RESUMO: O presente artigo analisa criticamente a política de encarceramento em massa no Brasil à luz das violações sistemáticas aos direitos fundamentais das pessoas privadas de liberdade. A partir de abordagem bibliográfica e empírica, articulada com referenciais filosóficos como Hobbes, Habermas e Foucault, evidencia-se que o sistema penal brasileiro atua sob uma lógica seletiva, punitivista e estruturalmente racista. A superlotação, a violência institucional, a precariedade das condições prisionais e a ausência de garantias mínimas configuram um quadro de inconstitucionalidade e violação da dignidade humana. O estudo também examina decisões judiciais relevantes, como a ADPF 347/DF, e iniciativas institucionais no Estado de Minas Gerais, destacando a importância de políticas públicas integradas para a superação desse modelo. Conclui-se que a efetividade dos direitos fundamentais no cárcere depende do compromisso do Estado com a justiça social, a legalidade e a humanização do sistema prisional.
Palavras-chaves: Encarceramento em massa. Direitos fundamentais. Sistema prisional. Violência institucional. Racismo estrutural.
ABSTRACT: This article critically analyzes the mass incarceration policy in Brazil in light of the systematic violations of the fundamental rights of people deprived of their liberty. Based on a bibliographical and empirical approach, articulated with philosophical references such as Hobbes, Habermas and Foucault, it is clear that the Brazilian penal system operates under a selective, punitive and structurally racist logic. Overcrowding, institutional violence, precarious prison conditions and the absence of minimum guarantees constitute a situation of unconstitutionality and violation of human dignity. The study also examines relevant judicial decisions, such as ADPF 347/DF, and institutional initiatives in the State of Minas Gerais, highlighting the importance of integrated public policies to overcome this model. It is concluded that the effectiveness of fundamental rights in prison depends on the State's commitment to social justice, legality and the humanization of the prison system.
Keywords: Mass incarceration. Fundamental rights. Prison system. Institutional violence. Structural racism.
O presente artigo analisa a política de encarceramento em massa no Brasil à luz da violação sistemática dos direitos fundamentais das pessoas privadas de liberdade. Utilizando abordagem teórica baseada na literatura filosófica, constitucional e criminológica, busca-se demonstrar como o sistema penal brasileiro reproduz desigualdades históricas e estruturais, operando com seletividade punitiva e ineficiência na proteção dos direitos humanos.
A Constituição Federal de 1988 consagrou um rol de garantias fundamentais que deveriam ser observadas indistintamente, inclusive no âmbito da execução penal. Contudo, a realidade das prisões brasileiras revela um cenário de superlotação, precariedade estrutural, violência institucionalizada e ausência de mecanismos eficazes de accountability estatal. Nesse contexto, destaca-se a criminalização da pobreza e a desproporcionalidade racial como pilares do modelo penal vigente.
Fundamenta-se esta análise em autores clássicos, como Thomas Hobbes, Michel Foucault e Jürgen Habermas, bem como em dados empíricos de órgãos oficiais e em decisões paradigmáticas do Supremo Tribunal Federal. Busca-se, com isso, contribuir para a compreensão crítica do fenômeno do encarceramento em massa, propondo alternativas que promovam uma política penal mais compatível com os preceitos de um Estado Democrático de Direito.
2.O ENCARCERAMENTO EM MASSA NO BRASIL: CONTEXTO E IMPLICAÇÕES JURÍDICO-SOCIAIS
O encarceramento em massa, fenômeno amplamente verificado na realidade brasileira, caracteriza-se pela adoção de políticas penais que priorizam a repressão e o aumento da população carcerária, em detrimento da garantia dos direitos fundamentais. Tal política tem como principais alvos pessoas negras, pobres, jovens e com baixa escolaridade, revelando um viés seletivo no funcionamento do sistema penal.
Dados divulgados pelo Relatório do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (RELIPEN) indicam que o Brasil conta com mais de 644 mil pessoas privadas de liberdade, número que supera em larga escala a capacidade oficial do sistema prisional, estimada em pouco mais de 480 mil vagas. Essa disparidade revela um quadro de superlotação estrutural, responsável por agravar as condições de vida dos apenados e inviabilizar qualquer política efetiva de ressocialização.
