1 INTRODUÇÃO
Na seara penal, quando a infração deixar vestígios, necessário será a produção de prova técnica ou específica. É o que reza o art. 158 do Código de Processo Penal[1]:
Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.
Uma vez efetivada a perícia, incumbe ao magistrado cientificar as partes (defesa e acusação) para que se manifestem a respeito da conclusão exarada no laudo técnico.
Tal medida possibilita, teoricamente, a concretização dos princípios da ampla defesa e contraditório.
2 DESENVOLVIMENTO
Discorrendo sobre o tema, o professor Eugênio Pacelli[2] defende “que todas as provas devem se submeter ao contraditório, devendo também ser produzida diante de um juiz, na fase instrutória”.
Na mesma trilha o professor Gomes Filho[3]:
É imperativa a incidência dos princípios constitucionais do contraditório e do direito de defesa na prova pericial, de modo que a participação dos interessados é essencial também neste tipo de prova, seja através da possibilidade de críticas e pedidos de esclarecimentos em relação aos laudos já apresentados, seja pela formulação de quesitos antes da realização dos exames, bem como, com o advento da Lei 11690/2008, indicar assistente técnico.
Vale frisar que a doutrina[4] distingue contraditório formal e substancial. O primeiro efetiva-se com a simples participação das partes no processo, com a possibilidade de se expressar a respeito dos fatos que lhe são apresentados. O segundo, por sua vez, vai além, exigindo que os argumentos apresentados pelas partes tenham o condão de influenciar a decisão a ser proferida pelo Estado-Juiz.
Sendo assim, compete a magistrado decidir sobre todos e quaisquer fatos que lhe são dirigidos, rebatendo e apontando minuciosamente a ausência ou não de razoabilidade nas informações prestadas pelas partes.
Entretanto, se o magistrado, apesar de intimar as partes a respeito da conclusão exarada no laudo pericial, não tecer quaisquer considerações quanto às impugnações dirigidas contra a perícia, atentará, inegavelmente, contra a garantia preconizada na Constituição Federal, em seu art. 5º, LV, que assegura a todas as pessoas o direito ao contraditório substancial e a ampla defesa.
Ademais, não basta a mera participação da parte no processo; faz-se necessário a possibilidade dos arrazoados apresentados pelos sujeitos processuais terem o condão de influenciar na decisão a ser prolatada pelo juízo. A respeito do tema eis as lições de Fredie Didier Jr[5]:
A faceta básica, que eu reputo a formal, é a da participação; a garantia de ser ouvido, de participar do processo, de ser comunicado, poder falar no processo; (…) Há o elemento substancial dessa garantia. Há um aspecto, que eu reputo essencial, denominado, de acordo com a doutrina alemã, de “poder de influência”; (…) o contraditório não se implementa, pura e simplesmente, com a ouvida, com a participação; exige-se a participação com a possibilidade, conferida à parte, de influenciar no conteúdo da decisão. Como poderia o magistrado punir alguém, sem que lhe tenha dado a chance de manifestar-se sobre os fundamentos da punição, por exemplo, demonstrando que os fatos em que se baseia o magistrado ou não ocorreram ou não permitem a aplicação da sanção? Seria punir sem ouvir; seria condenar sem dar a chance de defesa. Não é possível a aplicação de qualquer punição processual, sem que se dê oportunidade de o “possível punido” manifestar-se previamente de modo a que se possa, de alguma forma, influenciar no resultado da decisão.
Assim também são os ensinamentos de Carlos Alberto Álvaro de Oliveira[6]:
Dentro dessas coordenadas, o conteúdo mínimo do princípio do contraditório não se esgota na ciência bilateral dos atos do processo e na possibilidade de contraditá-los, mas faz também depender a própria formação dos provimentos judiciais da efetiva participação das partes. Para isso, para que seja atendido esse mínimo, insta a que cada uma das partes conheça as razões e argumentações expendidas pela outra, assim como os motivos e fundamentos que conduziram o órgão judicial a tomar determinada decisão, possibilitando-se sua manifestação a respeito em tempo adequado.
Gozando do mesmo entendimento, citamos, ainda, o jurista Luiz Guilherme Marinoni, que, pontualmente, também defende o direito das partes de influenciarem a decisão a ser exarada pelo magistrado.
O direito das partes de influenciarem a decisão a ser prolatada pelo magistrado é uma conquista garantida pela Constituição de 88, que não pode ser afastada em razão de um juízo decisório já sedimentado pelas convicções íntima do agente público imparcial.
