O capítulo II, do Título I da Consolidação das Leis Trabalhistas, no qual o art. 62 está inserido, traz disposições referentes à jornada de trabalho, porém o artigo supracitado exclui os empregados que exercem atividade externa incompatível com a fixação de horário de trabalho e os gerentes, os diretores e chefes de departamento ou filial das proteções emanadas no dispositivo.
Há diversos posicionamentos sobre a eficácia e aplicabilidade do art. 62, dentre eles, uma corrente que defende a não recepção do artigo 62 da CLT, pois haveria uma afronta ao artigo 7º, XIII da Constituição Federal, o qual dispõe, in verbis, “a duração da jornada de trabalha não poderá exceder a oito horas diárias e quarenta e quatro horas semanais, facultada a compensação e a redução da jornada”, não mencionando, portanto, qualquer caso de exceção a tal limitação de duração de jornada. Ademais, o artigo 6º de nossa Carta Magna garante como direito social, dentre outros, o direito ao lazer.
Ademais, o Protocolo de San Salvador, o qual trata sobre direitos humanos em matéria de direito econômico, sociais e culturais e que fora ratificado pelo Brasil através do Decreto nº 3.321/99, dispõe em seu artigo 7º o seguinte: condições justas, equitativas e satisfatórias de trabalho.
Cabe salientar, ainda, que nosso sistema jurídico assegura que a interpretação das normas infraconstitucionais deve ser realizada à luz da Carta Magna, observando-se sempre os direitos e garantias individuais, em consonância com o princípio da supremacia constitucional.
Há no mínimo três fundamentos para a limitação da jornada de trabalho do obreiro: o de ordem fisiológica, o de ordem econômica e outro de ordem social. Todos convergem na proteção da dignidade da pessoa humana, e por fim, visam a disponibilidade de tempo razoável para que o empregado possua convívio familiar e para os compromissos sociais[1].
O direito ao lazer garantido por nossa Carta Magna impõe dos Poderes Públicos ações positivas no sentido de promover as condições necessárias para o efetivo cumprimento ao lazer, bem como, por possuir eficácia horizontal, limita a ação de particulares, pois esses estão obrigados a respeitá-los. O fato é que não se pode dar ao direito ao lazer como um mero conteúdo programático, nesse sentido Celso Bandeira de Melo expõe:
“não pode converter-se em promessa constitucional inconseqüente, sob pena de o Poder Público, fraudando justas expectativas nele depositadas pela coletividade, substituir, de maneira ilegítima, o cumprimento de seu impostergável dever, por um gesto irresponsável de infidelidade governamental ao que determina a própria Lei Fundamental do Estado.”[2]
É certo que a não imposição de controle da duração da jornada de trabalho nos casos enunciados no artigo 62 da CLT pode impor uma severa ofensa ao direito de lazer do obreiro. O direito ao lazer que inclui também tempo hábil para o convívio social é um instrumento da dignidade humana, essa por sua vez é um fundamento de nossa República conforme preceitua o artigo 1º, III da CF devendo ser protegido pelo estado, bem como deve ser respeitada pelos demais indivíduos. Nesse sentido manifesta-se a doutrina:
(...) resta evidenciado que o respeito à dignidade humana deve ser tomado como princípio supremo para todas as ações do Estado, cabendo ainda destacar que este princípio vincula também os particulares, impedindo que exerçam um direito com violação à dignidade essencial de outro ser humano. Qualquer ofensa à dignidade pessoal produzida em virtude de exercício de um direito acabe por transformá-lo em abusivo, privando aquele que atua dessa forma de qualquer apoio constitucional ou legal.[3]
Poderá, porém, o trabalhador recorrer à prestação jurisdicional para obstar possível lesão, e requerer uma sanção pecuniária caso o empregador imponha uma ameaça ou lesione o seu direito, ou no caso de dano já concretizado, poderá requerer uma indenização reparatória por dano moral causado[4].
Conclui-se, portanto, que é clara a possibilidade do empregador por em risco ou lesionar o direito ao lazer de seu empregado, tendo como fundamento para tal ação o artigo 62 da Consolidação das Leis Trabalhistas. Cabe ao judiciário, quando acionado, repelir tais ofensas e garantir a dignidade da pessoa humana, proporcionando a oportunidade de disposição de tempo hábil, ao trabalhador, para o convívio social e demais oportunidades de lazer, requisitos necessários para o desenvolvimento saudável de qualquer ser humano.
Bibliografia
1. NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional, 294 p. Trabalho não publicado
2. MELO, Celso Bandeira, RTJ 175/1212-1213 Apud NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional, 294 p. Trabalho não publicado
3. NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional, 294 p. Trabalho não publicado
4. CALVET, Amaral Otávio. Disponível em: http://www.calvo.pro.br/artigos/otavio_calvet/otavio_calvet_direito_ao_lazer.pdf
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