A seletividade penal manifesta-se especialmente na criminalização da pobreza, com a aplicação de medidas punitivas severas a condutas de baixa lesividade social, muitas vezes praticadas por indivíduos em situação de vulnerabilidade econômica. Além disso, há uma notória desigualdade racial na imposição das penas: às pessoas negras representam mais de 60% da população carcerária, embora constituam aproximadamente 56% da população brasileira, segundo dados do IBGE (2022).
Essa realidade revela uma política de controle social punitivo que aprofunda as desigualdades estruturais e contribui para a perpetuação de um ciclo de exclusão. A prisão, em vez de se constituir como instrumento de reabilitação e reintegração, transforma-se em espaço de degradação humana, onde se verifica a violação reiterada de direitos constitucionalmente assegurados, como a dignidade da pessoa humana e o devido processo legal.
A partir dessa constatação, torna-se indispensável uma análise crítica da política criminal vigente e da atuação do Estado no campo da execução penal, a fim de evidenciar as contradições entre o discurso jurídico-constitucional e a prática institucional.
3.A VIOLAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS NA EXECUÇÃO PENAL
A Constituição Federal de 1988 consolidou um extenso catálogo de direitos e garantias fundamentais, cuja aplicabilidade é imediata e universal, inclusive para os indivíduos privados de liberdade. Entretanto, o sistema penitenciário brasileiro revela uma persistente desconexão entre a normatividade constitucional e a realidade institucional. A execução penal, longe de cumprir seus objetivos legais e constitucionais, caracteriza-se por múltiplas formas de violação dos direitos fundamentais.
O artigo 5º da Carta Magna assegura o direito à liberdade, à integridade física e moral, à igualdade, ao contraditório e ao devido processo legal. Contudo, tais prerrogativas são constantemente desconsideradas no interior das unidades prisionais. A superlotação, a insalubridade, a escassez de recursos humanos e materiais, a ausência de assistência médica e jurídica adequada e a precariedade das instalações violam diretamente o princípio da dignidade da pessoa humana, erigido como fundamento da República (art. 1º, III, CF/88).
Estudos recentes do RELIPEN apontam que milhares de pessoas permanecem encarceradas sem sentença penal definitiva ou sem sequer saberem a duração de sua pena. Tal cenário configura grave afronta ao princípio do devido processo legal (art. 5º, LIV, CF), que exige, entre outros aspectos, julgamento célere, imparcial e justo.
A segurança jurídica, embora não expressamente destacada como direito autônomo na Constituição, é inerente ao Estado de Direito. A incerteza quanto ao tempo de reclusão e à legalidade das condições de cumprimento da pena gera profunda instabilidade jurídica, reforçando a sensação de abandono e descrença no sistema de justiça.
Diante desse panorama, a atuação do Estado revela-se insuficiente para garantir os direitos básicos dos custodiados. Ao negligenciar o cumprimento das normas constitucionais e infraconstitucionais, o Estado contribui para a legitimação de um modelo penal incompatível com os princípios do constitucionalismo contemporâneo. A prisão, que deveria ser exceção, torna-se instrumento de exclusão e violação sistemática, reproduzindo desigualdades sociais e raciais sob a forma de punição estatal.
4.FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS DA CRÍTICA AO SISTEMA PENAL
A crítica ao sistema penal brasileiro, especialmente em relação ao encarceramento em massa e à violação dos direitos fundamentais, pode ser significativamente enriquecida por aportes filosóficos que auxiliam na compreensão das dinâmicas de poder, controle social e legitimidade do Estado. Autores como Thomas Hobbes, Jürgen Habermas e Michel Foucault contribuem com perspectivas que revelam a complexidade da relação entre o Estado, a norma jurídica e os indivíduos encarcerados.
Thomas Hobbes, em sua obra Leviatã, parte da premissa de que os indivíduos, por serem iguais em natureza, vivem sob constante ameaça uns dos outros em estado de natureza, levando-os a buscar um pacto social com o objetivo de garantir a segurança e a ordem por meio de um soberano. Contudo, esse pacto é condicional: ao abrir mão de sua liberdade, o indivíduo espera em troca proteção. Quando o Estado não cumpre sua função de garantir direitos mínimos, como a dignidade, a segurança jurídica e a integridade física dos presos, rompe-se o pacto hobbesiano. Conforme Hobbes alerta no capítulo XIII de sua obra, se os indivíduos não forem protegidos, acabam por “atacar para não serem atacados”. Essa lógica, aplicada ao sistema carcerário, mostra como a negligência estatal em garantir direitos pode fomentar o fortalecimento do crime organizado, o qual passa a exercer funções que deveriam ser do Estado, como proteção, ordem e regulação interna.