Cabe ao magistrado, segundo palavras de Cleber Lúcio de Almeida[7],
Tratar igualmente as partes é estar aberto aos seus argumentos e críticas, para, com elas e considerando a sua ótica sobre as questões de fato e de direito, alcançar a norma adequada para o caso submetido à apreciação do Poder Judiciário (o confronto de argumentos e provas favorece a eliminação de erros na reconstrução da situação fática submetida ao Judiciário e definição da norma jurídica adequada à sua adequada disciplina). No processo devem reinar condições gerais de simetria que excluam qualquer coação, a não ser a do melhor argumento.
Fica evidente, assim, que o magistrado não pode agir sem ouvir as partes, sob pena de desestabilizar o contexto democrático que envolve a relação processual.
Deste modo, a fim de garantir o diálogo no processo, e cumprir com a efetiva garantia de igualdade entre os sujeitos processuais, é de incumbência do magistrado oportunizar as partes o direito igualitário de acesso a construção pacífica da decisão judicial, direito este que só será efetivado mediante a motivação pormenorizada de todos os atos que lhe são submetidos a decisão.
Realizada estas considerações, pode-se afirmar que o ciclo da colheita da prova técnica-pericial somente se efetivará com a participação efetiva e incisiva das partes da relação processual.
3 CONCLUSÃO
A importância da prova técnica para a busca da verdade processual é indiscutível. Para alguns seria a verdadeira “rainha das provas”.
Contudo, sem a participação efetiva das partes na produção da prova técnica, não haverá a concretização dos princípios do contraditório (substancia e formal) e ampla defesa.
O magistrado, então, deve possibilitar que as partes se manifestem a respeito da prova produzida, deliberando, ao final, sobre todos e quaisquer questionamentos que lhe forem dirigidos.
Sendo assim, para a plena democratização da relação processual, faz-se necessário que todos os atores processuais efetivamente tenham a possibilidade de influenciar na decisão a ser proferida pelo Estado-Juiz.
4 REFERÊNCIA
DE ALMEIDA, Cleber Lúcio. A Legitimidade das Decisões Judicias no Estado Democrático de Direito. Extraído do sítio: DE ALMEIDA, Cleber Lúcio. A Legitimidade das Decisões Judicias no Estado Democrático de Direito.
DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. Salvador: Jus PODIVM. 8ª ed, 2007
JUNIOR, Aury Lopes. Direito Processual Penal. 10º ed. São Paulo: Saraiva, 2013
OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. Garantia do Contraditório In: TUCCI, José Rogério Cruz e Garantias constitucionais do processo civil. São Paulo: RT, 1999.
OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de Oliveira. Curso de Processo Penal. 8º ed., Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007.
SITE PLANALTO. DISPONÍVEL EM: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto lei/del3689compilado.htm.
[1]Extraído do sítio: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689compilado.htm. Acesso em: 01/03/2013.
[2] OLIVEIRA, Eugênio Pacelli de Oliveira. Curso de Processo Penal. 8º ed., Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 2007, p. 352.
[3] Apud JÚNIOR, Aury Lopes. Direito Processual Penal. 10º ed. São Paulo: Saraiva, 2013, p. 615.
[4] DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. Salvador: Jus PODIVM. 8ª edição. 2007, p. 42/43.
[5] DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. Salvador: Jus PODIVM. 8ª edição. 2007, p. 42/43.
[6] OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. Garantia do Contraditório In: TUCCI, José Rogério Cruz e Garantias constitucionais do processo civil. São Paulo: RT, 1999, p. 144.
[7] Extraído do sítio: http://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_75/Cleber_Almeida.pdf. DE ALMEIDA, Cleber Lúcio. A Legitimidade das Decisões Judicias no Estado Democrático de Direito. Acesso em: 02/03/2013.
Defensor Público Federal, com pós-graduação em Direito Público.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: AMARAL, Pablo Luiz. Prova técnica e o direito das partes de influenciarem no convencimento do magistrado na esfera penal Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 05 mar 2013, 06:30. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/34063/prova-tecnica-e-o-direito-das-partes-de-influenciarem-no-convencimento-do-magistrado-na-esfera-penal. Acesso em: 21 nov 2024.
Por: Gabrielle Malaquias Rocha
Por: BRUNA RAFAELI ARMANDO
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