as alterações promovidas no Código Penal são inexpressíveis, visto que tornar qualificado o delito de lesões corporais praticadas com violência doméstica e familiar, aumentando sua pena in abstrato, não será suficiente para inibir a prática desses crimes contra a mulher. Além disso, considerar a mesma circunstância qualificadora, como circunstância agravante (art. 61, “f”, do CP), demonstra que o legislador esqueceu-se do princípio ne bis in idem, pelo qual não se pode punir uma pessoa duas vezes pelo mesmo fato.
g) impedir a substituição da pena de prisão por penas de cesta básica, prestação pecuniária ou multa demonstra que o legislador agiu em desconformidade com as “REGRAS DE TÓQUIO”, aprovada pelas Nações Unidas em 14 de dezembro de 1990, no 8º Congresso da ONU, que estabeleceu que as nações se comprometeriam a aplicação de Medidas não Privativas de Liberdade, visto que após vários anos de estudos, apurou-se que a pena privativa de liberdade não evita a reincidência. Assim, com a nova lei, as penas restritivas de direitos que ainda poderão ser aplicadas em substituição a pena de prisão são: a prestação de serviço à comunidade ou entidade pública; a limitação de fim de semana e a interdição de direito na modalidade de proibição de freqüentar determinados lugares.
Por fim, sabe-se que a intenção do legislador foi boa, entretanto a forma como legislou tornou a Lei Maria da Pena inexeqüível e ineficaz em alguns aspectos, sendo que somente o tempo demonstrará os resultados de sua aplicação, fazendo-se necessário que as instituições públicas, tais como o Judiciário, o Ministério Público, as instituições de Segurança Pública estejam alinhavados nessa luta contra a violência doméstica e familiar contra a mulher e que os “operadores do direito” façam a melhor interpretação da lei, no sentido de atender os anseios das mulheres vítimas de violência doméstica, delito de repugnância internacional.
Artigo publicado no IBCCRIM: COIMBRA, Valdinei Cordeiro. Aspectos criminais da Lei nº 11.340, de 08.08.2006, que trata da violência doméstica e familiar contra a mulher. Disponível na internet www.ibccrim.org.br, 12.09.2006.
[1] Texto integral da Lei disponível no site: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11340.htm
[2] O caso Maria da Pena pode ser acessado através do site: http://www.mulheresnobrasil.org.br/pdf/PMB_Cap8_Reportagem.pdf
[3] Dado obtido através do Guia para prevenção do crime e da violência, disponível em: http://www.mj.gov.br/senasp/prevencao/prevencao_guia.htm
[4] Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher foi uma inovação trazida pela Lei no seu art. 14, com competência para julgar causas cíveis e criminais decorrentes da prática de violência doméstica (art. 13).
[5] Segundo a experiência nacional e as avaliações internacionais pode-se afirmar que a violência contra a mulher é enfrentada com muito mais eficiência quando se estrutura uma rede institucional de vários serviços e entidades. Assim, em cada município, deve-se articular esta rede envolvendo as Delegacias Especializadas, as Polícias Civil e Militar, o Corpo de Bombeiros,
o Instituto Médico Legal, os serviços de proteção às mulheres vitimadas, como Casas-abrigo, a rede de saúde pública (postos e hospitais), a Defensoria Pública, os centros de referência para tratamento psicológico, os departamentos municipais de habitação, as escolas, as universidades, os órgãos de imprensa, ONGs etc., de tal forma que se construa uma política comum para o enfrentamento do problema e que cada agente público, instituição ou serviço saiba o que se espera deles e o que devem fazer quanto ao tema. Iniciativas isoladas e programas solitários se esgotam rapidamente sem que se criem novas rotinas institucionais e sem que se consolide uma conduta pública de enfrentamento do problema. (Guia para prevenção do crime e da violência, disponível em: http://www.mj.gov.br/senasp/prevencao/prevencao_guia.htm).
[6] Nas grandes capitais, onde as DEAM’s estão bem estruturadas, as providências do art. 11, são perfeitamente possíveis, entretanto nas Delegacias dos Municípios interioranos, onde a Autoridade Policial conta com uma viatura policial e apenas dois ou três policiais, incluindo um escrivão de policia para apurar todo o tipo de crime que chegam à Delegacia, entre eles, os crimes de violência doméstica contra a mulher, torna-se impossível a implementação de tais providências.
[7] Lei nº 9.099/95, Art. 88. Além das hipóteses do Código Penal e da legislação especial, dependerá de representação a ação penal relativa aos crimes de lesões corporais leves e lesões culposas.
[8] Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.
[9] Atualmente como exemplo de proteção à mulher vítima de violência doméstica, temos as CASAS DE ABRIGO, espaços reservados e protegidos, com endereço sigiloso, que prestam atendimento multiprofissional e multidisciplinar (social, psicológico, médico e jurídico) a essas mulheres, sendo que em meados de 2003 já existiam, no país, 75 instituições em funcionamento. Um número muito pequeno para as dimensões do problema, mas, ainda assim, significativo. Os estudos disponíveis demonstram que os abrigos para mulheres vítimas da violência doméstica têm se constituído em recursos importantes de proteção e amparo às vítimas, fazendo-se necessário que as prefeituras se organizem no sentido de criar ou adotar políticas públicas de implementação de Casas de Abrigo, pois elas têm salvado mulheres ameaçadas de morte pela violência perpetrada por seus maridos e companheiros.
[10] Art. 11, inc. V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis.
[11] As expressões fumus comissi delicti e periculum libertatis foram utilizadas por: LOPES JUNIOR, Aury. Sistema de investigação preliminar no processo penal. 3. ed. rev. ampl. atual. Rio de Janeiro: Editora Lúmen Juris, 2005, p. 307.
Mestre em Direito Penal Internacional pela Universidade de Granada - Espanha. Mestre em Direito e Políticas Públicas pelo UNICEUB. Especialista em Direito Penal e Processo Penal pelo ICAT/UDF. Pós-graduado em Gestão Policial Judiciária pela ACP/PCDF-FORTIUM. Professor Universitário de Direito Penal e Orientação de Monografia. Advogado. Delegado de Polícia da PCDF (aposentado). Já exerceu os cargos de Coordenador da Polícia Legislativa da Câmara Legislativa do Distrito Federal (COPOL/CLDF), Advogado exercendo o cargo de Assessor de Procurador-Geral da CLDF. Chefe de Gabinete da Administração do Varjão-DF. Chefe da Assessoria para Assuntos Especiais da PCDF. Chefe da Assessoria Técnica da Cidade do Varjão - DF; Presidente da CPD/CGP/PCDF. Assessor Institucional da PCDF. Secretário Executivo da PCDF. Diretor da DRCCP/CGP/PCDF. Diretor-adjunto da Divisão de Sequestros. Chefe-adjunto da 1ª Delegacia de Polícia. Assessor do Departamento de Polícia Especializada - DPE/PCDF. Chefe-adjunto da DRR/PCDF. Analista Judiciário do TJDF. Agente de Polícia Civil do DF. Agente Penitenciário do DF. Policial Militar do DF.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: COIMBRA, Valdinei Cordeiro. Aspectos criminais da Lei nº 11.340, de 08.08.2006, que trata da violência doméstica e familiar contra a mulher Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 24 out 2008, 13:09. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/15268/aspectos-criminais-da-lei-no-11-340-de-08-08-2006-que-trata-da-violencia-domestica-e-familiar-contra-a-mulher. Acesso em: 22 nov 2024.
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