A ausência de um agente estatal eficaz na proteção dos direitos fundamentais dentro do cárcere não só fere o pacto social, mas também reforça a deslegitimação do poder soberano, levando os presos a buscar representação e segurança em estruturas paralelas, como as facções criminosas. Nessa dinâmica, o próprio Estado contribui para o agravamento da criminalidade, ao invés de reduzi-la, ao abandonar aqueles que deveria proteger, mesmo em situação de privação legal da liberdade.
Complementando essa análise, Jürgen Habermas, ao refletir sobre o Estado Democrático de Direito, enfatiza a necessidade de um sistema jurídico que se afaste da lógica autoritária e promova a participação racional dos cidadãos na construção das normas. Para Habermas, o Estado deve ser o mediador do conflito e o garantidor dos direitos de todos, inclusive dos sujeitos em cárcere, os quais, embora excluídos da liberdade de locomoção, permanecem sujeitos de direitos. A partir de uma perspectiva garantista, a prisão não deve significar a perda da cidadania, mas sim a aplicação de uma pena com respeito à dignidade humana e ao devido processo legal. A realidade, entretanto, é inversa: os presos são invisibilizados, desumanizados e privados de direitos básicos, como acesso à saúde, educação e justiça, contrariando os princípios do Estado de Direito.
A crítica de Michel Foucault também é essencial para compreender o papel disciplinar do sistema prisional. Em Vigiar e Punir, o autor revela que a prisão moderna não surge como instrumento de reabilitação, mas como uma forma de controle dos corpos, uma técnica de dominação. A punição, que antes era pública e violenta, torna-se silenciosa, contínua e disciplinadora. A prisão não apenas retira a liberdade, mas redefine subjetividades, molda comportamentos e reforça desigualdades. No contexto brasileiro, essa análise é ainda mais contundente, pois as prisões não corrigem, não ressocializam e não oferecem qualquer perspectiva de reinserção social. Ao contrário, produzem mais violência, marginalidade e reincidência.
A articulação entre os pensamentos desses autores permite concluir que o Estado brasileiro, ao adotar uma política de encarceramento em massa, falha em cumprir sua função essencial de garantidor dos direitos fundamentais. Ao desrespeitar os princípios constitucionais e abandonar os apenados à própria sorte, o Estado deixa de ser instrumento de justiça e passa a ser vetor de opressão. A prisão, nesse contexto, torna-se símbolo da falência institucional, revelando um Estado que, ao invés de promover o bem comum, legitima a exclusão e a violência estrutural.
5.VIOLÊNCIA INSTITUCIONAL E RACISMO ESTRUTURAL NO CÁRCERE
A política de encarceramento em massa no Brasil não pode ser dissociada das formas de violência institucional que atravessam o sistema de justiça criminal. Essa violência, perpetrada por agentes do próprio Estado ou por sua omissão, manifesta-se tanto no momento da prisão quanto no cumprimento da pena, atingindo desproporcionalmente a população negra, pobre e periférica. Tal realidade evidencia a existência de um padrão de seletividade racial e socioeconômica que estrutura o sistema penal brasileiro, funcionando como instrumento de manutenção da desigualdade.
A violência institucional ocorre de múltiplas formas: desde a ausência de condições mínimas de habitabilidade nas unidades prisionais até o uso abusivo da força, o confinamento excessivo e a negação de acesso à saúde, educação e justiça. Apesar das garantias constitucionais previstas no artigo 5º, inciso XLIX da Constituição Federal, que assegura aos presos o respeito à integridade física e moral, observa-se que tais garantias são sistematicamente descumpridas. O desrespeito às normas nacionais e internacionais de direitos humanos é frequente e corrobora para a perpetuação de um ciclo de degradação e exclusão social.
A superlotação carcerária agrava esse cenário. Em 2022, segundo relatório do RELIPEN, havia cerca de 644 mil presos em um sistema com capacidade para 481 mil vagas. Tal situação não apenas impossibilita a aplicação efetiva das políticas de ressocialização, como também transforma o ambiente prisional em um espaço propício à reprodução da violência e do crime organizado. A ausência de prestação de contas por parte das instituições responsáveis e a falta de mecanismos de fiscalização eficazes reforçam a impunidade e tornam invisíveis as violações cometidas no interior dos presídios.
