RESUMO: Após 14(quatorze anos) da promulgação e publicação do Código de Trânsito Brasileiro, a ausência de interesse das autoridades municipais no cumprimento da legislação no âmbito de suas circunscrições, contribuindo para o crescente número de acidentes de trânsito, justifica a intervenção do Ministério Público na Defesa dos Serviços de Relevância Pública.
PALAVRAS–CHAVE: Trânsito, Municipalização, Relevância Pública, Ministério Público.
1. INTRODUÇÃO
A Constituição de 1988 ao dispor sobre a organização político-administrativa da República Federativa do Brasil definiu os entes políticos, União, Estados, Distrito Federal e Municípios, fixando-lhes competências materiais e legislativas, no sentido de preservar-lhes a autonomia política, administrativa e financeira.
2. MUNICIPALIZAÇÃO DO TRÂNSITO: AUSÊNCIA E ATUAÇÃO DO PARQUET
No que concerne às competências atribuídas aos Municípios, em especial a organização dos serviços públicos locais e, notadamente a municipalização do trânsito nas cidades brasileiras, chama a atenção a ausência de interesse das autoridades municipais no cumprimento da legislação e normas de trânsito no âmbito de suas circunscrições.
Questão curiosa é a compreensão do significado de “interesse local”, a justificar o englobamento no referido conceito dos serviços públicos locais. No dizer de Hely Lopes Meirelles(2003):
Interesse local não é interesse exclusivo do Município; não é interesse privativo da localidade; não é interesse único dos munícipes. Se se exigisse essa exclusividade, essa privaticidade, essa unicidade, bem reduzido ficaria o âmbito da Administração local, aniquilando-se a autonomia de que faz praça a Constituição. Mesmo porque não há interesse municipal que não o seja reflexamente da União e do Estado-membro, como, também, não há interesse regional ou nacional que não ressoe nos Municípios, como partes integrantes da Federação Brasileira. O que define e caracteriza o “interesse local”, inscrito como dogma constitucional, é a predominância do interesse do Município sobre o do Estado ou da União.
Discorrendo sobre o tema, Sampaio Dória, leciona que “o entrelaçamento dos interesses dos Municípios com os interesses dos Estados, e com os interesses da Nação, decorre da natureza mesma das coisas. O que os diferencia é a predominância, e não a exclusividade”.
Corroborando os pensamentos dos ilustres doutrinadores, quanto aos reflexos de interesses entre os Entes federados, verifica-se que a Constituição normatizou no art. 22, inciso XI, como competência privativa da União legislar sobre trânsito e transporte, justificando o nascimento da Lei n. 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro. No entanto, referido diploma legal disciplina no art. 24 e incisos a participação dos Municípios, através de seus órgãos e entidades executivos de trânsito, no exercício de suas competências no âmbito de sua circunscrição.
A ausência de interesse das autoridades municipais no cumprimento da legislação e normas de trânsito no âmbito de suas circunscrições, repita-se, é patente, visto que, após 14 (quatorze) anos da promulgação e publicação do Código de Trânsito Brasileiro, o que se vê nos municípios brasileiros, principalmente nas “cidades do interior”, é a total ausência de aplicação das leis de trânsito, consubstanciada na prática em condutores de veículos sem permissão para dirigir, motociclistas sem o uso do capacete de segurança, excesso de passageiros, veículos na contra mão de direção, condutas muitas vezes justificadas pelo desconhecimento do código de trânsito ou sob o argumento de que nas “cidades do interior” é permitido.
Fala-se em autoridades municipais, pois não basta a adoção de medidas administrativas e elaboração de leis municipais por parte do chefe do Executivo, que atendam a normatização do quanto previsto no art. 24, do Código Brasileiro de Trânsito, sem a efetiva participação dos edis, representantes dos munícipes, no sentido de colaborar com a eficiência do serviço a ser implantado.
O assunto trânsito é polêmico. Tamanha a importância devida, que corriqueiramente notícias sobre o tema, em especial mortes violentas, são veiculadas nos meios de comunicação. Os acidentes de trânsito figuram com uma das causas que mais registram vítimas fatais no mundo, sem contar as vítimas com sequelas, sejam de natureza leve, grave ou incapacitante. Daí a amplitude do problema em escalas nacional, regional e local, caracterizando-se a questão como assunto de relevância pública a viabilizar a atuação do Ministério Público, notadamente o Estadual, na implantação da municipalização do trânsito nos Municípios.
Dados estatísticos, colhidos através de pesquisa realizada pela Confederação Nacional dos Municípios (CNM), revelam que a municipalização do trânsito é realidade em apenas 14%(quatorze por cento) das cidades brasileiras e, dentre os municípios integrantes da confederação 44%(quarenta e quatro por cento) noticiaram o desinteresse na municipalização.
Visando o atendimento das disposições gerais do Sistema Nacional de Trânsito, previstas no Código de Trânsito Brasileiro e, diante da omissão suscitada, é que o Ministério Público, destacando-se o do Estado de Sergipe, através de seus agentes ministeriais, legitimado pelo art. 129, II, da Constituição Federal, tem firmado Termos de Ajustamento de Conduta – TAC´s, no sentido de assegurar a municipalização do trânsito nos municípios, cuja efetivação do serviço não foi observada.
A medida adotada, qual seja: celebração de Termo de Ajustamento de Conduta para efetivar a implantação dos órgãos e/ou entidades de trânsito nos municípios que não dispõem, a exemplo do Município de Boquim, no Estado de Sergipe, consiste, ainda, na realização de concurso público para agentes de trânsito, aquisição de veículos, regulamentação dos meios de transporte coletivo e sinalização das vias de circulação, possibilitando a fiscalização de trânsito, autuação e aplicação das medidas administrativas cabíveis aos possíveis infratores.
3. CONCLUSÃO
Em que pesem as dificuldades apresentadas pelas autoridades municipais, especialmente a falta de recursos financeiros, a resistência à municipalização do trânsito tende a diminuir, ante o clamor da sociedade e a atuação persistente dos Ministérios Públicos Estaduais, visando precipuamente o comprometimento das autoridades na segurança viária dos munícipes.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Municipal Brasileiro. 13ª. ed. Malheiros: São Paulo, 2003.
SAMPAIO DÓRIA. “Autonomia dos Municípios”. Revista da Faculdade de Direito de São Paulo XXIV.
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 15. ed., rev., atual. e amp. São Paulo: Saraiva Siciliano S/A, 2011.
Brasil. Ministério da Justiça Departamento Nacional de Trânsito. Código de trânsito brasileiro(1997). Código de trânsito brasileiro: com as alterações da lei nº 10.350, de 21 de dezembro de 2001 e lei nº 10.517, de 11 de julho de 2002. Brasília, DF: DENATRAN, 2002.
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao.htm
http://www.denatran.gov.br/ctb.htm
http://www.cnm.org.br/
http://www.mp.se.gov.br/NoticiaExibir.aspx?id=5303
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