Além disso, o recorte racial é um elemento central da crítica ao sistema prisional. Dados do mesmo relatório revelam que mais de 60% da população carcerária é composta por pessoas negras (pretas e pardas), sendo que grande parte possui baixa escolaridade e pertence a grupos socialmente vulneráveis. Esse dado reforça o argumento de que a política penal brasileira opera sob uma lógica de seletividade racial, criminalizando determinadas identidades e corpos. Conforme apontado em audiência do Seminário Questões Raciais e o Poder Judiciário (2020), pessoas negras são submetidas a penas mais severas mesmo quando cometem os mesmos delitos que indivíduos brancos, como demonstrado em pesquisa da Agência Pública, na qual a quantidade média de maconha apreendida com brancos era maior que com negros, mas estes últimos eram mais frequentemente classificados como traficantes.
Essa desigualdade não é um reflexo isolado do racismo institucionalizado, mas uma manifestação concreta do racismo estrutural que perpassa as políticas públicas, as decisões judiciais e os padrões de policiamento. O encarceramento em massa, nesse sentido, funciona como mecanismo de extermínio simbólico e físico de grupos racializados, marginalizados historicamente no Brasil.
Trata-se, portanto, de uma política penal que opera por meio de uma lógica seletiva, reprodutora de injustiças históricas, alheia às exigências do Estado Democrático de Direito. Tal quadro exige a adoção de políticas públicas integradas que enfrentem o racismo institucional, promovam a justiça racial e estabeleçam os compromissos com a dignidade humana e com a legalidade constitucional.
A relação entre juventude, criminalidade e seletividade penal revela a face mais visível do racismo estrutural e da desigualdade social no Brasil. Conforme discutido por Miranda (2010), a fragilidade dos vínculos institucionais, como família, escola e comunidade, associada à exclusão social, constitui um dos principais fatores criminógenos que impulsionam crianças e adolescentes à prática de atos infracionais. A ausência de políticas públicas efetivas que garantam cidadania, educação de qualidade, lazer e oportunidades dignas insere essa juventude em um ciclo de invisibilidade e vitimização. Entretanto, ao ingressarem no mundo do crime, frequentemente como mecanismo de sobrevivência ou busca de pertencimento, esses jovens passam a ser vistos como vitimizadores, tornando-se alvos prioritários da repressão estatal. O discurso da segurança pública, segundo Chauí (2008), cumpre o papel ideológico de ocultar as causas estruturais da violência, transferindo a responsabilidade da insegurança social aos adolescentes em conflito com a lei. Assim, a criminalização da pobreza e da juventude negra serve não à justiça, mas ao controle social, reforçando a cultura do encarceramento e legitimando práticas de exclusão travestidas de ordem pública
6.INICIATIVAS INSTITUCIONAIS E PROPOSTAS DE SUPERAÇÃO
A gravidade da situação prisional no Brasil tem motivado, em certa medida, respostas institucionais voltadas à mitigação das violações sistemáticas de direitos fundamentais no cárcere. Tais iniciativas, ainda que pontuais e insuficientes frente à dimensão do problema, revelam esforços para enfrentar o estado de coisas inconstitucional declarado pelo Supremo Tribunal Federal na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) n.º 347/DF. Nesse julgamento, a Corte reconheceu a omissão do Estado brasileiro diante da precariedade do sistema prisional e determinou, entre outras medidas, a realização de audiências de custódia e o descontingenciamento de recursos do Fundo Penitenciário Nacional (FUNPEN).
No âmbito estadual, destaca-se a atuação da Defensoria Pública de Minas Gerais, que tem promovido vistorias técnicas e ações concretas em defesa da população encarcerada. Um exemplo emblemático foi o Procedimento Administrativo de Tutela Coletiva (PTAC) instaurado para acompanhar as condições do Centro de Remanejamento Provisório de Belo Horizonte (CERESP Gameleira). Relatórios elaborados entre 2022 e 2023 evidenciam progressos modestos, como a redução do número de detentos de 1.188 para 525, e o aumento da equipe médica. Entretanto, persistem deficiências estruturais, como a ausência de ambulatório, a limitação do acesso ao banho de sol e o número insuficiente de agentes de segurança e administrativos.
Esses dados reforçam a importância da atuação articulada entre instituições do sistema de justiça. Em julho de 2023, o Comitê Interinstitucional de Ação do Sistema de Justiça Criminal de Minas Gerais promoveu reunião para pactuar medidas destinadas à proteção dos direitos das pessoas privadas de liberdade. Participaram representantes do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, Ministério Público, Defensoria Pública e da Secretaria de Justiça e Segurança Pública. Entre as ações acordadas, destacam-se: a transferência de detentos para outras unidades, a instalação de Centrais de Audiências de Custódia, o reexame da situação jurídica de presos provisórios e o fortalecimento da fiscalização sobre denúncias de tortura.
Apesar desses avanços, ainda é necessário enfrentar as causas estruturais do encarceramento em massa. A construção de novos presídios, frequentemente apontada como solução, não é capaz de alterar o paradigma punitivista que orienta a política criminal brasileira. Conforme salientado pelo Ministro Gilmar Mendes em entrevista à BBC Brasil (2017), “construir presídios não é a solução para a crise carcerária”, pois, além do tempo e custo envolvidos, a medida reforça o ciclo de aprisionamento sem enfrentar suas raízes sociais e institucionais.
O enfrentamento eficaz do problema exige a adoção de políticas públicas integradas e orientadas por uma perspectiva garantista, que priorize a prevenção da criminalidade, a aplicação de penas alternativas à prisão, a valorização da educação e do trabalho no sistema prisional e a garantia de acesso à justiça. Medidas como mutirões carcerários, fortalecimento das defensorias públicas, monitoramento por órgãos independentes e investimentos em reintegração social devem ser parte de uma estratégia coordenada e permanente de reversão do quadro atual.
Portanto, ainda que existam iniciativas relevantes, é imprescindível que o Estado brasileiro assuma o compromisso político, orçamentário e institucional com a transformação profunda de seu sistema penal. A crise carcerária, longe de ser um problema isolado, reflete o fracasso das políticas públicas de segurança e justiça, exigindo resposta estruturada e baseada na centralidade dos direitos humanos.
7.CONCLUSÃO
A análise desenvolvida permite concluir que a política de encarceramento em massa no Brasil configura uma grave afronta aos direitos fundamentais, ao Estado Democrático de Direito e à dignidade da pessoa humana. A manutenção de um sistema prisional baseado na punição excessiva, na seletividade e na marginalização de grupos vulneráveis compromete não apenas a eficácia da justiça criminal, mas também a coesão social e a segurança pública.
O reconhecimento da falência desse modelo exige do Estado, em todas as suas esferas, uma atuação pautada na legalidade, no planejamento e na promoção de políticas públicas efetivas voltadas à prevenção da criminalidade, à ressocialização dos apenados e ao respeito incondicional aos direitos humanos. Medidas como o fortalecimento da Defensoria Pública, a ampliação das audiências de custódia, a fiscalização sistemática das unidades prisionais e o combate à cultura do encarceramento devem ser priorizadas.
A partir de uma abordagem interdisciplinar e crítica, conclui-se que a superação do estado de coisas inconstitucional reconhecido pela ADPF 347/DF demanda uma reestruturação profunda do sistema penal brasileiro, que incorpore a justiça social como princípio orientador. Somente assim será possível avançar em direção a um sistema prisional mais justo, eficiente e verdadeiramente humano.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ÂMBITO JURÍDICO. A seletividade do sistema penal brasileiro. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-penal/a-seletividade-do-sistema-penal-brasileiro/. Acesso em: 09 nov. 2024.
ÂMBITO JURÍDICO. O falso pragmatismo de aumento de pena. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-penal/o-falso-pragmatismo-de-aumento-de-pena/. Acesso em: 23 nov. 2024.
BARATTA, Alessandro. Criminologia crítica e crítica do direito penal: coleção pensamento criminológico. 3. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2002.
BBC NEWS BRASIL. 'A questão não se resolve com construção de presídios', diz Gilmar Mendes sobre crise penitenciária. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-38492779. Acesso em: 29 out. 2024.
BOTTINI, Pierpaolo Cruz; TORON, Alberto Zacharias. O encarceramento em massa, um estado de coisas abominável. Disponível em: https://direito.usp.br/noticia/36dbdd2ab0d2-o-encarceramento-em-massa-um-estado-de-coisas-abominavel. Acesso em: 16 abr. 2025.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 15 abr. 2025.
CANAL CIÊNCIAS CRIMINAIS. Os processos de criminalização primária e secundária. Disponível em: https://canalcienciascriminais.com.br/os-processos-de-criminalizacao-primaria-e-secundaria/. Acesso em: 29 nov. 2024.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. O encarceramento tem cor, diz especialista. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/o-encarceramento-tem-cor-diz-especialista/. Acesso em: 05 abr. 2025.
CONSULTOR JURÍDICO. Direito de defesa: o encarceramento em massa, um estado de coisas abominável. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2022-jan-31/direito-defesa-encarceramento-massa/. Acesso em: 03 mar. 2025.
CONTEUDO JURÍDICO. Direito penal do inimigo (ou inimigos do direito penal). Disponível em: https://www.conteudojuridico.com.br/open-pdf/cj029698.pdf. Acesso em: 01 abr. 2025.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento da prisão. 16. ed. Tradução de Raquel Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 1997.
GARCÍA-PABLOS DE MOLINA, Antonio; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade e validade. Tradução de Flávio Beno Siebeneichler. 2. ed. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 2010.
HOBBES, Thomas. Leviatã. Tradução de Jackson Pierre de Andrade e Ricardo Marcelino Palo Rodrigues. São Paulo: Hunter Books, 2014.
INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS (IBCCRIM). Encarceramento em massa e a tragédia prisional brasileira. Disponível em: https://arquivo.ibccrim.org.br/boletim_artigo/5947-Encarceramento-em-massa-e-a-tragedia-prisional-brasileira. Acesso em: 29 out. 2024.
INSTITUTO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS CRIMINAIS (IBCCRIM). Teoria do Labelling Approach. Disponível em: https://ibccrim.org.br/noticias/exibir/7410/. Acesso em: 29 mar. 2025.
JUS.COM.BR. As prisões no Brasil e a impossibilidade de ressocialização do preso. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/42375/as-prisoes-no-brasil-e-a-impossibilidade-de-ressocializacao-do-preso-verdade-ou-mentira. Acesso em: 20 mar. 2025.
JUS.COM.BR. Ressocialização prisional: um dever estatal e social. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63324/ressocializacao-prisional-um-dever-estatal-e-social. Acesso em: 20 nov. 2024.
MIRANDA, Emanuelle Lopes. Juventude, criminalidade e segurança pública. [S.l.]: [s.n.], 2010.
NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais comentadas. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.
OLIVEIRA, Eliana. Prisão: um paradoxo social. 3. ed. Florianópolis: UFSC, 2003.
SECRETARIA NACIONAL DE POLÍTICAS PENAIS (SENAPPEN). Relatório de informações penitenciárias (RELIPEN) - 1º semestre de 2023. Disponível em: https://www.gov.br/senappen/pt-br/assuntos/noticias/senappen-lanca-levantamento-de-informacoes-penitenciarias-referentes-ao-primeiro-semestre-de-2023. Acesso em: 23 fev. 2025.
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF). ADPF 347 MC / DF. Disponível em: https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=10300665. Acesso em: 15 fev. 2025.
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS (TJMG). Comitê interinstitucional define medidas para resguardar direitos de pessoas detidas. Disponível em: https://www.tjmg.jus.br/portal-tjmg/noticias/comite-interinstitucional-define-medidas-para-resguardar-direitos-de-pessoas-detidas.htm. Acesso em: 28 mar. 2025.
ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal brasileiro. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.
Bacharel do curso de Direito da Faculdade de Minas - FAMINAS BH. Cursando Pós-graduação em Direito Penal e Processo Penal Aplicados pela EBRADI e Criminologia pela Ipemig
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: RIBEIRO, Sarah Alves. Políticas de encarceramento em massa e os direitos fundamentais no Brasil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 30 abr 2025, 04:32. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/artigos/68459/polticas-de-encarceramento-em-massa-e-os-direitos-fundamentais-no-brasil. Acesso em: 30 abr 2025.
Por: Valdir Rodrigues Moraes
Por: JOÃO VICTOR TAYAH LIMA
Por: Janielly Araújo Porfirio de Souza
Por: Fernanda Corso Sartori
Por: Michel Lima Sleiman Amud
Precisa estar logado para fazer comentários.